Nesta quarta-feira, como o prometido, encerro à série de artigos que desnudam como se ensaiam partidos, coligações, políticos, grupos de influência e instituições nos bastidores em relação às eleições municipais em Gaspar, em outubro do ano que vem. Eles foram feitos todos ao mesmo tempo. Na “gaveta” do arquivo digital, foram sendo atualizados à medida que chegava o dia da publicação. Este fato por si só, mostra bem, à dinâmica em tão curto período de tempo. Os três primeiros, foram publicados na segunda, quarta e sexta-feira da semana passada com o mesmo título.
Eles tiveram ampla repercussão, e naturalmente, como o esperado, foram, também, seguidos de fortes questionamentos, até porque, é um assunto que, para muitos, é apaixonante e por isso, ao mesmo tempo, incapacita-os no obrigatório pragmatismo. Ou então, na maioria dos casos, atinge interesses partidários, pessoais e pasmem, até de negócios.
Sim, para alguns, política e poder é algo muito intimamente ligado a negócios, vantagens e até mesmo sobrevivência, por falta de qualificação no mundo competitivo de trabalho. Há os que vivem eternamente de boquinhas, ou também, chamadas de tetas. E é isso que os mandatários e circunstantes deste circo escondem dos seus eleitores e eleitoras quando se unem, desunem, reúnem-se na busca do poder e da eleição de si, ou de seus prepostos. Alguns plantam informações falsas. Outros combatem fatos verdadeiros que por interesses não querem ver conhecidos da sociedade, onde buscam privilégios, status e o mando sobre ela. É o jogo jogado. Incluindo os blefes e principalmente, às trapaças.
Como eu olho a maré, apenas registro estas oscilações dos diversos momentos. São ciclos repetitivos, mas nem sempre com a mesma água, a mesma altura, mesma espuma. E do meu ponto de vigia, que necessariamente nem sempre é o melhor, igualmente, muito menos, posso produzir verdades imutáveis. Afinal, lidamos com política. E ela é, no fundo, uma entidade viva, mutável, surpreendente, capaz dos maiores desastres, mas também, reconheça-se, de significativos avanços em benefício da comunidade e da sociedade em geral. Depende apenas dos líderes que escolhemos para estes resultados tão díspares. E estamos, faz tempo, errando nas escolhas, quase sempre bipolares. É o inventado mau e o bom, o nós contra eles, e quase nunca, o melhor, normalmente fora desta bipolarização.
Vamos ao encerramento deste ciclo de quatro artigos de observações, como se fosse a foto do momento. Haverá outras, até porque serão outros momentos.
Primeira observação é repetida. Tudo o que acontecer no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, PT, e Jorginho Mello, PL, terão influências por aqui – para melhor ou pior – em outubro do ano que vem. Seja no humor que que provocam nos eleitores e eleitoras, como nas articulações. De outro modo, também não se pode descartar, mas em menor proporção, os movimentos político regionais vindos principalmente de Blumenau. A segunda observação, no mesmo senso de recapitulação, apesar da forte migração, o conservadorismo ainda é predominante em Gaspar, até mesmo quando se trata do petismo que governou e se assanha por aqui.
Vamos ao cerne dos movimentos.
Com o desconforto e a tranca do PL à filiação, ainda não confirmada, o vice-prefeito Marcelo de Souza Brick, poderá sair do Patriota e ir para o PP. Se concretizado, será o grande movimento para salvar a coligação estruturada pelo MDB no passado, com o seu então arquirrival PP. Esta coligação em 2020 somou os agregados PSD – origem de Marcelo -, PSDB, um nanico manchado com os áudios vazados com falas do seu presidente Jorge Luiz Prucino Pereira, bem com o incógnito PDT, um progressista nanico e que esteve sempre gravitando nos governos petistas.
Olham-se às pesquisas que os partidos escondem. E o governo de Gaspar depois se quase sete anos no poder não conseguiu claramente marcar um nome para suceder ao que está aí. Impressionante. Este é o tamanho do problema, do erro e do que se tornou, por imprudência e incapacidade, um desafio. Incrível!
Marcelo, o que foi enganado e boicotado – e avisado estava por seus pares – pelo próprio Kleber Edson Wan Dall, MDB, depois de uma semana de sumiço – sem explicação à cidade -, “fumou” o “cachimbo da paz” nas fotos e alguns eventos comuns. Aparências. E se Marcelo vai representar na campanha do ano que vem, o que foi o governo até aqui, terá problemas. Vai empregar quem não fez o que prometeu, já lhe deu rasteiras e está em dívida com a cidade. Resumindo: será o ensaio do mesmo e o discurso, o da justificativa, inclusive para aquilo que não se explica.
Marcelo, supostamente, como vítima, excluída do poder decisório, talvez, tivesse mais chances no discurso de vingança, ou de descolamento do seu próprio governo, que viu e fez vistas grossas para tudo. É claro, nas pesquisas internas dos partidos que compõem o governo – e de seus supostos adversários -, a rejeição aos nomes ligados a Kleber. Este é o nó a ser desatado. Por mais nomes que se testem, dando-lhes até secretarias para se reinventem, continua o forte cheiro de enxofre no ar.
O grupo que está no poder de plantão, diante de tantos desgastes que acumulou, está sem muitas alternativas para vencer. Precisa e acredita na máquina do aparelho estatal, na mobilidade partidária e religiosa, bem como no mecanismo que o protege. E neste funil, Marcelo virou a única e desesperada opção para a continuidade, mesmo que não seja o agrado de parte que faz o governo de Kleber, incluindo o setor religioso. Isto acontecendo, também significa, que o MDB, no máximo dará um vice para esta chapa. E desde que se tornou MDB e nascido no seio do PDS depois do golpe de 1964, o partido não terá cabeça da chapa, numa exata medida da sua decadência. Imitou Blumenau, literalmente.
