Um domingo difícil. Escolhas ruins. Polarizadas. Perigosas até. Não costumo escrever sobre o cenário nacional. Ainda mais aos domingos, dia de baixa audiência por aqui. Há muitos e mais competentes observadores da cena política brasileira e cuja leitura o Miguel José Teixeira (principalmente) e eu replicamos aqui. Hoje é uma exceção. E histórica. Inclusive contra os nossos erros
O presidente Jair Messias Bolsonaro, PL, entrou no modo desespero.
Se ele perder, a culpa será só dele – o que não ouve, o que dita, o que mente, o que acusa -, dos filhos irresponsáveis e do seu entorno de milicianos provocadores radicais nas mídias sociais.
Foram eles que escolheram o ex-presidente e ex-presidiário Luiz Inácio Lula da Silva, do PT , o partido que atrasou o Brasil com o sindicalismo pelego, o radicalismo do nós contra eles, do estatismo para se ter empreguismo e corrupção, bem como do desastre chamado Dilma Vana Roussef, como adversário.
Era para vencê-lo com facilidade. Nada de terceira via para não se ter uma surpresa, o novo, naquilo que se fazia a meia-boca com um posto Ipiranga de fachada na economia que prometia ser revolucionária e virou igualzinha ao passado.
Era o bem contra o mal – o breve mal do passado que citei acima. Parece – se as pesquisas de ontem estiverem certas -que não está dando certo. São tiros no próprio pé desde o primeiro dia de governo, companhias estranhas e oportunistas que estiveram no lamaçal petista como o PP, o PL de Valdemar da Costa Neto e o guloso Centrão de Arthur Lira, PP-AL – prioridades erráticas. Uso de imagens que foram se desfazendo, numa prova de uso indevido e esperto.
E isso, ficou claro quando da expulsão do ex-juiz e hoje senador, Sérgio Moro e que agora é o que pode salvá-lo, numa reaproximação que fica claro sem liga. A lista deste desatino é longa, desde quando Eduardo Bolsonaro, Republicanos, o deputado federal campeão de queda de votos em São Paulo, anunciou há cinco anos que para fechar o Supremo Tribunal Federal, bastava um jipe, um cabo e dois praças.
Ontem, em suprema humilhação, na “carta” com lista que Bolsonaro divulgou, prometeu e também, pasmem, não fazer nada no STF. E lá nesta “carta aos brasileiros” que não iria aumentar o número de ministros do STF, respeitar a instituição e muito mais, como a liberdade de expressão. E precisava esta “carta”? Desdisse o seu próprio discurso de anos e que move seus fanáticos. Esta carta prova que o que se escreve não tem valor. Nada mais. Meu Deus!
Como abri este comentário, Bolsonaro se perder, perderá para ele próprio com a ajuda de seus fanáticos, milicianos que os trouxe para si, bem como os conselheiros que escolheu para permanecer e inflar à sua própria bolha. Ora, com uma máquina governamental, de estado e política, distribuindo dinheiro a rodo, inclusive para os pobres que agora estão mandando solene bananas, perderá, se perder, para aquilo que já foi símbolo do atraso, da corrupção e de perseguição à modernidade de um Brasil eternamente à procura do seu futuro.
Impressionante disso tudo. A de hoje escolha está se dando num país majoritariamente conservador ou de centro-direita, cristão e liberal na economia. E poderemos estar escolhendo o oposto disso, que se sabe pode ser o buraco. É um domingo difícil na história e nas escolhas. Deus tenha piedade de nós. Renegamos o melhor para nós nas eleições. A começar por Gaspar. Basta ver os resultados do dia dois de outubro e que foram temas de vários comentários. Wake up, Brazil!
3 comentários em “UM VOTO PARA CONTINUAR NO MESMO LUGAR OU PARA VOLTAR AO PASSADO JÁ REJEITADO”
UMA ELEIÇÃO DE DUAS TORCIDAS, por Bruno Boghossian, no jornal Folha de S. Paulo
Uma pesquisa feita pelo Datafolha há 535 dias desenhava o que seria a corrida presidencial. Recém-saído da prisão, Lula mostrava que havia mantido o domínio da esquerda, aparecendo como favorito. Mesmo desgastado pela tragédia da pandemia, Jair Bolsonaro tinha mais que o triplo das intenções de voto de outros nomes de direita, fechando espaços para uma candidatura alternativa.
