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O MDB DE GASPAR VOLTOU ÀS ORIGENS. A ESCOLHA DE IVETE PARA VICE DE MARCELO É A PROVA DO FRACASSO DA RENOVAÇÃO PARTIDÁRIA E AO MESMO TEMPO, O TAMANHO DA DIFICULDADE DE UM GOVERNO QUE QUER CONTINUAR NO PODER

Corrigido e alterado às 11h43min deste 26.06.2024O fato político mais importante das últimas semanas da atual pré-campanha a prefeito em Gaspar, cujas eleições se darão neste seis de outubro, foi a escolha da ex-vereadora por dois mandatos e candidata a prefeita nas eleições de 2008, Ivete Mafra Hammes, MDB. E a sagração disso se deu nesta segunda-feira. A foto acima não deixa dúvidas nenhuma. É a quarta que o Marcelo de Souza Brick, recém chegado ao PP tem um evento de pré-lançamento a prefeito.

Oficialmente, ela está escolhida para ser vice-prefeita de Marcelo, o que trocou o PSD, na calada da noite, pelo já extinto Patriota, esteve com ficha assinada no PL e foi abrigado pelo PP, onde a velha guarda e a parte histórica do PP estão em outra candidatura. Coisa de louco. Coisas de Gaspar. Coisas da política de arranjos para não perder o poder.

Podem falar, discursar, argumentar, desacreditar-me – fato muito comum e de há muito para essa gente que gosta de fazer tudo no escurinho da cidade e fica puta quando se esclarece minimamente alguma coisa. Podem enrolar nas costumeiras entrevistas sem perguntas, podem tergiversar aos sem memória, aos perdedores de ontem e até jovens de hoje que não acompanharam o passado político da nossa cidade.

Contudo, o fato real desta escolha de Ivete pelo histórico MDB que sobrou em Gaspar é tanto simbólico quanto emblemático para quem acompanha a política gasparense. 

Ivete é um dos quadros mais representativos do partido e andava meio que escanteada no governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, o que foi preparado para ser o expoente do partido, o líder da renovação. Se não se cuidar, Kleber colará na sua testa a marca de ter sido um dos principais coveiros do partido em Gaspar. Fruto de marquetagem a granel mal feita, administrador carente de resultados para a cidade, articulador pífio, Kleber está sendo engolido e se espremer, nem MDB é ou será, apesar de sempre ter estado nele por quase duas décadas.

VOLTA O FILME DE 2008. ELE É ELUCIDATIVO

Não vou me estender muito. Todavia, antes, é preciso contextualizar tudo isso que está no título deste artigo. Não vou falar da vereadora Ivete, que até em um de seus mandatos foi sacrificado por causa de um câncer. Superou. O mandato foi concluído por longos períodos por suplentes.

Vou ao ano de 2008. Crise no poderoso MDB de Gaspar de então e cujo poder daquele tempo não se compara ao de hoje. O governo do então outro jovem, o médico veterinário, Adilson Luiz Schmitt, estava ao fim e bem desgastado depois que ele tentou peitar os coroados do MDB e os empresários que estavam com o seu vice, o malheiro Clarindo Fantoni, PP. 

Sem opções, porque o Adilson já estava no PSB na tentativa frustrada de reeleição, o MDB escalou Ivete, como hoje, para o cadafalso. Ela foi com servidor público municipal e sindicalista (o que um dia virou bolsonarista de mentirinha e não deu certo), Sérgio Luiz Batista de Almeida, PSDB, de vice. 

Resultado daquela aventura para salvar o MDB daqueles tempos? Ivete ficou em terceiro lugar 4.140 votos (13,63% dos válidos), atrás do próprio Adilson 8.552 votos (28,15% dos válidos) e na frente, vejam só, de Clarindo do mesmo PP e empresários que estão com o PL e Paulo Norberto Koerich, o então vice de Adilson, com 2.274 votos (7,49% dos válidos). Venceu pela segunda vez, Pedro Celso Zuchi, PT, com 15.030 votos (49,48% do válidos). Na rabeira ficou naquele pleito, Sérgio Henning, de um tal PHS, com 382 votos (1,26% dos votos válidos).

Notaram como as histórias de 2008 estão se repetindo em 2024? Notaram que em ambos há um ponto em comum, o fracasso do MDB como elo de liderança política e de resultados para a comunidade para se perpetuar no mando e poder?

E por quê? 

IVETE JÁ FOI A TÁBUA DE SALVAÇÃO DO MDB DE GASPAR

Diante do fracasso nas urnas e com o seu então jovem líder onde se apostava todas as fichas [Adilson] fora do partido e marcado para morrer política e administrativamente, o MDB de Gaspar apareceu com Ivete nas eleições de 2008. Tudo para não perder espaços políticos. Evitou a morte prematura. Sabia que era difícil. Entretanto, na eleição seguinte, o MDB daqui se reergueu das cinzas, criou o candidato Kleber em 2012, com outro jovem, de esquerda, Rodrigo Boeing Althoff, PV. Foram derrotados. Mas, o MDB de Gaspar foi salvo e se saiu respirando bem. Sua militância mesmo derrotada, acreditou que estava se refazendo do fenômeno Adilson.

Com a oportunidade instalada outra vez, com tempo e noção de composição, o MDB gasparense, sob a então batuta de Carlos Roberto Pereira, o que queria se eternizar politicamente por décadas como declarava na época, pavimentou a dobradinha MDB e PP para vencer em 2016 com o mesmo Kleber. PP estava escaldado. Era sabedor de que sozinho não tinha chances. Ocupou espaços de vice e na máquina. Por exemplo, o mais longevo dos vereadores foi ser o presidente do Samae.

Mas, nada disso teria chegado onde chegou, sem a composição, tomada de decisão tática e as bençãos dos caciques articuladores da época, o ex-prefeito Osvaldo Schneider, MDB e o médico João Leopoldino Spengler, PP, ambos já falecidos. O serventuário da Ditran e vereador, Luiz Carlos Spengler Filho (sobrinho do dr. João), se tornou vice de Kleber. Hoje, Paca e o dr João fazem falta. E Carlos Roberto sumiu da política. Foi cuidar dos negócios financeiros que montou.

O MDB DE GASPAR FALHOU NA RENOVAÇÃO DOS SEUS QUADROS OU COMO GOVERNO?

Resultado? Venceram em 2016 e penaram com a minoria na Câmara no primeiro ano quando transformaram o mais ferrenho dos opositores, Roberto Procópio de Souza, PDT e hoje no MDB, em um dos mais fiéis aliados do esquema de poder político de plantão em Gaspar. 

Instalou-se a arrogância, o loteamento, as dúvidas e a vingança aos derrotados e principalmente aos críticos. Carlos Roberto reinou como se prefeito de fato fosse por quatro anos e início do segundo mandato, quando o deputado estadual, hoje Federal, irmão de templo de Kleber, Ismael dos Santos, PSD, resolveu colocar a mão nessa cumbuca. 

