Alterado às 8h55min de 05.06.22. Era uma aparente ingênua apresentação de engenheiro Ricardo Alexandre da Silva, do Samae, na terça-feira passada, feita apenas para “acalmar”, e preventivamente, os vereadores da própria Bancada do Amém (MDB, PP, PSD, PDT e PSDB) ao transtorno de mobilidade – inclusive na circulação do transporte coletivo. Isto se dará por conta das obras para a implantação de uma adutora de 40 centímetros de diâmetro no Centro de Gaspar. Ela vai interligar e permitir levar água ao sistema do Barracão, Bateias, Oleo Grande, Bom Jesus e Macucos. Todavia, ao fim, esta apresentação deixou a nu, que a autarquia vive de improvisos (é no plural, mesmo). E pior: ela não possui caixa – e não sabe como gerá-lo – para fazer frente ao mínimo e suprir à demanda de água tratada dos próximos anos para as áreas urbanizadas e industriais em expansão em nossa cidade.
Mais. Está claro que o viés político e não técnico – o qual seria de se esperar em ambiente tão estratégico numa cidade – é prevalente no Samae de Gaspar. São eles – o lado político e os improvivisos – infelizmente, quem são a caixa de torque do governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, mas que está com um pé no PP. Pobre Gaspar! A reprodução acima, mostra em azul, o traçado onde se assentarão os canos da nova adutora. Os de outras cores, são estudos feitos e que não vingaram.
O engenheiro Ricardo fez o papel preventivo dele. E, ao mesmo tempo, sem que esta fosse à sua intenção, alimentou duas munições para males que tiram o sono de alguns por aqui. A primeira foi para a Bancada do Amém tourear o povo no engarrafado e sem alternativa de rotas do Centro quando começarem as obras. E a segunda e mais importante, ficou nas entrelinhas das justificativas desta obra. São graves e preocupantes. E é delas que tratarei essencialmente neste artigo para, mais uma vez, desesperar os “çábios” que se aboletaram no governo do poder de plantão e estão às sombras do Paço como se estivessem no País de Alice. Eles próprios sabotam este imaginário marqueteiro.
Sobre a primeira, antes de prosseguir sobre a segunda, é ingênuo o engenheiro Ricardo acreditar – com seis agentes disponíveis para escalas, sem contar férias, licenças e o trabalho rotineiro deles -, que a Ditran – Diretoria de Trânsito – vai dar conta de organizar o trânsito a favor dos gasparenses durante execução das obras aqui no Centro. Basta ver o que aconteceu, por muitos meses seguidos, com algo muito mais simples.
Quando da reparação da passarela da ponte da Sociedade Alvorada, durante a interdição parcial dela, a Ditran, a secretaria de Obras e Serviços Urbanos, a executora da obra, o a secretaria de Planejamento Territorial – a que está afeita à ação estratégica – sequer conseguiram instalar um semáforo “siga-e-pare” para suprir à falta de agentes nos horários de picos, mesmo diante de severas e constantes críticas da população, as quais colocaram o governo sob desgaste. E para esta obra do Samae no Centro estima-se quatro meses de transtornos. Se estimam quatro meses…
Voltando.
O que o engenheiro Ricardo disse a todos os vereadores que não tinham saído antes da hora, como virou uma prática por lá para em média uma hora e meia de um a única sessão deliberativa por semana?
O que toda a cidade já sabia, que foi tratado várias vezes aqui e não exatamente pela minha cabeça – como se costuma dizer por aí para me desqualificar -: o abastecimento da zona sul da cidade é deficitário e deficiente, não é de hoje. E tudo tende a piorar para o futuro. Daí a emergência e a escolha, segundo ele, técnica, em interligar a rede de lá com a daqui, para suprir a demanda de lá, e de acordo com os cálculos do próprio Samae para justificar a obra, até 2050. A tentativa via o Macucos se mostrou insuficiente.
