Alterado foto e texto às 15h06min – Finalmente, o PL bolsonarista de Gaspar dirá quem será o seu candidato a prefeito em seis de outubro deste ano: o gasparense da gema, apesar de nascido em Blumenau por falta de maternidade aqui, o policial civil, atual delegado aqui, mas com ampla experiência numa carreira profissional, incluindo associação de classe, a posição de delegado geral de polícia de Santa Catarina e que lhe o topo dela quando foi, ao equivalente ao que é hoje secretário de Segurança Pública (no governo de Carlos Moisés da Silva, Republicanos, mas eleito pelo PSL bolsonarista, que o pichou, injustamente, de traidor), Paulo Norberto Koerich.
Paulo – o que fez fama de implacável no passado e hoje está sossegado – já se ensaiou entrar neste ambiente político quando ele foi o chefe de gabinete nos primeiros anos do então governo do prefeito Francisco Hostins, PDC (1989/92). Depois de testemunhar uma pernada do ex-prefeito em seus técnicos que o deram fama administrativa incomum até então, com crédito naquilo que se tornou uma marca e bem antes das redes sociais, o bacharel em direito, animado pelo amigo delegado Ademir Serafim, resolveu entrar e seguir a carreira policial, onde está prestes a se aposentar.
O lançamento da candidatura dele amanhã será na Comunidade São Cristóvão, no Gaspar Grande, bairro onde Paulo possui raízes de vizinhanças há longo anos. Será às sete e meia da noite. Será regional para dar densidade, não deixar nenhuma dúvida, e está sendo chamado de “Encontro do Partido Liberal”. Ela terá a presença do governador Jorginho Melo, PL. O que se havia de querer mais?
AVAL DA FAMÍLIA
Este convescote de alto prestígio de amanhã, fecha um ciclo que se iniciou em setembro do ano passado quando Paulo foi a Florianópolis, e na presença do governador Jorginho assinou a ficha no PL, depois em Gaspar, disse no início deste ano a um grupo de empresários que o patrocina, unidos com políticos de partidos conservadores, mas principalmente do PP, sob o testemunho da imprensa, em evento no Restaurante Questão de Gosto, de que poderia ser candidato. Tinha tido o aval familiar, até então a justificativa para deixá-lo no limbo neste assunto, além do encaminhamento da sua aposentadoria como policial.
Na semana passada, em novo encontro com o governador Jorginho, em Florianópolis, Paulo reafirmou que estava honrando a palavra empenhada em setembro do ano passado. Selou também o destino de Rodrigo, na foto ao lado e em segundo plano – o que não ocupou o espaço. Vai, a princípio, ser o vice de Paulo.
Agora, Paulo posará para a foto, oficial, em Gaspar, sua terra, que quer governar a partir de janeiro do ano que vem. É para divulgação e não terá mais volta.
Os flashes testemunharão à assinatura dele numa ficha já assinada, com o abono do governador. Discursos. Juras. Promessas. Festa. Reconciliações e pé na estrada. Delegado aqui. Delegado em Blumenau com Egídio Maciel Ferrari, que também já trabalhou em Gaspar – aliás, Jorginho também, na falecida agência do BESC – de muda para o PL. Todos na mesma barca. Aqui inicialmente, junto com o União Brasil. Mas, há espaço para outras siglas. E o PL trabalha muito neste sentido.
OS ADVERSÁRIOS
Esta será a segunda pedra cantada no jogo sucessório gasparense deste ano. A primeira, foi a do ex-prefeito por três mandatos que vai concorrer pela quinta vez a prefeitura, Pedro Celso Zuchi, PT.
Falta, agora, o grupo que sustenta Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, no arco MDB, PP, PSD (enfraquecido), PDT (que tem tudo para migrar ao MDB) e o PSDB (que está se desmanchando em quase todos os municípios catarinenses e aqui seu presidente, Jorge Luiz Prucino Pereira está envolvido em áudios cabulosos) indicar a chapa para esta corrida continuar na busca do poder de plantão.
A outra pedra cantada, mas não oficializada, é a do empresário Oberdan Barni, Republicanos. O PL daqui e o estadual o dá como morto. E está numa feroz campanha paralela de bastidores para desacreditá-lo e ensacá-lo nas pressões que faz em Florianópolis, Blumenau, Bombinhas e Brasília. O PL sabe que corre risco com Oberdan vivo, mesmo sendo o PL um voto caixão dos bolsonaristas. Qual o temor? O candidato de Kleber e Marcelo não deslanchar e as viúvas de Rodrigo, silenciosamente, juntos, migrarem no voto útil da direita e conservadorismo para Oberdan contra o PT de Zuchi e Lula.
A outra pedra quase certa desse jogo, é pela insistência do meirinho Ednei de Souza, pelo Novo. Quer aproveitar as ondas do Novo de Blumenau e com chances por lá na dobradinha que faz, vejam só, com o PSD do novo prefeito de fato daqui o deputado Federal, Ismael dos Santos. A mulher Denise está mapeada para a vice do ex- promotor de Justiça, Odair Tramontin.
A candidatura de Paulo Norberto Koerich – apesar de todas as negativas e “cuidados” para não machucar os que davam Rodrigo nesta corrida – na cabeça pelo PL, é irreversível neste momento. Os próprios bolsonaristas mais extremados de Gaspar e que tinham preferência pelo engenheiro Rodrigo, candidato em 2020, quando obteve 22,21% dos votos válidos, já estão conformados e convencidos disso. E caminham para a conciliação. No fundo, e de verdade, Paulo é mais bolsonarista do que Rodrigo. E os bolsonaristas sabem disso muito bem.
A ESCOLHA DO CANDIDATO PELA CÚPULA
Sustenta-se essa mudança da cabeça de chapa na corrida eleitoral em pesquisas – e só conhecidas entre pouquíssimos – que a direção do PL e União Brasil, bem como o grupo de empresários, os quais dizem que realizaram junto ao eleitorado gasparense nos últimos dias.
De verdade? As pesquisas existiram, todavia, no fundo se trata de uma escolha feita por padrinhos, os mesmos que já colocaram Kleber, Marcelo e até Zuchi no poder. Eles estavam em Florianópolis na semana passada, depois de tentar dar um balão, sem sucesso, no presidente do PL de Gaspr, Bernardo Leonardo Spengler Filho para ter acesso direto ao governador.
A foto que abre este artigo se esconde das redes sociais e das alvissaras. Ela é a diferente do oficial, ao lado, onde o governador ladeado por Rodrigo (à esquerda) e Paulo (à direita) mostra a ficha de Paulo que ele a abonará aqui amanhã. E quem está invisível em todas estas fotos? O deputado Ivan Naatz, PL, de Blumenau, então amigo de dias difíceis com Rodrigo no PV. Ivan boicotou como pouco Rodrigo nos últimos anos. Ivan comemorou a tranca que Rodrigo sofreu.
E a franquia partidária da vez, escolhida pelo grupo de empresários e políticos foi o PL, com alguém da sua confiança, diante dos degastes e à falta de liderança dos partidos tradicionais como o MDB, PP, PSD e igrejas neopentecostais onde o mesmo grupo já transitou e franqueou os seus preferidos.
Para não correr risco, buscou-se no PL. De verdade? Buscou-se o aval de Bolsonaro e Jorginho como cabos eleitorais da atual onda conservadora. Nada mais.
Este fator de apadrinhamento estadual e nacional é quase garantia de sucesso eleitoral nos dias de hoje ao campo conservador e isto está explícito nos resultados e mapas eleitorais de Gaspar do Tribunal Regional Eleitoral de 2018, 2020 e 2022. É só consultar e analisá-los. É o canto da cotovia do nós contra eles, que o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, PT, alimenta diariamente, mas que, contraditoriamente pode complicar o que aparece sempre na ponta de qualquer pesquisa que se faça por aqui, o ex-prefeito Pedro Celso Zuchi, PT.
UMA DIANTEIRA A SER TESTADA A PARTIR DE AGORA
Zuchi está na frente porque, naturalmente, é lembrado por quatro campanhas a prefeito e duas a deputado estadual. Ou seja, são quase 25 anos de poder, influência e campanhas permanentes, e vencedora em quase todas. É muita coisa. Seria muito decepcionante, não ser lembrado antes de qualquer competição começar para valer.
Mas, Zuchi é mais lembrado ainda neste momento, exatamente pela decepção que se tornou para a cidade, os cidadãos e cidadãs, o sucessor dele, Kleber, primeiro com Luiz Carlos Spengler Filho, PP e depois, com Marcelo, no PSD e que migrou para um tal de Patriota, tinha assinado a ficha no PL pelas mãos do deputado estadual de Blumenau, Ivan Naatz, e finalmente, parou no PP. E há quem diga que poderá mudar até seis de abril.
Zuchi está na frente porque a campanha não começou e quase ninguém, incluindo Paulo Norberto Koerich, disse que é capaz e como vai mudar a cidade, que foi reprovada nas urnas quando também rejeitaram o PT em 2016 e 2020 sem Zuchi diretamente na parada. Zuchi só perdeu a reeleição em 2004 para Adilson Luiz Schmitt, naquela época filiado no MDB. Hoje Adilson está no PL.
O único que disse até agora o que não concorda e como fará diferente, e não fui eu quem inventei como insistem alguns acostumados a comprar gente na imprensa e das redes sociais da moda, pois foi o próprio candidato quem escreveu, assinou e publicou na imprensa local, foi Oberdan Barni, Republicanos. Os eleitores e eleitoras de Gaspar neste ano querem se livrar daquilo que os incomoda e não avançou com Kleber, o religioso, o marido e pai de família exemplar, o vendedor de sonhos nas mídias sociais, o marqueteiro, o vingativo, o que tem o corpo fechado nas instituições…
Paulo Norberto Koerich diz que pode ser esta esperança. A conferir o discurso de amanhã. E isso deve começar pela transparência. Ela é o antídoto das cobranças. E que virão. Afinal é uma campanha, e não uma investigação que precisa – e as vezes se estabelece imaginários – de sigilos. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
Sem foco e prioridade. O Samae de Gaspar foi “surpreendido” esta madrugada com a quebra da principal bomba de captação de água para o sistema de tratamento e abastecimento de 70% do município. O que mostra isto? A nossa perigosa dependência de de quase um único ponto de captação, de uma única bomba e a falta de uma contingência. Sai e entra gestor – que entende e não entende nada do assunto devido aos arranjos políticos e até divergências – e tudo continua à mercê da “sorte”. Na foto de Jadir Amorim, ao lado, uma visão de quem passava hoje pela manhã pela velha ponte Hercílio Deecke. Ela já testemunhou cada coisa… E não tem jeito.
Este é o Samae de Gaspar. Ele acaba de gastar milhões em um contrato emergencial para ass roçadas para salvar a pele do prefeito, vice e dos candidatos da coligação do MDB, PP, PSD, PDT e PSDB – para que a mixuruca festa dos 90 anos de emancipação de Gaspar não fosse engolida pelo avanço do capim, mas, ao mesmo tempo, não foi capaz de cuidar do seu próprio negócio. E o castigo veio a galope. Incrível!