O primeiro sinal de que este estilo bélico, descasado da realidade, somada às dúvidas, tornou-se uma ameaça à reeleição de Kleber vieram com as pesquisas. Aí, novamente, Paca, dr. João e os empresários entram em cena: “casaram” Marcelo de Souza Brick, PSD com Kleber, para não correrem risco em 2020.

De lá para cá, é bom encurtar a história: o MDB de Gaspar se afundou imitando o de Blumenau onde nem vereador mais possui. Carlos Roberto Pereira foi embora. Escândalos. CPIs. Uma administração em zigue-zague a tal ponto de Pedro Celso Zuchi estar novamente nas paradas de sucesso pretendendo o quarto mandato. E por que? Porque o MDB não se renovou e não entregou resultados à cidade, gerou dúvidas e escondeu tudo sob pesada marquetagem barata. Nem usar as redes sociais a seu favor, a atual administração conseguiu.

Por outro lado, o PP padece até de um mal maior e ao lado do PL aposta apenas no aval bolsonarista e se possível, que nenhum adversário além de Zuchi continue no páreo para ter reais chances de vencer. Perguntar não ofende. A entrada à última hora de Ivete no jogo eleitoral não se assemelha muito ao de 2008? Mais que isso: é um atestado de que o MDB jovem falhou com o partido, com os eleitores e a cidade?

Com sob o pretexto de ser uma mulher, Ivete cortou o barato do vereador Ciro André Quintino. Enfraqueceu no reduto do Gaspar Grande, o outro vereador que estava vestido de pré-candidato a prefeito, mas traído, se bandeou para o PL, Francisco Hostins Júnior. No espaço mulher, ocupou por mérito, fidelidade e antiguidade, da novava e recém chegada, Franciele Daiane Back, que estava no PSDB, embrulhado em conversas cabulosas, deu um chega prá lá, em Leila, a mulher de Kleber, que apostava as suas fichas na suplente de vereadora e irmã de templo, Rafa Vancini. Muda, Gaspar!

TRAPICHE

Coisas de Gaspar I – Este assunto da denúncia contra o vereador Alexsandro Burnier, PL, rola, entre o ofício expedido pela secretaria de Obras e Serviços Urbanos com as bençãos do governo Kleber Wan Dall, MDB e Marcelo de Souza Brick, PP, ela recebida e chegada às mãos do presidente da Câmara, José Hilário Melato, PP, a conversa particular dele com o vereador (como registrei aqui discretamente) e a leitura do requerimento na sessão da terça-feira dia 18, pelo menos 15 dias.

Coisas de Gaspar II – A imprensa de Gaspar só se deu conta e fez manchetes do assunto como notícia e não como análise, a partir desta segunda-feira, dia 24, e só depois que este espaço esquartejei o caso que traz a marca da mais pura perseguição do governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, aos que não se calam, ou se ajoelham aos seus desmandos e dúvidas. Detestam transparência e fiscalização. Entenderam para que serve este espaço sem rabo preso, sem dependência de verbas públicas e privadas? Francisco e Chico reclamam da mesma borduna.

Coisas de Gaspar III – A Expo-feira de Gaspar não foi realizada em 2022 e 2023, mas escolheu a rainha e princesas para a edição de 2024, mesmo sem ter certeza de que o evento vai acontecer. Se o governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, não tiveram capacidade, ou condições de realizá-la, por que obrigar o próximo governo ao constrangimento de eventualmente destronar as rainhas e princesas eleitas por eles?

Coisas de Gaspar IV – O sensato não seria esperar o novo governo se instalar, se organizar, e decidir o que fazer com a Expo Gaspar? E se se decidisse pela sua realização, ele então que organizasse à escolha da rainha e princesas da Expo Gaspar? Afinal, o que elas fazem até haver esta decisão? Muda Gaspar!

Hoje há reunião regional do “Novo” Republicanos catarinense, agora comandado pelo PL de Jorginho Melo. O pré-candidato do partido a prefeito de Gaspar, Oberdan Barni, Republicanos, está no olho do furacão. O PL de Gaspar que tem Paulo Norberto Koerich como pré-candidato e Rodrigo Boeing Althoff como vice, já mandaram cortar a cabeça de Oberdan a qualquer custo. Não querem concorrente neste campo ideológico. Está armada a confusão, até porque nas pesquisas, os candidatos do PL não deslancham, apesar do selo de Jair Messias Bolsonaro e Jorginho Melo a alavancá-los.

Este caso, é um dos poucos delicados em Santa Catarina e que não possui acerto fácil afim de se evitar disputa entre eles. O novo presidente do Republicanos em Santa Catarina, indicado pelo governador Jorginho Melo, presidente do PL, o deputado Federal por Rio do Sul, Jorge Goetten, ex-PL, tem se debruçado na busca de soluções. O presidente nacional da sigla, deputado Federal paulista Marcos Pereira, só autorizou a transmissão da presidência estadual do Republicano para o PL de Jorginho, com a condição de que todos os acordos feitos por Carlos Moisés da Silva fossem preservados. E ameaça de intervir no diretório estadual se isto não for cumprido. Então…

A Polícia Federal, discretamente esteve em Gaspar atrás de gente que supostamente financiou os atos antidemocráticos em Brasília. Mas, o que ficou claro, num contato que ela teve com um advogado da cidade, foi de que ela está atenta às redes sociais e o que se posta nela. A inteligência da Polícia Federal penetrou na bolha e está estabelecendo conexões dos grupos de malho e principalmente de fake news. Ou seja, Deus está vendo.

O prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, iniciou há três semanas, todos os domingos, uma prestação de contas dos seus oito anos de mandatos. O conteúdo, pelo jeito terminou em dois episódios. Por outro lado, gente que o arrodeia diz que ele não esperava tanta crítica. Como assim? Estamos em pleno tempo de campanha eleitoral, tempo de avaliações justas e injustas, também.

O reaparecimento do médico veterinário e ex-prefeito (2005/08) Adilson Luiz Schmitt, PL, foi em grande estilo. Reuniu em torno de cem amigos no Clube Santo André (o que teria apresentado a Jesus os pães e peixes para multiplicação), para se lançar a vereador e tentar recomeçar a sua vida político-administrativa com o aval do voto popular. Simbolicamente, o evento se deu no mesmo dia em que ex-partido de Adilson, o MDB, apresentava oficialmente Ivete Mafra Hammes como vice de Marcelo de Souza Brick, PP. Como se sabe, foi contra o MDB de Ivete que começaram os desencontros da gestão de Adilson, uma história longa e contravertida, onde só ele, foi o único perdedor por peitar forças e esquemas que atrasavam a cidade.