E o engenheiro Ricardo disse isso diante no mais longevo dos vereadores – e originário do Barracão – José Hilário Melato, PP. O vereador ao tempo que foi presidente do Samae e podendo fazer esta interligação, não a fez, preferiu o improviso dos caminhões pipas sob dúvidas da vigilância sanitária; preferiu aumentar a reservação do Centro e se meteu a fazer drenagens, que lhe rendeu uma CPI na Câmara. Para enterrá-la e salvar Melato, levou ao desgaste os vereadores representantes do governo nela contra as evidências que se apurou na época.
É claro que Melato – o político e não, o que tecnicamente não entende deste assunto – discordou mais uma vez desta prioridade. Melato não é mais presidente do Samae, mas age como se fosse e quer ter o controle da autarquia. E talvez a terá, se confirmada, à volta de Jean Alexandre dos Santos, MDB, ao primeiro escalão do governo.
As preocupações que o engenheiro Ricardo relatou – de forma direta quase – são as mesmas que anos atrás, quando eram temas recorrentes dos ex-vereadores Rui Carlos Deschamps, PT, ex-presidente da autarquia e de Cícero Giovane Amaro, sem partido, mas na época no PSD, ainda funcionário efetivo do Samae. Foram elas que alimentaram o debate público e tiraram o governo da perigosa zona de conforto onde está e por culpa da Bancada do Amém. Ela já está recebendo a fatura deste apoio cego e incondicional ao erro, onde não se consegue sequer dar conta da simples manutenção da cidade.
Os políticos usam o Samae. A autarquia já foi tida como o “caixa” para ajudar a prefeitura nas emergências, como foi o caso das drenagens relatado acima. Pelo jeito, não é mais. “O cobertor está curto. Se puxa de um lado, descobre o outro. Se tiver como enviar mais recursos…”, exemplificou o engenheiro Ricardo para dizer que não se pode fazer tudo ao mesmo tempo naquilo que está na cara de todos nesta área.
E quais são estas vulnerabilidades?
A primeira delas é a dependência de Gaspar quase que exclusivamente uma única fonte de água para ser tratada: o poluído Rio Itajaí Açú. Acontecendo um acidente que impeça o uso da água do Rio, a cidade fica sem água nas torneiras.
A segunda é que precisa aumentar a produção de água nas duas principais Estações de Tratamento: a do Centro e a do Bela Vista, bem como criar uma terceira para atender o município no lado esquerdo do Rio Itajaí – incluindo o Distrito do Belchior até a Lagoa em visível expansão urbana, empreendimentos logísticos, comerciais e industriais. E por último, com a expansão da rede, o aumento da reservação em novos pontos estratégicos do município e não apenas a perigosa concentração como é hoje no Centro e Bela Vista, defendida pelo político Melato.
Estas duas prioridades expressas acima, não vieram da minha cabeça. E sim de técnicos especialistas neste assunto daqui e de fora. Elas permeiam o debate técnico sufocado pelos políticos que preferem o improviso e a suposta falta de recursos.
Se o Samae de Gaspar não possui geração de caixa, fontes de financiamento de longo prazo por falta de lastro financeiro, não possui função estratégica e Orçamento, para o que precisa ser projetado, ampliado, criado, modernizado, mantido e executado para pura e simples cumprir esta parte essencial desta sua missão, qual é a razão para enveredar em coisas que não é do seu “core business” como as drenagens, onde até se mistura águas pluviais com esgoto?
Nem a banal coleta de lixo, o Samae de Gaspar é capaz de gerenciar e vive se distraindo em debates fora do seu foco de resultados para a cidade, os cidadãos e cidadãs. Pior mesmo, é saber, que o Samae e o governo Kleber e Marcelo não cumprem nem a outra obrigação essencial e mínima, ou seja, que é a de implantar a coleta e tratamento de esgoto, numa agressão sem tamanho contra à própria saúde dos gasparenses e o meio ambiente. Casualmente neste cinco de junho é o Dia Mundial do Meio Ambiente. E por aqui, só desastres. A começar pela implantação muito recente de área estruturada de Meio Ambiente, como manda a lei, que se atrasou por anos e ao máximo, com Kleber e Marcelo. Só a implantaram, na última hora, a mando e “ameaças” de puni-los via o Ministério Público.