O poder de atração. A ex-vereadora e ex-secretária da Saúde, Tereza da Trindade, que já peregrinou em vários partidos, estará no convescote do PL. Vai assinar a ficha no partido e é candidata a vereadora. Ela se junta ao ex-prefeito Adilson Luiz Schmitt – eleito pelo MDB – que já assinou a ficha no PL, que mira a eleição de quatro vereadores.
Primavera do Leste, no longínquo Mato Grosso, é agora ponto de atração para investimentos de gasparenses e seus parentes.
O vice-prefeito de Gaspar, e pré-candidato da poderosa coligação que está no poder de plantão, Marcelo de Souza Brick, PP, finalmente, assumiu a prefeitura de Gaspar. Dez dias no lugar do titular Kleber Edson Wan Dall, MDB. O que vai mudar? Nada. A não ser mais exposição – e nisso ele se vira bem – ao pré-candidato e que ele acha essencial para deter o seu derretimento como candidato até então viável e imbatível.
Os políticos atrelados ao governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, estão fechando a interação e áreas de comentários das suas redes sociais. É que apareceram os corajosos fazendo fortes cobranças. Todos do governo preferem ser avestruzes, achando que enterrando a cabeça no buraco que cavaram, vão se livrar nas urnas das consequências. Kleber diz que está estressado. Uma boa desculpa para viajar.
Para atender a uma demanda de um vereador, em ano de eleições, a Câmara de Vereadores de Gaspar numa sessão mudou o Regimento Interno: de três para quatro as moções para cada vereador por ano. Na outra, aprovou as quatro moções permitidos pela mudança.
Bate-boca. Uma emenda parlamentar de R$500 mil da deputada Federal Ana Paula Lima, PT, liberada em 15 de dezembro só apareceu nos cofres da prefeitura de Gaspar da semana passada. O problema estava na documentação da prefeitura para recebê-la, que só se ajustou em fevereiro deste ano. Enquanto isso, os vereadores Dionísio Luiz Bertoldi, PT e o líder do governo Francisco Solano Anhaia, MDB, ocupavam a tribuna para apontar os culpados pela presepada. Perguntar não ofende: não é esta equipe que é modelo nacional e que ganhou um prêmio e foi até Brasília para recebê-lo? O que avança de fato em Gaspar? A enrolação!
Propaganda falsa I – O líder do governo na Câmara de Gaspar, Francisco Solano Anhaia, MDB, foi à tribuna na terça-feira passada para se orgulhar que o tal “Alô Saúde”, em tempos de dengue, covid (com uma morte recente) e gripe correndo soltos e lotando os postinhos e o Pronto Atendimento do Hospital de Gaspar, já atendeu 938 pessoas, supostamente doentes ou atrás de informações, por telefone.
Propaganda falsa II – O “numerão”, se verdadeiro, trabalha contra a propaganda ufanista do governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP e do líder Francisco Solano Anhaia, MDB. Noves fora, isto significa que, por dia, em plantão de 24 horas, repito, 24 horas, atendeu-se 49,4 pessoas nos 19 dias do serviço. Ou seja, em torno de duas pessoas a cada hora. Uau!
Propaganda falsa III – E tudo piora, quando desses 938 que ligaram para o serviço “Alô Saúde” de Gaspar, apenas 470 foram dar nos médicos deste serviço de telemedicina, ou seja, menos de 9 pessoas por dia, ou, feita a conta: uma a quase cada três horas. O governo, a Bancada do Amém, a secretaria de Saúde e Francisco Solano Anhaia, MDB, classificam isso como sucesso. Será?
Propaganda falsa IV – Os políticos de Gaspar estão tropeçando nos números e na própria realidade. E é isto que os descredencia para continuar no poder. E não enxergam. O “Alô Saúde”, só foi implantando, emergencialmente, em Gaspar por terceiros – ou seja é um negócio -, para propaganda e principalmente, para diminuir as filas nos postinhos, policlínica e PA do Hospital onde o governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, perdeu a batalha do controle e dos resultados faz tempo. Exagero? Então leiam o relato abaixo.
Um drama em casa I – Mara Lúcia Xavier da Costa dos Santos é vereadora pelo PP, o qual dá apoio incondicional ao governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB e Marcelo de Souza Brick, PP. Foi eleita, usando a Saúde – de onde vem – como carro chefe e como sobrenome na propaganda facilitadora de cata a votos: Mara da Saúde. Preta, queria desfilar com os do movimento negro e os da Saúde na segunda-feira, dia 18, dia dos 90 anos de emancipação de Gaspar. Faltou. Teve que correr atrás de socorro, velar e enterrar Ana Paula, sua sobrinha.
Um drama em casa II – O drama pessoal e familiar da vereadora é um retrato de como está a precarização da Saúde Pública em Gaspar e da qual a própria vereadora que é conhecida como uma facilitadora na busca de soluções na burocracia, na improvisação e resoluções. Por ser da Bancada do Amém (MDB, PP, PSD, PDT e PSDB) Mara na terça-feira, mesmo sob comoção, não pode tocar nesta ferida. “Ela cuidava da saúde dos outros, num Posto de Saúde, há 16 anos e se esqueceu de cuidar da saúde dela própria“, lamentou ao acrescentar que faltou a sobrinha saúde e socorro na hora em que seus parentes mais precisaram. A Síndrome de Burnout a pegou. Burnout é uma palavra inglesa para excesso de trabalho e estresse.
Um drama em casa III – É assim que estão os postinhos de Saúde em Gaspar. Abarrotados de gente para atendimento de um lado e um déficit de gente para atender à demanda de outro, incluindo os que estão em licença, por diversos motivos, incluindo a licença médica e a tal Síndrome de Burnout, que como se sabe, pode até matar. E aí, o governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, remenda a situação emergencialmente – e não como uma ferramenta suplementar estruturada e integrada – com o tal “Alô Saúde”. E todos batem palma para o escamoteamento daquilo que não se resolve de verdade. Adia-se.
Um drama em casa IV – Restou a vereadora Mara Lúcia Xavier da Costa, PP, se emocionar. Afinal, ela faz parte do governo onde sua sobrinha se estabeleceu na Síndrome de Burnout em área essencial e que não funciona adequadamente para a população, principalmente a mais desassistida. A Bancada do Amém, respeitosamente, ficou em silêncio.
Os donos do novo Brasil I – No domingo – algo raro, e de Ramos, mais simbólico ainda – a Polícia Federal, sob a proteção do Supremo Tribunal Federal, prendeu no Rio de Janeiro, um deputado Federal, Chiquinho Brazão, União Brasil – já devidamente expulso da legenda em ano de eleições -, um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, irmão de Chiquinho, também ex-deputado, Domingos Brazão e incrivelmente, o ex-chefe de Polícia Civil do Rio, Rivaldo Barbosa.
Os donos do novo Brasil II – Todos como mandantes e no caso do policial, dificultador intencional da apuração para proteger o grupo político mandante, da morte da ex-vereadora fluminense Marielle Franco, Psol. Impressionante esta confirmação. E cada vez mais comum.
Os donos do novo Brasil III – Qual o retrato desta notícia de ontem e que dá manchetes hoje? A tomada criminosa do estado brasileiro por quem deveria proteger nos proteger ou nos representar, a quem os pagamos com os nossos pesados impostos. Mas, eles criam, vivem e usufruem de um estado paralelo, matando os do estado legal. Neste caso, os mandantes se vingaram dos que não queriam a regularização de loteamentos e construções ilegais e clandestinas caprichosamente fonte de riqueza desse estado paralelo. O leitor e a leitora estão enxergando alguma coincidência?
Os donos do novo Brasil IV – Não importa se Marielle era de esquerda ou de direita. Importa como essa gente, com os votos, se encorpa e vira dono do dinheiro público, das pessoas e como elimina adversários que atrapalham seus negócios clandestinos e lucrativos, que não pagam os pesados impostos como nós. O delegado, por exemplo, prometeu aos olhos da família da vereadora morta que solucionaria o caso. Mas, como, se faz parte da trama? Todos em presídio Federal. Outro sinal de controle da Justiça sobre o caso e na farra dos advogados de gente poderosa ou endinheirada nas cadeias do Rio de Janeiro.
É vergonhoso para um catarinense ver e ouvir, membros do PL de Gaspar, defenderem o nome de Michelle Bolsonaro, a terceira esposa do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, PL, como candidata a senadora por Santa Catarina, se por acaso, o carioca Jorge Seift Júnior, PL, for cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral na sessão do dia quatro de abril e for entendido que, deverá haver uma eleição suplementar para o preenchimento desta representação política catarinense.
O PL catarinense não possui um nome identificado com os catarinenses para concorrer a este mandato? É isso? Ao importar enfraquecemo-nos e perdemos a nossa identidade cultural bem como a dinâmica de desenvolvimento. Não basta o ensinamento da decadência do Rio de Janeiro?
Candidato chiclete. Gruda em tudo. Em campanha aberta há meses para prefeito, tem candidato em Gaspar que já admite ser vice de quem tenha chance de vencer. Preferencialmente do PL e se rejeitado, até pelo PT. Falta combinar com ambos. O seu padrinho financeiro já desistiu do candidato.
Poucos perceberam, mas o Vale Alimentação dos servidores da prefeitura e da Câmara sofreu um reajuste de 19,4% para uma inflação que ficou em 3,82% como se usou para a base do reajuste dos vencimentos desses mesmos servidores municipais. O vale saiu de R$620,00 para R$750,00.
Fim de campeonato. O governo Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, estão ampliando a máquina efetiva da prefeitura em projeto de leis em tramitação na Câmara. Ou então, dando reajustes localizados. Na última sessão, o PL 15/2024 foi aprovado. Ele altera as referências dos cargos efetivos de agente de serviços gerais, operador de bomba, pedreiro, leiturista, eletricista, merendeira/servente e lavador de carros tanto no Samae como na prefeitura.
Eles estavam na referência 20; agora no 22. Ganhavam antes do reajuste de 4%, R$1.880,13 por mês. Agora, R$1.994,61. E vem mais. E tem que ser rápido. Até o dia seis de abril, devido às restrições da legislação eleitoral.
Pelo menos três vereadores titulares em Gaspar e todos da Bancada do Amém, ou seja, da base de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, deverão trocar de legendas até sábado. Dois deles, movidos por legendas fracas à reeleição. Este é o caso de Franciele Daiane Back, PSDB e Roberto Procópio de Souza, PDT. O destino de ambos é o MDB. O outro que deverá mudar de partido é Francisco Hostins Júnior, MDB. Estava encaminhado para o PL, mas diz que não será candidato a nada.
Franciele Daiane Back, PSDB, que foi assessora e desbancou seu ex-chefe, o vereador Jaime Kischner, MDB, quando resolveu concorrer como representante do Distrito do Belchior, poderá ser a carta na manga, para compor a majoritária sucessora de Kleber Edson Wan Dall, MDB. E esta notícia irritou gente que estava na fila dentro do MDB.
Este meu artigo será o único desta semana neste blog. Para alívio dos políticos e gestores públicos incomodados. Vou me dedicar ao ócio não remunerado da Semana Santa, se nada tão urgente me provocar a voltar a teclar. Uma boa e Santa Páscoa a todos que são cristãos, leitores e leitoras daqui. Aos demais, apenas uma boa semana.
Os artigos de leitura, comentários meus, dos leitores, leitoras e de Miguel José Teixeria, no espaço de comentários, serão atualizados em tempo real até segunda-feira que vem.