A volta de Adilson Luiz Schmitt, PL, depois de 16 anos para ser testado nas urnas ainda desperta misto de raiva, vingança e paixão. O MDB em claro declínio em Gaspar não quer que Adilson volte ao cenário político. O atual governo também. E por incrível que pareça, os empresários e o PP que estão com Paulo Noberto Koerich e Rodrigo Boeing Althoff, PL, igualmente. Não enxergam Adilson como um carregador de votos para o próprio partido, mas como um político com força política e luz próprias. E isso foi o que se viu no discurso de Adilson na segunda-feira: foi para prefeito e não para vereador. Lição a candidatos presentes. Equivocamente, admitem que estão fazendo favores, pois poderiam estar na “dolce vita”. Gaspar não precisa de favor, mas de gente que pegue pesado na massa e a transforme olhando o pressente e estabelecendo-se no futuro.

Propaganda enganosa. O governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, anunciou como turno integral na Escola Vitório Anacleto Cardoso. As aulas vão até as 15h. No máximo, isto é um contraturno capenga. Turno integral é de dez horas.

Gira pelas redes sociais, um vídeo pré-eleitoral de empresários feito em 2016 exaltando as qualidades administrativas e de como Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Luiz Carlos Spengler Filho, PP, iriam melhorar e transformar Gaspar naquilo que estava ruim. São os mesmos empresários que no escurinho já estiveram com Pedro Celso Zuchi, PT, e agora estão por detrás e com o mesmo discurso a favor de Paulo Norberto Koerich e Rodrigo Boeing Althoff.

É bom mudar de opinião, mas obrigatório se penitenciar e dizer à razão disso. Se não fizer perde no presente a credibilidade para pedir votos. É preciso dar nomes aos bois, aos erros e frustações. É preciso salientar as expectativas que foram frustradas e as que se querem ver renovadas. A primeira coisa que esses meses empresários deveriam fazer é pedir desculpas a cidade pelas sucessivas escolhas políticas que fizeram. A segunda desculpa é a de dizer claramente, que não criaram mecanismos de observação e fiscalização aos seus “afilhados” que instalados no poder, com o poder dessas lideranças, fizeram gato e sapato contra o futuro, a cidade, os cidadãos e cidadãs.

Ainda voltarei ao tema exibindo este depoimento. A internet, ainda sem a manipulação da Inteligência Artificial, não perdoa e é uma memória irrefutável aos desmemoriados. Muda, Gaspar!

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12 comentários em “O MDB DE GASPAR VOLTOU ÀS ORIGENS. A ESCOLHA DE IVETE PARA VICE DE MARCELO É A PROVA DO FRACASSO DA RENOVAÇÃO PARTIDÁRIA E AO MESMO TEMPO, O TAMANHO DA DIFICULDADE DE UM GOVERNO QUE QUER CONTINUAR NO PODER”

  1. A PF E O MP NO TESTE DAS AMERICANAS, por Elio Gaspari nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo

    Houve algo de teatral na operação da Polícia Federal (PF) para trazer de volta à vitrine o escândalo da rede varejista Americanas. Depois do vexame da Comissão Parlamentar de Inquérito, que não identificou responsáveis por um calote de R$ 47,9 bilhões, é nela e no Ministério Público que se depositam as esperanças de que a maior fraude corporativa da história de Pindorama seja exposta ao público. É coisa de R$ 25,2 bilhões.

    Na sua expressão mais simples, já se sabe o seguinte:

    1) Miguel Gutierrez, o CEO da Americanas por mais de uma década, tinha uma sala exclusiva no prédio da empresa, onde só ele entrava. A partir de julho de 2022, quando soube que seria substituído no comando da empresa, começou a transferir bens para parentes e vendeu ações da Americanas no valor de R$ 171,8 milhões. Com nacionalidade espanhola, Gutierrez deixou o Brasil em 2023. Na semana passada foi expedido um mandado de prisão contra o doutor.

    2) No segundo semestre de 2022, quando a Americanas se apresentava ao mercado como um prodígio de gestão, diretores da empresa desfizeram-se de ações da empresa no valor de R$ 241,1 milhões. Vinte dias antes do estouro, Anna Saicali, uma de suas diretoras, transferiu para um filho um patrimônio de R$ 13 milhões e vendeu ações da empresa no valor de R$ 59,6 milhões. Contra ela a PF também expediu um mandado de prisão. Anna Saicali deixou o Brasil.

    Outro diretor, José Timotheo de Barros, desfez-se de ações da Americanas por R$ 20,7 milhões.

    A investigação recente estimou que a fraude pode ter começado em 2007. Em agosto de 2022, diretores da Americanas começaram uma operação para escondê-la.

    Tudo bem, aceitando-se que ninguém havia desconfiado. Mais: como seria possível esconder a inexistência de R$ 25,2 bilhões? Sobretudo se, de uma hora para outra, os diretores começaram a vender suas ações.

    Para que um esquema desses ficasse de pé, seriam necessários milhões de otários dentro e fora da Americanas. Se isso pudesse ser possível, sabe-se agora que no dia 27 de dezembro de 2022 a nova diretoria foi informada do que se chamaria de “inconsistência contábil”.

    A Polícia Federal já localizou contubérnios entre a turma da Americanas e funcionários de bancos encarregados de analisar seus números, bem como acertos com dois bancos para direcionar aplicações. A PF e o Ministério Público foram além da superfície do caso.

    A Americanas explodiu em janeiro de 2023. Passou-se mais de um ano e até agora ninguém havia sido responsabilizado. A Comissão de Valores Mobiliários abriu inquéritos que ainda não fulanizaram responsáveis. (Nos Estados Unidos, o escândalo da empresa de energia Enron estourou em 2001. Um ano depois seu gênio financeiro tornou-se réu e em 2004 tomou uma cana de dez anos.) No Brasil, até agora, só foram penalizados milhares de acionistas, centenas de funcionários que perderam os empregos e oito mil credores.

    QUEM DECIDIU SACAR R$ 800 MILHÕES?

    O país está assistindo ao funeral togado da Lava-Jato. A ação da Polícia Federal e do Ministério Público pode impedir que aconteça o mesmo com a Americanas.

    A turma da varejista era audaciosa. Remunerava-se regiamente e trocava mensagens explicitando a maquiagem de seus balanços. Se tudo isso fosse pouco, no dia 11 de janeiro de 2023 tentaram sacar R$ 800 milhões da conta da empresa no banco BTG Pactual. O BTG não pagou.

    As investigações poderão revelar o processo decisório que instruiu essa iniciativa. Afinal, mesmo admitindo que ninguém sabia da fraude, está comprovado que o novo CEO, Sérgio Rial, soube do rombo no dia 2. (Seu diretor financeiro soube que havia gatos na tuba uma semana antes.) No dia 4 começou-se a falar em “inconsistências contábeis”. No dia 5, Rial contou o caso ao acionista de referência Carlos Alberto Sicupira, que, nas suas palavras, ficou “chocado”. Sicupira era um dos astros do que se supunha ser um novo tipo de gestão.

    No dia 11, horas depois da tentativa de saque, a Americanas explodiu.

