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KLEBER FOI NA ABERTURA DA CÂMARA PELA ÚLTIMA VEZ COMO PREFEITO DE DOIS MANDATOS. O POLÍTICO NÃO TINHA CONTAS A PRESTAR PARA ALIMENTAR COM REALIZAÇÕES O PALANQUE DO SUCESSOR E CALAR OS CRÍTICOS. RESTOU AGRADECER A GENEROSIDADE CÚMPLICE DOS VEREADORES DA BASE AMPLA

É tradição, em ambiente alinhado, o prefeito de Gaspar ir e prestigiar a abertura dos trabalhos do ano legislativo na Câmara de Vereadores. É um gesto político. Foi o que aconteceu na sessão ordinária de terça-feira passada. Isto é notícia velha. Em 2023, com Ciro André Quintino, MDB, ensaiou quebrar a escrita. Mas, atrasado Kleber foi lá e pediu desculpas por ter outra agenda inadiável. Isto é observação da notícia velha.

Neste ano, com a presidência da Câmara do mais longevo dos vereadores, José Hilário Melato, PP, Kleber bateu ponto sem atraso, com o vice Marcelo de Souza Brick, PP à tiracolo e um séquito de meia dúzia de comissionados. Eles já sabem que é fim de festa e da improvável continuidade. Kleber fez um pronunciamento burocrático e desanimado como se lia na expressão corporal e no timbre da voz. Para conferir, o vídeo da fala dele está disponível no site da Câmara. 

E por quê disso? Kleber não tinha o que apresentar à cidade. E os cúmplices disso tudo estavam ali bem à sua frente: a Bancada do Amém, com onze (MDB, PP, PSD, PDT e PSDB) dos 13 vereadores. Não é à toa que ele agradeceu, penhoradamente, à “Casa” – onde já foi vereador e presidente dela -, e não exatamente à bancada governista que é no fundo a “Casa”. O que eles podem cobrar, enviam cópia dos papelinhos para os eleitores e eleitoras, mas ninguém é atendido na maioria dos casos, são as centenas de requerimentos.

O que um político de dois mandatos, com ampla maioria na Câmara, com o suposto candidato sucessor do seu legado faria neste ambiente político, que em tese, é a palanque da campanha da continuidade aos líderes políticos que sustentam o seu governo?  No mínimo, uma robusta prestação de contas dos sete anos de mandato, para que dela, não restasse a menor dúvida de que a cidade precisaria de continuidade de um modo de governar e produzir resultados positivos e atualizados para a sociedade. Mais do que isso: os que apoiaram o governo de Kleber, não precisariam passar vergonha ou perrengues na busca de votos e reeleição, neste caso o plano da maioria dos vereadores da base ali presente. 

E olha que Kleber, ainda deixou escapar, que quer voltar a ser prefeito um dia de Gaspar para poder abrir o ano legislativo no futuro. Então…

PASSOU UMA BORRACHA NO PASSADO DE REALIZAÇÕES OU ELE JÁ SE DESBOTOU?

Retomando.

Mas, não. O prefeito Kleber criou um espetáculo virtual, para substituir a tradicional visível cortina de fumaça. 

Segundo Kleber, o trabalho dele “não foi para o mandato, foi para o futuro da cidade, olhando para além do próprio do mandato [de oito anos, dez meses ainda por cumprir, menos de oito até as eleições]”, insistiu na redundância do nada. Para este “futuro” a que se referiu, certamente, vão ficar as dívidas e que ele próprio as escondeu, mas a revelou que os projetos que deixa são algo maior que R$100 milhões, a chamada de “Carta de Projetos”. Ou seja, vai deixar para o prefeito eleito em seis de outubro próximo amarrado, altas contas para pagar e cortando capim.

O que o prefeito Kleber, o ex-vice Luiz Carlos Spengler Filho, PP e o atual vice Marcelo fizeram de concreto para a cidade nestes mais de sete anos de mandato e Kleber esqueceu de tratar como legado?

Deixaram mal iniciado o Anel de Contorno – numa cidade caótica na mobilidade – e que tem o quilômetro mais caro que se tem notícia em Santa Catarina, R$12 milhões, isto há três anos atrás.

Não implantaram a coleta e o tratamento de esgotos. Não construíram ou permissionaram novos cemitérios e preferiram enfrentar o problema com mais taxas para forçar a vida de uma cremadora. Não solucionaram o problema o sistema de Transporte Coletivo local e só agora, depois de oito anos, tenta fazer isso e com propaganda de conquista. Ainda está na licitação.