A outra é que nem Kleber está certo de que ficará no MDB. Ele tenta manter em torno de si um grupo, independente do partido onde ele estiver.
Kleber, antes de ser partidário, é um fiel da Igreja neopentecostal, a que o fez candidato a prefeito e também, deixou-o na mão quando ensaiou buscar uma vaga na Assembleia Legislativa. O melhor sinal disso vem de Blumenau. Lá o partido Novo se ensaia outra vez com o promotor Odair Tramontim. A diferença é que o PSD do ex-prefeito, o deputado estadual Napoleão Bernardes, mas, principalmente do deputado Federal, Ismael dos Santos, o prefeito de fato de Gaspar, quer ser parceiro de chapa do Novo por lá. E a mulher de Ismael, Denise, a que foi candidata a suplente de senadora de Raimundo Colombo, é o ensaio de vice. Como o Novo vem mudando, não será nenhum espanto, então, se isto se materializar.
E está arrumada mais uma confusão.
Porque por aqui o Novo também se ensaia. E Rodrigo Boeing Althoff, candidato natural do PL, todavia, sob tiroteio e enfraquecido pela errática tática de se esconder durante o segundo mandato de Kleber, está mirando o Novo como novidade para ele. Primeiro, este ensaio é mais apropriado ao discurso dele do que o arranjo ao PL. Segundo, mesmo que se viabilize no PL, Rodrigo tentará atrair o Novo – ainda em formação – para a coligação para dar cara marqueteira de gestão. Rodrigo foi com o presidente do PL de Gaspar, Bernardo Leonardo Spengler Filho a Blumenau para ouvir o governador mineiro Romeu Zema Neto e de quebra marcou um apontamento com o prefeito de Joinville, Adriano Silva.
Mais confusão? Sim! Sempre escrevi sobre o desconforto do deputado Ivan Naatz, PL, de ser governo, ser conservador, ser bolsonarista, ser PL e o desalinho com a raposa chamada Jorginho Mello, PL. Ele disfarça e joga em todas as pontas. É um hábil sobrevivente.
Na quarta-feira da semana passada informei dos contatos que ele teve em São Paulo com o governador Tarcísio Gomes de Freitas, Republicanos, e com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, secretário de Tarcísio. Escrevi que o problema de Ivan se chamava Carlos Moisés da Silva, Republicanos, contra quem tentou dois impeachments e uma CPI, todos frustrados. Pois é! Carlos Moises e Ivan estão se conversando. E a iniciativa foi do deputado.
“Gato escaldado tem medo é de água fria”. O PL de Blumenau mostrou que tinha um outro plano e nele não incluiu Ivan. Ele se considera candidato preferencial a prefeito por lá. O PL está incensando o empresário Adrian Rogers Sensi, segundo suplente de senador de Jorge Seift Júnior, PL. Com a possível cassação de Seift, pelos mesmos motivos que levaram à cassação do prefeito de Brusque Ari Vequi, MDB, devido ao apoio que teria dado o empresário Luciano Hang à campanha, na mesma barca estarão suspensos os direitos políticos de Adrian. É aí que começa a vingança e a oportunidade do deputado Ivan. Resta saber como ele se comportará em relação a Gaspar. Porque no discurso de hoje, Ivan continua a dizer que dará apoio a Marcelo onde ele estiver. Será?
E por que desta dúvida? É que o Republicanos já tem candidato declarado em Gaspar. É a novidade que incomoda o establishment político gasparense. E o empresário Oberdan Barni só se tornou um candidato viável, porque os que estão no poder de plantão se uniram e colocaram o pé na jaca. Abriram uma janela de oportunidade e que o conservadorismo não quer dar de bandeja ao PT. Simples assim!
Isto é tão grave contra este grupo no poder de plantão, que ele – mesmo sob intensa marquetagem errática do varejinho – não possui, sequer, uma marca de governo para jogar na cara dos adversários; porque Rodrigo se escondeu quando a cidade mais precisava dele; porque as instituições – inclusive as empresariais – não fizeram o papel delas na fiscalização do poder público e naquilo que é básico, como suprir a cidade com creches, turno integral e contraturno, saneamento básico, transporte coletivo urbano integrativo, a revisão do plano diretor, uma saúde pública e uma assistência social mínima para os cidadãos e cidadãs que dependem da gratuidade do sistema, numa cidade essencialmente de assalariados.
E o PT que já governou Gaspar por três mandatos? O maior adversário de Dionísio Luiz Bertoldi, ou de uma novidade aos leões, ou até mesmo de Pedro Celso Zuchi se ele se arriscar pela quarta vez, está em Brasília. Agarra-se ao velho e ao decadente. Naquilo que está sendo estraçalhado no Congresso Nacional – como nas duas derrotas de ontem à noite – e está se descobrindo mundo afora que o discurso para salvar à democracia brasileira era fake. Saímos de uma ameaça da autocracia de direita e estamos metidos perigosamente numa de esquerda. E se a economia não deslanchar, tudo ficará ainda pior.
Por fim. Mais de quatro candidaturas em Gaspar é suicídio. Foi assim que o PT levou a primeira dele em 2.000. Ou seja, o tempo já provou isto. Três serão do mesmo campo conservador, sendo que um competidor virá do núcleo onde está o atual governo. Outro tentará dividir este núcleo. Se houver outros se torna um jogo aberto e arriscado para todos do mesmo campo. E uma candidatura é, claramente, do centro esquerda, com o PT na liderança.
Reforço. Há um esboço para outubro do ano que vem, mas os pintores e as cores ainda são as dúvidas destes artistas da política neste quadro sempre surreal e que querem que enxerguem a obra como sendo ela do realismo. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
Um retrato de Gaspar. Os prefeitos ontem tomaram o plenário da Assembleia Legislativa, em Florianópolis, para debater a liberação das verbas do tal Plano 1.000, de Carlos Moisés da Silva, Republicanos, travadas no governo de Jorginho Mello, PL, sob às mais variadas dúvidas. Lá não estava o prefeito de Gaspar Kleber Edson Wan Dall, MDB, que depende – e chora – destas verbas e nem o vice, Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá. Já o prefeito de Blumenau. Mário Hildebrandt, Podemos, e outros da região, por exemplo, marcaram presença.
