Qual a única coisa que é certa para as eleições de outubro em Gaspar? Se o PT quiser manter alguma chance terá que apostar no quarto mandato de Pedro Celso Zuchi, 71 anos, e torcer para que as vaidades e interesses dividam ainda mais o que está dividido no lado conservador, liberal e extrema direita. O PT, como outros partidos tradicionais (MDB, PP e PSD), diga-se, a bem da verdade, não se atualizaram no discurso e práticas, não remoçaram seus quadros, não produziram novas lideranças confiáveis para a população em Gaspar. Por isso, não podem oferecer nomes competitivos de seus próprios quadros.
Estão importando, rearranjando e até estão reféns de grupos externos políticos e ou mesmo, estranhos à política, mas que sempre deram as cartas por aqui. Ao menos, até agora, não estão falando de importar candidatos de outros municípios como já se pensou em Blumenau e se ventila em Itajaí.
Uma simples enquete nesta semana numa conta de Instagram – as pesquisas já precisam ser registradas com cinco dias de antecedência na Justiça Eleitoral para serem publicadas – mostrou o nervosismo de todos os quatro que estavam dentro dela, mas, principalmente, daqueles que ficaram de fora e que ainda não são páreo de verdade. É difícil levar a sério, este tipo de enquete, exatamente por falta de metodologia. Pode participar dela quem nem eleitor é e nem na cidade mora, por exemplo. Entre tantas aberrações estatísticas está na falta de definições de escolaridade, faixa etária e residência por áreas eleitorais.
Nomes e simpatizantes do delegado Paulo Norberto Koerich, sem partido, Ednei de Souza, Novo, Francisco Hostins Júnior, MDB e de muda para o PL, bem como o do que mais marqueteia a partir da sua estrutura na Câmara, Ciro André Quintino, MDB, queriam que eles fossem testados com os do empresário Oberdan Barni, Republicamos, Marcelo de Souza Brick, PP, Rodrigo Boeing Althoff, PL e o próprio Zuchi. São muitos nomes. A queixa, tratou-se, na verdade, da busca de espaços, apenas. Eles não querem cair do caminhão de mudanças antes do tempo. Simples assim.
Gaspar não comportará mais do que três candidaturas competitivas. E como na eleição de 2020, pelo menos dois nomes que se diziam bolsonaristas – e não eram – ficaram na rabeira como castigo de tal mentira que pregavam aos eleitores e eleitoras. E tem tudo para este tipo de distração punir os incautos mais uma vez. Iso sem falar na toxidade que nomes ligados ao governo e a Bancada do Amém estão perante a população por tudo que não fizeram e esconderam.
O que ainda mete a colher nas decisões que serão homologadas nas convenções entre os dias 20 de julho e cinco de agosto? O jogo de interesses regional (Blumenau), partidário vindo de Florianópolis e até, inclusive, Brasília. Já escrevi várias vezes sobre isto. Lembram como o deputado Ivan Naatz, PL, quis pôr no jogo do seu partido, Marcelo? E onde está Marcelo? E cada vez está mais claro este tipo de interferência externa, mesmo que seus participantes neguem, até terem seus interesses afetados.
Paralelamente, está no meio do jogo, outra vez, o grupo que inventou Kleber Edson Wan Dall, MDB, olhando os votos das igrejas neopentecostais pois o partidário já estava enfraquecido; que também inventou Marcelo fora da disputa e colou ele em Kleber para ele continuar sem concorrência servindo o grupo, com o agravante de não ter entregue o que ser prometeu a Marcelo; o mesmo grupo que inventou Kleber candidato a deputado estadual e que bichou desde aquele glorioso anúncio feito sob o quilômetro de asfalto mais caro que se conhece por aqui (R$12 milhões) e que se inaugurava, mas já remendado e prestes a novo re-remendo.
Este grupo cheirou mudanças no humor do eleitor gasparense e fingiu que ele não é o causador deste cheiro. Então, mais uma vez, sob disfarce de “salvar” a cidade, o grupo quer o delegado Paulo Norberto Koerich como candidato, por exatamente ele não ter nenhuma intimidade política. Como dizia o ex-primeiro ministro do Brasil, o mineiro Tancredo de Almeida Neves, “quando a esperteza é demais, ela come o dono“. E ela já comeu uma vez.
Do nada já enquadraram o presidente do PL de Gaspar, Bernardo Leonardo Spengler Filho, em um “jantar surpresa”. Queriam que ele trocasse o candidato do partido. Fui o único que registrei. Insatisfeitos, podem ser comidos pela esperteza pela segunda vez, se é verdade também, a afirmação de Bernardo de que haverá influências de Florianópolis, depois de vencer a de Ivan na imposição que Ivan Naatz queria. Pessoalmente, tenho dúvidas e fontes para isso.
É que Paulo até se ensaiou no PL em conversa reservada no final do ano passado com o próprio governador Jorginho Melo, PL, em Florianópolis. Ela esfriou. Ele não decolou. Paulo não está certo, não está confortável e tem alguma resistência à política em si. Agora, ele ressurgiu à agenda, mas pelo PSD que o deputado Napoleão Bernardes, de Blumenau, quer reconstruir em Gaspar, esfacelado por jogos de Marcelo e Giovano Borges.
Paulo é competente no ofício. Já escrevi isso aqui várias vezes. Antes de retornar a Gaspar foi o Delegado Geral da Polícia Civil e por um ano, o equivalente, hoje, a cargo de secretário de Segurança do ex-governador Carlos Moisés da Silva, Republicanos, de onde saiu magoado e exatamente porque a política o engoliu. Se há grupos que colocam, há grupos que tiram. Enfim, não é pouca coisa o que ele foi e fez. Os números jogam a favor dele.
Todavia, em Gaspar, e neste caso, os problemas de Paulo continuam sendo os padrinhos dele por aqui. E por dever de ofício, ele está impedido de dizer um ai contra o que se questiona a todo momento. A cidade sabe disso. E como bom investigador, penso que Paulo também saiba. É só ver onde está a cidade afundadas em dúvidas – e incompetência – com os apadrinhados dessa gente e que querem ser dele também.
Para o primeiro, a solução é a transparência, que nunca chega. Para a segunda, é troca mesmo e dizer que não concorda. Paulo não pode fazer isso como delegado, então perde ponto e fica num limbo perigoso. E as pessoas que querem a verdadeira mudança precisam de posicionamentos. Isto sem contar, que no PSD ele estará ao lado do novo prefeito de fato de Gaspar, o deputado Federal e irmão de templo de Kleber, Ismael dos Santos, PSD, de Blumenau. E a desconfiança do eleitorado com isso só aumenta, e contra Paulo.