Não deram transparência dos seus atos por mecanismos digitais amplos e acessíveis pelos cidadãos. Não atualizaram o Plano Diretor como manda a Lei, já que está defasado desde 2016 como rege o Estatuto das Cidades e com isso permitiram uma série de prejuízos e que se revelados a fundo, sãoi escândalos em estado puro, como revelaram as conversas cabulosas do seu braço mais direito e irmão de templo, Jorge Prucino Pereira, PSDB.

Não criaram a contingência no tratamento de água para atender à demanda de crescimento da cidade, dar segurança e atrair novos investimentos e moradores. Não sanearam as finanças e a gestão para resultados do Hospital de Gaspar, tornando-o um instrumento público de saúde eficaz para os doentes e os de baixa renda. Não diminuíram a longa fila de atendimento nos postinhos de saúde, Policlínica e exames especializados.

Pior de tudo, não criaram vagas em tempo integral nas creches para as trabalhadoras e as de meio período que impuseram à cidade não solucionou o problema de filas de espera. Não criaram escolas em turno integral, ou não criaram os contraturnos escolares entre tantas necessidades básicas, não preencheram as vagas de professores e auxiliares em escolas e CDIs, principalmente para os de necessidades especiais. Ou seja, não souberam lidar com o antigo, o analógico do dia-a-dia para atender população e agora estão falando em mundo digital. Inacreditável.

Nada, nadinha de nada sobre tudo o que discorri – e a lista é muito, mas muito mais comprida – no pronunciamento oficial e de improviso do prefeito Kleber. E aí o prefeito, orientado por seus “çábios”, provavelmente, aqueles que in ventaram que qualquer reuniãozinha descontraída no gabinete é algo sério de planejamento, partiu para o virtual, como se ele, a cidade, os políticos e os cidadãos estivessem integrados a um futuro tecnológico como aqueles que a gente vê nos filmes de ficção ou futuristas. Isto até é desejado e estamos, de verdade, na compararão com outros de mesmo tamanho, atrasados, mas é pouco, muito pouco, para quem não fez primeiro, a elementar lição do tempo analógico, o básico. Parece teimar no erro, na teimosia, na vingança e na omissão. 

Até o slogan marqueteiro Avança Gaspar, que sempre reputei como uma peça desfocada da realidade, o capim, ao final do governo de Kleber e Marcelo, colocou este slogan no devido lugar. Só ele vem avançando e engolindo a cidade e os políticos plantados no governo de plantão por arranjos políticos e não exatamente de competência, como seria de esperar de quem desejava a continuidade por décadas no poder.

Se Kleber no discurso de terça-feira “esqueceu” a tal desgastada conquista Capital Nacional da Moda Infantil inventada em Brasília por políticos, ele partiu, por outro lado, para relembrar a velha fantasia do mesmo tipo: o treinamento, implantação e certificação nacional da obrigatória burocracia estatal federal no tal Gestãogov. 

Ela nada mais é do que uma plataforma digital, obrigatória. Nela, burocratas daqui inserem dados daquilo que recebem de verbas federais, estaduais e emendas parlamentares prestando contas de como usaram esses recursos, numa exigência de contrapartida da transparência aos cidadãos, que verdadeiramente são os donos destas verbas públicas. “Somos referência nacional“, disse Kleber sobre o preenchimento eletrônico obrigatório desses dados e documento eletrônicos integrativos. Como assim? Ora, se não fizer isso é punido. De verdade, que referência é esta em algo de integração de dados, transparência e conciliação contábil entre os entes federados?

OS AVANÇOS PROPAGADOS, DE VERDADE, REVELAM O ATRASO

Quer mais outra? Kleber está se orgulhando de um tal DataCenter onde todos os documentos da prefeitura estão sendo colocados lá para armazenamento perpétuo e acesso digital. 

Ele pode até se orgulhar desta iniciativa, mas não do feito em si. Ele está atrasado em pelo menos três décadas – e portanto, deve-se, de pronto, ressaltar e reconhecer, que não é só culpa dele. Eu mesmo trabalhei numa grande empresa que implantou este sistema em 1979. Mas, a questão é outra. Diante disso, e com essa possibilidade de acesso aos dados, documentos tão rápidos e precisos, é de se perguntar: qual a razão para a prefeitura atrasar tanto em atender os vereadores e os cidadãos nos pedidos de esclarecimentos e documentação, se em simples cliques, tudo está disponível digital e virtualmente? É birra? É chicana? É vingança? Ou jogo rasteiro? É seleção? É constrangimento intencional?

Mas, as novidades com anos de atraso não são só esta. 

Sabe o que Kleber anunciou? Que vai entregar o novo Portal de Transparência, chamado de “Projeta Gaspar”. Passou auase oito anos se escondendo na massaroca que é o atual portal e para o próximo governo, que provavelmente não será nenhum da continuidade ao seu, já armou a arapuca para pegá-lo no acesso que dificultou aos cidadãos nos seus dois mandatos. Essa gente faz tudo de forma bem pensada e articulada, mas a favor deles próprios.