Então, não estaria na hora de se trabalhar com a privatização da autarquia para atrair investimentos e tornar a cidade mais segura, humana e competitiva para o desenvolvimento sustentável às novas gerações, ao invés de deixar o Samae “vivo” apenas para atender os interesses políticos partidários, empreguismo, improvisos e reinado dos nossos políticos, que dobram e ensacam os técnicos da autarquia diante de realidades tão cruéis? Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
O prefeito de Gaspar, Kleber Edson Wan Dall, MDB, pode estar cruzando uma linha perigosa onde se mistura o público com o privado familiar. Até aqui, as dúvidas se relacionavam à falta de transparência no ambiente em que ele está obrigado à gestão como o Hospital de Gaspar e até mesmo os áudios vazados do seu irmão de templo e o que fazia tudo no governo, Jorge Luiz Prucino Pereira, PSDB. Agora, o vereador Dionísio Luiz Bertoldi, PT, sem formalmente acusar, trouxe dados sobre o que considerou como sendo “ligações” perigosas. E não é na área do ramo imobiliário, mas das obras públicas.
Sob o título “Prefeitura de Gaspar: negócios de família”, o único vereador de oposição, Dionísio Luiz Bertoldi, PT, e sob olhares atravessados e o silêncio de quase todos – apenas o líder do governo, no papel dele, Francisco Solano Anhaia, MDB, surpreendido, desclassificou à apresentação – mostrou uma ligação umbilical societária e de representação comercial entre duas empresas que levam o prefeito ao centro de um possível problema de improbidade administrativa. A imprensa, como de costume, não tocou num ai de mais este delicado assunto.
Uma empresa chamada de SA Concretos Ltda., situada no bairro Santa Terezinha, fez vendas de produtos de concreto para a prefeitura de Gaspar no valor de R$156 mil. Nada demais. A não ser que um dos sócios dela, Alexandro Scarbelot é também de uma outra empresa, onde todos os irmãos e o pai do prefeito Kleber são sócios, também com sede em Gaspar. E para piorar, um dos sócios desta empresa, Nilberto Gessi Wan Dall , está nas redes sociais, convidando possíveis clientes para participarem de uma exposição e feira de negócios, realizada em Blumenau, não exatamente para a sua empresa, mas para a SA Concretos, onde está o sócio dele, Alexandro. Ai, ai, ai.
Esta gente, sem orientação ou se achando com o “corpo fechado” nas instituições de fiscalização como arrota por aí – até porque este assunto está no Ministério Público Estadual desde dezembro do ano passado e foi Dionísio quem levou -, diante da falta de oposição estruturada, ação da tal sociedade organizada, gosta mesmo é de colocar pelo – e gratuitamente para se complicar – em ovo. E depois reclama que está sendo “perseguido”. E por só um vereador? Ou pelo silêncio fingido de todos os demais, da imprensa e de grande parte da cidade? Meu Deus! Veja abaixo, o vídeo da sessão de terça-feira passada. Um espanto!
Manchete do final de semana: carros batem de frente na Rodovia Ivo Silveira, entre Brusque e Gaspar. Dois feridos graves. Esta é mais uma manchete – de muitas do passado e de imprevisíveis, mas certos acontecimentos iguais no futuro para a conta dos políticos populistas caolhos e empresários que olham só seus umbigos. Eles não querem a duplicação da Rodovia. Eles preferem-na como uma picada perigosa e contra o desenvolvimento regional, para sempre.
Bate e volta. Uma conselheira titular de Gaspar foi a São Paulo, em viagem aérea, acompanhar uma mãe de 28 anos e a criança dela. Isto tem, ainda, tudo para render. Espera-se o relatório da viagem.