No outro lado da cozinha, por sua vez, a chaleira está fervendo, a tal ponto que Zuchi, do PT, da esquerda do atraso, de Lula e Janja aparece como o que pode interromper este desastre que não é só de Kleber, Luiz Carlos Spengler Filho, ex-vice de Kleber, presidente do PP e atual chefe de Gabinete, e Marcelo, Mas de quem os incensou e não cobrou resultados diferentes dos que estão aí? O grupo que está inventando candidatos. É ele, que faz também, por exemplo, o azarão Oberdan Barni, Republicanos, estar sempre nas listas de prováveis vencedores. Ele é o único que pode falar que fará diferente; pode apontar erros, também nunca foi político.
A casta acostumada a inventar nomes, naturalmente, não quer Oberdan. Primeiro porque não é do seu agrado. Segundo, porque não tem controle. Simples assim.
A candidatura deste grupo é articulada na Inglaterra, reuniões no Poço Grande e já tem até um coordenador escolhido por aqui: Pedro Inácio Bornhausen, PP, ex-presidente do partido e ex-chefe de gabinete de Kleber. Então! Prosperando mais este desarranjo é de se perguntar: onde está Marcelo nesta descartada? Será candidato a vereador, ou vai trocar, rapidamente, de partido, mais uma vez, como fez no escurinho em 2022 para continuar candidato, quando foi para o Patriotas e se estabeleceu como um concorrente a deputado estadual que não deu certo?
Como se vê, há muita peleias, blefes, acomodações, traições e choradeiras pela frente no campo conservador, liberal e extrema direita. Consenso, só na esquerda. Ela pode até ter alguém se fingindo como possível adversário de Zuchi dentro do PT. Mas, só para gerar notícia. No final, estarão todos abraçados. Já na direita…
No ambiente político, Gaspar ainda não é dona de si própria. E a culpa histórica é dos partidos e suas lideranças fracas, reféns de grupos de interesses que atuam na coxia para demonstrar poder e influência, as quais, pelo que se vê agora, nem sempre são favoráveis à cidade, aos cidadãos e cidadãs comuns.
Não que esses grupos não tenham legitimidade para tal. Eles a perdem, entretanto, quando ao apadrinhar um candidato não consideram e não cobram resultados coletivos, nos quais, os seus podem estar incluídos como parte desta legitimidade. Quando falta o básico como creche, ensino em tempo integral, remédios e socorro médico e social, e isto não os sensibiliza, é porque a casta trata o zé pequeno como trouxa e descartável. E a única oportunidade do troco – ou seja, a punição – e mudanças estará em outubro deste ano. Melhor um erro inconsciente do que um proposital e criado por os que se acham donos da cidade. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
O grande nó de Jorginho e seu filho Felipe Melo, PL às instituições e adversários. Jorginho ameaçava uma bobagem desgastante: nomear Felipe para a Casa Civil, sob inspiração de um “rival”, o deputado Júlio Garcia, PSD. A desculpa era a de se ter um canal mais direto com o governador nas soluções legislativas. Quem não deixou que isso acontecesse? A extrema esquerda, pelo PSOL, o braço do PT e um desembargador substituto plantonista na Justiça estadual.
Restabelecido o erro claro de julgamento, diante de tamanha repercussão negativa, Felipe deu três nós de uma só vez e saiu mais forte de quando entrou nesta roubada: livrou o pai de ataques desnecessários nos desacertos da composição do primeiro escalão; provou para a Justiça que estava certo, ou seja, ilegal é diferente de imoral e não podem ser confundidas; e disse que continuará sendo o que sempre foi para o governo, ou seja, o homem forte, mesmo sem ter cargo ou função alguma. Restou aos adversários e à esquerda chuparem cana, porque ela é dura e doce.
No ano passado a Câmara de Gaspar pagou R$134.569,00 em diárias para vereadores e assessores. Entre os vereadores, o campeão foi o ex-presidente Ciro André Quintino, MDB, com R$20.601,00. Distante, no segundo lugar, veio o vereador Alexsandro Burnier, PL, com R$9.730,00, seguido de José Hilário Melato, PP, com R$6.450,00; Dionísio Luiz Bertoldi, PT, com R$6.110,00 e Franciele Daiane Back, PSDB, com R$5.610,00.
A primeira diária requerida este ano foi de R$231,00, por João Ramires, assessor de Ciro André Quintino, MDB. No ano passado as diárias dele somaram R$R$3.461,00.
A primeira diária deste ano dele foi para as filmagens de uma viagem do vereador na quarta-feira ao gabinete do secretário de Infraestrutura e Mobilidade, deputado Jerry Comper, MDB, em Florianópolis e uma reunião no Dnit para se ter a passarela da Rua Albertina Maba sobre a duplicada BR-470. E entulhou as redes sociais na promoção do vereador que ainda sonha ser candidato a prefeito ou vice.
O que mostra isto? Que a estrutura de gabinetes dos vereadores, paga pelo povo, é uma vantagem sobre os demais candidatos a prefeito, vice e mesmo na reeleição de vereadores. Ah, Ciro André Quintino, MDB, e o vereador Francisco Solano Anhaia, MDB, ao final da manhã de ontem propagaram nas suas redes sociais, após a reunião do DNIT, que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, PT, jurou que fará passarela da Rua Albertina Maba este ano e para isso vai licita-la em abril.
Gaspar de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, como ela é, em quatro atos e três vídeos. Outubro de 2023. Chuvas torrenciais, solaparam e levaram duas carreiras de tubos que davam vazão ao ribeirão Gasparinho, no encontro dos bairros Gaspar Mirim e Gasparinho e das ruas Rodolfo Vieira Pamplona e Fausto Dagnoni. Retirada de areia do ribeirão e de tapumes para a cultura do arroz, aumentaram a velocidade da água e facilitaram o desastre.
O prefeito disse que este assunto seria resolvido pelo governo do estado, ou federal, via a Defesa Civil. Chiadeira geral da comunidade que se isolou e só o governo não enxergou isso. Esse nenhenhém foi até se construir uma passagem instável e perigosa com um tronco de madeira, substituída por um mais longo e mais perigoso, devido ao contínuo processo de erosão daquela área. Bingo: quase aconteceu um desastre fatal de repercussões nacional. Veja o vídeo.
Foi só aí, que a prefeitura se mexeu e por terceiros. Neta segunda-feira, depois de quase três meses, vereadores da base do governo chegaram antes do prefeito e do seu secretário de Obras e Serviços Urbanos, Roni Jean Muller, MDB, em campanha, para fazer seus filmetes mostrando que a passagem estava recuperada para o povo. Veja o vídeo oficial.
Kleber Edson Wan Dall, MDB, fala em projeto, mas não conseguiu responder a um outro vídeo feito na mesma segunda-feira pelo Ednei de Souza, presidente do partido Novo, em Gaspar. Este é o verdadeiro problema da atual gestão: está sempre a reboque das pressões emergenciais e quando impelida a resultados urgentes, “esquece” da mínima prestação de contas à sociedade. E reclama que é perseguida por quem paga a conta e pede escarnecimentos mínimos. Acorda, Gaspar!