22 comentários em “A SEGUNDA PEDRA CANTADA DO JOGO SUCESSÓRIO EM GASPAR SERÁ ASSENTADA AMANHÃ EM REPETIDO CONVESCOTE. O PL DIRÁ À CIDADE QUE PAULO NORBERTO KOERICH SERÁ SEU CANDIDATO A PREFEITO”
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WALTERS, O AMERICANO ESTEVE EM TODAS, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Na manhã de hoje, há 60 anos, o embaixador americano Lincoln Gordon chegou à sua sala por volta das 9h15m. Ele sabia que o golpe estava por dias, mas não sabia que o general Olímpio Mourão Filho, comandante da Região Militar com sede em Juiz de Fora (MG), havia resolvido se rebelar. Quem o avisou que a coisa havia começado foi seu adido militar, o coronel Vernon Walters, um homem corpulento, amigo de militares brasileiros desde a Segunda Guerra Mundial.
Walters ralou durante esse dia. No fim da tarde achava-se que o general Castello Branco, seu colega de barraca na Itália e chefe do Estado-Maior do Exército, estava encurralado no Ministério da Guerra. (Falso, ele estava num aparelho na Zona Sul.) Um marechal avisou-o de que uma tropa legalista da Vila Militar marchava para Minas Gerais. Às 19h05m seu prognóstico era sombrio: “A rebelião parece estar perdendo ímpeto.”
Naqueles dias o Rio de Janeiro penava um racionamento de energia e bairros inteiros ficavam sem luz à noite. Perto das 23h, o marechal Lima Brayner, chefe do Estado-Maior da Força Expedicionária Brasileira durante a guerra, ouviu pancadas na entrada de serviço do seu apartamento de Copacabana, abriu a portinhola e viu, iluminado por uma vela, o coronel Walters. Brayner disse-lhe: “O Kruel acaba de lançar um manifesto.” “Graças a Deus”, respondeu Walters, um católico devoto.
A adesão do general Amaury Kruel, comandante da guarnição de São Paulo, havia decidido a parada. O marechal Cordeiro de Farias, patriarca de todas as sublevações militares do período resumiria a questão: “O Exército foi dormir janguista a acordou revolucionário.”
No dia 2 de abril, Walters passou pela casa de Castello Branco, em Ipanema. No dia 4, de novo, e também na do ex-presidente, marechal Eurico Dutra (1946-1950).
Eleito presidente, no primeiro dia de serviço, Castello convidou-o para um almoço no Palácio do Planalto. Walters presenteou-o com um abacaxi.
O coronel Walters entrou na mitologia das intervenções militares americanas como se, com seus seu pés enormes, esmagasse governos. Teria ajudado a derrubar o rei Farouk no Egito (1954), o premier Mossadegh no Irã (1953), os presidentes Manuel Prado no Peru e Arturo Frondizi na Argentina (1962), noves fora Jango. É um exagero.
Na vida real ele foi mais que isso. Onde houve encrenca ou mistério, lá está ele. Conversas secretas com chineses e vietnamitas? Foi Walters quem bateu à porta de embaixada chinesa em Paris com um recado do presidente americano Richard Nixon. Era em sua casa que Henry Kissinger se escondia para negociar com os vietnamitas do Norte. Escândalo do Watergate, que derrubou o presidente dos Estados Unidos? Ele era o vice-diretor da Central Intelligence Agency em 1972, quando a Casa Branca concebeu um estratagema para congelar as investigações do FBI. Walters e o diretor da CIA, Richard Helms, barraram a manobra.
Walters alistou-se no Exército para derrotar o nazismo e continuou na carreira para derrotar o comunismo. Em 1989, ele era embaixador na Alemanha e de sua janela viu o fim do Muro de Berlim. Morreu em 2002, aos 85 anos.
O HOMEM QUE FALAVA OITO LÍNGUAS
Walters era um interlocutor direto, dotado de um humor sarcástico. Costumava dizer que falava outras sete línguas (francês, italiano, espanhol, português, alemão, russo e holandês) mas não pensava em nenhuma. Seu português tinha pouco sotaque, como o de Roberto Campos.
Quando Fidel Castro lhe disse que estudou com padres, cortou:
— Yo también, pero me quedé fidel.
Quando era acusado de saber tudo sobre o Brasil, respondia.
— Se eu fosse isso tudo, não teria comprado um apartamento no Panorama Palace Hotel. (Lançado no Rio nos anos 1960, o Panorama foi um mico e hoje é chamado de Favela Hub.)
Walters alistou-se no Exército em 1941 antes mesmo que os Estados Unidos entrassem na guerra. Seu pai teve algum dinheiro, mas perdeu-o na Depressão dos anos 1930. Tinha talento para idiomas e lapidou-o na adolescência, como mensageiro de uma companhia de seguros da Babel de Nova York. Achou que com isso teria uma boa posição mas, de saída, virou soldado raso.
Um ano depois era tenente, na área de informações, e um coronel mandou que aprendesse português. Em 1943 foi designado para acompanhar oficiais brasileiros nos Estados Unidos e, mais tarde, na Itália. Daí em diante foi interprete das conversas de presidentes americanos com brasileiros, de Dutra a Médici, de Harry Truman a Richard Nixon. Teve dois padrinhos, o presidente Eisenhower e Averell Harriman, milionário, diplomata, ex-governador de Nova York grão-duque do partido democrata.
Depois de ter vivido alguns anos no Rio (e virar flamenguista), era adido militar em Roma em 1962, quando o embaixador Lincoln Gordon pediu ao presidente Kennedy que o removesse para o Rio, reforçando o dispositivo militar da embaixada. Walters moveu céus e terra para não sair de Roma, pensou em pedir passagem para a reserva. Em outubro o coronel desceu no Rio e teve 13 generais para recebê-lo no aeroporto.
Na noite de 13 de março de 1964 ele viu o discurso de João Goulart na casa do general Castello Branco. (O alto da testa de Castello batia abaixo da base do queixo de Walters, que o descreveria assim: “Baixo, robusto. O pescoço muito curto e a grande cabeça dão a impressão de que é corcunda”.)
Walters deixou o Brasil em 1967 como general. Uma semana depois da edição do AI-5, quando havia pressão para que os EUA se afastassem da ditadura, ele escreveu ao secretário de Estado Henry Kissinger defendendo a aliança:
“Se o Brasil se perder, não será outra Cuba. Será outra China”.
Walters foi adido militar em Paris, vice-diretor da CIA, embaixador nas Nações Unidas e em Berlim. Lá, pelo seu jeitão loquaz, o secretário de Estado James Baker evitava-o.
WASHINGTON MANDA, E WALERS CUMPRE
Em 1966 a Polícia Federal prendeu dois americanos com contrabando de minérios na Amazônia. Um poderoso senador foi ao secretário de Defesa e pediu por eles. Walters recebeu o seguinte telegrama:
“Apreciamos seus francos comentários se há algo que possa ser feito nesse caso através de seus bons contatos com seus interlocutores militares brasileiros.”
Walters foi a Castello Branco dizendo-se envergonhado por encaminhar a gestão. Dias depois, as celas dos americanos amanheceram com as portas abertas e eles fugiram.
MISSÃO IMPOSSÍVEL, RESGATAR KISSINGER
Quando: 1970.
Onde: Paris
O general Walters está no seu gabinete de adido militar na França e recebe uma mensagem de Washington informando que o avião que conduz do secretário de Estado Henry Kissinger para mais um encontro secreto com vietnamitas está sobre o Atlântico e será obrigado a descer no aeroporto de Frankfurt, na Alemanha.
Missão: Trazer Kissinger, incógnito, a Paris.
Walters desceu, caminhou até o palácio presidencial e pediu para ser recebido imediatamente pelo presidente francês Georges Pompidou. Expôs o seu caso: precisava de um avião para buscar o secretário.
Quando Pompidou perguntou-lhe o que Kissinger vinha fazer em Paris, respondeu que a viagem envolvia uma senhora.
Pompidou emprestou-lhe um jato militar, ele desceu em Frankfurt, atravessou a pista, mandou apagar os refletores e resgatou Kissinger. Seguindo a rotina, levou-o para seu apartamento, onde a empregada jamais soube quem era o hóspede.
SERVIÇO:
Walters escreveu dois livros de memórias, o primeiro, “Missões silenciosas”, muito bom, tem edição em português.
A INFAME NOTA DO PT SOBRE A REELEIÇÃO DE PUTIN, por Sérgio Fausto, no jornal O Estado de S. Paulo
A nota em que o PT felicita Vladimir Putin pela sua vitoriosa reeleição à presidência da Rússia é uma das mais infames da história do partido. O texto é efusivo. Mostra contentamento com o “feito histórico”, ressalta o “expressivo resultado” e termina com “calorosas saudações”. Desconheceriam os dirigentes do PT as condições de coerção em que se realizaram as eleições russas, a brutalidade repressiva sobre a oposição, os assassinatos e prisões de opositores e jornalistas independentes? Esqueceram-se de que o partido nasceu na luta contra a ditadura militar no Brasil, quando muitos dos que viriam a criá-lo sofreram arbitrariedades semelhantes?
Infame do ponto de vista moral, a nota é politicamente inepta. O PT colhe simpatia e votos entre setores da sociedade civil engajados em causas que a Rússia criminaliza. A lei russa prevê pena de prisão para quem exibir símbolos do movimento LGBTQIA+. Para Putin, a igualdade de gêneros destrói os valores da família tradicional. A aliança entre o Kremlin e a Igreja Ortodoxa russa lembra os tempos do czarismo.
Além de afrontar parte significativa do eleitorado simpático ao partido, a infame nota afasta eleitores de centro que votaram em Lula nas eleições presidenciais passadas. Desconheceriam os dirigentes do PT que esses eleitores foram decisivos para que o atual presidente derrotasse Bolsonaro numa eleição decidida por margem ínfima de votos? Suporiam que o conjunto da obra do partido no apoio a ditaduras amigas não terá peso em eleições futuras? Não se dariam conta de que o apoio a Putin reforça a paranoia, fomentada pela extrema direita, de que o PT na verdade quer implantar o comunismo no País? Não importa que Putin seja hoje um ídolo da direita reacionária. No mundo da pós-verdade e das fake news,a Rússia continua a ser vermelha como a União Soviética.
A nota infame é mais um sintoma de um partido com a bússola moral e política avariada, incapaz de autocrítica, intelectualmente esterilizado, pronto a seguir e ecoar o que seu líder máximo disser. Vista dessa perspectiva, a nota não discrepa da linha dominante da política externa do atual governo, em especial quando o presidente Lula a manifesta de forma espontânea, à margem do cuidado profissional do Itamaraty.
Nem sempre foi assim. Para comprová-lo, basta visitar o site da Fundação Perseu Abramo, ligada ao partido, que guarda uma longa série da revista Teoria e Debate. Entre os anos finais da década de 1980 e o início da década seguinte, intelectuais e dirigentes partidários discutiram as causas e possíveis consequências do fim do socialismo real com honestidade intelectual, sem medo do dissenso. Nas páginas da revista, não faltam críticas à “experiência socialista” na União Soviética e na China.