Aliás, enquanto isso prefeito postava fotos nas redes sociais. Ele visitou o gabinete do secretário de Obras e Urbanos, Roni Jean Muller. Para quê? Segundo ele próprio se vangloriou nas redes sociais dele, para “fazer alinhamentos”. Esta gente vive alinhando, mas e tudo continua torto nesta área contra a cidade.
E o primeiro alinhamento é o ter recursos para as obras que estão paradas saírem do papel, discurso e promessa. São elas, entre outras, como a simples manutenção, que estão levando o governo de Gaspar no poder de plantão ao desgaste. Já o vice estava sumido neste assunto. E o deputado estadual Napoleão Bernardes, PSD, vice presidente da comissão que tenta destravar estas verbas, tirou uma casquinha por aqui. Mostrou na sua rede social as obras paradas em Gaspar e que segundo ele, precisam de solução do governo do estado por estarem neste Plano 1.000.
O prefeito e o vice de Gaspar mais uma vez lavaram as mãos em assunto tão essencial para a cidade. Primeiro deixaram o candidato Carlos Moisés da Silva, Republicanos, na mão. Agora, não querem bater de frente com o governador de plantão Jorginho Mello, PL. Então sobrou para Napoleão Bernardes, PSD, que já foi prefeito de Blumenau, dizer claramente que o acordo não foi entre pessoas, mas com entes públicos: governo do estado e municípios, independente de quem fosse titular e candidato. E foi sobre esta realidade que os municípios contrataram e devem aos seus munícipes.
Quem apareceu lavando a égua, mais uma vez, foi o vereador Dionísio Luiz Bertoldi, PT. Ele fez um filmete que bem emoldura o retrato da atual administração de Gaspar. Enquanto se gastou R$14 milhões para comprar um terreno na Rua Itajaí e salvar com isso, o caixa da Furb, de Blumenau, este dinheiro. segundo o vereador, justamente está faltando para iniciar, fazer e terminar obras na cidade, ou pior, para manter o que já foi feito um dia. Quem mais uma vez levantou a bola para o Dionísio chutar? Não foi este espaço, a imprensa, as entidades de fiscalização e sim o próprio prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, e o vice-prefeito Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá.
Registro. Morreu e foi enterrado ontem em Florianópolis, Luiz Orlando Poli, 69, o Zolando, irmão do ex-prefeito Luiz Fernando Poli que se elegeu uma vez pelo MDB e outra pelo PFl, que foi dar no que é hoje parte do PSD. Luiz Orlando trabalhou na Epagri.
O deputado Ivan Naatz postou um vídeo entregando um caneco de cristal e convidando o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, PL, para a Oktoberfest de Blumenau. Quem comeu mosca foi o senador e que se diz o quinto filho de Bolsonaro, Jorge Seif Júnior, PL.
Não tem jeito. Roda nas redes sociais, fotos de documentos de um atendimento feito no Hospital de Gaspar. Na pulseira, em vermelho, está dito que a paciente, idosa, é alérgica à dipirona. Pois é, depois de atendida, saiu com uma receita. O que tinha nela? Dipirona. Meu Deus!
Na Assembleia Legislativa, o empresário e deputado estadual, Antídio Lunelli, MDB, ex-prefeito de Jaraguá do Sul, desnudou ontem, uma mágoa dele com o seu partido e uma incoerência do governo de Jorginho Mello, PL. Foi durante o encontro com os prefeitos para debater como honrar os compromissos do tal Plano 1.000.
A mágoa foi a de como foi rifado pela ex-bancada do MDB no sonho dele em ser candidato a governador em 2022. Depois de uma caravana fake para se escolher um candidato, o seu MDB se alinhou com o ex-governador Carlos Moisés da Silva, Republicanos. Antídio comprou ontem, a versão do governador Jorginho Mello, PL, de que o Carlos Moisés deixou o estado endividado e com ajuda dos deputados do MDB.
E a incoerência? Ao mesmo tempo, Antídio Lunelli, MDB, elegantemente, mostrou que ela está no governador Jorginho Mello, PL, o mesmo que prova aos atuais deputados, incluindo o visionário Antídio, o estado de miséria das contas do estado. Ora, se elas estão tão ruins assim, qual a razão da Assembleia ajudar a criar mais uma despesa milionária – e de longo prazo, ou sem volta, o que é mais provável – como a gratuidade para alunos nas universidades particulares e do sistema Acafe?
Antídio Lunelli, MDB, foi mais longe na sua argumentação. Primeiro, o estado deve fazer à sua obrigação e competência, que é o ensino médio. E de acordo com o deputado, o estado está fazendo muito mal. E relatos na imprensa, abundam. Se se acusa, o ex- governador Carlos Moisés da Silva, Republicanos, de ter feito política com o tal Plano 1.000, Jorginho Mello, PL, está cumprindo uma promessa de campanha feita com irresponsabilidade e quer que a Assembleia Legislativa avalize, como avalizou o Plano 1.000. Casa de ferreiro, o espeto é de pau.