    A fraude da Americanas é o maior escândalo corporativo da história de Pindorama. Não envolve um só centavo de dinheiro público. Tudo coisa da iniciativa privada, com personagens que se apresentavam como modelares, meritocráticos e inovadores. (A rede varejista pagava em até 200 dias contas que devia ter pago em 90, mas essa é outra história.)

    Desde 2023 o caso da Americanas inova também tecendo o grande tapete para debaixo do qual tenta-se varrer o escândalo.

    A entrada da Polícia Federal e do Ministério Público na cena é uma esperança.

    Valeria a pena que colocassem na operação um delegado e um procurador munidos de um mapa dos erros da Lava-Jato. Eles teriam a tarefa de alertar os colegas para os riscos de ações teatrais e da manipulação da imprensa. No caso da Americanas, nada disso é necessário. Basta seguir o roteiro de fatos, cifras e golpes desprezados pela Comissão Parlamentar de Inquérito.

    POLÍTICA AMERICANA

    O crescimento da candidatura presidencial de Donald Trump disseminou a mania global de se falar mal do partido Republicano. É verdade que ele segue Trump com suas malfeitorias, mas pouca atenção se dá à decadência do partido Democrata.

    Os democratas carregam Joe Biden porque não conseguiram produzir nada melhor. Uma das raízes desse problema está na influência do casal Bill e Hillary Clinton com suas redes de alianças e interesses. Esse domínio explica, entre outras coisas, o afastamento do ex-presidente Barack Obama.

    LULA 3.0

    Lula acha que pode tudo, inclusive lidar com coincidências que refrescam a vida dos irmãos Joesley e Wesley Batista.

    No segundo ano de governo pode-se tudo. A conta só chega durante a campanha eleitoral.

    GRANDE RECUPERO

    Os 30 anos do Plano Real foram comemorados com autoexaltações da equipe de economistas que de forma brilhante conceberam sua moldura teórica. Infelizmente, na segunda metade do segundo tempo reconheceu-se a importância do papel de Fernando Henrique no Ministério da Fazenda. Infelizmente, deixaram como pitoresco coadjuvante o presidente Itamar Franco. Sem Itamar e sua decisão de tomar riscos, FH estaria condenado a disputar uma cadeira de deputado e os professores continuariam redigindo trabalhos acadêmicos.

    Dessa fogueira de vaidades escapou, com brilho, o embaixador Rubens Ricupero, que substituiu FH na Fazenda. Foi um ministro correto e detonou-se dizendo que falava do que havia de bom e escondia o que havia de mau. Não sabia que estava sendo gravado e perdeu o cargo.

    Relembrando esses tempos, disse ao repórter Luiz Guilherme Gerbelli:

    “Caí porque disse muita bobagem.”

    Ricupero completou 50 anos no serviço público sem ter dito outras bobagens e sem circular na porta giratória do mercado. Se as pessoas reconhecessem suas bobagens com a lisura de Ricupero, as coisas melhorariam bastante.

  2. O CORTE DE GASTOS É PARA VALER? por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo

    Além de descumprir uma regra elementar de política externa, ao apoiar Joe Biden contra Donald Trump e correr o risco de trazer problemas para o Brasil, o presidente Lula está desmontando, uma a uma, as medidas dos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet para cortar gastos. Das cinco, sobra uma, exatamente a que não caracteriza corte nem gastos, só combate a fraudes, que deveria ser mera rotina.

    Se Lula de fato aprovou a lista em reunião com os ministros, como anunciado, ele disse uma coisa em privado e está fazendo outra em público. Ou… é tudo um jogo de cena, em que os ministros assumem medidas impopulares, dando a Lula a chance de vetá-las. Eles levantam a bola, Lula corta, a torcida aplaude. O foco continua sendo na receita, os gastos ficam pra lá.

    O primeiro item da lista nem chegou a ser levado a sério, apesar de muito importante. Alguém está ouvindo falar em “fim dos supersalários”? Os que ganham acima do teto constitucional e juízes, promotores e procuradores podem dormir sossegados, com seus penduricalhos que consomem muitos milhões de reais.

    O segundo item, também natimorto, foi a mudança na previdência dos militares. Lula deixou claro que não admite, até com uma certa razão. Não pela proposta em si, que, mais cedo ou mais tarde, terá de ser discutida, mas porque não é hora de jogar a Defesa e a cúpula legalista das Forças Armadas contra suas tropas.

    A lista continua com a desvinculação de pensões e aposentadorias do salário mínimo.

    Lula descartou, em entrevista ao UOL: “Se eu acho que vou resolver o problema da economia brasileira apertando o mínimo do mínimo, eu não vou para o céu, eu ficaria no purgatório”. Um presidente com a marca da igualdade social, num país com tal desigualdade, não poderia dizer o contrário, mas qual a alternativa? A ameaça fiscal, ao fim e ao cabo, atinge exatamente a base da pirâmide.

    O item cinco da pauta é a mudança dos pisos constitucionais da Saúde e Educação, que cai no mesmo caso. De um lado, a estimativa é de que consumam 112% do Orçamento até 2028, sem sobra para o resto, como habitação, auxílio-gás e defesa civil. Do outro, as duas áreas podem perder até R$ 500 bilhões, em nove anos, com a mudança. O que é mais justo, ou menos injusto? Escolha de Sofia.

    Da lista, sobrou o pente-fino nos cadastros do INSS, que não tem a ver com corte nem com gastos, mas com fiscalização e fraude. Assim, o governo finge que está decidido a cortar, os aliados fingem que acreditam, Lula tira uma casquinha populista e tudo continua como está. O equilíbrio fiscal? Balança, mas não cai. Ou será que cai?

  3. Lula e o PT sempre foram ferozmente contra o Plano Real. Quanto pior, melhor. Quanto mais estado gastador, empregador, mal gerenciado e corrupto, melhor. Esta é a raiz da crise dos dias de hoje. O PT e a esquerda do atraso são incapazes de se unir por soluções comuns e com a participação de todos. Querem a exclusividade do erro e do custo pago por todos, que sempre ficam reféns desse grupo de poder. Este editorial, é elucidativo, principalmente aos jovens. Eu sei o que era inflação da remarcação de produtos três vezes ao dia, e quando ele não faltava para se especular na alta, na falta de referência e ganância.

    ESPÍRITO DO PLANO REAL, É INSPIRAÇÃO APRA OUTROS DESAFIOS, editorial do jornal O Globo

    O aniversário de 30 anos do Plano Real, amanhã, prova que o Brasil, quando unido em torno de uma meta, tem plena capacidade de superar a realidade mais adversa. A comemoração desmente a crença derrotista, popular em alguns círculos, de que os avanços por aqui são de pouca monta. Um exame do passado ensina que o maior dos problemas pode ser vencido se houver clareza de propósito e determinação. É preciso resgatar o espírito que animou o Real para encarar os desafios do futuro, independentemente da dificuldade que aparentem. Seu maior legado é comprovar o poder das ideias e da perseverança.