Para encerrar. Quatro observações da posse dos “novos” cinco membro do Conselho Tutelar de Gaspar. Como havia antecipado e parte da cidade já sabia, Jussara Spengler não assumiu. Preferiu ficar na prefeitura no cargo comissionado. No lugar dela, assumiu Marinez Testoni Theiss (segunda a esquerda na foto ao lado), que havia perdido por um voto e pediu a recontagem e a diferença se ampliou para dois para Flavia Poleza (a primeira a esquerda).
Entre os presentes, três supostos candidatos. Ednei de Souza, do Novo, que já foi secretário de Assistência Social, de Pedro Celso Zuchi, PT, além de Oberdan Barni, Republicanos, e Marcelo de Souza Brick, PP. Ao chegar, o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, foi cumprimentar os que estavam no evento. Ednei recusou o cumprimento formal.
15 comentários em “FATORES EXTERNOS FAZEM AINDA DAS ELEIÇÕES DE OUTUBRO EM GASPAR UM JOGO DE FORÇAS, DÚVIDAS E ESCARAMUÇAS”
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SEGURANÇA LOTEADA, por Elio Gaspari, nos jornais O globo e Folha de S. Paulo
Ricardo Lewandowski assumirá um Ministério da Justiça transformado em algo parecido com a mal falada Codevasf. Pela primeira vez na história dessa pasta ocupada por Diogo Feijó (1831-1832), por Bernardo Pereira de Vasconcelos (1837-1839) e Tancredo Neves (1953-1954) discutiu-se o preenchimento de cargos no seu segundo escalão a partir de critérios partidários ou regionais.
O PT quer cadeiras ocupadas pelo PSB e seria desmontada a “República do Maranhão” criada por Flávio Dino. Nenhum dos prováveis degolados foi classificado como incompetente e nenhum dos prováveis sucessores é louvado pela competência em questões de segurança pública. Trata-se apenas de discutir a filiação partidária ou a origem regional. Pior: prevalece nas aspirações a massagem dos egos de candidatos interessados em melhorar seus contatos e polir seus currículos.
Na campanha eleitoral, quando o tema da segurança pública teve a importância que merecia, Lula prometeu dividir o ministério. Na cadeira, atendeu às ponderações de Flávio Dino e Lewandowski, desistindo da ideia.
Enquanto isso, o Brasil vive numa tempestade perfeita. O crime organizado cresceu e tem 53 quadrilhas. Na outra ponta, aumentou a letalidade policial sobre os pobres inclusive em áreas governadas pelo PT.
Como o Ministério da Justiça tem a maior quantidade de advogados por metro quadrado, o problema da segurança pública é enfrentado com planos e regras que servem para nada. A passagem de Flávio Dino pela pasta confirmou essa anomalia.
Lewandowski anunciou que o combate ao crime organizado será a prioridade de sua gestão. O que ele fará com essa prioridade, só Oxalá sabe. É de justiça reconhecer que o comando da Polícia Federal ficou fora do loteamento. Seu atual diretor, Andrei Rodrigues, deverá continuar no cargo.
Lewandowski quer preencher os cargos de confiança com pessoas da sua confiança. É uma ideia que conforta o ministro, mas tem pouca serventia. Confiança é uma coisa, competência é outra.
A segurança pública dos Estados Unidos deveu a J. Edgar Hoover a criação do Federal Bureau of Investigation. Ele ficou no cargo de 1935 até sua morte, em 1972. Sujeito detestável, passou por seis presidentes. Pelo menos três não confiavam nele. Robert Kennedy, seu superior hierárquico, achava que era maluco. Lyndon Johnson manteve-o no cargo com uma explicação simples: “É melhor tê-lo urinando para fora do que tê-lo urinando para dentro”.
Implacável com inimigos e bandidos, Hoover era um competente puxa-saco. Vizinho de Johnson por cerca de 20 anos, deu-lhe de presente um cachorrinho e, quando o bicho morreu, mandou-lhe outro.
Hoover trabalhou em duas direções. Organizou uma polícia federal técnica, disciplinada e praticamente incorruptível. Além disso, federalizou crimes que eram tolerados nas jurisdições estaduais. Policiais e juízes corruptos temiam seus agentes.
OS SISTEMAS NÃO SE COMUNICAM
Vários especialistas em segurança pública queixam-se porque os diversos bancos de dados não se comunicam. Antes de comprar novos equipamentos, seria boa ideia chamar quem comprou as traquitanas atuais. O fornecedor sabia que seu sistema não falaria com o outro.
GUARDAA NACIONAL
Pelo andar da carruagem, há uma pequena possibilidade de que reapareça a ideia de se criar uma nova repartição policial. Seria a criação de uma Guarda Nacional. Depois do 8 janeiro de 2023, essa ideia circulou no comissariado petista e, aos poucos, foi esquecida.
A quem interessar possa:
As instituições militares detestam a Guarda Nacional desde o fim do século 19. No início de novembro de 1889, falava-se na transferência de batalhões sediados no Rio e no fortalecimento da Guarda. Na noite do dia 14 começou um levante e no dia 15 estava proclamada a República.
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e acredita ter percebido um padrão na defesa da moralidade pública e na sua vulnerabilidade.
De uma maneira geral, o cidadão começa a delinquir no ano Zero. No ano Um, o doutor é exposto, mas nega os malfeitos. No ano Dois, ele começa a ser investigado. No ano Cinco, se a culpa é estabelecida, ele é condenado e vai para a cadeia, condenado a duras penas. Na pior das hipóteses, por volta do ano Dez é libertado por algum benefício, revisão ou indulto.
Livre, caso ele circule no andar de cima e disponha de bons advogados, no ano Quinze consegue na Justiça a anulação das penas a que foi condenado por motivos que nada têm a ver com a essência das malfeitorias.
As denúncias de irregularidades em quatro ministérios de hoje estão no ano Um.
Esse padrão só vale para o andar de cima, no de baixo a vítima fica na cadeia mesmo sem culpa formada.
MADAME NATASHA COM EREMILDO
Madame Natasha tem horror a Eremildo porque ele é um cretino confesso, mas associou-se a ele e concedeu uma de suas bolsas de estudo ao secretário-geral da Presidência, Márcio Macêdo, que atribuiu a um “erro formal” a viagem de três de seus assessores para festas em Sergipe, com passagens e diárias pagas pela Viúva.
Nas suas palavras: “Houve um erro formal do meu gabinete, erro de procedimento, e isso nunca mais se repetirá.”
Natasha acredita que o doutor falou demais. Não precisava enfiar o “formal” na confissão. O erro seria formal se a trinca tivesse pedido passagens para Aracaju e tivessem sido mandados para Roraima.