Ao nascer, em 1980, o PT introduziu uma nota dissonante e promissora no campo da esquerda brasileira. Tomou distância das pátrias-mães do socialismo real e ganhou maior autonomia de pensamento. Partiu em busca de um socialismo novo, que incorporasse a democracia e desse lugar a cooperativas e pequenas e médias propriedades privadas. A procura pelo novo tropeçou em muitos obstáculos. O partido não queria abdicar do socialismo e rejeitava assumir uma identidade social-democrata, por não aceitar reformas liberais que a social-democracia europeia passava a incorporar em sua agenda. Dilema difícil para um partido de esquerda, ainda em construção: como atualizar-se sem perder a identidade? O PT o resolveu apenas parcialmente. De todo modo, apesar do inconcluso debate sobre o socialismo, o partido abraçou a democracia representativa e ajudou a reerguê-la no Brasil em bases sociais e políticas mais inclusivas.
O dilema mal resolvido, porém, não desapareceu. Ressurgiu com uma visível atração pelo capitalismo de Estado na China e simpática ambivalência pela Rússia de Putin, países onde a democracia e os direitos humanos não têm vez. Detalhe menor diante do que realmente importaria: a contraposição ao imperialismo americano, a mesma justificativa para apoiar ditaduras amigas na América Latina.
Salta aos olhos a esquizofrenia entre o que o partido prega e pratica no Brasil e as posições que defende no âmbito internacional. Aqui, a força das instituições democráticas, em geral, e a lógica eleitoral, em particular, levaram o PT a moderar sua agenda. O partido abandonou na prática qualquer aspiração socialista, como ocorreu com todos os partidos social-democratas europeus, mas sem levar às últimas consequências a incorporação da democracia como valor universal. Interrompido o debate interno, velhas ideias autoritárias encontraram seu lugar na face externa do partido.
Fosse o PT irrelevante, a esquizofrenia seria um assunto interno do partido. Não sendo, o tema é de interesse nacional, sobretudo quando o partido tem a Presidência da República e influência na política externa do País. Esta deve ser realista, mas não pode ser antagônica aos princípios e valores que defendemos como nação democrática.
O PSDB MORREU E AINDA NÃO SABE, por Josias de Souza, no UOL
A morte de um partido político é todo um lento, suave, pachorrento processo. Começa antes, muito antes. No caso do PSDB, a morte é anterior a si mesma. A legenda começou a fenecer há coisa de duas décadas, quando renegou FHC. Tentou retirá-lo do armário um par de vezes. Mas era tarde.
Em franco processo de decomposição, o tucanato tem dificuldades para recrutar candidatos a prefeito. Em São Paulo, uma revoada de vereadores dá à sangria do ninho uma aparência de hemorragia. O partido pode ficar sem nenhum representante na Câmara municipal.
Na Câmara federal, restam ao PSDB 12 cadeiras. No Senado, o senador Plínio Valério, em voo solo, rala para manter a unidade da bancada durante as votações. Tem dificuldades para convencer a si mesmo na hora da orientação de voto
Ninguém diz em voz alta, talvez por pena. Mas o PSDB já morreu e não sabe. Ao implodir a centro-direita em 2018, Bolsonaro tomou o lugar que o PSDB ocupava há um quarto de século na polarização com o PT. O capitão empurrou o tucanato para a cova.
No buraco, o PSDB chegou a 2022 sem candidato ao Planalto. João Doria desistiu. Eduardo Leite não resistiu. Houve mais e pior: o PSDB perdeu a disputa pelo governo de São Paulo, interrompendo uma hegemonia de 28 anos.
Egresso do DEM, o tucano postiço Rodrigo Garcia foi gongado pelo eleitor já no primeiro turno. O bolsonarista Tarcísio de Freitas jogou terra em cima do ninho
Ironicamente, Geraldo Alckmin tornou-se o símbolo da decomposição do PSDB. Governou São Paulo em nome do partido por quatro mandatos. Pretendia concorrer novamente. Mas foi escanteado por Doria, um afilhado político que preferiu o fiasco Garcia ao ex-padrinho.
Doria voltou para suas empresas. Garcia desceu ao ostracismo. Alckmin aninhou-se no PSB e na campanha presidencial de Lula. Eleito vice-presidente da República na chapa do antigo arquirrival, Alckmin acomodou uma lápide sobre o tucanato
Se a demora do PSDB em se dar conta da própria morte serve para alguma coisa é para demonstrar que o partido, suprema desgraça, não foi para o céu. O atestado de óbito do PSDB já foi expedido. Preencheu o formulário uma legista insuspeita. Chama-se Evidência. No espaço reservado à causa mortis, ela escreveu: “Suicídio”
Só em Gaspar para uma “topiqueira” e um comissionado serem homenageados dando nomes a estabelecimentos de ensino.
Já a dona Mimi…
MAL CORRIGINDO, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo
A ministra Nísia Trindade não está apenas submetida a uma lenta fritura. É pior. Foi jogada numa fogueira alimentada por inimigos, os suspeitos de sempre e pretensos companheiros. Uma maldade sem tamanho contra uma pessoa do bem, atirada numa missão que exigia outros atributos além de ser uma técnica de respeito.
O orçamento do Ministério da Saúde para este ano é de R$ 218 bilhões, o segundo maior da Esplanada e quase R$ 50 bi acima das despesas de 2023. As funções são certamente as mais difíceis do governo.
Na parte técnica, digamos, vão desde distribuir remédios de graça em farmácias até planejar e investir em pesquisas de alta complexidade; comprar e aplicar vacinas; prevenir desastres anunciados, como a epidemia de dengue; selecionar e adquirir medicamentos; administrar hospitais complexos; levar medicamentos e tratar dos ianomâmis; manter os programas de tratamento de aids; financiar e apoiar ações de prefeituras e governos estaduais.
Nessa parte administrativa, o ministério tem como interlocutores: a grande indústria farmacêutica; fabricantes e importadores de equipamentos e insumos; governadores, prefeitos, secretários da Saúde, médicos, enfermeiros, pessoal de apoio; o INSS; a indústria de planos e seguradoras.
Tem mais, mas fiquemos por aqui. Claro que, em parte, são negociações administrativas, mas está na cara que tem muita política aí, no atacado e no varejo.
No atacado: a distribuição de recursos para outros ministérios, governos estaduais e prefeituras. Quem recebe antes, considerando um ambiente político polarizado? Um estado governado pela oposição pode precisar mais que a administração de companheiros. Que programas precisam de mais apoio? Gastar mais com a dengue hoje ou com os ianomâmis?
No varejo: negociar com deputados e senadores a distribuição das emendas, dinheiro do Orçamento federal cujo destino é indicado pelos parlamentares, mas passa pelo crivo do ministério. De novo, um deputado do PT vale mais que um do PL, independentemente da finalidade do recurso?
Tem mais: a relação com as diversas entidades da sociedade civil ligadas à saúde, incluindo questões como aborto e liberação de drogas.
Finalmente, a nomeação das equipes: há necessariamente critérios técnicos, mas claro que os militantes dos diversos partidos, que também ganharam a eleição, têm indicações a fazer. A começar pelo presidente Lula e sua turma mais próxima.
Vai daí que a ministra Nísia Trindade precisaria combinar enorme capacidade de gerência técnico-administrativa — gente! É mais difícil do que administrar uma grande estatal — com experiência e habilidade político-partidária. E precisaria contar com apoio irrestrito do governo e dos partidos que o integram — o que certamente não é o caso.
Vamos falar francamente: não está funcionando. Tem problema em todas as áreas. É uma administração que reage atrasada. Declarou-se agora emergência nos hospitais federais do Rio. Depois de 15 meses de governo, todo mundo sabendo que a situação era caótica? Só lembrando: a emergência para os ianomâmis foi declarada em janeiro do ano passado.
O ministério está em desmonte. Troca-se um secretário aqui, outro ali, sobe um diretor, mudanças bruscas. A menos culpada nisso tudo é Nísia Trindade. Na verdade, tornou-se vítima de ataques ora sutis, ora ostensivos. A responsabilidade maior neste momento é do presidente Lula. Reclama ostensivamente da ministra — como é de seu estilo —, mas não oferece saídas. A culpa é dos outros.
E quem colocar? Entregar tal ministério para o Centrão seria capitular à pior política. Então? Uma dica, um exemplo: o melhor ministro da Saúde das últimas décadas foi José Serra, político e gestor.
O desgaste se arrasta. Lula tem dificuldade em reconhecer erros, especialmente quando cometidos com amigos. Caso da tentativa de mudar a abordagem em relação à Venezuela, mas sem admitir que nesse tempo Lula apoiou ostensivamente uma ditadura. E que Maduro continua sendo ditador.
Com pesquisas ruins, o governo Lula parece estar em algumas manobras de correção. Atrasadas e insuficientes.
A RUA DA ESQUERDA ESTÁ DESERTA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
A esquerda brasileira “morreu como esquerda”, e a extrema direita é hoje a única força política real no Brasil. Esse diagnóstico, feito por um dos principais intelectuais de esquerda, o professor da USP Vladimir Safatle, tem produzido um animado debate entre seus pares. Não faltaram reflexões sobre a tese do falecimento, por si só polêmica, nem sobre as razões para a falta de norte da esquerda, os caminhos para superá-la e até embates delirantes sobre a recusa a “gerir a crise do capitalismo” – sim, houve quem sugerisse que a esquerda morreu porque se limitou a conviver com o capitalismo, como se a alternativa a isso pudesse ser muito diferente das ditaduras como a Rússia de Putin ou a Venezuela de Maduro, para citar dois tiranos que contam com a admiração embevecida da esquerda e o beneplácito do presidente Lula da Silva.
Caso se leve realmente a sério, contudo, a esquerda tem mais um rico objeto de análise para discutir seu passamento ou sua desorientação: o notável esvaziamento das manifestações convocadas em todo o Brasil no último dia 23 de março.
Foram constrangedoras as cenas produzidas nos atos convocados pela frente que abriga PT, PCdoB, PSOL, sindicatos e movimentos sociais. Entre as 22 cidades programadas para abrigar manifestações, Salvador teve a maior mobilização, reunindo modestas 1,7 mil pessoas, segundo cálculo do grupo de pesquisa da USP, especializado em medições dessa natureza. No Largo São Francisco, em São Paulo, viu-se um público estimado em até 1.300 pessoas. Houve capitais com algumas poucas centenas de pessoas, e isso no pico da manifestação. A palidez dos atos foi reafirmada pela ausência das maiores lideranças da esquerda – não compareceram a nenhuma manifestação nem o presidente Lula da Silva nem governadores, parlamentares ou ministros relevantes.
Era um fracasso anunciado desde que a frente mais extremista da esquerda arquitetou os atos como resposta à multitudinária manifestação recentemente promovida pelo bolsonarismo na Paulista. Neste caso, a derrota da esquerda não se deu somente nos números – foi também conceitual. Enquanto os bolsonaristas tinham uma agenda enxuta e bem definida – a defesa de Bolsonaro e dos golpistas –, os atos do PT e de seus satélites foram marcados pela dispersão de propósitos. Havia de tudo no receituário lulopetista, da defesa da “prisão de Bolsonaro” à “ditadura nunca mais”, em memória dos 60 anos do golpe militar; do discurso cínico “contra o genocídio na Palestina” a uma difusa “defesa da democracia” – totalmente seletiva, é claro.