E qual foi a cartada de encerramento do discurso de terça-feira à noite? A Educação, onde está no comando, o irmão de tempo, um curioso no assunto, aparentado e indicado pelo deputado Federal Ismael dos Santos, PSD, o jornalista de Blumenau, Emerson Antunes. Aliás, ele chegou aqui causando e teve que ir a Câmara pedir desculpas à cidade. Lembram-se disso, ou já esqueceram?

A gente precisa se preparar para o futuro e nele não se pode tirar a tecnologia disso“, disse o prefeito Kleber se dirigindo a sua ex-secretária de Educação, hoje presidente do MDB de Gaspar, vice-presidente da Câmara e educadora, Zilma Mônica Sansão Benevenutti. Mas, foi Zilma, a mais analógica de todas. Foi ela por exemplo, que antes da pandemia fez o Ideb cair em Gaspar. Foi ela, que manobrou para que as creches tivessem só meio período para marotamente diminuir as filas de esperas de trabalhadoras, por que os políticos do governo Kleber continuaram com o turno integral, e mesmo assim, as filas de espera nos CDIs continuaram longas até hoje. A “organização” sendo a “organização“, como escrevi no artigo de segunda-feira desta semana e que os empresários fingem não entender, e se entendem levaram uma rasteira do próprio Kleber, luiz Carlos e Marcelo.

Sem fatos tangíveis para demarcar terrenos, o prefeito Kleber tangenciou e usou esta suposta “inserção digital” no seu discurso aos do plenário da Câmara como uma grande conquista sua. Três aspectos estão bem claros. O primeiro é que esta tal inserção digital não é inclusiva em Gaspar, mas, de certa forma, discriminatórios à medida que não engloba todos os estudantes nas escolas municipais. O segundo é que o digital camufla problemas reais de gestão e aplicação pedagógica no mundo analógico como a falta de professores. E terceiro, não se criou mecanismos para impedir à interrupção dessa ideia por “outra ideia”, ou interesse comercial do futuro prefeito, gerando mais custos para a cidade e atraso para os estudantes gasparenses.

Kleber em 2021 atualizou, segundo ele, os professores e estudantes no Crome Book. Em 2022 foi a vez da parceria, paga, diga-se, com a Google para ampliar a formação tecnológica de professores, trabalhando inclusive na certificação Internacional, em novo ufanismo, de que esse movimento feito aqui seria exemplo nacional (mais um!). No ano passado foi a vez de apresentar o Gaspar Maker Lab, na Escola Norma Mônica Sabel e que ele, em repetido ufanismo (mais outro!), diz não existir igual em escola privada e pública em Santa Catarina. 

Está bom! Mas, perguntar não ofende: por que só uma escola, se o discurso de Kleber é o de transformação do ensino de Gaspar? Por enquanto só de uma escola. Qual o plano? Qual o projeto? Qual o planejamento? Onde estão os recursos não apenas para este ano, mas para a continuidade?

Neste 2024, Kleber quer entregar o tal “‘Projeto Fábrica’, ao lado Ginásio João dos Santos“, como se ele não soubesse que aquele local é o ginásio Gilberto Francisco Sabel, ex-vereador e líder comunitário. Segundo Kleber, para trabalhar a robótica, a inteligência artificial, a internet das coisas e programação aos alunos da rede municipal que terão que ir lá ao invés de terem laboratórios em suas escolas como a Norma Mônica Sabel. Prazo? Não assumiu. Até lá propaganda virtual é engolida pelo capim.

Como se viu, Kleber depois de mais de sete anos está sem discurso, sem legado e até quem o apoiou, tonto, à procura de outro para expiar os pecados graves da administração dele, Luiz Carlos e Marcelo contra a cidade. Kleber. Diz que faz tudo isso, preparando os estudantes da cidade para o futuro da cidade. Bom, se esses alunos e os demais cidadãos e cidadãs soubessem o que é exatamente este tal futuro da cidade, sem nem Plano Diretor atualizado temos, alguma coisa faria sentido no discurso dele. Por enquanto, não. É desesperador. Acorda, Gaspar!

TRAPICHE

Parece que agora vai. Entre o Republicanos e o PL, o ex-prefeito Adilson Luiz Schmitt, nascido, eleito e divorciado no MDB (2004/2009) com passagens pelo PSB e os já falecidos PPS e DEM, optou pelo PL. Quer voltar a política e quer ser candidato a vereador, depois de ser penalizado por parte dos dirigentes do próprio MDB, por empresários a quem não se conteve com a sua língua solta quando prefeito e os necessários comedimentos familiares. Na foto acima, Adilson está ladeado Rodrigo Boeing Althoff e pela professora Fernanda Chiminelli, do Barracão.