Perguntaram a um empresário que lida com a moda infantil na Capital Nacional da Moda Infantil, o que teria mudado na vida empresarial dele depois que Gaspar ganhou o título arrumado pelos políticos em Brasília. E ele respondeu na lata: “nada. Só piorou. Faltam costureiras. As antigas não querem que suas filhas na profissão. Por isso, tenho que faccionar as costuras no Alto Vale e Planalto Norte”.
E na terça-feira, a Câmara de Gaspar, aprovou, a toque de caixa uma Moção de Aplausos as costureiras para se entregar no seu Dia, na mesma noite, em evento que se realizava fora dali. O que precisa de verdade? É qualificação de mão de obra, principalmente para quem chega na cidade à procura de renda, bem como orientação para se tornar micro empreendedor individual e assim entrar neste mercado faccionista. É uma forma de suprir demanda e rotatividade neste ambiente, diante da qualidade exigida, volumes e remuneração cada vez mais comprimida.
Duas dores de cabeça. A primeira delas é onde arrumar emprego para o atual presidente do Samae, Cleverton João Batista, MDB, se Jean Alexandre dos Santos, MDB, for para o lugar dele como se desenha no plano de paz que se arruma nos bastidores do governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB e Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, ou talvez no PP. A turma do prefeito Mário Hildebrandt, Podemos, de Blumenau, já mandou avisar que não quer Cleverton de volta. A segunda, é que o secretário da Saúde, Francisco Hostins Júnior, MDB, desgastado e vendo as chances de candidato a prefeito no ano que vem diminuírem, quer voltar para a Câmara para fazer o básico e não carregar mais este encosto chamado de Saúde.
Isto, naturalmente, vai demandar um rearranjo no governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, mas com os pés no PP. Nem tanto para a escolha do substituto de Francisco Hostins Júnior, MDB, na secretaria que troca de titular como se troca de roupa, mas para acomodar o suplente Norberto dos Santos, MDB. Ele – como primeiro suplente do partido – já deu sinais ao paço que não está gostando nada do novo desenho que se faz nos bastidores depois de esperar por mais de dois anos pela prometida vaga de vereador.
A primeira a bater em retirada foi a suplente Rafaele Vancine, MDB, para a volta emergencial de Francisco Solano Anhaia, MDB. Anhaia voltou para estancar a surra que o governo, o prefeito e a Bancada do Amém (MDB, PP, PSD, PDT e PSDB) estavam levando de um só vereador – Dionísio Luiz Bertoldi, PT – e as vezes, de Alexsandro Burnier, PL. Resumindo, um voltou porque ninguém teve capacidade ou quis dar a cara para o tapa e o desgaste. E o outro quer retornar, porque sabe que está numa barca furada e na Câmara se protege melhor das tempestades, ao mesmo tempo em que é mais um que pode defender o governo com suposta fundamentação.
O Maio Amarelo, quase branco se foi. Por isso, só no dia três e quatro de junho, a Ditran de Gaspar, resolveu repintar a sinalização horizontal das ruas São José e Industrial João Beduschi, Nereu Ramos e transversais no Centro. Nem calendário esta gente conhece. Acorda, Gaspar!
6 comentários em “O TARDIO DEBATE SOBRE GESTÃO TEMERÁRIA DO SAMAE DE GASPAR. É TRATADO COMO CABIDE DE EMPREGO E NÃO UM ENTE ESTRATÉGICO PARA O FUTURO DA CIDADE E DAS PESSOAS”
REPAGINANDO, por Eliane Cantanhede, no jornal O Estado de S. Paulo
A distância, durante duas semanas de férias, a sensação foi de que o presidente Lula continua fazendo e falando bobagens, sem enxergar a realidade: o governo está sem rumo, refém do Congresso e anunciando medidas que parecem fantásticas, mas não se sustentam 24 horas e deixam ministros e assessores quebrando a cabeça para consertar o estrago.