O embate entre um presidente e um ex-presidente populares, com plataformas e defeitos públicos, fez com que a eleição se desenrolasse como uma disputa de torcidas. Movido por uma sensação de pertencimento, o país se alinhou de maneira firme em cada lado da arquibancada e reduziu o potencial de mudanças bruscas provocadas pela campanha.
Nenhum fato dos últimos meses abalou de maneira significativa o vínculo de meio eleitorado com o líder de um governo encerrado há quase 12 anos. O próprio Lula explorou como arma de defesa a monotonia de ser um político conhecido, a fim de vender a ideia de que fará uma gestão sem sobressaltos.
A campanha adversária não desidratou o petista ao investir no velho fantasma da ameaça comunista ou fabricar novos, como a ideia de que o ex-presidente fechará igrejas. Os ataques foram úteis apenas para permitir que Bolsonaro vestisse o uniforme com que conseguiu a vitória na eleição de 2018.
O principal feito do presidente foi reaglutinar parte considerável do grupo que o empurrou para o poder há quatro anos. Bolsonaro soube instrumentalizar a rivalidade com o lado oposto para convencer muitos daqueles torcedores de que seria impossível mudar de time na hora de enfrentar o mesmo adversário.
A máquina do governo foi incapaz de produzir uma avalanche na eleição, ainda que tenha conseguido reduzir o peso da inflação e a memória do morticínio dos últimos anos. A fidelidade dos apoiadores foi suficiente para fazer Bolsonaro resistir a escândalos como o caso das meninas venezuelanas e o ataque armado protagonizado por um aliado
BIAL FOI O MELHOR DO DEBATE, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Hoje as urnas falarão. Infelizmente, no último debate os dois candidatos foram agressivos e repetitivos. É verdade que, sendo repetitivo, Lula falava do seu governo, tinha um acervo que falta a Bolsonaro. Houve uma pandemia, mas sua conduta não o credencia. Bolsonaro falava do seu governo e instalou-se na crítica que o beneficiou em 2018. Ambos diziam que o outro é mentiroso. Como disse Bolsonaro, “chegamos a um impasse aqui”. Quem ficou preso no impasse foi o eleitor.
As únicas propostas transmitidas durante as duas horas do debate vieram nos comerciais, com Pedro Bial pedindo doações para os refugiados das Nações Unidas, contando a história da menina Ana. Além dele, o Programa Médicos sem Fronteiras, pedia doações de R$ 30 mensais.
Bolsonaro defendendo a Constituição parecia uma cena de comédia italiana. Do treinamento dos dois candidatos resultou que Lula administrou direito seu tempo e afastou-se fisicamente do adversário. Deixou Bolsonaro cenograficamente isolado no cenário. O bordão “vai pra casa Lula”, repetido do debate anterior, parece ser inócuo porque no primeiro turno 57,2 milhões de pessoas acharam o contrário.
Os dois primeiros blocos do debate foram apenas cansativos, com dois senhores insultando-se.
Mesmo quando Lula apontou para o calcanhar de Bolsonaro e levantou o tema da pandemia de Covid o debate da Globo repetiu o da Band. Voltaram ao ponto de partida, com um chamando o outro de mentiroso, com Bolsonaro preso à bola de ferro dos 680 mil mortos. Ganha uma caixa de Viagra quem souber de alguém que toma a pastilha com o objetivo mencionado por Bolsonaro no seu compulsivo exercício ilegal da medicina.
Todo governante carrega defeitos. Lula nadou de braçada quando cobrou resultados a Bolsonaro. Capitão ia buscar desastres velhos. Os dois sentiam-se melhor quando o outro não respondia ou permitia que o chamasse de mentiroso.
Bolsonaro, incumbente, jogou na defesa e, como ensina o futebol, quem não faz gol, toma. Felizmente voltaram os comerciais, com Ambipar falando do meio ambiente.
Terminados os blocos dos insultos, os candidatos foram obrigados a anunciar o que pretendem fazer de Pindorama nos próximos quatro anos. Ambos ofereceram suas plataformas. Cada eleitor poderá julgá-las.