    A nova moeda entrou em circulação em 1º de julho de 1994. Nos 12 meses anteriores, a inflação alcançara inacreditáveis 4.922%. Para as novas gerações, o número — mais de mil vezes o atual — pode soar abstrato. Na época, era bem concreto. A maioria dos assalariados, sem a proteção das aplicações financeiras, corria aos supermercados depois de receber, pois comida e itens básicos estariam mais caros no dia seguinte. Estocar alimentos era uma espécie de poupança. Passado o dia de pagamento, os varejistas ficavam vazios.

    Usar cheques era comum depois das 16h. Com os bancos fechados, o desconto só viria no dia seguinte, abrindo espaço para ganhar uma vantagem extra na transação. Motoristas faziam fila em frente a postos de gasolina antes das repetidas remarcações de preço. A falta de referência de valor tornava difícil planejar a compra de imóveis e todo tipo de investimento. Nas empresas, o planejamento era uma abstração. Isso derrubava o crescimento da economia e a geração de empregos. No exterior, brasileiros eram questionados sobre como era viver num lugar com hiperinflação. Éramos uma atração bizarra.

    Nada parecia dar conta do problema. Logo depois da redemocratização, o Plano Cruzado apostara numa nova moeda e no congelamento de preços. Fugaz e enganador. Ainda em 1986, foi anunciado o Cruzado 2. Em seguida, viriam os planos Bresser (1987), Verão (1989), Collor 1 (1990) e Collor 2 (1991). Houve todo tipo de tentativa. Do aumento das taxas de juros ao absurdo de confiscar os depósitos bancários. Em comum, todos deram errado. A sensação de incapacidade para derrotar a alta cotidiana dos preços era indiscriminada. A inflação parecia ser parte inseparável da cultura nacional.

    No governo Itamar Franco, economistas escolhidos pelo então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, enfim adotaram a estratégia certa para quebrar esse passado. Antes do lançamento do real, foi criado um sistema de conversão, a Unidade Real de Valor (URV). Enquanto esteve em vigor, foram necessários mais e mais cruzeiros reais para atingir o valor de uma URV, mas esta se mantinha estável, garantindo a ancoragem dos preços. Quando entrou em circulação, um real valia uma URV, ou CR$ 2.750.

    Mesmo adotando uma estratégia inovadora, o Plano Real dependeu do Congresso para dar certo. De lá para cá, a moeda erradicou a hiperinflação, passou por altos e baixos, mas se impôs. O principal reflexo positivo foi a melhora no poder de compra dos mais pobres, evidente quando se comparam os indicadores sociais. Olhando para a frente, não faltam problemas que parecem insolúveis. Da crise fiscal à educação, da saúde à segurança pública, é preciso resgatar o espírito inspirador do Plano Real. Se o país venceu a hiperinflação, pode dar conta do resto também.

  4. AS CRISES DO REAL, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo

    De Fernando Henrique Cardoso:

    — Não se pode desperdiçar uma crise.

    FH deve ter chegado a essa conclusão depois das diversas crises que enfrentou na elaboração, na implantação e no desenvolvimento do Plano Real, que completa 30 anos na próxima segunda-feira.

    A primeira crise foi o ambiente em torno de sua nomeação para ministro da Fazenda, em maio de 1993. Seria o quarto ministro de um presidente fraco, Itamar Franco, com o país tomado pela hiperinflação. Os preços subiram 27% no mês da posse de FH, que se tornava o maior e talvez o único ativo de Itamar. Como o próprio Itamar disse a seu novo ministro: sua nomeação foi muito bem-aceita. FH entendeu: tornara-se responsável de fato pela política econômica. Na circunstância, dono de uma crise grave e piorando.

    O lado promissor: a população andava cansada da inflação e dos sucessivos planos que só tornavam ainda mais complicada uma situação difícil. Provavelmente, toparia sacrifícios para um programa crível com uma equipe respeitada. Ainda assim, o propósito de FH e de sua então reduzida equipe era modesto: dar uma arrumada na casa, especialmente nas contas públicas, deixando qualquer coisa mais ousada para um futuro governo. O próximo presidente seria eleito em outubro de 1994.

    Uma segunda crise mudou tudo. Em setembro de 1993, Itamar, sem conversar nem sequer avisar FH, demitiu o presidente do Banco Central, Paulo Ximenes, por uma questão boba em torno dos cheques pré-datados. Era Itamar sendo Itamar, provavelmente instigado pela sua turma para mostrar quem mandava ali. Para a equipe de FH, tudo acabava ali. O ministro se demitiria, e todos iriam para casa. Deu o contrário. FH foi conversar com Itamar e saiu maior ainda: colocou Pedro Malan na presidência do BC, reforçando seu time, e assumiu controle total de tudo o que se referia à política econômica.

    Como teria sido a conversa? FH nunca entrou em detalhes, mas Edmar Bacha, seu principal assessor, tem uma boa ideia. Fernando Henrique deve ter dito: vou embora, a inflação vai estourar mais forte, e o Congresso votará seu impeachment. Era uma boa previsão. Itamar entendeu. A equipe de FH também — agora vai, dá para fazer algo maior, tal era o sentimento. O Plano Real nascia ali.

    Na véspera da introdução das notas novinhas de real, há exatos 30 anos, ainda houve crises. Como conta Rubens Ricupero, então ministro da Fazenda, já que FH deixara o posto para se candidatar a presidente, Itamar queria um congelamento de preços, fiscalizado pelos consumidores, e o tabelamento dos juros. Era a última tentativa de mandar em alguma coisa. Tudo contrário à base teórica e prática do Real. Então não tem plano, não tem nada, disseram a ele. Itamar sobraria só e com uma inflação que atingira espantosos 50% ao mês. Recuou, claro.

    Assim o real começou a circular, e FH elegeu-se presidente, derrotando Lula no primeiro turno. Outras crises o esperavam. A quebradeira de bancos estaduais e privados, que viviam de girar dinheiro na inflação, serviu para uma arrumação geral no sistema financeiro. No fim do primeiro mandato, 1998, a crise dos países emergentes, que começara nos Tigres Asiáticos, chegou ao Brasil. O país foi ao FMI buscar dólares, com a ajuda do então presidente Bill Clinton, que falou com outros chefes de Estado e conseguiu uma vaquinha de US$ 40 bi para reforçar o caixa do BC brasileiro.

    O real passava por uma crise financeira e cambial, que não foi desperdiçada. Fez-se outro ajuste de contas públicas e, sobretudo, ele deixou de ser atrelado ao dólar. Introduziu-se o regime de metas de inflação. Chegou-se, assim, ao desenho final do tripé macroeconômico: superávit nas contas públicas; taxa de câmbio flutuante; e metas de inflação. E incluídas as privatizações.

    O tripé está incorporado à cultura econômica, embora diversos governos posteriores tenham tentado quebrar alguma perna. Lula, que seguiu o modelo em seu primeiro mandato, agora investe contra as metas de inflação e não gosta nada de cortar gastos para fazer superávit.

    Uma pena. Deu tanto trabalho.