A bancada feminina na Câmara de Gaspar está de dieta. Chegou a quatro dos 13 vereadores. Todas da Bancada do Amém. A primeira a cair fora, foi a suplente Rafaelle Vancini, MDB, para a volta do titular, Francisco Solano Anhaia, MDB. É que governo, acuado e sob ataques – como as dúvidas do hospital e dos áudios vazados – estava sem defesa. Na sessão da semana passada, pediram para sair mais cedo: Mara Lucia Xavier da Costa dos Santos, PP, bem como Zilma Mônica Sansão Benevenutti, MDB. Ficou, Franciele Daiane Back, PSDB
A rodovia que liga Gaspar a Brusque vai continuar sendo uma picada para atender a interesses de políticos e alguns empresários que se “sentem prejudicados” com a duplicação dela. Acham esses mesmos políticos, que, com a implantação de quatro trevos alemães, esta rodovia deixará de ser uma picada e menos perigosa. Experimentem ficar atrás de um dos muitos caminhões de brita, macadame ou barro por dez quilômetros para lá ou para cá, sem a possibilidade de ultrapassá-los. Isto, no conceito dos nossos políticos se chama desenvolvimento. E são eles se acham aptos a dirigirem a Gaspar do futuro, sem futuro.
Há político que possui exatamente à consciência de onde está o erro. E zomba. Ao menos já aprendeu escrever a palavra honestidade com “h”.
Perguntar não ofende: onde está o presidente do PSDB de Gaspar, ex-secretário da Fazenda e Gestão Administrativa, ex-presidente da Comissão Interventora do Hospital de Gaspar, Jorge Luiz Prucino Pereira? Acorda, Gaspar!
10 comentários em “O DESENHO DAS ELEIÇÕES DE OUTUBRO EM GASPAR NÃO ESTÁ NEM NO ESBOÇO. HÁBEIS PINTORES ESTÃO ESPERANDO A HORA CERTA PARA ESCOLHER AS CORES. “EPÍLOGO””
Maio Amarelo, ou vermelho. Em Gaspar foi o da hipocrisia. Para o prefeito, o vice que aparelha a Ditran e os políticos lerem o tamanho da insensatez.
TRAUMAS DO TRÂNSITO, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Entre 2011 e 2021, o número de motocicletas circulando no Brasil cresceu 64,7%, de 18 milhões para 30,3 milhões. Como se sabe e boletim do Ministério da Saúde comprova, a escalada elevou a insegurança.
Em 2011, 70,5 mil motociclistas lesionados em acidentes de trânsito foram hospitalizados (3,9 a cada 100 mil habitantes). Já em 2021, foram 115,7 mil (6,1 a cada 100 mil) —aumento de 55% em dez anos.
Apesar de o número de mortos ter permanecido quase estável no período (11,5 mil e 11,1 mil, respectivamente), ele representa 26,6% das fatalidades no tráfego em 2011 e 35,3% em 2021.
Acidentes de trânsito são grave problema de saúde pública no país que, no caso de motocicletas, atinge estratos sociais fragilizados.
Em 2021, as hospitalizações de motociclistas custaram R$ 167 milhões ao Estado. Despesas por traumatismo cranioencefálico grave (TCE) passaram de R$ 123,7 milhões, em 2008, para R$ 278 milhões em 2019. Acidentes de trânsito são a principal causa de TCEs, seguidos por violência interpessoal.
Os custos não findam com a internação. Traumas geram sequelas que exigem tratamentos custosos para reabilitação e podem incapacitar o paciente por toda a vida. Ou seja, além dos gastos públicos, o país perde força laboral.
Ainda segundo o boletim do Ministério da Saúde, entre os motociclistas acidentados predominam homens (88,1%) e negros (64,9%), idades de 20 a 29 anos (30,8%) e 8 a 11 anos de estudo (39,6%). Ademais, boa parte sofre acidentes durante o exercício da profissão. Ou seja, trata-se de população economicamente ativa e com algum grau de vulnerabilidade social.
Isso ocorre porque o aumento do número de motocicletas está ligado à economia de combustível, à alta de compras por aplicativos de entrega e a más condições do transporte público, que afastam passageiros.
Em São Paulo, a quantidade de motos emplacadas nos primeiros quatro meses deste ano foi a maior para o período desde 2015.
Para diminuir gastos na saúde e proteger jovens trabalhadores, é fundamental que o poder público, nas esferas municipal, estadual e federal, implemente ações de fiscalização e de conscientização que integrem órgãos de transporte, Justiça, saúde e educação.
Tal orientação já consta do Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito, legislação aprovada pelo Congresso em 2018. Basta tirá-lo do papel.
LULA E MADURO, O AMOR É LINDO, por Ruy Castro, no jornal Folha de S. Paulo
Entre as várias besteiras que tem cometido em vez de dedicar-se a reconstruir o país, Lula embarafustou-se por uma mixórdia verbal na segunda-feira (29) ao receber em palácio um convidado que entrou em surdina, quase que pelos fundos e sem limpar os pés: o ditador venezuelano Nicolás Maduro. Lula chamou de “narrativa” as acusações que pesam sobre Maduro e sua maneira de tratar os opositores —com prisões, sequestros, desaparecimentos, afogamentos, tortura, estupros e execuções, tudo isso possibilitado por asfixia da imprensa, degola do Poder Legislativo, pesada corrupção de militares e eleições de araque.
Esse é o violento diagnóstico contra Maduro pela Anistia Internacional, a Human Rights Watch, a Organização das Nações Unidas e o Tribunal Penal Internacional de Haia, entidades a que apelamos contra Bolsonaro por incitação a golpe de Estado, charlatanismo na pandemia e genocídio dos povos indígenas. Não por acaso, Bolsonaro também chamou a isso de “narrativa”.
Narrativa, como se vê, é uma história cuja veracidade depende de quem a conta —ou de quem a escuta. Lula instou Maduro a “construir sua narrativa, para que possa efetivamente fazer as pessoas mudarem de opinião”. Jurando por essa narrativa antes mesmo de ouvi-la, carimbou: “A sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que a que eles têm contra você”. O amor é lindo, não?
E então vem a mixórdia verbal: “Está nas suas mãos construir a sua narrativa e virar esse jogo, para a Venezuela voltar a ser um país soberano, onde somente seu povo, por meio de votação livre, diga quem vai governar o país”.
Pois não é exatamente o que o mundo espera da Venezuela? Que volte a ser um país soberano, onde somente o povo, através de eleições livres, sem as mentiras, as gambiarras econômicas e o uso da máquina do Estado praticados por Bolsonaro, digo Maduro, escolha quem irá governá-lo.