A tábua de salvação pode ser a economia (atenção: pode…), com a inflação apontando para baixo e o crescimento para cima. Mas o governo precisa ajudar, não atrapalhando nem ignorando crises, criando confusões desnecessárias, falando besteiras, lançando o que o próprio presidente chama de “ideias mirabolantes”.
Os “carros populares” são uma dessas “genialidades”. Os carros não eram tão populares, o plano era só uma ideia e, enfim, está sendo “repaginado” para ônibus e caminhões, segundo o apagador de incêndios Fernando Haddad. O governo não agradou ao consumidor, que parou de comprar, nem à indústria, que parou de vender. Nem à sociedade. Lula, ex-líder sindical no ABC paulista que prestigia carros e o setor automobilístico, está na contramão do mundo desenvolvido, que mira o futuro e soluções coletivas (metrôs, trens…), mais justas e saudáveis.
Isso lembra outras ideias que pareciam muito bacanas, mas ninguém sabe, ninguém viu, como taxar os produtos chineses que fazem a festa dos consumidores, baixar na marra os juros do crédito consignado, inventar passagens aéreas a R$ 100 e até o programa Desenrola,
que nunca desenrolou. Também joga holofotes na mania de Lula de trazer o Lula 1 e 2 para um mundo e um Brasil muito diferentes e com uma novidade que amplifica erros, críticas e fake news: a internet.
No início, Lula acertava na política externa e errava na gestão interna. Agora, erra nas duas. Como fazer loas à China e à Rússia e atacar EUA e Europa? Ficar em cima do muro na invasão da Ucrânia? Considerar um “momento histórico” o encontro com Nicolás Maduro, que destrói a Venezuela? Não é só um assombro para brasileiros, sul-americanos, terráqueos e marcianos, mas uma indignidade com o povo venezuelano.
Dito isso, não é justo condenar só Lula pela crise com o Congresso, que seria tomar partido a favor de Arthur Lira. Não dá. Ok que Rui Costa (Casa Civil) não pode atacar Brasília e Alexandre Padilha (Relações Institucionais) decepciona, anunciando calmaria na véspera das tempestades. Mas Lira é Lira, usa métodos questionáveis, brinca de ser Eduardo Cunha e, ao falar de “articulação”, traz de volta o grande risco: mensalões e petrolões. Lula 3 acha que pode tudo, mas sabe que, aí, está seu maior perigo.
BANCADA DA TOGA, por Dora Kramer, no jornal Folha de S. Paulo
Carece de melhor esclarecimento a declaração do presidente da República, dada há dias, de que não pretende repetir erros do passado na indicação de ministros ao Supremo Tribunal Federal. Qual seria exatamente a ideia?…
Lula não explicou onde acha que errou, mas a escolha do advogado pessoal para integrar a corte fornece pista robusta, quase uma prova de que considera a independência dos magistrados uma falha no exercício da guarda constitucional.
Ao expressar arrependimento, ele dá margem a tal interpretação. Pior: confere ares de veracidade à versão corrente segundo a qual o Executivo cogita firmar aliança com o Judiciário, a fim de superar as dificuldades com o Poder Legislativo.
A se confirmar essa intenção, a tradução dela seria a de que o governo planeja fazer do STF um atalho, colocando os ministros na condição de pajens do Planalto na tarefa de compensar dificuldades nas tratativas com deputados e senadores.
Não parece que possa dar certo. Embora hoje os juízes sejam vistos como participantes do embate político e objetos de julgamento em suas decisões, uma aliança explícita seria obviamente malvista, além de agressiva ao princípio da autonomia equipotente dos Poderes.
Numa breve consulta às internas do tribunal, constata-se rejeição ao suposto plano. Seria “o fim do mundo”, diz um ministro. Outro reserva-se o direito de silenciar ante a ideia, o que em si já é uma resposta. Um terceiro permite-se sugestão melhor que a de investir na formação de um Supremo “amigo”, algo semelhante a uma bancada da toga.