  5. LUIZ FUX DESABAFA, por Carlos Andreazza, no jornal O Estado de S. Paulo

    Luiz Fux resolveu desabafar sobre o “protagonismo deletério” do Supremo. Foi na sessão em que o tribunal legislou pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Aquela jornada em que se usou a balança da Justiça – de alta precisão – para pesar gramas de droga, expostos juízes da Corte constitucional, em busca da batida perfeita, ao debate-definição sobre qual seria a gramatura justa.

    “Não se podem desconsiderar as críticas de que o Judiciário estaria se ocupando de atribuições próprias dos canais de legítima expressão da vontade popular, reservada apenas aos Poderes integrados por mandatários eleitos” – disse o ministro que suspendeu individualmente a implementação de lei, a que instituíra o juiz de garantias, aprovada pelo Parlamento.

    “Nós não somos juízes eleitos.” São os não eleitos cuja confiança nas próprias luzes lhes autoriza a identificar (forjar) urgências e preencher lacunas sobre as quais a democracia representativa se acovardaria.

    “Brasil não tem governo de juízes” – declarou o juiz que esteve longamente sentado sobre liminar que garantia o pagamento de auxílio-moradia a magistrados.

    “Nós assistimos, cotidianamente, ao Poder Judiciário sendo instado a decidir questões para as quais não dispõe de capacidade institucional.” Diante de arguição sobre constitucionalidade de lei, em vez de responder e ponto, expande-se o tribunal para criar critériosprocedimentos. Porque, tão sabedores os seus, não podem admitir que a acusada omissão do Parlamento seja uma posição.

    “Essa disfuncionalidade desconhece que o STF não detém o monopólio das respostas nem é o legítimo oráculo para todos os dilemas morais, políticos e econômicos da nação.” Nesse momento, lamentei não haver o diretor de imagens da TV Justiça nos mostrado o ministro Barroso.

    Fux lastima que o Supremo arque com o “preço social” de decidir sobre o que não lhe cabe. Haveria espécie de armadilha contra o tribunal, manipulando-lhe a natureza contramajoritária. Como se o STF fosse obrigado a entrar na arapuca, compulsória a prática proativa. Como se não houvesse o voto de Fachin (pela descriminalização), exemplar da expressão comedida que se espera da Corte constitucional.

    “Nós não temos de fazer pesquisa de opinião pública.” Correto. “Nós temos que aferir o sentimento constitucional do povo.” Ele adora esse conceito. O sentir jurídico – dos intérpretes da massa – pela construção da cidadania. Né? Melhor fazer pesquisa de opinião.

    “Quanto mais as nossas decisões se aproximam do sentimento constitucional do povo, mais efetividade terão as nossas decisões” – falou o juiz, leitor do povo, que nem sequer a própria cadeira afasta.

  6. O LEGADO DO REAL PARA A DEMOCRACIA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    O real, moeda mais longeva da história recente do País, completará 30 anos no próximo dia 1o de julho. O distanciamento histórico só enaltece a grandeza da concertação política entre os Poderes Executivo e Legislativo que viabilizou a aprovação do Plano Real. Seguramente, a estabilidade monetária foi a maior conquista coletiva da sociedade brasileira na Nova República – no mínimo, por ter restaurado sua capacidade de sonhar. Ademais, o feito se tornou uma das mais chamativas vitrines do bem que só o regime democrático é capaz de fazer à Nação.

    “A democracia motivou toda a estabilização”, disse Pérsio Arida, um dos formuladores do Plano Real, durante um seminário realizado há poucos dias na Fundação Fernando Henrique Cardoso a propósito do aniversário do plano. De fato, estabilização permite planejamento. E só uma sociedade livre, senhora do seu destino, é capaz de planejar e construir um futuro mais auspicioso para todos.

    Desde o advento do real, milhões de brasileiros nasceram e cresceram sem ter vivido um dia sequer as agruras de lidar com a hiperinflação, um desastre que consumia todas as energias do País. Para esses cidadãos mais jovens pode até soar estranho, talvez inconcebível, mas se tratava de um Brasil incapaz de olhar para quaisquer outros de seus muitos problemas, que dirá pensar e implementar políticas públicas mais perenes para solucioná-los, absolutamente perdido que estava por ter em circulação uma moeda que mal valia o papel em que era impressa.

    Como foi possível superar um desafio dessa magnitude? – muitos podem se perguntar, sobretudo olhando o passado em contraste com a claudicante relação entre o governo Lula da Silva e o Congresso, movida a orçamento secreto. Ora, o Congresso daqueles idos da década de 1990 não era essencialmente melhor ou pior do que o Congresso atual. Era um retrato tão fiel da sociedade como o é hoje. Os parlamentares tampouco eram mais ou menos desprendidos de interesses paroquiais. O que havia então e não há agora eram um governo digno do nome, com um plano claro para o País, e disposição para negociar em bases minimamente republicanas, vale dizer, em torno do melhor interesse público.

    Um plano como o Real – pensado, implementado e comunicado da forma como tudo foi feito – decerto foi um “milagre”, “um acidente histórico”, “um ponto fora da curva” ou qualquer outra expressão similar que o leitor queira empregar no lugar. Dificilmente se repetirá, não apenas na área econômica, mas em qualquer outra esfera da administração pública. Em primeiro lugar, havia o quilate intelectual, a capacidade administrativa e o espírito público dos envolvidos – a começar, é claro, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.

    Ademais, ao longo dessas três décadas, a política, desafortunadamente, deixou de ser tratada como o meio civilizado de negociação da miríade de interesses em jogo na sociedade para ser apresentada por trambiqueiros de todas as cepas como uma guerra de aniquilação. Isso dificulta, quando não interdita, a formação de consensos mínimos entre os cidadãos, como foi o Real, em que pesem suas diferenças políticas e ideológicas.

    A despeito das singularidades do Plano Real, uma coisa é certa: um dos maiores legados daquela união de esforços ímpar na história republicana, que haverá de ser lembrado junto com suas realizações técnicas, é o triunfo da democracia como esteio das grandes conquistas sociais, políticas e econômicas. Não foi por acaso que a superação de uma das mais terríveis mazelas nacionais ocorreu sob o regime democrático.

    Não se pode condenar quem olhe para o passado e lamente que uma liderança como Lula da Silva – que, aliás, foi ferozmente contra o Plano Real – desperdice todo o seu capital político ao apostar numa agenda desagregadora, desconectada de seu tempo e irremediavelmente condenada ao fracasso, por já ter sido testada e reprovada.

    Resta torcer para que um novo alinhamento de planetas se forme, sabe-se lá quando, e o Brasil volte a ser governado por um estadista que, ao lado do Congresso, resgate na Nação a capacidade de dialogar e fazer nascer dias melhores.