O BICHO, por Merval Pereira, no jornal O Globo
Se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. Nada melhor para definir a situação política do governo hoje que o título da peça de Oduvaldo Vianna Filho e Ferreira Gullar, de 1966. Não havia saída. A decisão da Câmara, já tomada, de alterar a estrutura organizacional imaginada pelo presidente eleito é um duro golpe político, uma intromissão indevida que deveria ser contestada no Supremo Tribunal Federal (STF). Mas Lula não tem apoio político para tanto.
Obrigar um governo de esquerda a se organizar dentro do conceito de extrema direita, esvaziando as políticas públicas do meio ambiente e indigenista, fazendo desaparecer ministérios como Planejamento e Cultura, já é uma sublevação, negação do que o eleitorado de centro democrático aprovou nas urnas, embora por pequena margem, que sugeria que o governo saído dela fosse de união nacional.
Não é — e por culpa de Lula. O Congresso está, como sempre esteve, no conservadorismo. Ao contrário, o governo montado até agora é um simulacro de união nacional, na verdade uma hegemonia da esquerda, principalmente do PT. Enquanto os partidos de centro-direita reagem rejeitando as políticas esquerdistas, mesmo as necessárias como as ambientais, o governo acelera na direção da esquerda, e a distância entre os espectros políticos se amplia.
O governo Lula não está agindo com presteza para aprovar suas teses no Congresso; só se preocupa quando perde. A negociação do marco temporal deveria ter sido feita há muito tempo, especialmente depois da derrota das políticas indigenistas. Não quer dizer que a disputa se dê apenas no campo ideológico, mas esse fator é a grande diferença entre Lula 3 e Lula 1 e 2. Naquele tempo em que Lula era quase imbatível, os partidos de centro ou centro-direita se contentavam com as migalhas do mensalão e do petrolão. E que migalhas.
Hoje continuam querendo as migalhas milionárias das emendas e fundos financeiros, mas querem mais. Acostumaram-se a definir as políticas públicas durante o período em que Bolsonaro rendeu-se à maioria de que sempre fez parte: o Centrão. Bolsonaro tentou fazer política pessoal, jogando seu prestígio contra as estruturas partidárias, e deu com os burros n’água. Docemente constrangido, aderiu ao que era seu passado político no baixo clero e dedicou-se apenas a montar um golpe ditatorial.
Lula gostaria de controlar as emendas parlamentares, controlando assim o Congresso, e de cuidar de um governo com fortes cores de esquerda. Uma das queixas dos líderes rebelados contra o governo é que as emendas são negociadas individualmente, assim como Bolsonaro tentou negociar com “bancadas suprapartidárias”, esvaziando as lideranças. O resultado está aí.
Na Câmara, toda vez que quer negociar, o governo tem de dar algo em troca. Quanto mais difícil a aprovação, mais caro fica. Os deputados estão emparedando o governo e não querem conversa. Os dois lados estão assim. Se Lula tivesse feito realmente um governo de união nacional, de forças partidárias equivalentes, esse problema não estaria acontecendo.
O Congresso está claramente resolvido a aprovar só o que considera de interesse do país, como fez com o arcabouço fiscal, mas, quando a disputa é ideológica, vence a direita, que domina o debate. Cada vez que Lula mexe com ideologia, como aconteceu dias atrás na vergonhosa recepção ao ditador venezuelano Nicolás Maduro, mais atiça a direita no Congresso, que mostrará força para derrotar o governo.
A direita, que tinha vergonha de existir quando Lula e Dilma governaram, agora não tem mais. Foi avançando com Temer e fez um strike com Bolsonaro, sem possibilidade de controle. Lula só ganhou a eleição porque o eleitorado de centro se decepcionou com Bolsonaro. Na campanha, fez discurso de união nacional, que não acontece. Com isso, está perdendo o apoio do centro democrático.
Na campanha, Lula fez discurso de união nacional, que não acontece. Com isso, está perdendo o apoio do centro democrático
POLÍTICOS não tem limites, nem semancol 👀
Hoje, no velório de um vizinho querido aqui no Bateias, quem aparece dirigindo uma Kombi plotada pra campanha eleitoral?
Sim, ele, Ciro, acompanhado do Wando Andrieti.
Deram azar de estacionar bem na minha frente.
Quando me viram , tentaram enrolar pra sair do carro, esperando que eu fosse embora.
Fiquei esperando 👀😁
Perguntei se iriam distribuir “santinhos” e se depois iriam visitar o postinho do Barracão.
Com um sorriso amarelo, Ciro disse que depois iria pro hospital.
Com tantos tiros no próprio pé que acho não sobrar munição pra outubro/24..
Realmente, leitora. Os nossos políticos tratam seus eleitores e eleitoras como sendo uma maioria de trouxas
Jorge foi visto hoje de manhã (quarta) em uma padaria no bairro Coloninha, tomando um cafezinho. Será que estava amargo? Será que a padaria aceita pix de contas internacionais? Acorda Gaspar!
LULA ENVERGONHA O BRASIL, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O presidente Lula da Silva envergonhou o Brasil de uma maneira como poucas vezes se viu nos últimos tempos – e olhe que o País passou muita vergonha durante o mandato do antecessor de Lula, Jair Bolsonaro. Depois de estender o tapete vermelho para Nicolás Maduro, pária mundial por razões óbvias, o petista declarou que o tirano venezuelano é um governante legitimamente eleito e que a Venezuela, portanto, é uma democracia exemplar.
Na opinião de Lula, todas as inúmeras denúncias de violações de direitos humanos, de manipulação das eleições e de perseguição a dissidentes e jornalistas naquele país não passam de “narrativa que se construiu contra a Venezuela”. Lula então sugeriu ao “companheiro Maduro” que “construa a sua narrativa”, que “será infinitamente melhor do que a narrativa que eles têm contado contra você”.