Na nota que soltou, Adilson Luiz Schmitt, PL, escreveu: ” Acabo de me filiar ao PL e desta forma volto efetivamente para o cenário político gasparense. Nunca saí da política. contribuí nos bastidores para nossa cidade, só que chegou a hora de voltar à cena. Ao longo desses 12 anos sem concorrer a um cargo eletivo aprendi muito. A política mudou e eu também mudei“.

Foi uma noite concorrida com pré-candidatos e dirigentes do PL e do União Brasil, já alinhavado para a coligação, na Sociedade Alvorada. A estrela do encontro que teve outras filiações além de Adilson, teve também instruções técnicas aos políticos que vão à cata de votos deste ano para não pisarem em falso na campanha eleitoral, foi o pré-candidato a prefeito pelo PL, o engenheiro Rodrigo Boeing Althoff.

A ausência sentida, foi a do outro pré-candidato, com ficha assinada no PL no encontro que teve com o governador Jorginho Melo, em setembro, em Florianópolis, o delegado Paulo Norberto Koerich, bem como seus padrinhos do “convescote” de duas semanas atrás. Paulo anda sumido. E isto tem incomodado os que querem definições no PL e dele. Foi anunciada e era esperada a presença do secretário de segurança de Santa Catarina, Carlos Henrique de Lima, deputado do PL conhecido como Sargento Lima. Não apareceu. Sintomático.

Na outra ponta do PL está a preocupação chamada Oberdan Barni, Republicanos (foto ao lado) e como ele vem ocupando espaços, porque no Republicanos, ele comanda o jogo e já conta com apoio formal do partido estadual. Tanto que na quarta-feira Oberdan foi entrevistado por Emanuel Soares, no Programa Jogo do Poder, da Jovem Pan 103.3, de Florianópolis. De forma simples, clara, coerente e contundente desceu o verbo naquilo que parece ser óbvio que a cidade e as pessoas precisam em Gaspar. E impressionou na comunicação fácil e direta.

Aqui em Gaspar, seus adversários questionaram a razão pela qual Oberdan foi dar entrevista em Florianópolis sobre a corrida dele em Gaspar. “Primeiro fui convidado. É uma oportunidade. Segundo, é um programa líder não apenas na Grande Florianópolis, mas ele está na internet. Terceiro, é uma forma dos políticos que estão decidindo em Florianópolis conhecer quem eu sou”, justificou. Hoje, Oberdan, é o único, no campo conservador, que consegue verbalizar o que as pesquisas qualitativas feitas por aqui pedem: mudanças.

Um grupo de empresários de Gaspar passou a consultar seus pares sobe a possibilidade de reunirem 100 doadores particulares, cada um com uma cota de R$15 mil, ou seja, arrecadar em torno de R$1.5 milhão para alimentar a campanha de um de seus apadrinhados, que não tem certeza se aceitará ou não o convite que fizeram para ele segurar este cajado.

Perguntar não ofende: isto não é vedado pela Lei? Não deveria estar lá na prestação oficial de contas do candidato, quando a candidatura for homologada ou na conta PIX da Justiça Eleitoral vai liberar em poucos dias? Outra: se vão tirar quase R$5 bilhões dos impostos para o tal Fundo Eleitoral e outros R$2 bilhões do Fundo partidário, para que tanta vaquinha?

Gaspar é Carnaval o ano inteiro. O carnavalesco Kleber Edson Wan Dall, MDB, acaba de decretar ponto facultativo na prefeitura na segunda e terça-feira em Gaspar, uma cidade de intensa programação momesca, que atrai nesta época do ano, milhares de foliões de outras cidades e estados, impulsiona a nossa economia como poucos avalia o setror turístico da cidade. A informação é fake? É um xiste, como diria Didi mocó sonrisal…. Mas a que vem abaixo não.

Quando assumiu em 2017, o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, declarou que no seu governo não haveria pontos facultativos como este. Protestos do funcionalismo. Cumpriu. Agora, enfraquecido politica, administrativa e nos resultados e em ano de eleições municipais, está agradando os barnabés, a quem ainda deposita esperanças de serem eles ainda seus principais cabos eleitorais pelo emprego que oferece. A prefeitura e a Câmara voltam só na quarta-feira, se até lá, ainda restar cinzas.

O PP de Gaspar se reuniu e finalmente lavou roupa suja. Estava escrito que isso iria acontecer. Os históricos encurralaram o presidente Luiz Carlos Spengler Filho que filiou e lançou o vice-prefeito Marcelo de Souza Brick como candidato aprefeito do partido. Marcelo, presente, assistindo o bate-boca. E o mais longevo dos vereadores e hoje presidente da Câmara, José Hilário Melato, lavando as mãos e esperando uma toalha felpuda para enxugá-las.

