Jair Bolsonaro e Arthur Lira querem tirar dinheiro de estados e cidades para bancar também a redução do preço da gasolina de rico. Bolsonaro e Lira, o presidente da Câmara, querem diminuir o preço dos combustíveis para todo mundo por meio da redução da cobrança do ICMS, imposto estadual.
É uma mutreta que não tem sentido social, econômico ou mesmo efeito prático relevante. É uma tentativa de limpar a barra de Bolsonaro, suja também por causa da carestia dos combustíveis, em parte culpa de Bolsonaro-Guedes. O dólar por aqui foi às alturas também porque essa dupla promove baderna política e econômica. O real foi a moeda que mais se desvalorizou desde o início da epidemia, entre as 38 acompanhadas pelo FMI.
No plano Lira, a redução seria de centavos, se tanto, no caso de gasolina e diesel. Todo mundo teria direito à redução do imposto, à mesma redução do preço de gasolina e diesel, desde que consuma esses produtos ou compre bens e serviços que são afetados pelo preço dos combustíveis.
O problema maior, no entanto, é de quem perdeu parte ou toda a renda do trabalho (ou nunca teve), que não tem como pagar R$ 98 por botijão de 13 kg. Pior do que a carestia é a falta de renda e de trabalho. Por falar nisso, desde que Bolsonaro tomou posse, a inflação da comida e a dos combustíveis foi quase a mesma. Vai ter lei para baratear o prato feito?
Em tese, esse dinheiro que seria tirado de estados poderia ser utilizado na maior parte para transferir renda, de algum modo, apenas para os mais pobres. Mas vai bancar também o dono do SUV que faz 5 km com um litro de gasolina e todo mundo remediado que tem carro.
É bem provável que os planos de Bolsonaro e o de Lira não passem no Congresso – se passarem na Câmara desembestada e embestada de Lira, param no Senado. Mas Bolsonaro, com apoio de seu cúmplice Lira, tenta com essa desconversa jogar a responsabilidade pela alta horrível dos combustíveis nas costas dos governadores. É picaretagem política misturada com ideias socioeconômicas de jerico.
Lira quer mudar o cálculo da cobrança do ICMS sobre combustíveis. Esse imposto é uma porcentagem (alíquota) do preço médio dos últimos 15 dias. Lira quer um cálculo sobre a média dos últimos 2 anos (quando o preço era menor).
Nas contas da Petrobras, o peso do ICMS é de 27,7% do preço da gasolina, 15,8% no do diesel, 14,8% no gás de cozinha (na média nacional dos preços da semana de 26 de setembro a 02 de outubro). Se a lei Lira do Delírio passasse, o preço médio do litro de gasolina cairia de R$ 6,09 para R$ 5,60; o do diesel, de R$ 4,80 para R$ 4,47 (nas contas de Lira). Caso o preço do petróleo e do dólar continue a subir, porém, tudo volta a ficar mais caro.
A receita estadual de impostos de fato aumentou. No conjunto, os estados estão com superávit em suas contas (em 2019, estavam no vermelho). Contas a partir dos últimos dados disponíveis na Receita Federal indicam que a receita de impostos sobre combustíveis equivale a 16% da arrecadação tributária dos estados. Note-se que os municípios também perderiam dinheiro, pois têm direito à 25% do ICMS que seus estados arrecadam. Se existe dinheiro “sobrando”, porém, não deveria ser usado com subsídio para ricos e remediados.
Por fim, a ideia de redução geral desses preços é, no caso, bobagem econômica. Vai dar um sinal errado para consumo e investimento: o preço alto é sinal para a contenção do consumo ou também para investimento em mais produção do bem (ou em alternativa, o que é ainda mais o caso em se tratando de combustível fóssil).
Não haverá milagre nessa história de combustíveis.