“Eles”, no caso, são os “nossos adversários”, conforme Lula chama aqueles que “vão ter que pedir desculpas pelo estrago que eles fizeram na Venezuela”. Encabeçam essa lista os Estados Unidos e a União Europeia, que impuseram sanções contra o regime chavista por conta das atrocidades cometidas por Maduro. Na “narrativa” de Lula, americanos e europeus simplesmente “não gostam” de Maduro, por puro “preconceito”, e por isso resolveram inviabilizar o governo chavista – e as agruras dos venezuelanos, com hiperinflação, escalada da miséria e da fome e êxodo de 7 milhões de cidadãos em poucos anos, seriam resultado das sanções internacionais, e não da ruína do país promovida pelo chavismo.
Não há dúvidas de que o Brasil deveria restabelecer relações com a Venezuela, grosseiramente rompidas, por razões puramente ideológicas, pelo governo Bolsonaro. Exportamos para o vizinho cerca de US$ 1 bilhão e importamos quase US$ 500 milhões. Ambos compartilham mais de 2 mil km de fronteira na Região Amazônica, delicada tanto do ponto de vista ambiental quanto em razão do narcotráfico. Cerca de 20 mil brasileiros vivem na Venezuela, e, entre imigrantes e refugiados, há mais de 300 mil venezuelanos no Brasil.
Nada disso significa, no entanto, que o Brasil deva ignorar que a Venezuela é hoje talvez a mais violenta ditadura da América Latina, só rivalizando com a da Nicarágua – outro país governado por um “companheiro” de Lula, o ditador Daniel Ortega. Não se espera que Lula saia por aí a denunciar os crimes desses tiranos, mas se espera, sim, que ele não insulte a inteligência alheia nem os venezuelanos que padecem horrores sob as patas de Maduro ao declarar que na Venezuela vigora uma democracia plena e que, por isso, Maduro é governante legitimamente eleito. Em relatório recente, o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU informou que “os serviços secretos militares e civis do Estado venezuelano funcionam como estruturas efetivas e bem coordenadas na implementação de um plano orquestrado no mais alto nível do governo para reprimir dissidências através de crimes contra a humanidade”. Eis aí a “narrativa” que Lula pretende denunciar.
É difícil saber o que governou a decisão de Lula de afagar Maduro dessa maneira indecente. Ao fazê-lo, o presidente desqualificou o Brasil como eventual mediador entre Maduro e a oposição nas negociações para a distensão do regime. Ademais, internamente, o gesto de Lula tende a implodir de vez a fragilíssima “frente ampla” que o elegeu e com a qual prometeu governar, algo incompreensível diante da necessidade premente de construir governabilidade.
Nada disso parece importar para Lula. Em seus delírios, a Venezuela voltará a se beneficiar de vultosas obras de infraestrutura financiadas pelo Brasil, como se o Ministério da Fazenda não estivesse catando moedas no vão do sofá para fechar as contas. Lula também promete ajudar a Venezuela a integrar os Brics. Como se sabe, Rússia e China, junto com autocracias como Irã, Turquia e Arábia Saudita, planejam transformar esse grupo econômico de emergentes em um clube geopolítico antiocidental. A julgar pelo obsceno discurso de Lula, é uma narrativa que faz brilhar os olhos do chefão petista, que parece sonhar acordado com o dia de sua consagração como grande líder desse tal “Sul Global”.
MESSURAS AO DITADOR, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não deixou vestígios de conduta autoritária ao longo de sua longa trajetória política —mesmo velhos ensaios de controle da imprensa nunca foram levados a cabo. O que mancha sua reputação democrática é o apoio, para o qual arrasta o Estado brasileiro, a regimes ditatoriais de seu horizonte ideológico.
Não chegaram a surpreender, portanto, as mesuras e afagos de Lula ao ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, que voltou a visitar o Brasil depois de oito anos e participou de um encontro de presidentes da América do Sul.
Nada há de errado, do ponto de vista diplomático, em manter relações com regimes autoritários de qualquer orientação, seja por interesses comerciais ou geopolíticos, seja na negociação por liberdade e direitos humanos.
Nesse sentido, a política de enfrentamento a Maduro, conduzida por Jair Bolsonaro (PL) sob a inspiração do americano Donald Trump, mostrou-se estéril —ou, pior, contribuiu para fortalecer o discurso persecutório do vizinho.
Já Lula foi, na segunda-feira (29), muito além de mostrar a correta disposição ao diálogo. Não satisfeito em proporcionar uma recepção de gala ao visitante, prestou-se a defender o regime chavista.
De acordo com o mandatário brasileiro, a caracterização da Venezuela como uma ditadura não passa de uma “narrativa”, que pode perfeitamente ser substituída por outra. O país vizinho sofre centenas de sanções internacionais, segundo a narrativa lulista, “porque outro país não gosta dele”.
Há zonas cinzentas entre uma democracia plena e um regime autoritário, mas não pode restar dúvida de que a Venezuela há muito cruzou essa fronteira. Esta Folha considera Maduro um ditador desde agosto de 2017, depois da criação de uma Assembleia Constituinte para enfrentar o Legislativo de maioria oposicionista.
Mas o processo de degradação da democracia venezuelana começou bem antes, sob Hugo Chávez, que esteve no poder de 1999 a 2013, quando morreu. O caudilho aproveitou a popularidade obtida graças à alta dos preços do petróleo para aparelhar as instituições e ampliar os próprios poderes.
Maduro assumiu quando os ventos econômicos já mudavam de direção —e patrocinou uma escalada de atrocidades documentadas pela ONU, incluindo torturas e assassinatos, enquanto o país mergulhava numa crise humanitária comparável aos impactos de guerras.
No afã de defender uma esquerda arcaica, obscurantista e autoritária, Lula não apenas alimenta mentiras descaradas. Também apequena a diplomacia brasileira e relativiza o sofrimento de milhões de cidadãos em um país devastado.