FESTA NAS BANCAS
Os repórteres Jéssica Sant’Ana e Marcelo Ribeiro revelaram que o governo criará 19 grupos de trabalho para regulamentar a reforma tributária. Além disso, a nova ordem exigirá uma penca de leis complementares para esclarecer 71 pontos cegos. Nos estados os subgrupos serão 21. Estimando-se que cada grupo tenha cinco pessoas, serão 200 os burocratas convocados.
É possível que a reforma simplifique o sistema tributário nacional, mas até lá, a balbúrdia fará a alegria de burocratas, parlamentares e advogados.
A ESTRELA DE CAMILO
A estrela do ministro da Educação, Camilo Santana, brilhou quando ele governou o Ceará. Com um ano no Ministério da Educação, começou a piscar.
Ele entrou com o pé esquerdo. Um dos primeiros anúncios do MEC sob sua gestão foi a suspensão dos planos para se aplicar eletronicamente as provas do Enem.
Continuar aplicando as provas de papel pode ser conveniente, mas fechar a porta para a prova eletrônica é exercitar a opção preferencial pelo atraso.
ELEIÇÃO MUNICIPAL
Às vezes as eleições municipais soltam sinais de fumaça que prenunciam os dilemas da sucessão presidencial.
Em 2020, a eleição municipal sinalizou o esgotamento da maré que em 2018 havia alimentado o bolsonarismo.
Em 2018, a jornalista Joice Hasselmann elegeu-se deputada federal com mais de um milhão de votos. Dois anos depois, disputou a Prefeitura de São Paulo e saiu do jogo com 98,3 mil votos.
O ex-capitão e seu entorno desprezaram o sinal.
POR QUE? por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo
Por que, afinal, o presidente Lula decidiu atrair mais chuvas e trovoadas, dentro e fora do País, ao anunciar oficialmente apoio ao julgamento de Israel, por genocídio, na Corte Internacional de Justiça de Haia? Não precisava. Países não votam na Corte e não interferem no resultado. Bastava acompanhar de perto e ver no que daria, como fizeram China e Rússia, os dois principais integrantes dos Brics.
A explicação nos bastidores, ou melhor, nos palácios, é a tragédia humanitária em Gaza, transformada num gigantesco cemitério de crianças depois que Israel reagiu ao ataque terrorista do Hamas despejando sua ira e sua força na faixa que abriga(va) os palestinos. Mas, fora dos gabinetes envidraçados de Oscar Niemeyer, a interpretação é outra: a posição ideológica de Lula e do PT contra Israel.
Depois de notas do Instituto Brasil-Israel e da Confederação Israelita do Brasil (Conib), cobrando a tradição de “equilíbrio e moderação” da política externa brasileira, veio a carta, igualmente dura, mas em formato erudito, do ex-chanceler Celso Lafer, de família judia da Lituânia, professor emérito da Faculdade de Direito da USP e especialista em Direito Internacional.
Endereçada ao chanceler Mauro Vieira, mas distribuída publicamente, a carta rebate à luz do direito a acusação de “genocídio” e acusa a África do Sul, autora da petição à Corte de Justiça, de tentar deslegitimar o Estado de Israel e aumentar o antissemitismo mundial, “em sintonia com os que almejam minar o direito à existência de Israel”.
“É um deslize conceitual de má-fé valer-se da imputação de genocídio para discutir as controvérsias jurídicas relacionadas à aplicação do direito humanitário e aos problemas humanitários em Gaza”, ensina Lafer, acusando a posição do governo de falta de consistência, coerência e obediência às regras do Direito Internacional.
Na véspera, a ONG Human Rights Watch (HRW) divulgara seu relatório de 2023, criticando o Brasil por falhas no combate à violência policial e também em quatro conflitos internacionais: “declarações controversas” de Lula sobre a invasão da Rússia na Ucrânia, defesa de Nicolás Maduro na Venezuela e omissão em relação às violações na Nicarágua e aos crimes da China contra os Uigures.
Não há, porém, referências ao Brasil em relação à Guerra de Israel. Talvez porque o foco da HRW, pelo óbvio, é em direitos humanos, não em política externa e direito formal internacional. Mas a HRW é uma ONG, o Brasil é um País. Uma coisa é a opinião de organizações independentes, outra é o posicionamento oficial de um Estado num conflito que, como sempre, tem dois lados.
RELAÇÕES PERIGOSAS, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Quando Ricardo Lewandowski se aposentou do Supremo Tribunal Federal, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicou seu advogado pessoal para o posto. Quando uma segunda vaga foi aberta, o indicado foi o aliado político Flávio Dino. Para o lugar de Dino no Ministério da Justiça, o escolhido foi Lewandowski.
Os movimentos escancaram, sem nenhuma preocupação com a sutileza, as expectativas de Lula em relação à atuação dos magistrados e da corte mais elevada do país. Trata-se de um jogo perigoso.
Ao longo de 17 anos no STF, Lewandowski se notabilizou pela postura garantista e, particularmente, por votos e manifestações favoráveis ao líder petista e a nomes do partido. Assim foi no julgamento do mensalão, na Lava Jato e até no impeachment de Dilma Rousseff, quando contribuiu para que a ex-presidente não ficasse inelegível.
Ainda que não lhe tenham faltado argumentos jurídicos para sustentar suas decisões, é inevitável que seu ingresso no governo agora pareça reconhecimento da lealdade.
Lula, ademais, reforça laços com o Supremo em seu terceiro mandato —viabilizado, aliás, por deliberações do tribunal que anularam suas condenações por corrupção.
Eleito por margem mínima de votos e sem maioria confiável num Congresso que rumou à direita, o presidente e seu entorno recorrem com frequência inaudita ao STF para o desembaraço de pautas de seu interesse.
Foi uma medida de Lewandowski, por exemplo, que suspendeu normas moralizadoras da Lei das Estatais e permitiu nomeações políticas nas empresas federais. O plenário do tribunal, note-se, até hoje não examinou o tema.
Ali também se resolveu o imbróglio do pagamento dos precatórios deixados por Jair Bolsonaro (PL). Nesse caso, os magistrados ao menos não endossaram a pretensão governista de mudar a classificação dessa despesa para maquiar o déficit das contas públicas.
Lula tem em Alexandre de Moraes, ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, um aliado-chave na ofensiva pela regulação da internet, que traz ameaças indisfarçáveis à liberdade de expressão. Dino, na Justiça, dedicou-se ruidosamente à causa.
Tanta proximidade não se dá sem riscos —e o mais óbvio é para a credibilidade do Judiciário.
Há mais, porém. Um Supremo ativista, que venha a tomar decisões controversas sobre temas da alçada do Legislativo, tende a provocar reações e atrair represálias do mundo político, como já vem acontecendo, e da sociedade.