Sobraram duas promessas concretas. Lula diz que isentará de imposto de renda quem tem renda inferior a R$ 5 mil mensais. (Em 2018, Bolsonaro prometeu e não cumpriu.) O capitão prometeu um salário mínimo de R$ 1.400, perdeu-se no palanque de 2018 e por pouco não pediu votos para voltar à Câmara dos Deputados.
Na dúvida, quem quiser pode mandar uma pequena doação para refugiados da ONU, como pede Pedro Bial, ou para o programa Médicos sem Fronteiras.
AVISO AOS NAVEGANTES
Contados os votos, sempre aparece alguém pensando em lances excêntricos.
Na eleição de hoje as cartas foram para a mesa na segunda-feira.
No primeiro lance, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, ladeado por Fabio Wajngarten, assessor da campanha bolsonarista, denunciou uma fraude nas inserções radiofônicas.
No segundo lance, Eduardo Bolsonaro pediu o adiamento da eleição. No terceiro, o pai de Flávio reuniu-se com ministros, inclusive os comandantes militares.
Tomaram um contravapor do ministro Alexandre de Moraes: a falha não era do TSE e, se houve, veio do partido do capitão.
Na sexta-feira, o ministro Fábio Faria informou:
“Me arrependi profundamente de ter participado daquela entrevista coletiva. Se eu soubesse que (a crise) iria escalar, eu não teria entrado no assunto”.
Caso raro de honestidade política.
Em outros tempos Pindorama passou por coisas parecidas em três ocasiões:
Em 1982, armou-se um esquema de roubo de votos no sistema de totalização da empresa privada Proconsult. Deu em escândalo.
Em 1981, a “tigrada” do DOI do Rio, armou um atentado talvez para tumultuar um show no Riocentro, explodindo um carro no estacionamento. Morreu o sargento que tinha a bomba no colo.
Em agosto de 1954, a guarda pessoal de Getúlio Vargas armou um atentado contra o jornalista Carlos Lacerda. Contrataram um pistoleiro e foram à cena do crime num táxi do ponto perto do palácio presidencial.
Atiraram e mataram um major da Aeronáutica que escoltava Lacerda.
O motorista apresentou-se à polícia na manhã do crime e dois dias depois identificou o passageiro. Era um dos capangas do presidente.
Vargas matou-se.
CONTRA OUTRA, DOUTOR
Campanha eleitoral transforma urubu em meu louro. O doutor Paulo Guedes resolveu acertar o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que decidiu apoiar Lula.
Como Meirelles disse que Guedes furou o teto de gastos, ele atirou:
“Nós furamos o teto porque é um teto muito mal construído. É tão mal construído que o economista não é nem economista.”
Noves fora a engenharia do teto, Guedes vestiu a camisa do sindicalismo corporativista ao dizer que Meirelles “não é nem economista”.
Não eram economistas:
Pedro Malan, Mário Henrique Simonsen e Eugênio Gudin formaram-se como engenheiros. Roberto Campos era diplomata. Joaquim Murtinho, o ferrabrás da República Velha, era também médico e homeopata.
O primeiro professor de “ciência econômica” brasileiro foi o Visconde de Cairu (1756-1835). Estudou em Portugal com bolsa da Viúva, passou a vida em cargos públicos, aposentou-se aos 50 anos e nunca deu uma aula. Não produziu um só prego.
ONIPOTÊNCIA VERBAL
Paulo Guedes padece de onipotência verbal. Quando ele insinua, quatro dias antes de uma eleição que o PT poderá taxar as transações com o Pix, exagera.
O PT nunca propôs isso. Quem propôs taxar as transações eletrônicas foi ele.
Aos fatos:
Em dezembro de 2019, depois do fracasso da ressurreição da CPMF, o doutor disse:
“Tem transações digitais. Você precisa de algum imposto, tem que ter um imposto que tribute essa transação digital.”
NOVOS NOMES
Sejam quais forem os resultados da eleição de hoje, a política brasileira tem três novos nomes.
De longe, o primeiro nome é o de Simone Tebet, seguida de perto pelo mineiro Romeu Zema. Adiante, surge Tarcísio de Freitas, ganhando ou perdendo o governo de São Paulo.