Está definido. O PSB em Gaspar, a exemplo do que é no plano nacional, será a linha auxiliar do PT e muito provavelmente ocupará o espaço de vice-prefeito, desde que ofereça um nome feminino. Enquanto isso, o PSD estadual primeiro não sabe bem o que fazer com o diretório de Gaspar, não sabe também quem apoiar e aguarda o desenlace do delegado Paulo Norberto Koerich, a quem apoiaria, sem olhar as tendências e pesquisas.

Este assunto é sério, delicado e integrante. O deputado estadual Egídio Maciel Ferrari, PRD, de Blumenau, ex-delegado de Polícia, inclusive em Gaspar onde marcoou terreno, protocolou um Projeto de Lei para multar quem estiver fazendo o uso de drogas em ambientes públicos em Santa Catarina. Este é um problema social, saúde publica e de segurança até então bem conhecido só das metrópoles, grandes cidades ou polos, mas que nos últimos tempos tem incomodado as administrações municipais até de pequenos municípios ou cidades turísticas.

Em Santa Catarina, já há municípios com legislação semelhante ao que está propondo o deputado Egídio Maciel Ferrari, PRD, como Balneário Camboriú, governada por Fabrício de Oliveira, PL. E se instalou a confusão. Primeiro sobre a constitucionalidade de se propor uma legislação desse tipo, que a princípio, deve ser federal e pode estar ferindo vários direitos basilares das liberdade individuais – e até coletiva – consagrados na Constituição. Segundo, virou um debate entre direita e esquerda, o que por si só, contamina qualquer tentativa de solução razoável e necessária em favor da pessoa em vulnerabilidade, em dependência não apenas à droga, mas das organizações criminosas.

Segundo o deputado Egídio Maciel Ferrari, PRD, “o Projeto de Lei, além de reduzir a sensação de impunidade do usuário, que agora vai sentir no bolso, será mais uma ferramenta para desestimular o consumo de drogas, já que crianças e adolescentes cada vez menos verão pessoas consumindo drogas ilícitas em via pública e não tomarão para si isso como uma atitude cotidiana”.

Não vou me alongar, até porque não sou nenhum especialista em qualquer ângulo que se queira tratar este assunto. Como cidadão, penso ser interessante este debate, desde que ele tenha praticidade,  racionalidade e longe dele, estejam os mesmos atores e interesses de sempre: a politização de algo que degrada a vida das pessoas, da beleza natural, convivência e dos lugares.

Mas, uma coisa é certa: quanto mais rica a cidade ou turística para ricos, mais demanda de droga há. E o comércio dela é uma decorrência dessa demanda. E se há essa facilitação para consumo da droga em público, torna-se um ato inserido na paisagem, que logo se degrada e sem volta, como testemunhei em várias partes do mundo e do Brasil ao longo dos anos.

Aos leitores e leitoras. Vou imitar o prefeito Kleber Wan Dall, MDB, e o presidente da Câmara, José Hilário Melato, PP. Vou me conceder o ponto facultativo na segunda-feira. Volterei não em cinzas, mas vendo-as queimadas da festa pagã do Carnaval, para então, como na tradição cristã Católica, todos estejam puros para penitencial Quaresma, até que o traidor venda Jesus por 30 moedas, para vê-lo morto na Cruz na próxima Sexta-Feira Santa. Assim seja.

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17 comentários em “KLEBER FOI NA ABERTURA DA CÂMARA PELA ÚLTIMA VEZ COMO PREFEITO DE DOIS MANDATOS. O POLÍTICO NÃO TINHA CONTAS A PRESTAR PARA ALIMENTAR COM REALIZAÇÕES O PALANQUE DO SUCESSOR E CALAR OS CRÍTICOS. RESTOU AGRADECER A GENEROSIDADE CÚMPLICE DOS VEREADORES DA BASE AMPLA”

  1. Pingback: "O DESPERTAR DE UMA NOVA ERA!" FOI ASSIM QUE OS EMPRESÁRIOS DE GASPAR ANUNCIARAM KLEBER PARA O SEGUNDO MANDATO NA UNIÃO QUE ARRUMARAM COM MARCELO. QUAL SERÁ A MEDIUNIDADE DE AGORA? - Olhando a Maré

  2. Este é o título do artigo desta quarta-feira

    “O DESPERTAR DE UMA NOVA ERA!” FOI ASSIM QUE OS EMPRESÁRIOS DE GASPAR ANUNCIARAM KLEBER PARA O SEGUNDO MANDATO NA UNIÃO QUE ARRUMARAM COM MARCELO. QUAL SERÁ A MEDIUNIDADE DE AGORA?