À corte, que teve méritos inegáveis na resistência aos ataques de Bolsonaro às instituições, cabe zelar por sua imagem e conduta. Essa não é uma preocupação de Lula.
Herculano e leitores, Boa Tarde.
Estamos em 2024, com os mesmos problemas de anos passados. Contudo este ano é ano de eleição para o cargo de gestor municipal e de seus fiscais/legisladores.
Hoje é visível que afloram e ressuscitam pré candidatos em todas as partes, aqueles que ressuscitam são os mesmos que nada ou pouco realizaram do que apresentaram com propostas anteriormente, já os que se afloram me parece que não tomaram ciência do que é necessário para Gaspar.
Aos candidatos fica a sugestão de que Gaspar precisa de mais propostas exequíveis e menos Quinhões a serem partilhados por quem chega ao Poder.
Caro leitor Aurélio Marcos
Verdade. Os que surgiram, NADA OU POUCO FIZERAM – E OLHA QUE TINHAM A OPORTUNIDADE – para impedir o caos em que estamos metidos. A primeira coisa, os que não são da banda que está tocando desafinada neste coreto, é a pedir desculpas aos gasparenses, se explicar e dizer porque ficou omisso. Depois, e só depois disso, dizer como pode e se vai mudar o que está caótico para todos. Acorda, Gaspar, porque por enquanto o que avança é o capim…
Vdd mesmo, capim ao povo e Quinhão aos que comem a mesa.
MUITA CONVERSA PARA POUCA AÇÃO, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo
Com a devida licença poética, foi mais ou menos assim.
Do prefeito do Rio para o ministro interino da Justiça, no X (Twitter):
— Tem bandido cobrando 500 mil de empreiteira que toca obra pública.
Ministro, também no X:
— Tô sabendo. Seu colega de Nova Iguaçu também alertou. Vamo pra cima.
Não foram. Ficaram ocupados consigo mesmos, com as trocas no Ministério da Justiça e Segurança Pública. O então ministro interino, Ricardo Cappelli, continua secretário executivo da pasta, mas entrou em férias, depois deixará o cargo. Também se dá como certo que o atual secretário de Segurança Pública, Francisco Tadeu Barbosa de Alencar, será substituído, provavelmente por Benedito Mariano, quadro do PT que participou da transição nas questões de segurança.
As propostas da transição não foram aproveitadas na gestão do ministro Flávio Dino. A julgar pelos resultados, nenhuma outra proposta foi aproveitada, nem sequer formulada no detalhe. Agora, confirmadas as mudanças, Mariano deverá imprimir “nova política”.
Pelo jeito, demorará para o governo federal ir para cima da milícia e do narcotráfico. A Polícia Civil do Rio tentou. Descobriu o nome do bandido que cobrou os R$ 500 mil da empreiteira que toca a obra do Parque da Piedade. Trata-se de Jean Carlos Nascimento dos Santos, o Jean do 18. O Ministério Público apresentou denúncia por extorsão, a polícia foi atrás do sujeito. Não encontrou.
Nada, portanto. Para prender Jean do 18, não era preciso denúncia alguma. Ele está condenado a 66 anos de prisão, é réu em 20 crimes, incluindo homicídios, foi preso em 2017, mas fugiu no começo do ano passado. E voltou às atividades.
O tuíte do prefeito Eduardo Paes trouxe à tona toda essa história. Com mais detalhes. Tinha ocorrido, em novembro passado, uma reunião de Dino e Cappelli com empreiteiros do Rio, que reclamaram justamente das extorsões. Todo mundo que deveria saber, portanto, estava sabendo. Vai ver foi por isso que o prefeito do Rio recorreu ao X. Boca no trombone.
Agora, todos sabemos — nada foi feito, nem ao menos se tem a tal política nacional de segurança. Parece mais fácil formular do que colocar para funcionar o que já existe. Em todas as áreas.
Um ano depois de iniciada a gestão Lula e depois de o presidente ter ido a Roraima para denunciar a tragédia do povo ianomâmi com a titular da nova pasta dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, a situação dos ianomâmis continua uma tragédia.
Repórteres e fotógrafos que foram até lá há uma semana encontraram crianças desnutridas com os ossos à mostra. Explosão de casos de malária e virose. Centenas de mortes. Rios poluídos tomados pela lama. O garimpo ilegal, que nunca saiu totalmente, de volta com força no interior da Floresta Amazônica — como descrevem reportagens e declarações de lideranças locais.
Em janeiro de 2023, Lula decretou emergência de saúde pública. Neste mês, revelada a tragédia persistente, fez uma reunião com vários ministros e decretou questão de Estado. A Casa Civil anunciou que tomará “ações estruturantes”.
De novo, não seria mais eficiente levar comida e remédios para lá? Há 27 mil indígenas na Terra Yanomami. Não pode ser tão difícil entregar lá comida e remédios. Em janeiro do ano passado, a ministra Sonia Guajajara dizia exatamente isso, que a ação imediata seria levar suprimentos. Combater o garimpo ilegal, um tipo de crime organizado, e tocar o saneamento de rios e matas é mais difícil, claro. Mas levar alimentos?
O governo diz que o desastre foi causado pela gestão Bolsonaro — é verdade — e que conseguiu alguns resultados, como redução no número de mortos. Não foi o que os jornalistas encontraram. Não é o que dizem lideranças indígenas. Além disso, até quando continuarão culpando o governo anterior?
A ministra Sonia Guajajara orgulha-se de ter levado cem indígenas brasileiros em sua delegação para a COP28, em Dubai. Um marco histórico, como ela diz. Mas que vale isso diante da tragédia continuada dos ianomâmis?
8/1, UM DIA SEM HERÓIS, por Demétrio Magnoli, no jornal Folha de S.Paulo
Frustrar tentativas de golpe de Estado geralmente faz heróis. Pense em De Gaulle, no 23 de abril de 1961, em Juan Carlos, rei da Espanha, no 24 de fevereiro de 1981, e em Boris Ieltsin, no 19 de agosto de 1991. O Brasil foi exceção à regra, como se depreende do incisivo documentário “8/1: A Democracia Resiste”, de Julia Duailibi e Rafael Norton, produzido pela GloboNews. Naquele dia de 2023, sobraram vilões, mas não emergiram heróis.
Janja sai bem na fita, mas na medida exata em que Lula e seus conselheiros próximos saem chamuscados. Ela acendeu o alerta contra a hipótese de GLO, algo que cairia como luva no roteiro sonhado pelos golpistas. Surpreende, negativamente, que políticos calejados como o presidente, Flávio Dino, Alexandre Padilha e cia não tenham matado essa charada antes da jovem primeira-dama.