Não se trata de um fracasso pontual. É de um tempo distante o protagonismo da esquerda na ocupação das ruas. Sua liderança existiu enquanto sindicatos formavam a espinha dorsal dos movimentos sociais que empurraram a pauta da democracia, a partir do fim da década de 1970, e os protestos contra Fernando Collor, nos anos 1990. Essa força se diluiu quando os sindicatos perderam musculatura pela incapacidade de atualização de suas pautas e pelo fim das benesses financeiras que eram geradas pelo imposto sindical. O PT também exibiu força enquanto se protegeu sob o manto da virtude oposicionista, um messianismo desmoralizado após os ruidosos casos de corrupção dos mandatos de Lula e Dilma Rousseff. Para completar, as Jornadas de Junho de 2013 e o “Fora, Dilma”, em 2015 e 2016, mostraram que as ruas não tinham mais dono a partir dali.
Pesaram para isso também a captura do campo progressista pela pauta identitária, agenda que hoje mais afasta do que atrai progressistas moderados, além das próprias contradições petistas: o envelhecimento do seu ideário, a incapacidade de perceber que as clivagens na sociedade não permitem mais tentar se mostrar como o único representante dos interesses nacionais e a escandalosa associação petista com ditadores. Enquanto achar que sua pauta se confunde com o petismo e planejar seus atos com base do bolsonarismo, a esquerda seguirá produzindo vexames como o que se viu no vazio de março. A ausência nas ruas é um dos sintomas da ausência de boas ideias.
A RÚSSIA DE CADA UM, por Demétrio Magnoli, no jornal Folha de S. Paulo
Visitei a Rússia em 2017. Num centro comercial de São Petersburgo, à procura de uma informação, indaguei de uma jovem, cabelo pintado de azul, se ela falava inglês. “Sim, claro. Todo mundo nessa cidade fala inglês e francês”. Na Rússia, quase todos só entendem o russo –mas a nação moderna da garota e seu círculo cosmopolita de amigos é tão real quanto a “Rússia eterna” que a envolve. Pondé equivoca-se ao enxergar a Rússia como um monólito adornado pela face de Putin (shorturl.at/yM237).
Seu argumento central apoia-se na recusa histórica da Rússia em tornar-se um país europeu. De fato, porém, ao longo de séculos, a elite russa oscilou entre tal recusa e um desejo intenso de ser Europa. São Petersburgo nasceu da pulsão europeísta, assim como a densa teia de uniões dinásticas entre os governantes russos e seu pares europeus.
A pulsão oposta, expressa pela aliança entre o trono dos czares e a igreja ortodoxa, desdobrou-se no pan-eslavismo e em incessantes guerras de conquista. O próprio Putin foi europeísta, no início, até girar rumo ao nacionalismo grão-russo.
Cada um tem a Rússia que quer. Comentando sua entrevista-propaganda com Putin, Tucker Carlson, arauto da extrema direita americana, comparou a limpeza do metrô de Moscou, com suas estações imponentes em estilo art-nouveau ou realismo socialista, à sujeira e aos grafites do metrô de Nova York. Decifrada a senha racial (o incômodo de Carlson é com o Harlem e o Bronx), registre-se: a Rússia dele é o país branco, cristão, tradicional que, tão diferente dos EUA, já quase não encontra paralelos na Europa.
A Rússia de um PT embevecido pelo “feito histórico” da reeleição de Putin com 87% dos votos é outra: a potência nuclear que faz contraponto ao “imperialismo americano”. Na Europa, o século 20 ensinou à esquerda o valor da democracia e de uma ordem internacional baseada em regras. Na América Latina, porém, predomina ainda uma esquerda presa à caverna do terceiro-mundismo e à figura mítica de Che Guevara. A Rússia da esquerda fossilizada ressurge na guerra imperial na Ucrânia. Para ela, Putin é uma espécie de Lênin reciclado.
Faz-se gato e sapato do conceito de representação. O militante identitário quer um Congresso “mais representativo” pela introdução de cotas raciais no sistema eleitoral, “corrigindo” a vontade do eleitorado. Talvez inspirado pelo PT, Pondé sugere que Putin representa os russos pois “ganhou a eleição com folga”. Maduro também ganhará, se vetar todos os opositores genuínos, perpetuando-se no palácio via eleições farsescas, como tantos ditadores.
No dia da vitória “com folga”, a organização de Navalni convocou o protesto silencioso possível: votar no mesmo horário, anulando as cédulas com frases de protesto. As longas filas do “meio-dia contra Putin”, registradas nas grandes cidades, provam que, abaixo da superfície congelada, a oposição existe. A “Rússia verdadeira” não é uma projeção da imagem de Putin – nem tem as feições de Navalni. A “alma profunda” das nações é só um mito invocado por ideólogos e embusteiros.
A praça Vermelha, umbigo de Moscou, delimita-se ao norte pela catedral de Basílio e a leste pelas muralhas do Kremlin, dois símbolos da “Rússia eterna” refletidos na águia bifronte da bandeira imperial. Distante três quilômetros, às margens do rio, situa-se a nova Galeria Tretyakov. Nela, descortinam-se as obras da vanguarda russa do início do século 20, a vertente mais radical do modernismo europeu, que terminou se esterilizando no realismo socialista. Lá, avistei uma jovem russa de cabelo azul admirando o modelo da Torre Tatlin. A Rússia não é um monólito sempre igual a si mesmo.
Cada um tem a sua própria Rússia, nenhuma delas menos verdadeira que a outra. A Rússia de cada um esclarece bem pouco sobre a Rússia –mas diz tudo sobre o sujeito que a inventa.
A QUEM INTERESSA? por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo
Assim, como não quer nada, o ministro Gilmar Mendes levou a julgamento pelo plenário virtual do Supremo, em plena Sexta-Feira Santa, uma questão deveras complexa sobre foro privilegiado. Por que agora? Por que no meio do feriadão? Por que no plenário virtual? Há quem tenha ficado com a pulga atrás da orelha: será que é para garantir que os inquéritos de Jair Bolsonaro sejam mantidos no STF, evitando recursos em sentido contrário? É uma dúvida.
Em 2018, o Supremo decidiu que o foro seria mantido para crimes praticados durante o exercício da função pública e relacionados a essa função, mas só enquanto o deputado, senador, ministro ou presidente da República, no caso dos que têm foro no Supremo, mantivessem o cargo. Depois, o processo cairia para a primeira instância.
Na prática, um deputado suspeito ou acusado por crime cometido enquanto detinha o mandato na Câmara, em 2020, por hipótese, só pode ser investigado pelo Supremo se foi reeleito em 2022. Caso tenha sido derrotado ou eleito para cargo ou função distinta, ele perde o foro e cai para outras instâncias.
O que Gilmar Mendes levou ao plenário virtual foi uma mudança significativa: mesmo saindo da função onde teria cometido o crime, a autoridade carrega consigo o foro. Em outras palavras: em vez de privilegiar a função atual do investigado, como está, a intenção é passar a focar no cargo ou função onde esse crime tenha sido cometido.
Vamos a Bolsonaro. Depois de perder a reeleição em 2022, ele perdeu automaticamente o foro no Supremo. Dependendo do resultado do pedido de Gilmar Mendes, ele recupera o foro e seus advogados não terão como, ou terão muito mais dificuldade, para tentar tirar seus processos da Corte – e, principalmente, das garras do relator, Alexandre de Moraes, inimigo número 1 da família Bolsonaro.
Outra hipótese para essa tentativa do ministro do STF de “recalibrar os contornos” do foro é a de sanar uma dúvida quanto ao deputado Chiquinho Brazão, preso sob suspeita de ser mandante do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes.
Quando o crime foi cometido, ele era vereador e não tinha foro no Supremo. E agora? Uma linha da mudança em julgamento pode ser a de devolver o foro para quem tem mandato, mas não cometeu o crime no cargo.
Tudo junto e misturado, é importante acompanhar bem, com muita atenção, essa mudança no foro privilegiado que está novamente em discussão no Supremo, até 8 de abril. Com uma lembrança importante: depois da redução de foro, há seis anos, as ações contra parlamentares no Supremo caíram 80%.
SUPREMO “A LA CARTE”, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a se debruçar sobre o foro especial por prerrogativa de função, o chamado “foro privilegiado”, apenas seis anos depois de ter fixado uma tese sobre o tema. Longe de ser um ponto fora da curva, a questão do foro é apenas a mais recente de uma série de revisões de jurisprudência em curtíssimo prazo que reforçam a percepção, amplamente difundida na sociedade, de que a mais alta instância do Poder Judiciário seria não só suscetível às mudanças de vento na política, como também casuística. Nessa toada, não há confiança na Justiça que resista.
No caso concreto, como mostrou o Estadão, os ministros julgarão um habeas corpus impetrado pelo senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), que contesta a competência da Justiça de primeiro grau do Distrito Federal para julgá-lo pela suposta prática de “rachadinha”, entre 2007 e 2015. Marinho argumenta que, por ter exercido cargos com foro por prerrogativa de função durante todo esse tempo, os crimes dos quais é acusado devem ser julgados pelo STF, não pela primeira instância. Foi a senha para que a Corte, com quatro novos membros – Nunes Marques, André Mendonça, Cristiano Zanin e Flávio Dino –, volte a tratar do assunto.
Não é nada improvável que, no julgamento desse habeas corpus, relatado pelo ministro Gilmar Mendes, a nova composição da Corte fixe novo entendimento sobre o alcance do “foro privilegiado”. Em 2018, vale lembrar, o STF decidiu que apenas os crimes cometidos por certas autoridades durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo poderiam ser julgados pela Corte. Ao fim do mandato, os processos deveriam ser remetidos à instância competente. Mas, como ficou notório nesses últimos seis anos, os próprios ministros deram de ombros para essa orientação, o que, na prática, revela que a questão não está pacificada como deveria.
Para citar apenas casos recentíssimos, o STF já expediu mandados de busca e apreensão contra um cidadão que se envolveu numa altercação em Roma com o ministro Alexandre de Moraes. Já julgou um sem-teto, ao final absolvido, que fora acusado de crimes relacionados ao 8 de Janeiro. Sob o manto opaco dos inquéritos intermináveis das fake news e das “milícias digitais”, o STF tem se arvorado em juízo universal da defesa da democracia, lidando com réus ou investigados que jamais deveriam estar submetidos à Corte Constitucional. O caso Marielle Franco é outro que suscita a competência do STF como foro criminal.
Procedendo dessa maneira, a Corte a um só tempo maltrata a Constituição e desprestigia todo o Poder Judiciário, como se não houvesse juízas e juízes anônimos Brasil afora com capacidade para julgar esses crimes, em especial os cometidos contra o Estado Democrático de Direito.
Outros temas de grande relevância para o País têm sido tratados com pouco cuidado – é forçoso dizer – pelo Supremo. Tome-se, por exemplo, a questão da execução da pena após condenação em segunda instância. Ao fim e ao cabo, trata-se de discussão sobre um princípio fundamental consagrado pela Constituição – a presunção de inocência. Não haveria de ser tão controvertido. No entanto, num curto intervalo de tempo, o STF já manifestou posições diametralmente opostas sobre essa questão. Neste momento, e sabe-se lá até quando, prevalece o entendimento, totalmente equivocado, de que um condenado só pode ser preso após o trânsito em julgado da sentença penal, ou seja, esgotadas todas as suas possibilidades recursais.