  7. QUAL O SALTO DAS ENTREVISTAS DE LULA? por Vera Magalhães, no jornal O Globo

    O governo Lula 3 superou a marca dos 500 dias em maio. O mês de junho foi marcado por uma turnê de entrevistas do presidente a rádios e portais de internet, algo sempre bem-vindo, pois a prestação de contas é primordial em governos democráticos. Mas qual o saldo das falas do petista? Se for feita uma pesquisa, provavelmente o que mencionarão serão as críticas, em diferentes tons de agressividade, ao Banco Central, à política monetária e ao presidente da instituição, Roberto Campos Neto.

    No dia da primeira das entrevistas da série, à CBN, o dólar fechou em R$ 5,43, maior patamar desde janeiro de 2023. Durante a fala ao UOL, na última quarta-feira, a moeda americana rompeu o patamar de R$ 5,50 pela primeira vez desde janeiro de 2022. Não adianta o presidente perder a esportiva e chamar de “cretinos” os que apontam coincidência entre suas falas e os movimentos do câmbio, porque a entrevista foi ao vivo, e a oscilação da moeda em tempo real. Claro que a depreciação do real não se deve exclusivamente às entrevistas do presidente, mas xingar a imprensa, ainda mais com dados imprecisos, não retira o peso das palavras.

    Uma rodada de entrevistas geralmente é pensada pela equipe de assessoria de governantes para comunicar alguma ideia-guia específica. Aos 500 dias, o que Lula pretendia destacar? Quais as conquistas, os programas em andamento, os próximos projetos prioritários e o que tem sido feito para chegar aos objetivos? Pouco se soube a esse respeito nas falas de Lula, e não por responsabilidade da imprensa, como pode vir a reclamar o presidente, pelo que se depreende da disposição de incorrer no surrado expediente de culpar o mensageiro.

    O ano de 2023 foi de êxito na resistência a uma tentativa de golpe de Estado por parte de bolsonaristas, gestada pelo próprio Jair Bolsonaro ao longo de quatro anos no poder e, sobretudo, nos dias finais em que se trancou no bunker do Alvorada. Também foi um ano em que o governo teve apoio no Congresso desde a transição, que lhe rendeu a PEC ampliando a margem para gastos, depois, a aprovação de reformas como o arcabouço fiscal e a tributária. A economia reagiu bem, o crescimento superou a expectativa, a inflação andou na linha, os juros começaram a cair, o emprego foi positivo.

    E em 2024? O governo começou o ano com o pé torto, tentando desfazer projetos do Congresso por Medida Provisória, revendo a meta fiscal antes de ela completar um ano de aprovação e fracassando em tentativas de equilibrar as contas aumentando a arrecadação — receita que também funcionou em 2023, mas que agora cobra uma contrapartida em contenção de gastos, que Lula se recusa a enfrentar.

    A tragédia do Rio Grande do Sul drenou esforços, recursos e atenções. Representou um bom momento de Lula como governante neste ano, se mostrando empático, presente, ágil e assertivo nas iniciativas de socorro ao estado devastado por uma catástrofe climática inédita. É difícil avaliar quanto a imagem de um político pode se beneficiar de um evento tão dramático, mas pesquisas que mostraram a interrupção na queda da avaliação do petista ao menos sugerem que a população, e não só a gaúcha, aprovou a ação sem rodeios no Sul.

    Diante dessa cronologia, fica difícil entender por que o presidente optou por desperdiçar uma vitrine em rádios e portais nacionais e regionais para ficar de picuinha com o presidente do BC, transformando-o em adversário, especulando sobre a própria sucessão, ressuscitando Bolsonaro e até fazendo apostas de alto risco, como dizer que só presidente incompetente não se reelege, quando se vê, mundo afora, uma alternância de mandatos maior que a História mostrava nas décadas passadas.

    O saldo, portanto, do road show de entrevistas de Lula, para seu próprio governo, é o oposto da disparada do dólar: bastante negativo.

  8. O FUTURO ESTÁ NO BERÇO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    Dentre as políticas mais comuns em boa parte dos países desenvolvidos estão aquelas voltadas a crianças de 0 a 5 anos de idade, já que a atenção a esse estrato produz benefícios duradouros tanto para indivíduos quanto para a sociedade.

    Há descaso histórico no Brasil nessa seara, que contribui para perpetuar um ciclo de desperdício de capital humano e baixa produtividade, acirrando desigualdades.

    Considerando que se avizinham as eleições municipais, o debate sobre o tema torna-se ainda mais pertinente. Afinal, são as prefeituras as responsáveis imediatas pelos aparelhos públicos que lidam diretamente com a primeira infância, tema de série de reportagens publicadas pela Folha.

    Segundo o Plano Nacional de Educação (2014), 50% das crianças de até 3 anos deveriam estar em creches, e 100% daquelas entre 4 e 5 anos, na pré-escola, neste 2024. Mas a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) apontou taxas de 38,7% e 92,9%, respectivamente, em 2023.

    Para piorar, parte considerável (38,5%) das crianças entre 1 e 3 anos estava fora do sistema de ensino não por vontade dos pais, mas porque não conseguiram vagas; ou seja, por inépcia do poder público.

    A educação na primeira infância melhora o aprendizado nas séries futuras e contribui para o aumento da renda. Não só. Estudos do economista James Heckman, Prêmio Nobel em 2000, apontaram benefícios para saúde: menor risco de consumo de drogas, cuidado na alimentação e maior interesse em atividades físicas na fase adulta.

    Heckman estimou que cada dólar gasto em programas para crianças desfavorecidas entre 0 e 5 anos gera retorno de 13% ao ano.

    De acordo com pesquisa de 2023 do Ministério da Saúde, 22,9% das crianças nessa faixa têm atraso no desenvolvimento infantil (habilidades motoras, cognitivas, de linguagem e socioemocionais).

    Candidatos a prefeitos precisam apresentar propostas para a primeira infância e eleitores devem exigi-las, antes e depois de depositar seus votos nas urnas. O governo federal, ao qual cabe desenvolver e guiar políticas nacionais, não pode se omitir sobre o tema.

  9. Miguel José Teixeira

    Espetacular, estratégico e promissor!

    “O reaparecimento do médico veterinário e ex-prefeito (2001/04) Adilson Luiz Schmitt, PL.”

    O Adilson entende perfeitamente que abandonar a vida pública pois ela não lhe dá sustento, abre espaço para os que dela se sustentam e “se-locupletam-se”!

  10. A JOGATINA GANHOU MAIS UMA, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo

    Por 14 votos contra 12, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o Projeto de Lei que autoriza o funcionamento de cassinos, jogo do bicho, bingos e outras modalidades de jogos de azar no Brasil. Como o projeto já passou pela Câmara, falta só o voto do plenário dos senadores para que ele vá à sanção de Lula, restabelecendo a legalidade da jogatina no país.

    O projeto não foi apreciado pela Comissão de Segurança Pública. Isso acontece enquanto abundam as notícias da expansão do crime organizado em Pindorama. Facções criminosas infiltraram-se nas redes de transportes de diversas cidades, controlam negócios que vão do tráfico de drogas a postos de gasolina.