“Melhor seria que [Legislativo e Executivo] se entendessem e não viessem a nós com tanta frequência, pois o Supremo não é banca de advogados. As demandas chegam, somos obrigados a responder e, com isso, viramos alvos de insultos, nunca de reconhecimento”, analisa o magistrado.
Recados dados, na corte espera-se que sejam anotados.
PEC DA DESFAÇATEZ, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Não foi por acaso que a proposta de emenda à Constituição número 9/2023 ganhou, mesmo entre seus defensores, o apelido de PEC da Anistia. Com essa iniciativa, os parlamentares querem assegurar que permaneçam impunes irregularidades cometidas pelos partidos políticos no uso de dinheiro público nos últimos ciclos eleitorais.
Reconheça-se a qualidade da alcunha; talvez fosse melhor, contudo, chamar a proposta de PEC da Desfaçatez. Pois é disso que se trata: deputados e senadores não se pejam de modificar o texto constitucional com o único objetivo de se protegerem das punições que, tudo indica, eram líquidas e certas.
Em defesa do Congresso, diga-se que coerência não lhe falta. Essa não será a primeira vez que, num gesto de onipotência, ele não só pede perdão a si próprio como também o concede, garantindo que infrações às regras do jogo mereçam nada além de um profundo oblívio.
Mais que a repetição de um padrão imoral sob qualquer ponto de vista, o que chama a atenção são as cifras recordes envolvidas. Conforme mostrou reportagem da Folha, os partidos políticos, em conjunto, deram um calote de R$ 900 milhões em candidaturas de mulheres e de pessoas negras.
Pelas normas em vigor nas eleições de 2022, as agremiações estavam obrigadas a repassar recursos para mulheres e pessoas negras de forma proporcional à quantidade de candidaturas. Ocorre que, da direita à esquerda, do governo de turno à oposição, quase nenhuma legenda cumpriu esse ditame.
Que os políticos gostem ou não desse tipo de ação afirmativa é irrelevante. A eles compete produzir leis, não descumpri-las.
O caso das cotas nem é a única infração cometida quase à unanimidade. Há ainda a malversação do dinheiro público detectada pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Ao julgar com atraso as contas dos partidos relativas a 2017, a corte determinou a devolução aos cofres públicos de ao menos R$ 40 milhões, a título de ressarcimento e multa —valor que ainda precisa ser corrigido pela inflação.
Entre as situações mais graves está a do Pros, partido do qual quase ninguém se lembra e que foi incorporado ao Solidariedade neste ano. Pois essa agremiação nanica julgou oportuno queimar o dinheiro do contribuinte em itens como 3.700 quilos de carne, além da construção de uma piscina e da reforma da casa de Eurípedes Jr., que vem a ser ex-presidente do Pros.
A PEC da Anistia ainda está em tramitação no Congresso, o que significa que deputados e senadores ainda podem se corrigir. Caso não o façam, estarão dizendo para toda a sociedade que não têm escrúpulo de amesquinhar o valor da Casa a que pertencem.
AS SUPREMAS NARRATIVAS DO PRESIDENTE, por Felipe Moura Brasil, no jornal O Estado de S. Paulo
“Se eu quiser vencer uma batalha, eu preciso construir uma narrativa para destruir o meu potencial inimigo.” A frase dita por Lula ao lado de Nicolás Maduro, durante visita do ditador venezuelano ao Brasil, é uma confissão do método usado e recomendado pelo presidente.
Ela passou quase despercebida, porque as reações nacionais e internacionais focaram na aplicação dele ao caso do sucessor de Hugo Chávez:
“Companheiro Maduro, você sabe a narrativa que se construiu contra a Venezuela, de antidemocracia e do autoritarismo. Acho que cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa, para fazer as pessoas mudarem de opinião… É preciso que você construa a sua narrativa. E eu acho que, por tudo que nós conversamos, a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que a narrativa que eles têm contado contra você… Nossos adversários vão ter que pedir desculpa pelo estrago que eles fizeram na Venezuela.”