RECEPÇÃO DE LULA A MADURO FOI VEXATÓRIA, editorial do jornal O Globo
É conhecido o apego do presidente Luiz Inácio Lula da Silva às “ditaduras amigas” do PT — especialmente, Cuba, Nicarágua e Venezuela —, mas passou muito do tom a recepção efusiva ao ditador venezuelano, Nicolás Maduro, recebido por Lula no Palácio do Planalto com todas as honras de chefe de Estado na véspera da reunião com presidentes da América do Sul.
Num discurso recheado de incoerência e exagero, Lula se referiu ao encontro com Maduro como “momento histórico”. Aproveitou para dizer que o Brasil recuperou o direito de fazer relações internacionais “com seriedade”. Criticou os Estados Unidos pelo embargo econômico “pior do que uma guerra” e, numa ofensa às famílias das vítimas da ditadura, chamou de “narrativas” a constatação de que a Venezuela não vive sob regime democrático. Os presidentes do Uruguai, Luis Lacalle Pou, e do Chile, Gabriel Boric, condenaram as declarações de Lula.
Em que planeta vive ele? Ao contrário do que diz, os ataques à democracia na Venezuela estão longe de ser fantasia. São fatos comprovados por organizações internacionais e locais que tentam resistir à asfixia imposta pelo governo autocrata. Lula parece não querer enxergar o óbvio: o regime chavista, que se perpetua no poder há duas décadas e meia manipulando regras eleitorais e manietando as instituições, é marcado por violação de direitos humanos, censura à imprensa, perseguição a opositores, submissão de Judiciário e Legislativo ao Executivo e práticas perversas que não fazem parte do cotidiano de Estados democráticos.
Pode ser considerado democrático um país que mantém 300 presos políticos e cala qualquer oposição? Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, além de prender jornalistas, políticos, sindicalistas e cidadãos que não seguem à risca a cartilha chavista, o governo Maduro obstrui sistematicamente o trabalho da Assembleia Nacional. A mão de ferro não esconde as crises econômica, social e humanitária que assolam o país. A Human Rights Watch estima que 7 milhões de venezuelanos emigraram. No Brasil, o êxodo pressiona Roraima, estado que recebe contingentes cada vez maiores da população fustigada pelo desemprego e pela miséria.
Lula foi eleito para seu terceiro mandato sob a bandeira da defesa da democracia. Reuniu uma frente ampla num momento em que as instituições republicanas eram ameaçadas pela conspiração golpista que eclodiria no 8 de Janeiro. É no mínimo contraditório que celebre com desenvoltura um regime oposto a tudo que pregou aos eleitores.
Não está errado o presidente brasileiro buscar integração com as nações da América do Sul. O isolamento durante o governo Jair Bolsonaro, regional e mundial, era um equívoco. Também é compreensível o gesto de reaproximação com a Venezuela, cujo governo estava afastado do Brasil desde 2016. Faz sentido o Brasil manter relações com Maduro e até mediar uma eventual transição venezuelana de volta à democracia. Nada disso destoaria da tradição da política externa brasileira.
Mas nenhum outro líder que participou do encontro no Itamaraty foi tão bajulado quanto Maduro. Uma coisa é o governo brasileiro se oferecer como negociador para uma transição à democracia. Outra, bem diferente, é estender tapete vermelho a um ditador, chamá-lo de democrata contra todas as evidências e tratá-lo como “amigo de fé, irmão camarada”. É vexatório.
Não se trata de resguardar a democracia como fingem o PT, a esquerda do atraso e o presidente Luiz Inácio da Silva, mas, trata-se claramente de um ato de desumanidade
CONTRARIANDO LULA, MISSÃO CRIADA PELA ONU DENUNCIA CRIMES DE MADURO, por Jamil Chade, no UOL
Tortura, espancamento, asfixia, violência sexual, prisões arbitrárias, censura, repressão e violações de direitos humanos. Num informe produzido por uma missão criada pela ONU, é refutada a tese do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que a situação na Venezuela seria apenas uma “narrativa” criada contra Nicolas Maduro. Segundo as conclusões do inquérito independente, crimes contra a humanidade ocorreram no país.
Nesta semana, o presidente brasileiro contestou a pressão internacional contra o venezuelano e alertou que uma “narrativa” havia sido criada para abalar o governo Maduro. A frase de Lula causou polêmica, com governos sul-americanos rebatendo a forma pela qual Lula descreveu a situação.
Se retomar a relação diplomática com Caracas era vista como um gesto importante por parte do Brasil, o entusiasmo de Lula com Maduro criou constrangimentos, mesmo entre diplomatas.
Na comunidade internacional, ninguém nega que a pressão sobre Maduro existiu e fazia parte de uma operação liderada por Donald Trump e seus aliados. Mas, diante da necessidade hoje de seu petróleo, governos estrangeiros reavaliam como retomar a relação com Caracas, inclusive por parte dos europeus.
Entre ativistas de direitos humanos e organismos internacionais, o temor é de que a repressão dos últimos anos seja ignorada, em nome de um “novo capítulo” na normalização da relação com os venezuelanos.
Para esses ativistas, os crimes já estão registrados.
Num informe detalhado sobre as operações de repressão na Venezuela contra a oposição, uma missão estabelecida pela ONU alertou no final de 2022 que as agências de inteligência militares e civis do estado funcionam para implementar um “plano orquestrado nos mais altos níveis do governo para reprimir a dissidência através de crimes contra a humanidade”
Antes, em 2020, a mesma missão alertou que o presidente Nicolas Maduro e outros membros do alto escalão do governo estavam cientes das violações e deram apoio e ordens aos grupos que levaram adiante tais atos. O inquérito sugeriu que o Tribunal Penal Internacional considerasse ações legais contra os responsáveis.