    Há dias os repórteres Bernardo Mello e Rafael Soares mostraram que o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho disputam o domínio do mercado de apostas legais no Rio, no Ceará e em Rondônia. Em abril, a Polícia Federal prendeu operadores dessa conexão, e eram um sobrinho e uma cunhada do notório Marcola, um dos chefes do PCC. Aquilo que se presume ser um mercado de apostas legalizado tornou-se um biombo para alimentação de organizações criminosas metidas com o tráfico de drogas e de armas. Segundo a Polícia Federal, apenas numa rede de 20 investigados foram movimentados R$ 301 milhões.

    Num país onde o crime organizado vem avançando, mesmo sobre setores de jogo legalizados, expandi-lo é, no mínimo, uma temeridade.

    No Congresso, arma-se o retorno da jogatina em nome do turismo e de um argumento falacioso e cínico, segundo o qual, mesmo sendo ilegal, o jogo existe. O aborto também é ilegal e existe, mas uma parte de um Congresso que se diz conservadora quer liberar o jogo, reprimindo a interrupção da gravidez de mulheres estupradas.

    A volta da jogatina já foi estimulada por Jair Bolsonaro e pelo ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella. Fazem isso sempre com os melhores argumentos, como se as bancas de jogos viessem a ser administradas por filantropos. Até agora, todas as brechas abertas para o jogo resultaram em expansão do crime. Estão aí as brigas de quadrilhas pelo controle das casas de apostas.

    Em 2018, Jair Bolsonaro encontrou-se com o bilionário americano Sheldon Adelson, magnata dos cassinos de Las Vegas e da Ásia. Entrou e saiu pela cozinha do hotel Copacabana Palace. Dias depois, disse que tinha uma ideia para aumentar a arrecadação.

    O governo Lula 3.0 já gastou mais verbo com a guerra na Ucrânia do que com a possibilidade da volta da jogatina. O crime organizado é combatido com planos mirabolantes. Enquanto isso, tratam da volta do jogo com solene silêncio. Inquéritos relacionados com assassinatos, incêndios e intimidações estão à disposição de todos nos arquivos da Polícia Federal. E não se trata de brigas de contraventores. São bandidos farfalhando em torno do que há de jogo legal. Discutir o tema é a melhor forma de jogar luz sobre seus riscos.

    Bicheiros matando pelo controle de pontos são cenas de um passado que ainda persiste, mas o que prevalece nos dias de hoje são organizações criminosas dominando áreas de cidades e também disputando o controle de casas ou plataformas de apostas legalizadas. Os segmentos dos jogos que foram legalizados tornaram-se um bom negócio para o crime, a Polícia Federal que o diga.

    1. odete.fantoni@gmail.com

      Penso que o crime organizado desceu no Brasil através das caravelas portuguesas.
      De lá pra cá, as capitanias só alternaram os donos…

  11. NA FOTO DE LULA COM FHC, SÓ HÁ UM ESTADISTA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    O presidente Lula da Silva visitou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em São Paulo, num encontro do qual saiu com uma comovente foto estampando o cumprimento de ambos. Os dois líderes que um dia representaram as principais forças políticas do País demonstraram mais uma vez civilidade, carinho e amizade. Como ocorreu outras vezes quando se encontraram pessoalmente, a imagem despertou em muita gente de boa vontade certo saudosismo de quando a polarização se organizava dentro dos marcos razoáveis de convivência, diálogo e divergência. A grandeza da foto, contudo, tirada no exato dia em que a Fundação Fernando Henrique Cardoso realizou um evento em comemoração aos 30 anos do Plano Real, esconde a constrangedora discrepância na estatura política dos dois personagens. Só superficialmente a visita de Lula pode ser vista como um gesto de magnificência efetiva. Quando observada em profundidade e à luz da história, constata-se a pequenez lulopetista.

    Mais uma vez Lula desperdiçou uma providencial oportunidade de reconhecer o valor e o papel de Fernando Henrique Cardoso. Não haveria momento mais conveniente para tanto, a começar pelo aniversário do Plano Real, do qual FHC foi o principal arquiteto político, ao não só unir o mais impressionante time de economistas dispostos a debelar a hiperinflação, como também ter a sabedoria de que a boa técnica não prescinde da boa política. FHC negociou exaustivamente com um Congresso que conhecia por dentro e preferiu o uso público da razão à demagogia salvacionista. Mas, ao registrar o momento em suas redes, Lula optou por unir a imagem com FHC com o registro de outros três encontros: com o ex-presidente José Sarney, o escritor Raduan Nassar e o jornalista Mino Carta. Foi como se preferisse evitar dar a FHC o protagonismo que este merecia, sobretudo na semana comemorativa do Real. Ou como se não conseguisse superar o histórico e mal resolvido desconforto do PT com o Plano e seus artífices. E assim Lula mostrou seu verdadeiro tamanho, minúsculo perto de FHC.

    Teria sido uma ótima oportunidade para um gesto de reconhecimento, por exemplo, ao apoio que FHC lhe deu no segundo turno da eleição presidencial de 2022. Naquele ano, mal iniciada a renhida disputa entre Lula e Jair Bolsonaro, o tucano não hesitou em anunciar: “Neste segundo turno, voto por uma história de luta pela democracia e inclusão social. Voto em Luiz Inácio Lula da Silva”. Ali FHC emprestava a Lula apoio incondicional em nome da democracia. Com seu apoio viriam outros, capazes de assegurar a frente ampla de que o petista precisava para superar Bolsonaro nas urnas e evitar o pior. Exceto por raros momentos de dor pessoal – como no caso da morte da ex-primeira-dama Ruth Cardoso – e pelo apoio dado na primeira eleição de FHC, como senador, em 1978, é difícil imaginar grandeza semelhante por parte do atual presidente.

    O fato é que Lula e o PT nunca entenderam o Plano Real. Economistas do partido apostavam no fracasso do Plano, enquanto, no front político, com a campanha no horizonte daquele ano de 1994, os petistas só enxergavam interesses eleitorais rasteiros quando, na verdade, se estava diante de um divisor de águas na história nacional. Os eleitores perceberam o descompasso e garantiram a FHC a mais indiscutível vitória dada a um candidato a presidente. Inconformados, os morubixabas petistas lideraram uma inclemente oposição ao governo tucano. Uma oposição por vezes violenta, que passava tanto pela demonização do presidente quanto por uma espécie de novo udenismo, com a denúncia estridente do que diziam ser grandes “escândalos de corrupção”. Depois, quando assumiram o poder, os petistas acusaram FHC de lhes deixar uma “herança maldita”, expressão inventada por Lula que até hoje anima a militância e da qual o demiurgo nunca recuou, a despeito de sua flagrante injustiça.

    Por isso, a visita de Lula a FHC e a imagem cheia de cordialidade entre ambos provam que FHC continua um estadista, capaz de superar as inúmeras grosserias que os petistas cometeram e ainda cometem contra ele. Já Lula mostrou que jamais será o estadista que julga ser.

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