A volatilidade da jurisprudência, quase um oximoro, é péssima não só para o próprio Supremo, mas para a credibilidade do Poder Judiciário como um todo. Nunca será demais lembrar que cada cidadão tem de respeitar a Justiça. Mas esta, por sua vez, também tem de respeitar cada um dos jurisdicionados. E um cenário de incerteza jurídica é, fundamentalmente, um quadro de desrespeito à sociedade.
Nesse sentido, não surpreende por que tantos cidadãos concordem com a ideia segundo a qual não haveria um único STF, vale dizer, uma única instituição colegiada e previsível, mas sim “onze ilhas” que mudam seus entendimentos de acordo com conveniências do momento.
AS PISTAS DE MARIELLE, por Malu Gaspar, em O Globo
Se não há dúvida de que a prisão dos mandantes do assassinato de Marielle Franco escancarou a contaminação do aparato estatal no Rio de Janeiro pelo crime organizado, também é verdade que só o crime ter sido solucionado já é um fato totalmente atípico.
Levantamento do GLOBO no ano passado a partir de dados públicos, registros jornalísticos e de centros de pesquisa mostra que o crime organizado é suspeito de ter executado 43 políticos no Rio nos últimos 20 anos. Noutro trabalho publicado na mesma época, a cientista política Mariana Carvalho, da Universidade Brown, cruzou dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com os do Datasus e concluiu que o Rio é o local onde mais se matam políticos no Brasil: 2,6 mortes por grupo de mil políticos.
Seja qual for o indicador, a conclusão é a mesma: no estado que mais mata políticos no Brasil, quase nunca se descobre quem matou e quem mandou matar. Por isso tanta gente alimenta a esperança de que o caso Marielle venha a ser um marco de mudança.
Mas há também grandes chances de Marielle ser apenas a exceção que confirma a regra, um daqueles crimes de grande repercussão em que se empenham os melhores esforços na investigação, se elege um inimigo público número um — como os irmãos Brazão — e se entregam cabeças apenas para que tudo continue funcionando como dantes.
A cabeça agora é o ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa, que o matador Ronnie Lessa diz ter arquitetado o crime e que estava “na mão” dos irmãos Brazão. A fama de Rivaldo já era conhecida, a ponto de a Polícia Federal (PF) avisar ao comando da intervenção federal sobre a segurança do Rio em 2018 que não o nomeasse para o cargo.
Quem conhece bem o cenário fluminense sabe que Rivaldo é apenas um na engrenagem azeitada pelo dinheiro do tráfico, da milícia, da contravenção e de outras empreitadas criminosas que alimentam a corrupção policial — negócio extremamente lucrativo, que em última instância resulta numa das menores taxas de solução de homicídios do país.
Por mais complexo que seja o cenário, porém, não é preciso ir longe para vislumbrar formas de virar a chave. A própria história do caso Marielle já traz algumas pistas. Tudo caminhava para que as mortes de Marielle e Anderson engordassem a estatística de crimes sem solução quando as promotoras Simone Sibilio e Letícia Emile começaram a desarquivar investigações sobre outros assassinatos suspeitos de ligação com o Escritório do Crime.
De repente, brotou na Polícia Civil uma denúncia anônima de que o atirador que puxara o gatilho era Lessa. As promotoras cutucaram um nervo exposto da corrupção policial no Rio, a Delegacia de Homicídios.
De lá para cá houve diversas reviravoltas. Quem acabou concluindo a investigação foi a PF, mas ninguém discorda do papel fundamental que as duas tiveram ao simplesmente cumprir a função do Ministério Público de fiscalizar o trabalho das polícias.
No Rio, esse trabalho ocorre de forma bissexta, sem recursos básicos, como acesso completo aos dados do sistema de inteligência onde se pode ver que crimes estão sem solução, em que regiões e há quanto tempo.
Para completar o quadro, em 2021 o procurador-geral do estado, Luciano Mattos, nomeado por Cláudio Castro (PL) com o apoio da família Bolsonaro, extinguiu o Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp), que fazia o controle das polícias.
Mattos foi reconduzido em 2023, mesmo tendo sido derrotado na eleição interna do MP — isso levou todos os 26 promotores do sobrevivente Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) a pedir exoneração, incluindo Simone e Letícia.
O meticuloso trabalho para evitar o controle da polícia fluminense não ficou restrito ao âmbito estadual. Quando o superintendente da Polícia Federal no Rio, Leandro Almada, foi indicado para o cargo, já com a missão de elucidar a morte de Marielle, o governador e aliados do próprio PT fizeram pressão sobre o Palácio do Planalto para barrar a nomeação.
Por essa mesma chefia da PF no Rio, aliás, Jair Bolsonaro é acusado de ter criado a crise que levou à saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça.
“Você tem 27 superintendências, eu quero apenas uma”, disse o ex-presidente, segundo o próprio Moro.
A cronologia do caso Marielle deixa claríssima a relação entre a metástase do crime organizado no Rio e o esforço do sistema político em dificultar o controle da ação policial.
Por isso, qualquer que seja a fórmula de começar a mudar esse quadro, será preciso que algumas cabeças sejam entregues, para que o controle comece a ocorrer. E não serão as cabeças de Ronnie Lessa ou de Rivaldo Barbosa.
INVERTEVENCIONISMO DE LULA AFUGENTA INVESTIDORES, editorial de O Globo
O Brasil já paga o preço das investidas do governo federal sobre Petrobras, Vale e outras empresas. Declarações e atitudes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm levado investidores estrangeiros a abandonar o mercado de capitais brasileiro, onde é predominante a transação de empresas como Vale ou Petrobras. Desde o início do ano, eles já sacaram mais de R$ 22 bilhões da B3, maior volume para o período desde 2020. Nesta semana, um dos maiores bancos americanos recomendou em relatório a venda de ações de estatais brasileiras.
É verdade que a debandada está ligada à dinâmica da economia global. Os juros ainda altos nos Estados Unidos atraem capital para o país, enquanto as dúvidas sobre o crescimento da China espalham incerteza sobre a demanda por commodities, afetando as previsões para países como o Brasil. No caso brasileiro, porém, o movimento também sofre a influência de um anabolizante: o intervencionismo do governo. A recomendação do banco americano é justificada pelo aumento dos riscos associados a ele. Há temor de efeitos negativos na gestão das companhias.
Não se trata de fantasia. No início de março, a Petrobras informou que não pagaria dividendos extraordinários aos acionistas, política adotada desde 2021. O presidente da petroleira, Jean Paul Prates, era favorável a pagar 50% do resultado extraordinário. Não demorou para que a ideia fosse derrubada no conselho da Petrobras, com as digitais de Lula. Ainda pior foi a tentativa de justificar a mudança. Em entrevista, Lula comparou o mercado a um dinossauro voraz. Para os investidores, ficou evidente que o ímpeto intervencionista não ficaria ali. Em um dia, a Petrobras desvalorizou-se em R$ 55 bilhões. Devido à desconfiança dos investidores, ela sempre foi cotada abaixo das maiores petrolíferas. Nos últimos tempos, esse desconto aumentou da média entre 30% e 34% para 44%.
O presidente já causara espanto no ano passado, quando tentou impor o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale, uma empresa privada. Mesmo depois de abandonar a ideia, Lula continuou tentando interferir na sucessão da mineradora, extrapolando suas atribuições.
Diante dos desmandos em governos anteriores, em particular petistas, o país criou “remédios” para evitar intromissões indevidas do governo no setor produtivo. Um deles foi a Lei das Estatais, com requisitos técnicos para a indicação a cargos de comando. O atual governo vem, contudo, tentando corroer esses mecanismos.
Mesmo os investimentos diretos no setor produtivo, cuja reação costuma ser mais lenta, já sofrem com a desconfiança que a gestão petista inspira no mercado externo. Em 2023, somaram US$ 62 bilhões (ou 2,85% do PIB), ante US$ 74,6 bilhões (3,82% do PIB) em 2022. Tais sinais deveriam fazer soar o alarme no governo.
A taxa de investimento brasileira, de 16,5% em 2023, ainda é baixíssima para a necessidade do país, em torno de 25%. Não haverá como elevá-la sem capital privado. Por isso, em contraste com o que diz Lula, a comparação mais apropriada para o mercado de capitais não é um dinossauro, mas o adubo. Ao comprar ações de empresas brasileiras ou apostar recursos no país, os investidores dão um voto de confiança e ampliam a chance de crescimento. Decisões políticas erradas e declarações infelizes elevam a volatilidade, destroem valor e corroem esse otimismo.
O APRODECIMENTO DO ESTADO, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Desvendada a trama do assassinato de Marielle Franco, resulta que nela não havia um só bandido desorganizado, daqueles que assaltam, roubam casas ou celulares. Um era chefe da Polícia Civil do Rio; outro, conselheiro do Tribunal de Contas; seu irmão, deputado federal; o pistoleiro e seu motorista, ex-PMs. Essa casta não rouba carros, alguns usam veículos oficiais.
Pior: Marielle foi assassinada porque atrapalhava os negócios de grilagem de terras e as milícias dos irmãos Brazão. Novamente, os bandidos que mataram Marielle relacionavam-se com o crime que age nas frestas da ausência do Estado, quer na barafunda fundiária, quer na exploração da falta de segurança pública.
Se existisse um sindicato do crime desorganizado, ele protestaria diante da concorrência desleal praticada pelos doutores e pelos policiais. Esse mesmo sindicato defenderia a classe contra a expansão de suas atividades criminosas.
Se tudo isso fosse pouco, Marielle foi executada três semanas depois da presepada da intervenção militar na segurança do Rio, e o crime foi planejado pelo chefe da Polícia Civil do Rio, nomeado pelos generais que poriam ordem na casa.
Inicialmente, pensou-se que o atentado era uma resposta dos criminosos convencionais demarcando o domínio do território. (O signatário caiu nessa.) Ilusão democrática. Não havia bandidos avulsos no lance. Só bandidos articulados no aparelho estatal. Gente que defende seu mercado estimulando a repressão aos PPPPs (pretos, pardos e pobres da periferia). Nela, as polícias matam pelo país afora, dizendo que são “suspeitos”.
Faz tempo, o assaltante Lúcio Flávio Vilar Lírio enunciou sua lei:
— Polícia é polícia, bandido é bandido.
Ela nunca foi respeitada, mas a morte de Marielle mostrou que o apodrecimento do Estado foi além. Ao longo de seis anos, a engrenagem da segurança pública foi sabotada para proteger os criminosos.
Foi a entrada da Polícia Federal no caso que interrompeu a putrefação. Vale lembrar que um policial federal alertou os generais sobre a periculosidade do delegado colocado à frente da polícia do Rio. Não foi ouvido. Naqueles dias, um general foi a um quartel da PM, e a tropa não lhe deu imediata continência. Não desconfiaram de nada. Achava-se que muita coisa se resolveria se fosse criado o instituto das autorizações para invasão de domicílios a partir da suspeita contra ruas. Pura demofobia.
De forma esparsa, a metástase do Estado fluminense repete-se em muitos outros. Até hoje, a reação do poder público tem oscilado entre a benevolência e as presepadas.
A crise da segurança pública não será resolvida por balas de prata, mas a Polícia Federal está aí, mostrando que, bem ou mal, resolve alguns casos que lhe chegam.