  3. LULA SUBESTIMA LIRA, por Dora Kramer, no jornal O Estado de S. Paulo

    “Não subestimem esta Mesa Diretora”, foi o aviso contundente que o presidente da Câmara deu ao governo na reabertura dos trabalhos da Casa, em 5/2.

    O restante do discurso listou fatos já conhecidos sobre as insatisfações do Parlamento: pagamento de emendas, acordos desfeitos, nomeações emperradas e vetos não digeridos.

    Rosário desfiado e repetido quatro dias depois em conversa, em tom mais institucional e menos agressivo, entre Luiz Inácio da Silva (PT) e Arthur Lira (PL) no Palácio da Alvorada. Dali o deputado saiu dizendo que a hostilidade havia sido contornada.

    Situação “zerada” segundo ele. Na verdade, um zero a zero mais ou menos, pois a paz duradoura depende de o Planalto cumprir acordos firmados e não insistir em anular decisões do Legislativo. Portanto, não houve um cessar-fogo definitivo. Foi, antes, uma trégua.

    Lula segue desconfiado, e Lira continua com o pé atrás diante das versões disseminadas por personagens palacianos de que neste último ano de mandato o presidente da Câmara teria entrado no modo pato manco, seria um comandante com poder desidratado. Detectada a ofensiva para mostrá-lo como fraco, o deputado decidiu exibir-se forte.

    Marcou ausências significativas no início do ano e, quando voltou, Arthur Lira foi com tudo para cima de um presidente que na visão dele atuava para desgastá-lo.

    A chama de Lira não está apagada. Tem apoio para eleger um sucessor que siga a mesma toada. Ademais, comanda uma pauta econômica que interessa ao Planalto e da qual não depende a Câmara para investir na formação de uma base capaz de na próxima legislatura impor novas derrotas ao Executivo.

    Um jeito de o governo desequilibrar a balança seria vencer a batalha da comunicação mostrando como algumas exigências do Congresso prejudicam a população.

    Mas fica difícil agora, porque no começo Lula entregou dedos e anéis, iludido de que teria a força ante um apetite que se mostrou insaciável.

  4. Para os governantes, seus patrocinbadores, funcionários efetivos e comissionados de Gaspar lerem neste prolongado feriadão de Carnaval

    ESTADO A SERVIÇO DE GRUPOS, por Paulo Feldemann, professor de administração na USP. Foi presidente da Eletropaulo e diretor de empresas públicas como Banespa e Caixa, no jornal O Globo

    Existe no Brasil uma grande confusão entre os conceitos de Estado e governo. Resumidamente, podemos dizer que o Estado abrange toda a sociedade política e é algo duradouro, enquanto o governo é apenas uma das instituições que o compõem — as outras são o Legislativo e o Judiciário. O governo administra apenas o Poder Executivo, e por um curto período de quatro anos, após o qual há eleições. O Estado não pode nem deve servir a nenhum grupo político, porque permeia tudo, sendo soberano, impessoal, estável e permanente. Infelizmente, no Brasil, o Estado tem sido capturado por grupos políticos por meio da figura dos cargos de confiança.

    A cada quatro anos, o Brasil troca completamente sua equipe dirigente nas várias instâncias do Poder Executivo, no âmbito dos governos federal, estaduais e municipais. Não é o que acontece na maioria dos países mais avançados, onde, quando se elege um governante — presidente, primeiro-ministro, governador ou prefeito —, o máximo que consegue indicar são aqueles que se reportarão diretamente, como ministros ou secretários estaduais ou municipais. Estes compõem o segundo escalão e não poderão levar ninguém com eles, nem mesmo um simples assessor. É assim que funcionam, entre outros, os setores públicos de França, Alemanha, países escandinavos e Israel. Mas, no Brasil, a cada nova eleição, se o vencedor for da oposição, tudo o que o antecessor fez poderá ser jogado fora e, certamente, a roda será reinventada.

    Não é por outra razão que existem no país cerca de 1 milhão ocupando cargos de confiança, segundo o IBGE. Entre estes, apenas em Brasília residem 30 mil. Praticamente todos os que se reportam a ministros ou a secretários municipais e estaduais não são, portanto, funcionários de carreira, que fizeram concurso para atuar no setor público. As exceções são poucas. O gasto total com os ocupantes de cargos de confiança beira os R$ 200 bilhões.

    O grande problema não é nem o número de funcionários nem o valor gasto, mas que, a rigor, todo funcionário público deveria trabalhar para o Estado, nunca para atender um governante específico, menos ainda um partido político. Há uma captura do Estado. Nada melhor que a elaboração de uma reforma administrativa para resolver esse problema.