De acordo com o inquérito, Maduro e outros líderes sabiam, coordenaram ou contribuíram nos atos criminosos. Desde 2014, 3,4 mil opositores políticos teriam sido presos e a repressão era “uma política de estado”. Segundo o inquérito, Maduro chegava a saltar a cadeia de comando dos militares para dar ordens diretas em certos casos.
Dois anos depois, no novo informe, a missão apontou que Maduro “orquestrou” o plano e constatou o papel de indivíduos em diferentes níveis nas cadeias de comando para suprimir a oposição ao governo.
Tais atos envolveram a prática de atos de tortura extremamente graves que equivalem a crimes contra a humanidade. O documento foi produzido pela Missão Internacional Independente de Investigação de Fatos sobre a República Bolivariana da Venezuela (FFMV). A missão foi proposta no Conselho de Direitos Humanos da ONU e aprovada pela maioria dos países.
“De acordo com a análise da Missão e as informações recebidas, dissidentes reais e supostos e opositores do governo foram alvos de detenção com base em critérios que incluíam sua suposta participação em conspirações contra o governo, seus papéis de liderança ou potencial de liderança, seus papéis dentro da oposição política, suas críticas públicas ao governo e, em alguns casos, seu potencial de serem submetidos a atos de extorsão”, disse o informe.
“Em certos casos, o presidente Nicolás Maduro e outras pessoas de seu círculo íntimo, bem como outras autoridades de alto nível, estavam envolvidos na seleção dos alvos”, denunciam.
Entre as medidas de tortura realizadas pelo estado venezuelano, a missão criada pela ONU identificou:
Espancamento de vários detentos, inclusive com objetos como um bastão
Asfixiar detentos com sacos plásticos ou granadas de fumaça;
Aplicação de “señorita”, um dispositivo de tortura para colocar corpos em tanques de água;
Aplicar choques elétricos contra os detentos, inclusive nos testículos dos detentos;
Cometer atos de violência sexual, inclusive estupro de detentos com varas de madeira;
Ameaçar os detentos de estuprar e matar membros de suas famílias se eles não fornecessem determinadas informações;
Colocar alfinetes nas unhas dos detentos;
No documento, o grupo detalha os papéis e contribuições de vários indivíduos em diferentes níveis das cadeias de comando dentro dessas agências e pede às autoridades que investiguem suas responsabilidades.
“Nossas investigações e análises mostram que o Estado venezuelano conta com os serviços de inteligência e seus agentes para reprimir a dissidência no país”, constata.
“Ao fazê-lo, crimes graves e violações dos direitos humanos estão sendo cometidos, incluindo atos de tortura e violência sexual”, disse. “Estas práticas devem cessar imediatamente, e os indivíduos responsáveis devem ser investigados e processados de acordo com a lei”, disse Marta Valiñas, presidente da missão.
No mesmo documento, o grupo destaca ainda a situação no estado Bolívar do sul do país, onde atores estatais e não estatais cometeram uma série de violações e crimes contra as populações locais em áreas de mineração de ouro.
Para chegar às conclusões, a missão realizou 246 entrevistas confidenciais, presenciais e remotas. Além disso, analisou arquivos de casos e outros documentos legais. Devido a uma contínua falta de acesso ao território venezuelano desde sua criação em 2019, a Missão realizou visitas a áreas ao longo das fronteiras do país.
“A Venezuela ainda enfrenta uma profunda crise de direitos humanos, e nossos relatórios de hoje destacam apenas dois aspectos desta situação. Exortamos a comunidade internacional a continuar a acompanhar de perto os desenvolvimentos na Venezuela e a monitorar se estão sendo feitos progressos confiáveis no avanço da justiça, da prestação de contas e do respeito ao direitos humanos”, disse Valiñas.
Entre os responsáveis pelos crimes, a missão destacou o papel da Direção Geral de Contra-espionagem Militar (DGCIM) e o Serviço Nacional de Inteligência Bolivariana (SEBIN) – na prática de violações dos direitos humanos desde 2014. Algumas dessas violações equivalem a crimes contra a humanidade.
No total, a missão internacional registrou 122 casos de vítimas que foram submetidas a tortura, violência sexual ou outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, perpetrados por agentes do estado. A tortura foi praticada na sede dos órgãos em Caracas e em uma rede de centros de detenção secretos em todo o país.
Já a inteligência venezuelana tem torturado ou maltratado detentos – incluindo políticos da oposição, jornalistas, manifestantes e defensores dos direitos humanos – principalmente no centro de detenção El Helicoide em Caracas. “A missão investigou pelo menos 51 casos desde 2014. O relatório detalha como as ordens foram dadas por indivíduos nos mais altos níveis políticos a funcionários de nível inferior”, constata. Tanto o SEBIN quanto a DGCIM fizeram amplo uso da violência sexual e de gênero para torturar e humilhar seus detentos.
PLANO COLOCADO EM AÇÃO POR MADURO
Uma das queixas da missão da ONU é de que as autoridades venezuelanas não conseguiram responsabilizar os autores dos crimes e nem reparar as vítimas em um contexto em que as reformas judiciais anunciadas a partir de 2021 não conseguiram resolver a falta de independência e imparcialidade do sistema judiciário.
“As violações e crimes cometidos pelo SEBIN e DGCIM continuam até hoje. As mesmas estruturas, dinâmicas e práticas permanecem em vigor, enquanto funcionários relevantes continuam a trabalhar para as agências, e em alguns casos foram até promovidos. A análise da Missão detalha ainda como estes esforços foram colocados em ação pelo Presidente Maduro e outras autoridades de alto nível como parte de um plano deliberado do Governo para suprimir as críticas e a oposição”, destacou.
“As violações dos direitos humanos pelas agências de inteligência do Estado, orquestradas nos mais altos níveis políticos, ocorreram em um clima de quase completa impunidade. A comunidade internacional deve fazer tudo para garantir os direitos das vítimas à justiça e às reparações”, disse Francisco Cox, membro da missão.