No início do século XX, os Estados Unidos tinham crime organizado, polícia corrupta e Justiça venal. Criado o Federal Bureau of Investigation, o jogo virou. Seu diretor era um sujeito detestável, mas criou o FBI.
É palpite, mas se a execução de Marielle tivesse capitulado um crime federal, a quadrilha que planejou e executou o crime não teria o atrevimento de embaçar a investigação por seis anos. O respeito à autonomia constitucional dos estados serviu apenas para proteger bandidos encastelados no aparelho do Estado.
Como funciona algo que se conhece bem por aqui
PODER, VIOLÊNCIA E VIOLÊNCIA CRIARAM NO RIO O “SISTEMA PRÉ-PAGO”, por Bruno Boghossian, no jornal Folha de S. Paulo
Os negócios das milícias do Rio se sustentam num tripé formado por poder, violência e corrupção. O caso Marielle Franco e o exemplo da família Brazão mostram como o loteamento da máquina pública, o assassinato de desafetos e a cooptação de órgãos de segurança se tornaram moedas correntes nessas atividades.
Os milicianos se incorporaram à paisagem política do estado. O domínio de territórios populosos permitiu que os criminosos exercessem uma espécie de monopólio eleitoral nessas regiões e ganhassem acesso facilitado aos mandatos usados para ampliar sua influência.
Chiquinho Brazão soube aproveitar o cargo de vereador para cuidar de seus interesses. Na investigação sobre a morte de Marielle, a PF lembrou que o então vereador presidiu a Comissão de Assuntos Urbanos da Câmara do Rio e patrocinou projetos para facilitar a ocupação de terrenos invadidos e explorados pela família.
O clã espalhou tentáculos por órgãos de licenciamento e departamentos que deveriam fiscalizar aquelas regiões. Em seus gabinetes, abrigou sócios, operadores e capangas que entravam em cena quando o poder político não dava conta do negócio. Quem cedeu a arma usada para matar Marielle, segundo a PF, foi um policial militar lotado no gabinete de Domingos Brazão no Tribunal de Contas do Estado.
A proteção dos negócios dependia de um trato com as polícias, de acordo com as investigações. Ronnie Lessa, que confessou o assassinato de Marielle, afirmou que os Brazão acertaram o acobertamento do crime com o então chefe da Polícia Civil. Para o matador, um ajuste “pré-pago” sairia mais barato do que uma extorsão posterior.
O relatório da Polícia Federal repisa conhecidas suspeitas de que as quadrilhas pagam mesadas às delegacias do Rio, além de propinas pontuais para blindar integrantes desses grupos. O problema é que a investigação ainda não mostrou as provas desse sistema, o que seria essencial para desfazer a infiltração do aparelho do Estado pelos criminosos.
SOCORRO A ESTADOS É PRÊMIO PARA MÁ GESTÃO, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Pela enésima vez, os estados conseguirão renegociar suas dívidas com a União. Segundo o acordo preliminar negociado com o governo federal, a taxa de juros acima da inflação que incide sobre esse passivo pode baixar de 4% ao ano para até 2%, se os governos estaduais cumprirem metas de ampliação de vagas no ensino técnico.
Caso eles consigam abater o valor do principal da dívida, por meio da entrega de ativos como empresas estatais ao Tesouro, a taxa pode diminuir mais, de 0,5 a 1 ponto percentual. A taxa real de juros no país é de cerca de 6% anuais.
Há meses que entes federativos lançaram nova campanha a fim de não pagar o que devem. Fazem parecer que são espoliados, que não podem investir ou cuidar das necessidades da população por causa de pagamentos que seriam injustos, indevidos ou até ilegais.
Ameaçavam mais uma vez levar o tema à Justiça e tentavam obter novos favores do Congresso.
Tal dívida resulta de um grande socorro federal, negociado entre 1997 e 2000, que beneficiou em especial Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo. A União assumiu as compromissos dos estados, quebrados por endividamento e má gestão generalizada.
A taxa de juros do socorro era então caridosa para a época, de 6% ao ano. Em troca, as administrações foram impedidas de emitir títulos. A autorização para contrair dívidas por outros meios passou a depender de regras mais rígidas e de garantias federais.
O endividamento diminuiu, mas desde fins da primeira década do século os estados passaram a se queixar de que o socorro federal era insuficiente. Com apoio de administrações petistas, passaram a tomar mais empréstimos.
Criaram artimanhas para maquiar o gasto com pessoal e não fizeram reformas previdenciárias. Na grande onda de aumento de arrecadação que ocorreu até 2014, elevaram despesas permanentes.
Concederam favores a empresas, na guerra fiscal. Governo federal e Congresso relaxaram restrições de endividamento; a Justiça acolheu a ofensiva contra os passivos.
Com a crise iniciada em 2014, gestões mais perdulárias, como as de Rio, Minas e Rio Grande do Sul, tinham dificuldades para arcar com despesas —das comezinhas, como a troca de pneus de carros da polícia, ao salário de servidores.
A arenga funcionou. Houve reduções de taxas de juros ou perdões a partir de 2014 e um novo regime de recuperação fiscal para os falidos. Os estados mais bem geridos pagam também a conta.
A União —ou seja, o contribuinte brasileiro— perderá receitas, e sua dívida aumentará. Mais uma vez se passa a mensagem de que a má gestão será premiada
Agora, os ditos intelectuais e a esquerda do atraso que infesta as redações estão tentando lavar as mãos da culpa solidária que tem com o crime organizado, sempre sob a desculpa que a polícia é um bicho e o criminoso, que usa gente – pobre, na maioria dos casos e dependente, ou medrosa das quadrilhas – inocente como escudo, um perseguido. No Rio isso é exemplo. No norte e nordeste também. A bandidagem evolui que estamos num ponto que nem sabemos quem é o bandido, a polícia e o político. O Ministério Público e a Justiça então sendo emburalhadas no mesmo pacote. Meu Deus!
O CRIME REDUZ A DEMOCRACIA, por Míriam Leitão, em O Globo
É de democracia que se trata no caso da morte de Marielle Franco. Desde o começo. Os que mataram a vereadora, crime no qual morreu também o motorista Anderson Gomes, estavam atingindo um mandato, uma representante que se dedicava a uma agenda ampla de defesa dos moradores do Rio. A operação contra os suspeitos de serem mandantes joga luz sobre o risco democrático que se vive no Rio, pela promiscuidade entre o crime, a política e a polícia. Marielle era uma vereadora em início de primeiro mandato, sem conexões com o poder local, nascida em área de periferia, e mesmo assim, foi vista como um obstáculo à expropriação de terra pública, que seria grilada para depois, em muitos casos, ser o caminho para explorar os pobres sem casa.
O crime é de uma torpeza sem limites, e além disso, essa etapa que está sendo revelada dos irmãos Brazão mostra um pouco do que tem sido o Rio. Sempre se disse que organizações criminosas, traficantes e milicianos, dominam parte do território. Mas a realidade é ainda pior. Houve uma simbiose entre o crime e a estrutura do próprio Estado. Nesta etapa da investigação, o que a Polícia Federal apurou é que um deputado federal, Chiquinho Brazão, um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Domingos Brazão, exerciam suas funções públicas em defesa dos seus interesses criminosos. Não seriam apenas corrompidos pelo crime, seriam o próprio crime. Para fechar esse verdadeiro cerco à democracia, os indícios são de envolvimento do ex-chefe da Polícia Civil e ex-chefe da Delegacia de Homicídios, Rivaldo Barbosa. O investigador encobrindo o crime.
Por mais espantoso que pareça a atuação dos irmãos Brazão, já havia inúmeros indícios da vinculação deles com o crime, desde a CPI das Milícias. A procuradora- geral Raquel Dodge chegou a pedir a denúncia de Domingos Brazão. Os Brazão eram um caso de impunidade, mas não de surpresa. E por mais espantoso que pareça um deputado e um conselheiro contratando matadores de aluguel para executar uma vereadora, eles não são os únicos. Há mais deles exercendo mandatos ou cargos públicos.
A especulação imobiliária da milícia aproveita-se das falhas da política habitacional para os pobres. Muzema, só para citar um exemplo, favela recente na Zona Oeste, é uma área que foi toda “incorporada” pelos milicianos. Eles vendem, financiam, projetam, constroem os prédios. Os pobres do Rio, que pagam aluguéis caros em favelas como a Rocinha, juntam todas as suas economias para dar entradas nos “financiamentos” e vão morar em prédios que não têm qualquer segurança, podem cair por falha de engenharia, ou por algum deslizamento. E seu dinheiro pode simplesmente ser perdido caso os bandidos resolvam por alguma razão retomar o imóvel. É assim que funciona.
Portanto, quando o inquérito diz que os Brazão achavam que Marielle estava atrapalhando seus planos imobiliários, era isso: ela estava colocando o seu mandato contra as ambições espúrias de quem queria grilar terra pública e explorar os compradores. Marielle corretamente estava querendo as mesmas áreas para habitação popular. Era o exercício democrático do seu papel de vereadora. Pagou com a vida. Com o brutal assassinato eles quiseram demonstrar que qualquer um que atravesse seus interesses pode ter o mesmo fim.
O Mapa dos Grupos Armados do Rio — que foi lançado pelo Instituto Fogo Cruzado e Geni, da Universidade Federal Fluminense, em 2022 —mostrou que as milícias aumentaram 400% a área sob seu domínio nos últimos 16 anos. O do tráfico, no período, cresceu 131%. O crescimento da milícia foi mais acelerado a partir de 2018. E o Rio está há seis anos sem política de segurança.
Cecília Oliveira, do Instituto Fogo Cruzado, disse que muito poderia ter sido evitado se houvesse atenção ao relatório da CPI das Milícias.
—Foram listados lá vereadores, deputados, pessoas lotadas nas prefeituras, câmaras, secretarias do Estado e do município. O relatório é uma espécie de inventário do crime do estado, sobre o qual praticamente nada foi feito. Há dezenas de recomendações para o Ministério Público, governos do estado e federal. Todos sabem quem são, como e com a ajuda de quem eles trabalham — diz a especialista.
Que democracia é essa em que uma parlamentar é morta por exercer seu mandato e em que o crime ocupa o próprio Estado? Para além das mortes trágicas, esse crime ilumina também a perda de qualidade e de consistência da democracia brasileira.
RIO DE JOELHOS PARA O CRIME, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O País agora sabe, após uma angustiante espera de mais de seis anos, sobre quem, afinal, recai a gravíssima suspeita de ter ordenado a morte da vereadora carioca Marielle Franco e por qual motivo. O que foi anunciado oficialmente pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, na tarde do domingo passado, é simplesmente assustador. Revelou-se um Estado a serviço do crime organizado. Ou uma organização criminosa que sequestrou o Estado para a consecução de seus objetivos espúrios.
A Polícia Federal (PF), informou o ministro, concluiu que os “idealizadores” do crime foram o deputado federal Chiquinho Brazão (União-RJ) e seu irmão, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão. O “planejador”, ainda segundo a PF, foi o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil fluminense, ninguém menos que o principal responsável pela investigação do caso na esfera estadual – âmbito apropriado, em condições normais, para a condução do inquérito à luz da Constituição.