Quem se sai pior, no governo, é José Múcio. O ministro da Defesa pedia GLO. Desde sua indicação, antes da posse, Múcio resolveu declarar que os acampamentos bolsonaristas diante dos quartéis pertenciam “à democracia”, esquecendo-se do veto legal à ação política em áreas militares, especialmente quando se trata de conclamação a um golpe de Estado.
A leniência do ministro frente aos acampamentos –compartilhada, silenciosamente, pelo presidente– pavimentou a trilha para o desastre. O acampamento montado às portas do QG do Exército funcionou como trampolim para a mobilização golpista.
No 8/1, segundo ele mesmo, Dino limitou-se a “abrir o cardápio” de opções legais. Acatando o conselho de Janja, no calor da hora, Lula tomou a decisão certa: intervenção na segurança pública do DF. Aí, agora sabemos, Dino e Padilha esquivaram-se da missão em nome da preservação de seus mandatos de senador e deputado, respectivamente. Não achei bonito: se a democracia estava em jogo, como fugir à raia?
Sobrou Ricardo Cappelli, o lugar-tenente de Dino, que agarrou o touro pelo chifre. O governo deu-lhe as tarefas de limpar a Esplanada, o que ele fez, e de prender os golpistas acampados diante do QG do Exército, o que não tinha como fazer. O touro –isto é, os generais Júlio César Arruda, comandante do Exército, e Dutra de Menezes, chefe do Comando Militar do Planalto– era grande demais. No seu ponto culminante, o documentário ilumina o impasse entre a tropa da PM do DF, liderada por Cappelli, e o bloqueio militar montado à frente do acampamento, que incluía veículos blindados.
Os dois generais decidiram proteger os golpistas contra o governo legal, usando o pretexto de que uma ação noturna provocaria um “banho de sangue”. As forças do Exército estavam prontas a enfrentar a tropa de choque da PM, mas supostamente temiam render uma chusma de zumbis encharcados em cerveja e lambuzados de churrasco. Contudo, registra o documentário, Lula preferiu ceder a ordenar, diretamente a Arruda, a realização das prisões.
Infelizmente, o documentário lança poucas luzes sobre o desfecho: a reunião, no Comando Militar do Planalto, entre Arruda e generais do Alto Comando do Exército com Dino, Múcio, Cappelli e o coronel Fábio Augusto, da PM. Nela, após uma ameaça implícita de Arruda a Fábio Augusto, firmou-se o “acordo” de adiar as prisões para a manhã seguinte. “A última palavra foi do Exército”, explicou Duailibi, com precisão cirúrgica.
Sabia-se, naquele dia, que o tal “banho de sangue” não passava de uma alegação ridícula. Sabe-se, desde o dia seguinte, o motivo verdadeiro da resistência de Arruda em efetuar de imediato as prisões: no acampamento golpista circulavam parentes de altos oficiais do Exército. A informação, porém, não aparece no documentário.
Arruda, exonerado, deu lugar ao general Tomás Paiva, de credenciais legalistas impecáveis, que tem a complexa missão de descontaminar a oficialidade militar. De positivo, foi principalmente isso que produziu um 8/1 sem heróis.
Cheira a golpe. Não vai dar certo. No final desta esperteza, enxerga-se um impeachment
LULA ESCOLHEU GOVERNAR COM O SUPREMO, por Bruno Boghossian, no jornal Folha de S. Paulo
Lula descreveu Flávio Dino e Ricardo Lewandowski como uma dupla. Ao comentar a ida de Dino para o STF, ele afirmou que o tribunal teria “um ministro com a cabeça política”. Nem foi preciso completar o raciocínio: para o Ministério da Justiça, o presidente optou por alguém com a cabeça de ministro do STF.
A nomeação de Lewandowski reforça o entendimento de que Lula escolheu governar com o Supremo. Com a entrada de um ex-integrante da corte no primeiro escalão, o presidente estreita uma aliança com a qual espera garantir estabilidade e se contrapor a um Congresso poderoso e frequentemente indócil.
No capítulo anterior, com a indicação de Dino, Lula mandou um político para o STF sem omitir o valor que dava a essa credencial. O presidente sinalizou a aliados, diversas vezes, que enxergava a corte como parte do jogo político e poderia negociar ali, portanto, saídas políticas para crises igualmente políticas.
Lewandowski deve atuar no sentido inverso. Enquanto Dino constrói sua própria força dentro do plenário, Lula espera que o futuro ministro da Justiça aproveite sua influência num ambiente profundamente corporativista para defender os interesses do governo —tanto no Supremo como em outros tribunais.
Lula deixa claro o peso que deposita sobre o Judiciário em questões sensíveis. O governo foi ao STF para questionar a privatização da Eletrobras e recuperar a arrecadação de tributos, e não esconde a expectativa de que a corte possa reverter derrotas impostas pelo Congresso no marco temporal e na desoneração.
O presidente parece avaliar que os benefícios superam os riscos da operação, a começar pela escolha de Lewandowski, que chega com a inevitável carga de decisões alinhadas aos petistas quando vestia toga.
Outro perigo é mais amplo e assombra aliados de Lula. Com o pacto, o STF acumulou poder, ampliou sua influência sobre nomeações para tribunais e ganhou proteção política. Dificilmente algum governante terá força para moderar seu apetite.
TROCA DE DINO POR LEWANDOWSKI FORNECE LENHA PARA O BOLSONARISMO, por Josias de Souza, no UOL
Na entrevista em que formalizou a escolha de Ricardo Lewandowski para ocupar a poltrona que Flávio Dino esquentou no primeiro ano de governo, Lula tratou a substituição como uma operação casada. Sobre o envio de Dino para o Supremo, declarou: “Sempre sonhei que deveríamos ter na Suprema Corte um ministro com a cabeça política”
Quanto à chegada de Lewandowski ao Ministério da Justiça, Lula celebrou a intimidade. “Conheci ele com 28 anos, trabalhando na prefeitura de São Bernardo”, recordou. O velho amigo ornamentou seus 17 anos no Supremo com decisões que favoreceram o novo chefe. Anulou provas e interrompeu investigações. Antes de pendurar a toga, suspendeu artigos da Lei das Estatais que impediam Lula de nomear políticos para empresas públicas
Ex-juiz federal, Dino havia trocado 12 anos de magistratura pela política. Indicado para o Supremo, disse que “as pessoas mudam” e assegurou, sob denso ceticismo, que esquecerá os trajes ideológicos. Algo que não orna com a realização do sonho presidencial da toga com viés político
Aposentado por idade, Lewandowski troca uma rentável banca de advocacia pela administração de emergências que vão do combate ao crime organizado à defesa do consumidor. Na melhor das hipóteses, a passagem pela Esplanada é o triunfo da vaidade sobre o saldo médio. Na pior das hipóteses, é um investimento
Diante de uma plateia de repórteres, o presidente disse que Dino e Lewandowski não dariam entrevista, porque “não têm nada a dizer”. Adiou a efetivação da mudança para 1º de fevereiro. Declarou que ganharão com a troca o Ministério da Justiça, a Suprema Corte e o povo brasileiro”
Por enquanto, lucraram apenas Bolsonaro e seus devotos. Com a saída de Dino, a Esplanada fica desfalcada do “vingador” antibolsonarista. Com a chegada de Lewandowski, Lula fornece lenha para a ficção bolsonarista segundo a qual a provável condenação criminal de Bolsonaro é parte de um complô do Planalto com o Supremo
INDICAÇÃO DE LEWANDOWSKI EXPÕE CONTRADIÇÃO PETISTA SOBRE MORO, editorial de O Globo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ontem Ricardo Lewandowski, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), como novo ministro da Justiça. Não houve surpresa. Embora outros nomes tenham sido cogitados, o favoritismo de Lewandowski era conhecido.