Lula, porém, já havia aplicado o mesmo método ao caso de José Dirceu. O presidente declarou, em fevereiro, que o mensaleiro petista também condenado pelo petrolão “não tem que andar escondido, tem que colocar a cara para fora e brigar”.
“Você tem que brigar para construir uma outra narrativa na sociedade brasileira.”
Dirceu está condenado em três instâncias por corrupção, com pena fixada pelo Superior Tribunal de Justiça em 4 anos e 7 meses em regime semiaberto. Ele recebeu suborno de R$ 2 milhões em caso envolvendo compra de tubos da Petrobras, segundo a acusação.
Já as agências de inteligência militares e civis do estado venezuelano implementam um “plano orquestrado nos mais altos níveis do governo para reprimir a dissidência através de crimes contra a humanidade”, segundo uma missão estabelecida pela ONU. Lula ainda tentou se explicar sobre o afago na ditadura que ajudou a sustentar com dinheiro dos brasileiros, via BNDES e Odebrecht:
“Desde que o Chávez tomou posse, foi-se construindo uma narrativa… Em que você determina que o cara é um demônio. A partir daí, você começa a jogar todo mundo contra ele. Foi assim que aconteceu com Chávez, foi assim que aconteceu comigo.”
Quando Lula se coloca junto a ditadores como vítima de narrativas falsas, ele só reforça a certeza sobre a falsidade de suas próprias narrativas, usadas para destruir seus inimigos. Lula crê que corrupção e abusos de poder – do passado, presente ou futuro – podem ser esquecidos, se houver narrativa “infinitamente melhor”. Para legitimar as dele, indicou seu próprio advogado para o Supremo Tribunal Federal.
Quando a ideologia passa o pano num direito profissional fundamental
MEXEU COM DUAS, MEXEU COM TODAS, por Lygia Maria, no jornal Folha de S. Paulo
O jornalismo teve uma semana difícil. Agressão e intimidação de profissionais pelo poder público expõem como ainda somos incapazes de lidar com a liberdade de imprensa.
Na terça (30), jornalistas foram agredidos por seguranças do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, quando se preparavam para uma entrevista coletiva no Itamaraty. Na confusão, um agente a serviço do GSI desferiu um soco no peito da jornalista Delis Ortis. Trata-se de um barbarismo autoritário comum na ditadura venezuelana, mas inaceitável em qualquer regime democrático.
No dia seguinte, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, intimidou publicamente a jornalista Malu Gaspar. Em postagem no Twitter, acusou Gaspar de inventar informações e atribuí-las a fontes da empresa. De modo infantil e destemperado, riscou digitalmente, em letras vermelhas garrafais, a palavra “fake” no print da notícia que o desagradou.
Jornalistas trabalham com fontes que, por lei, podem ser mantidas anônimas. Além disso, Gaspar tem trabalho reconhecido e de longa data na cobertura jornalística da Petrobras. Se informações sobre um novo escândalo de corrupção envolvendo a empresa vazarem, profissionais de imprensa deveriam esperar que a direção confirme o crime para poderem noticiar?
Prates demonstrou ignorância sobre a atividade jornalística e o papel primordial que ela exerce na fiscalização do poder público. Ademais, e mais preocupante, escancarou autoritarismo ao intimidar a profissional. Se um órgão público discorda de uma informação, há meios mais elegantes e republicanos para divulgar descontentamento —através das assessorias de imprensa que mantêm contato com jornais, por exemplo.
Curiosamente, duas mulheres. Um dos motes do feminismo é “Mexeu com uma, mexeu com todas”. Na última semana, mexeram com duas. Mas, ao contrário do que aconteceria se estivéssemos sob Jair Bolsonaro (PL), nem todas se afetaram.