    No entanto, nas discussões que hoje ocorrem, mesmo no Congresso, fala-se muito em aspectos ligados ao funcionalismo público, salários, quantidade de funcionários, estabilidade, métodos novos de avaliação de desempenho, formas para conseguir aumentar a produtividade da máquina pública etc. Tudo muito importante, mas nada é novo, e deve-se tomar cuidado para que, nas discussões, não se fuja do que é preciso fazer com os cargos de confiança, estes, sim, o fulcro daquilo que deveria ser a reforma: acabar com eles e fazer com que todo servidor público trabalhe para o bem do Estado, e não simplesmente para o governante daquele momento.

    Para que tenhamos um setor público moderno, precisamos exigir que os trabalhadores tenham sido aprovados em concurso e façam parte do quadro de carreira, seja do ministério ou da secretaria. O Brasil tem hoje 11 milhões de funcionários públicos. Não dá para acreditar que seja impossível encontrar os nomes necessários dentro desse enorme contingente. Quando chegar esse dia, provavelmente teremos o tão necessário plano de longo prazo e a estratégia de futuro para o país. Não temos nada disso, pois o horizonte hoje nunca ultrapassa quatro anos.

  5. O BRASIL AO AVESSO, por Denis Lerrer Rosenfield, professor de filosofia na Ufrgs, no jornal O Estado de S. Paulo

    Um extraterrestre, tendo visitado o Brasil apenas alguns anos atrás, teria ficado surpreso, senão maravilhado, com o que presenciou. Um país que tinha a corrupção, por assim dizer, naturalizada, caracterizado pelo mais escancarado patrimonialismo, imperando o “é dando que se recebe” em seu sentido mais comezinho, e não religioso, de repente acorda para os imperativos da moralidade, da vida justa. Poderosos de então, mormente nos governos petistas, foram julgados e condenados, alguns presos, com as provas abundando. O Judiciário, unido, deu curso aos processos, das instâncias mais inferiores às mais superiores, aí incluindo o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o próprio Supremo Tribunal Federal (STF).

    Os grandes escândalos do mensalão e do petrolão vieram à tona, políticos foram julgados, dirigentes de empresas privadas e estatais não escaparam à Justiça. Alguns grandes empresários, com destaque para os da J&F e da Odebrecht, fizeram voluntariamente delações premiadas para escaparem da prisão, em confissões explícitas de culpa. O País pareceu, naquele momento, estar em vias de uma espécie de regeneração moral, com alguns juízes e promotores vindo, mesmo, a ocupar um lugar messiânico. Havia um não à corrupção pairando no ar, algo que parecia inexorável, leia-se irreversível. O antigo lema petista de oposição, da “ética na política”, estaria se realizando por intermédio de juízes e promotores que trouxeram ao banco dos réus os que se tinham colocado como os alicerces da moralidade pública. O extraterrestre chegou a ficar aturdido.

    Anos depois, incumbido de melhor entender não apenas o planeta, mas uma das maiores áreas deste, o Brasil, desta vez ficou literalmente perplexo. Num primeiro momento, consultando o seu avançado sistema de GPS interespacial, chegou a se perguntar se estava no lugar correto. Nada batia. O país que tinha acordado para a corrupção estava, agora, entorpecido, com uma confusão generalizada entre crime e castigo, algoz e vítima, culpado e inocente. É como se as palavras tivessem perdido sentido, significando algo totalmente outro. O PT tinha conseguido eleger o seu presidente, com Lula despontando apesar de todo o histórico de corrupção partidária. O STF tornou-se um revisor de todas as operações da Lava Jato, como se a corrupção não tivesse jamais existido. Seria uma espécie de fake news inventada “pela direita” ou “extrema direita”.

    Um ministro do Supremo, Dias Toffoli, atribui-se a tarefa do revisionismo histórico, como se fosse missão sua revisar segundo o seu arbítrio decisões tomadas numa cadeia hierárquica formada por promotores e procuradores, juízes, desembargadores e ministros. Uma decisão monocrática sua – e agora já são várias – varre para debaixo do tapete, como se fossem inúteis, sentenças e decisões cuidadosamente elaboradas e verificadas. O desrespeito para com esses colegas é flagrante, algo indigno em relação a eles. E, pasmem, até agora, com o olhar complacente dos demais ministros, como se com ele concordassem. Já passou, inclusive, da hora de o Legislativo vir a regulamentar decisões monocráticas que, na verdade, atentam contra o ordenamento jurídico e institucional. Se o STF não consegue coibir os abusos de seus membros, outra instância republicana haverá de fazê-lo.