Não se pode dizer que ele não tenha qualificações ou não atenda aos requisitos do cargo — um dos mais desafiadores do governo, dada a crise na segurança que fustiga o país. Foi advogado, juiz, desembargador. Assumiu uma cadeira no STF em 2006, indicado pelo próprio Lula, permanecendo até abril passado, quando se aposentou perto de completar 75 anos.
Presidiu o Supremo entre 2014 e 2016 e ocupou também a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2010 a 2012. Ultimamente, integrava o conselho jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul. Tampouco se pode afirmar que, em sua passagem pelo Supremo, tenha se comportado de forma diferente do que manda a Constituição ou que tenha deixado de julgar os processos de forma imparcial.
Mas é inegável que a escolha revela certa incoerência. Se Lewandowski — revisor do caso do mensalão e autor de inúmeros votos favoráveis a Lula e ao PT no Supremo — pode integrar o ministério sem que isso seja prova de suspeição, qual o sentido de fazer tal acusação ao ex-juiz Sergio Moro quando foi para o Ministério da Justiça de Jair Bolsonaro? Como enfatizou Merval Pereira em sua coluna no GLOBO, embora tratada com naturalidade por petistas e aliados, a escolha de Lewandowski para a pasta se dá em contexto similar ao da ida de Moro para a equipe de Bolsonaro depois de julgar processos de Lula na Operação Lava-Jato.
Na época, petistas interpretaram a decisão como confissão de que Moro atuara na Lava-Jato para beneficiar Bolsonaro, acusação sem muito sentido, pois era impossível prever o que aconteceria nas eleições anos ou meses depois. Moro dizia que o cargo trazia uma oportunidade para conter os excessos do então presidente na questão das armas e dos direitos humanos, além de oferecer espaço para acelerar a política de combate à corrupção. Como a História mostrou, a associação com Bolsonaro se revelaria um erro político. Sem conseguir implantar suas ideias, Moro pediu demissão com pouco mais de um ano no cargo, em meio a uma crise gerada pela tentativa de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal.
Hoje, sabe-se que Moro cometeu muitos erros na Lava-Jato — erros que acabaram levando à declaração de sua suspeição e à anulação dos processos que corriam na 13ª Vara de Curitiba. Mas os petistas não podem mais apontar a ida para o governo Bolsonaro como evidência da atuação política de Moro como juiz; do contrário teriam de fazer o mesmo com Lewandowski. Esse argumento deixa agora de existir.
ASSIM SOMOS, por Willian Waack, no jornal O Estado de S. Paulo
Países latino-americanos são muito diferentes entre si e muito similares em pelo menos dois pontos. Não conseguem frear a expansão do crime organizado. Não conseguem promover de forma sustentável a expansão da economia.
A relação entre uma coisa e outra não deve ser estabelecida como causalidade mecânica (do tipo “menos prosperidade na economia significa mais prosperidade do crime organizado”). A complexidade da situação está no fato de serem comuns a esse enorme conjunto de países o desarranjo institucional e a incapacidade das diversas sociedades de se organizarem em torno de desafios percebidos.
Se pobreza e desigualdade foram sempre identificadas como graves problemas “estruturais” que o baixo crescimento relativo das economias não consegue resolver, agora acrescente-se o crime a essas mazelas. Segurança pública virou elemento importante em eleições recentes até em países como Chile e Argentina, que exibiam taxas de criminalidade mais “aceitáveis”.
Os atuais eventos no Equador são mais um exemplo da durabilidade, amplitude e penetração do crime organizado. E evidenciam como um “pico” de violência (exacerbado pela força de imagens) se transforma rapidamente em ameaça percebida ao próprio Estado. É como se uma grave doença “de repente” se tornasse conhecida, e então vem o medo dela.
Na verdade, é longa e se espalha por quase toda a região (há pequenas exceções, como o Uruguai) a história de episódios de enfrentamento aberto entre crime organizado e a autoridade estatal. Basta lembrar a guerra de Pablo Escobar na Colômbia nos anos 90, o Sendero Luminoso no Peru, a sucessão de vários cartéis do narcotráfico e sua contestação de governos mexicanos, a dissolução da política na América Central trazida pelas “maras” e, não por último, a ampliação das facções criminosas e milícias no Brasil.
Há exemplos também bemsucedidos de recuperação da autoridade do Estado – o mais famoso deles é o da cidade de Medellín, na Colômbia. Mas permanecem como eventos “isolados” numa paisagem de incapacidade generalizada de sociedades de países latinoamericanos de se mobilizarem frente a fenômenos – como economias de crescimento insuficiente e crime organizado de crescimento exuberante – que, no fundo, corroem brutalmente essas mesmas sociedades.
O problema, diria uma antiga escola de historiadores, é cultural no sentido mais amplo da palavra. Cultura entendida como a intrincada soma de tudo: história, geografia, economia, política, sociedade. É assim que somos?
O EQUADOR (AINDA NÃO) É AQUI, por Malu Gaspar
No mesmo dia em que o presidente do Equador, Daniel Noboa, decretou conflito armado interno em razão da onda de violência sem precedentes, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), pediu ajuda nas redes sociais ao governo federal para lidar com o achaque à empreiteira que constrói um novo parque na Zona Norte da cidade. Segundo a prefeitura, três bandidos foram ao canteiro exigir R$ 500 mil para permitir que a obra continue.
Embora os dois episódios não tenham nem de longe a mesma gravidade — ainda não se viram por aqui líderes de organizações criminosas construindo piscinas ou dando entrevistas coletivas na cadeia, nem invadindo canais de TV armados para falar ao vivo à população —, nossa situação tampouco autoriza ignorar o que se passa no vizinho latino.
Quem acompanha a evolução da crise da segurança no Rio ouviu falar em criminosos cobrando propina de empreiteiras em obras públicas pelo menos desde 2012, quando um grupo de traficantes promoveu até o sequestro-relâmpago de um funcionário para extorquir construtoras que faziam uma ponte nos arredores do Complexo da Maré, também na Zona Norte.