O FARDO DO HOMEM BRANCO
A chegada de Rishi Sunak ao cargo de primeiro-ministro da Inglaterra é uma boa ocasião para se pensar no destino dos povos. Ele nasceu na Grã-Bretanha, neto de indianos. Seu pai nasceu no Quênia e a mãe no Tanganyika (atual Tanzânia). Ao tempo do avô de Sunak, Winston Churchill debochava de Gandhi chamando-o de “faquir seminu”.
Naquele século, negros do Quênia rebelaram-se contra o domínio inglês e prenderam por vários meses Hussein Onyango Obama, avô de futuro presidente dos Estados Unidos.
Em 1899, o inglês Rudyard Kipling (nascido na Índia) escreveu seu famoso poema “O fardo do homem branco”, atiçando iniciativas imperialistas. Vinte anos depois ele veio ao Brasil e, ao chegar a Salvador, perguntou onde estavam os índios ao jovem repórter que o acompanhava. Era Luís Viana Filho, que viria a ser governador da Bahia.
A HISTÓRIA, NÃO, MAS OS NÚMEROS REPETEM, por Eliane Cantanhede, no jornal O Estado de S. Paulo
Luiz Inácio Lula da Silva não é Dilma Rousseff, Jair Bolsonaro não é Aécio Neves e os tempos são outros, mas há uma forte relação entre a eleição de 2022 e a de 2014, em que o tucano Aécio venceu no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste, mas perdeu a Presidência para a petista Dilma. O mapa de votos tende a reproduzir isso neste domingo, a favor do também petista Lula. Mesmo com o seu governo já fazendo marola e a economia morrendo na praia, Dilma surfou na onda do PT e de Lula. Venceu com enorme margem no Nordeste (que tem 27% dos votos nacionais), no Norte (8%) e… em Minas. O suficiente para subir novamente a rampa do Planalto.
O que fez a diferença foi Minas, estado natal de Aécio e Dilma. Ele venceu no Sudeste graças a São Paulo (maior colégio eleitoral), mas Dilma ficou na frente no Rio (terceiro colégio) e em Minas (segundo), a grande surpresa. Aécio perder ali?
Segundo as pesquisas, Bolsonaro, como Aécio, tem Rio e São Paulo, não Minas. Vence no Sudeste, Sul e Centro-Oeste e empata com Lula no Norte. Pode, assim, repetir o êxito regional de 2018, quando ganhou em todas as regiões, exceto o Nordeste, o bolsão vermelho seja com Dilma, Haddad ou Lula.
O que ameaça a reeleição de Bolsonaro? O mesmo que tirou a vitória de Aécio há oito anos: não virar em Minas nem crescer no Sudeste o suficiente para neutralizar o Nordeste. Saiu do primeiro turno e chega ao segundo com praticamente os mesmos percentuais, apesar de tudo.
Bolsonaro deu de ombro para a lei eleitoral, jogou todo o peso do governo na sua reeleição, inventou até empréstimo consignado para quem precisa do auxílio Brasil para comer e foi quatro vezes a Minas, acionando seu exército no Estado: o general Braga Neto, Michelle, o governador reeleito Romeu Zema, o senador eleito Cleitinho e o deputado mais votado do País, Nikolas Ferreira. E daí? Daí, nada. Os números não saíram do lugar.
Lula fechou o cerco, por cima e por baixo, com uma palavra mágica, democracia, e um carimbo, inclusão social. Atraiu Geraldo Alckmin e o eleitorado pobre, o maior do País. Vieram junto tucanos, emedebistas, economistas, juristas, Simone Tebet e Marina Silva. Bolsonaro não teve para onde correr. Manteve o que já tinha, antipetismo radical e eleitorado evangélico, da bala e do boi. Dali, não saiu.
Surpresas sempre podem acontecer, como a derrota de Aécio em Minas, que lhe custou a Presidência, mas, pelo andar da carruagem e das pesquisas, Lula está mais próximo da vitória, com o compromisso de união nacional, democracia, inclusão, reconstrução e transição. O fim de uma era. A eleição de 2026 terá ares e caras novas.