O deslinde do caso Marielle expôs o Rio como um Estado carcomido em sua estrutura por um consórcio delinquente formado por políticos de variadas afiliações, policiais civis e militares e, claro, milicianos. Tal é o grau de penetração desses criminosos no aparato estatal que, hoje, é impossível dissociar a política no Estado dos interesses econômicos das próprias organizações criminosas, que operam como uma verdadeira máfia. O que se viu, agora com contornos mais nítidos, é um Rio sequestrado por agentes públicos que deveriam zelar pelo bem da sociedade, e não traí-la.
O fato de uma parlamentar ter sido brutalmente assassinada em pleno exercício do mandato – em atentado que também matou seu motorista, Anderson Gomes, e feriu sua assessora, Fernanda Chaves – já era chocante por si só. Mas, como se isso não bastasse, ao longo das quase 500 páginas do relatório final da PF, desfiou-se uma teia criminosa que se espraiou por múltiplas esferas da política no Estado do Rio. Ao que tudo indica, Marielle e Anderson foram vítimas circunstanciais de um grupo político associado a policiais e milicianos que pretendia demonstrar, sem qualquer sutileza, que fim estaria reservado a todos os que ousassem atravessar seu caminho.
A PF foi clara ao afirmar que a elucidação da morte da vereadora Marielle Franco pode ser o ponto de partida para a conclusão de uma série de outras investigações sobre o submundo da política no Rio. Como muito bem destacou a pesquisadora Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança da FGV-RJ, é preciso “parar de dizer que o crime organizado é um poder paralelo” no Estado. De fato, a política fluminense, salvo honrosas e corajosas exceções, parece estar umbilicalmente ligada aos interesses das milícias, que, como se viu pelas investigações da PF, extrapolaram as fronteiras do Estado e já se fazem representar até mesmo no Congresso Nacional.
Nesse sentido, e até pelo histórico de suspeitas que já recaíam sobre os irmãos Brazão, não chega a ser surpreendente a implicação de ambos no caso Marielle. Já a participação direta do delegado Rivaldo Barbosa, como indica a PF, no “planejamento” da ação levada a cabo pelos executores Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, ao contrário, é um choque. Não só pela frieza de Barbosa, que chegou a consolar a família de Marielle poucas horas após seu assassinato, mas, principalmente, por se tratar, à época dos fatos, do principal servidor público com a missão de livrar a sociedade da mesma organização criminosa da qual ele ora é suspeito de pertencer.
A serem comprovados os indícios de autoria e materialidade apresentados contra ele pela PF, o delegado Rivaldo Barbosa teria colocado a Polícia Civil do Rio à disposição de milicianos, bicheiros e políticos dispostos a pagar caro por sua deliberada omissão funcional, deixando a sociedade fluminense à mercê de seus piores algozes. Caríssimo, portanto, deve ser o preço a ser pago agora por cada um desses traidores do múnus público.
BOAS E MÁS NOTÍCIAS, por Hélio Schwarstman, no jornal Folha de S. Paulo
A aparente elucidação do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes é uma excelente notícia. Espero que os investigadores tenham coletado provas robustas o bastante para que o julgamento dos suspeitos de ter encomendado a morte da vereadora se dê de forma técnica, rápida e certeira. O momento é de satisfação e deve ser celebrado. Não há como esconder, porém, que a boa nova chega embrulhada numa série de circunstâncias que pintam um quadro de deterioração da segurança pública muito pior do que se acreditava.
Se é verdade que o próprio chefe da Polícia Civil fluminense participou do planejamento do assassinato, então estamos diante de nada menos do que a falência do Estado. Se aqueles que deveriam zelar pela ordem pública são membros ativos do crime organizado, não há mais distinção entre polícia e bandido, entre lei e barbárie.
Habitantes de outros estados que não o Rio de Janeiro podemos tentar nos tranquilizar imaginando que nossa situação não é tão ruim. É verdade que o processo de milicianização das polícias avançou mais no Rio do que em outros lugares, mas a diferença é mais de grau do que de natureza. Em São Paulo, por exemplo, o governador e seu secretário da Segurança Pública parecem estar se esforçando para eliminar todos os vestígios de profissionalismo e respeito à lei.
O caso Marielle revela também que o braço político do crime organizado é mais longo do que se supunha. É muito preocupante que um dos suspeitos, que é deputado federal, tenha exercido posto de secretário municipal do Rio e outro seja conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Se a população normaliza através do voto candidatos ligados a milícias, é obrigação dos políticos que ainda não se deixaram contaminar erguer um cordão sanitário em torno dessas figuras, impedindo-as de exercer cargos de maior relevo. Deixar de fazê-lo é pregar mais uma tábua no caixão do Estado brasileiro.
Matutando bem. . .
Nada como um ex delegado de polícia para combater um PeTralha!
POLÍTICA E CRIME; ELO DE PADRÃO MEXICANO, por Diogo Schelp, no jornal O Estado de S. Paulo
Houve um tempo, no México, em que os cartéis das drogas lidavam com autoridades políticas, policiais ou judiciais de acordo com uma receita simples, que os criminosos chamavam de plata o plomo (“prata ou chumbo”, em espanhol).
Ou seja, políticos e agentes da lei podiam ser cooptados por meio do pagamento de propina (prata) ou intimidados e eliminados com o emprego da violência (chumbo). Há muitos anos, porém, os elos entre política e crime organizado no país evoluíram para um estágio mais complexo, em que interesses políticos se misturam com atividades criminosas, tornando impossível distinguir onde começa um e termina o outro, ou qual alimenta qual. É a política que está a serviço do crime ou o crime que serve à política?
O caso Marielle Franco sugere que o Brasil atingiu o padrão mexicano de elo entre política e crime organizado. Os suspeitos de ordenar ou encobrir o assassinato da vereadora do Rio de Janeiro, presos em operação da Polícia Federal neste domingo, incluem um deputado federal, Chiquinho Brazão, um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), Domingos Brazão, e um ex-chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa.
Os dois primeiros foram apontados como mandantes do crime pelo ex-PM e miliciano Ronnie Lessa, que confessou ter matado a vereadora e o seu motorista, Anderson Gomes, em 2018.
A motivação seria o fato de Marielle ter se tornado um obstáculo aos interesses de especulação imobiliária dos irmãos Brazão em uma área de influência das milícias na zona oeste do Rio. Chiquinho e Domingos têm uma longa trajetória política no Estado, que inclui mandatos na Câmara Municipal e na Assembleia Legislativa (Alerj), onde ainda mantêm influência, e possuem apadrinhados na prefeitura e no governo do Estado.
Já o delegado Rivaldo Barbosa foi preso pela suspeita de ter participado de uma trama para encobrir os culpados pelo assassinato. Justo ele, que chefiava o órgão policial inicialmente responsável pela investigação.
Guardadas as proporções, a suspeita sobre Barbosa lembra o caso do ex-chefe de combate ao narcotráfico no México, Genaro García Luna, que no ano passado foi condenado nos Estados Unidos por fazer exatamente o contrário do que seu cargo exigia: ele trabalhava para, não contra, os grupos criminosos.
Lá e aqui, frequentemente não é a política que está a serviço do crime ou o crime que serve à política. Ambos acabam se tornando uma coisa só.
REVISIONISMO SEM VERGONHA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O programa Especial 10 Anos da Lava Jato, levado ao ar recentemente pela TV Brasil, é um documento histórico. Não por reconstituir com imparcialidade a maior ação de combate à corrupção da história do Brasil, porque isso seria impossível numa TV pública convertida em emissora oficial do PT, mas justamente porque retrata com fidelidade a desfaçatez e a mendacidade do partido de Lula da Silva, ansioso por reescrever a história do período em que as entranhas corruptas do lulopetismo ficaram expostas para todo o País. E nesse revisionismo, diga-se a bem da verdade, o PT e Lula não estão sozinhos – têm a companhia de ministros do Supremo, de empresários corruptos ansiosos para limpar o nome e de políticos interessados em desmoralizar a luta contra a roubalheira.
A volta de Lula da Silva à Presidência certamente deu ânimo adicional aos petistas para distorcer os fatos. Afinal, o chefão petista – aquele que alhures disse que “o mensalão nunca existiu” – vive a alardear que a Lava Jato não passou de uma “conspiração” dos EUA para, por meio do então juiz federal Sérgio
Moro, tido por Lula como “capanga” dos norte-americanos, “destruir a indústria de óleo e gás deste país”. Nada menos.
Com uma hora e meia de duração, o tal programa da TV Brasil dedicou somente 1 minuto e 53 segundos à corrupção na Petrobras – e apenas para tratá-la como “pontual”, segundo um sindicalista entrevistado. O resto do tempo foi usado para desancar a Lava Jato, com convidados escolhidos a dedo – todos críticos virulentos da operação.
Esse é o padrão do PT. Nem Lula nem os petistas jamais admitiram a corrupção desvendada pela Lava Jato, malgrado as provas irrefutáveis dos desvios de recursos públicos por meio de contratos fraudulentos entre as maiores empreiteiras do País e a Petrobras. Convenientemente, os erros e abusos cometidos pela força-tarefa da Lava Jato foram usados pelos detratores da operação para desqualificá-la como um todo, como se crimes confessos jamais tivessem sido praticados. Eis o grau da desfaçatez.
Esse discurso revisionista, mais orientado pela mudança dos ventos da política nacional do que pelo apego à verdade factual, contaminou até a atuação do Supremo – Corte que outrora chancelou não uma, mas quase todas as ações da Lava Jato que ora pretende desmoralizar, como se os erros cometidos por alguns membros da força-tarefa tivessem o condão de contaminar a operação em todas as suas dimensões, sobretudo sua dimensão fática.
Talvez se sentindo devedor de Lula, cuja prisão classificou como “um dos maiores erros judiciários da história”, o ministro Dias Toffoli também contribuiu para esse esforço revisionista. Com a volta do petista ao Palácio do Planalto, Toffoli decidiu anular as provas de corrupção e suspender o pagamento de multas impostas à Odebrecht e à J&F por considerar que essas empresas teriam sofrido, ora vejam, “coação institucional” para firmar acordos de colaboração premiada. Em audiência pública recente, no próprio Supremo, nem os prepostos dessas empresas admitiram ter sofrido tal violência estatal.
Mas os fatos insistem em se impor. Levantamento feito pelo Estadão com base em acordos firmados entre os investigados e o Ministério Público mostrou que cinco ex-funcionários de alto escalão da Petrobras aceitaram devolver nada menos que R$ 279,8 milhões ao Tesouro e à empresa. Dessa dinheirama, quase 90% se referem a propinas recebidas por aqueles executivos, subornados por algumas das maiores empreiteiras do Brasil interessadas em obter contratos com a Petrobras. Ao que consta, nenhum desses ex-funcionários corruptos foi coagido pela Lava Jato a confessar que havia embolsado milhões em suborno – e igualmente não há notícia de que o dinheiro que devolveram fosse de mentirinha.
É preciso recolocar as coisas nos seus devidos lugares. Quem quiser acreditar na fábula lulopetista de que o PT e seu chefão foram perseguidos por um poderoso consórcio golpista que envolveu até o FBI, que acredite, pois questões de fé não se discutem. Já quem preza a verdade factual, sem a qual não há democracia, certamente espera que a Lava Jato encontre seu melhor lugar na história.