Naquela época, o país testemunhava o sucesso da política de ocupação de favelas pelas Unidades de Polícia Pacificadora, as UPPs, ao mesmo tempo que descobria que o mandante do assassinato da juíza Patrícia Acioli era um tenente-coronel envolvido com milícias.
As máfias de policiais e ex-policiais se fortaleciam novamente, mais de uma década depois da CPI da Assembleia Legislativa que indiciou 266 suspeitos e levou à prisão de diversos políticos.
Numa entrevista que fiz então com o sociólogo Claudio Beato para a revista Veja, ele previu que se daria aqui o mesmo roteiro da Colômbia dos anos 1990, quando os paramilitares se associaram ao narcotráfico, espalhando o terror e elevando os índices de criminalidade às alturas.
Naquele contexto, avisos desse tipo eram considerados alarmistas. Doze anos depois, milícia e tráfico estão tão juntos e misturados que são chamados de narcomilícias. Dominam parte considerável do território de várias outras metrópoles, da Bahia ao Amazonas, para ficar apenas em dois exemplos.
Tanto aqui como no Equador, o combustível para a disseminação do crime organizado é a corrupção policial. Ainda não temos chefes de cartéis dando coletivas em presídios, mas desembargadores dão liminares soltando chefes de facção durante o plantão judicial.
Citado na CPI das Milícias, o ex-deputado estadual Domingos Brazão se tornou conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. No final de 2023, a Polícia Federal fez uma devassa nos endereços da deputada estadual Lucinha (PSD), chamada de Madrinha pelos cabeças da maior milícia do estado — organização suspeita de ter ordenado o assassinato de uma policial militar que os investigava.
Não se viu ainda uma fuga tão espetacular como a do equatoriano Fito, mas há dois meses um dos líderes da milícia amiga de Lucinha, que deveria ter sido mantido preso, saiu pela porta da frente da cadeia e se escafedeu depois de um “erro de comunicação” entre a Justiça e a Secretaria de Administração Penitenciária do Rio.
Como o combate às milícias é atribuição do estado, muita gente questionou se o apelo de Paes ao governo federal não teve o propósito de fustigar o governador Cláudio Castro (PL), aliado do bolsonarista Alexandre Ramagem (PL-RJ) na disputa pela prefeitura neste ano.
Ou se não queria levantar a bola de Ricardo Cappelli, a quem dirigiu a postagem — o secretário executivo de Flávio Dino, afinal, tentou até a última hora se viabilizar como opção para o Ministério da Justiça em vez de Ricardo Lewandowski.
Mesmo que tais suposições fossem verdadeiras, a contaminação da polícia e da política fluminense pelo crime justifica a desconfiança. Não fosse assim, as investigações do caso Marielle Franco não teriam sido federalizadas.
No momento em que o presidente da República nomeia um novo ministro da Justiça e em que se ouve nos bastidores que a escolha de Lewandowski tem a ver com o fato de Lula achar estar na hora de colocar no posto alguém low profile para se contrapor à eloquência de Dino e Cappelli.
Se o novo ministro da Justiça falará mais ou menos, porém, importa pouco. O que interessa é saber quanto ele está disposto e habilitado a apostar em políticas públicas que limpem a polícia e retomem dos criminosos o domínio dos territórios. Até agora, não se sabe o plano de Lewandowski, se é que ele tem algum. Mas o alerta do Equador está aí, e desprezá-lo não é uma opção.
O CAOS NO EQUADOR SERVE DE ALERTA PARA O BRASIL, editorial do jornal O Globo
O caos institucional imposto ao Equador pelas facções do narcotráfico é um alerta para o Brasil e para outros países que enfrentam o poder desafiador de organizações criminosas transnacionais. As cenas de terror que se espalharam pelo país nos últimos dias expõem de forma didática o que pode acontecer quando o Estado falha no combate ao crime organizado e cede terreno à anomia e à barbárie.
A violência, já presente no cotidiano da população equatoriana, explodiu depois do último domingo, quando fugiu da prisão o chefe da facção criminosa Los Choneros, vinculada aos cartéis de drogas do México e da Colômbia. Rebeliões eclodiram nos presídios. Ao menos sete policiais foram sequestrados. Grupos criminosos tomaram universidades e hospitais, disseminando o pânico. Homens encapuzados e armados invadiram um estúdio da TV estatal, promovendo cenas de terror transmitidas ao vivo. Explosões e saques tomaram conta das ruas. Os episódios já deixaram pelo menos 13 mortos.
O descontrole é a primeira crise enfrentada pelo presidente Daniel Noboa, de 36 anos, há menos de dois meses no poder. Depois de decretar estado de exceção, ele declarou conflito armado interno e ordenou às Forças Armadas neutralizar organizações criminosas envolvidas com o narcotráfico (22 foram classificadas como terroristas).
Noboa foi eleito com um discurso de combate ao crime organizado inspirado nas políticas radicais do salvadorenho Nayib Bukele em sua guerra às drogas. Na campanha, chegou a prometer comprar barcos-prisão para confinar líderes de facções no Pacífico, longe da costa. Agora anunciou que erguerá dois presídios de segurança máxima para abrigar os traficantes, despertando protestos em comunidades indígenas afetadas pelas obras. Os fatos lhe impõem um desafio impossível de enfrentar na base do populismo.
A explosão da violência no Equador é recente. Entre 2018 e 2023, o índice de homicídios saltou de 6 para 46 por 100 mil habitantes (no Brasil, foi de 23,3 por 100 mil em 2022). A escalada é influenciada pelas facções criminosas, que disputam espaço na vida pública. Em agosto passado, o candidato à Presidência Fernando Villavicencio, depois de ameaçado pelo líder dos Choneros, foi assassinado a tiros ao deixar um comício numa escola em Quito.
Evidentemente, a realidade do Equador é distinta da brasileira. Mas há semelhanças no modo como as facções agem ao afrontar o Estado por meio do caos e do terror à população. Não se pode ignorar que extensões significativas do território brasileiro, especialmente nas comunidades pobres ou áreas da Amazônia, estão sob controle de bandidos que impõem suas próprias leis. As cadeias são focos de tensão permanente e, muitas vezes, servem de ponto de partida para execuções e ataques violentos ao patrimônio público.
Não se pode transigir com o crime. Sempre que o Estado negligencia seu papel fundamental na segurança pública, a violência explode, pondo em risco a estabilidade e a sobrevivência das instituições. Compreende-se que o combate às organizações do narcotráfico não é tarefa simples. Exige recursos humanos e materiais vultosos, cooperação federativa e políticas permanentes. No Brasil, o governo federal tem resistido a reconhecer sua responsabilidade na questão, empurrando aos estados a missão de combater facções criminosas cujo poder só faz crescer. O Equador deveria servir de alerta.