O PROJETO DE UM PAÍS QUE PENSA PEQUENO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
No embrião do pacote industrial preparado pelo governo, que agita o setor empresarial e movimenta o debate acadêmico, um detalhe chama a atenção: a exigência de conteúdo nacional como uma forma de dar mais competitividade à indústria. No dia 25 de maio, Dia da Indústria, a medida foi anunciada entre as que iriam compor o pacote de incentivo ao setor automotivo, por exemplo. Como se andar na contramão da economia mundial fosse um diferencial positivo.
Por mais bem-intencionada que possa parecer, a defesa de conteúdo nacional não implica aumento de eficiência e competitividade de nossos produtos diante da concorrência internacional. Pelo contrário. Num mercado há muito globalizado, que tem no setor automobilístico altamente tecnológico um exemplo bem acabado, a pseudoproteção representada pela obrigatoriedade de fabricação nacional significa, antes de tudo, abrir mão de avanços tecnológicos – que são, estes sim, o verdadeiro diferencial dos produtos que circulam no comércio mundial.
Não há como incentivar competitividade com um olhar voltado apenas ao mercado doméstico. Também não há como elevar a produtividade e a participação no mercado internacional distribuindo subsídios. Ou seja, um programa de subsídios para carros “populares” que incentiva o uso de peças nacionais é equivocado em múltiplas dimensões.
“Por que dar subsídio para a indústria automobilística se ela não consegue exportar o nosso carro?”, questionou, com razão, Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), em entrevista ao Estadão. “O dia em que a nossa indústria conseguir fazer um carro que compita no mercado internacional, aí vou achar que algum tipo de subsídio ou política vai fazer sentido. Mas essa é uma indústria que está conosco há 60 anos, e tirando um ou outro período relativamente curto, nunca gerou capacidade exportadora.”
De acordo com dados da Organização Mundial do Comércio, o Brasil, com 1,3% de participação na corrente de comércio, ocupa a 25.ª posição entre os maiores países exportadores. A soja lidera a lista dos produtos brasileiros mais vendidos, o que não é nenhuma surpresa, pois o agro, responsável por um terço do nosso PIB, é também o motor das exportações e também é, de longe, um dos setores que mais têm investido em tecnologia de ponta, não apenas com desenvolvimento próprio mas, sobretudo, importando tecnologia.
Não é de hoje que o presidente Lula da Silva bate na tecla de que quer fazer o Brasil elevar as vendas de produtos de maior valor agregado. Fala em vender combustíveis ao invés do petróleo cru; produtos industrializados ao invés de matérias-primas. Ora, não é investindo em uma nova versão de reserva de mercado, como parece pretender Lula, que isso vai acontecer. Conteúdo nacional mínimo pode ser extremamente prejudicial se houver erro na dosagem. Foi o que ocorreu com a indústria naval, embora o presidente se recuse a reconhecer.
É senso comum que a preocupação do governo vem em boa hora, pois a desindustrialização precoce do Brasil, se não for interrompida, ameaça consolidar no País a mediocridade da renda média e da baixa produtividade. No entanto, é preciso definir com mais rigor técnico e menos voluntarismo ideológico qual seria o melhor caminho para atingir esse objetivo. Tome-se o exemplo da anunciada intenção de incentivar a produção de carros ditos “populares”. Pouco depois da fanfarra do anúncio, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tratou de dizer que o programa duraria apenas alguns meses, deixando claro o caráter provisório da medida. Ora, não é com gambiarras como essa que se faz uma política industrial digna de ser levada a sério.
Como lembrou o economista e ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, a indústria tem perdido participação no PIB nacional independentemente dos inúmeros benefícios recebidos, com destaque para o crédito subsidiado do BNDES, proteção contra a concorrência estrangeira e incentivos tributários. “Claramente o espectro do desenvolvimentismo fracassado está de volta”, diz ele.
O que a economia brasileira precisa com urgência é de um modelo perene de crescimento, pensado com base em nossas capacidades reais e com visão de efeito a longo prazo. Enquanto continuar a pensar pequeno, com medidas provincianas como a do carro “popular”, estaremos condenados à mediocridade.