    O extraterrestre está estupefato. Não consegue entender mais nada. Seus pontos de referência voaram pelos ares. Chegou, inclusive, a pensar em abandonar a sua missão. Os novos fatos estão para além de sua compreensão. Um promotor, Deltan Dallagnol, figura importante da Lava Jato, perdeu seu mandato de deputado. O senador Sergio Moro está ameaçado de perder o seu. Os que capitanearam a luta contra a corrupção se tornaram os novos vilões, enquanto muitos dos comprometidos com a mesma corrupção agora se arvoram em defensores da moralidade pública. Eventuais erros processuais, tão alegados atualmente, são utilizados e manipulados para apagar os fatos. O Supremo compactua, agora, com o que antes condenava. Discorda dele mesmo, produzindo insegurança jurídica, até institucional. O País está totalmente do avesso.

    O PT, no governo, está literalmente empenhado, junto com ministros do Supremo, num temerário – para não dizer imoral – projeto de revisionismo histórico. São novos escribas a oferecerem uma nova narrativa, como se fatos (notórios) não existissem. Tudo se torna narrativa, outra versão, como se a realidade fosse constituída de uma sucessão de versões, avessas aos fatos, que são, assim, escamoteados, como se fatos não fossem fatos, mas meras narrativas. De moralidade pública não há mais nenhuma palavra, tudo sendo reduzido a declarações alheias ao mundo ao redor. É como se o mundo real fosse somente constituído das falas de dirigentes que procuram de todos os modos ocultar os fatos passados.

    Pergunta-se o extraterrestre: será que a corrupção nunca existiu? E as provas, foram colocadas no lixo, onde ninguém pode encontrá-las? Um país carente de bússola moral e de segurança jurídica pode almejar um futuro?

  6. CAUTELA NA REGULAÇÃO DAS REDES SOCIAIS, por Lygia Maria, no jornal Folha de S. Paulo

    Qualquer pessoa bem informada sabe que é preciso haver alguma forma de regulação das redes sociais. Isso não está em questão. O problema é a forma como se dará a regulação.

    Alexandre de Moraes, presidente do TSE, disse que o tribunal e o Ministério da Justiça estão constituindo um grupo para rastrear quem atenta contra a democracia na internet.

    A fala levanta preocupações, a começar pela participação do Ministério da Justiça, órgão ligado à esfera do Poder (o Executivo) que não deveria se meter na liberdade de expressão, ainda mais em período eleitoral.

    Ademais, quem avaliará as postagens? Que critérios linguísticos serão usados para atestar que uma mensagem atenta contra a democracia? Afinal, o que é atentar contra a democracia —esse conceito abstrato?

    O histórico do TSE e do STF nessa seara também não ajuda. Foram cometidos abusos no pleito de 2022, como a censura prévia de um documentário que sequer foi visto pelos membros da corte, sob alegação de “situação excepcionalíssima”.

    De modo semelhante, Moraes usou o argumento de “afastamento excepcional de garantias individuais” em decisão no STF que bloqueou as contas digitais de um influencer. Num exercício de futurologia, proibiu-se o que poderia vir a ser dito.

    O magistrado tem feito ativismo pela aprovação do PL das Fake News. Sugeriu ao Congresso a manutenção de métodos usados na última eleição, como suspensão imediata de conteúdos até mesmo se existir dúvida de que estejam divulgando informações antidemocráticas.

    Ofício da PF em inquérito sobre a atuação das big techs contra o PL afirma que o intuito das empresas era “incutir nos consumidores a falsa ideia de que o projeto de lei é prejudicial ao Brasil”. Quem comprovou a falsidade? Pelo visto, a PF agora determina que leis são boas para o país.

    Qualquer pessoa bem informada sabe que uma regulação das redes é necessária, e também que a cúpula do Judiciário brasileiro nos últimos anos tem falhado na defesa da liberdade de expressão. Daí a cautela.

  7. FIM AOS SUPER SALÁRIOS, editorial do jornal Folha de S. Paulo

    Dados do Tesouro Nacional mostram que, em 2022, o Brasil gastou R$ 159,7 bilhões com seu sistema de Justiça. Desse total, 82,2% foram destinados a remunerações de magistrados e servidores, incluindo os do Ministério Público.

    Com o montante, equivalente a 1,6% do Produto Interno Bruto, lideramos um ranking de dispêndios públicos com tribunais de Justiça entre 53 países para os quais há informações disponíveis, aí incluídos ricos e emergentes. No grupo, a média é de 0,4% do PIB.

    Fica clara aí a desproporção dos ganhos do Judiciário ante a realidade brasileira —privilégios com os quais arcam os contribuintes.

    É bem-vinda, nesse sentido, a intenção manifestada pela ministra Esther Dweck (Gestão), em entrevista à Rádio Eldorado, de incluir os supersalários daquele Poder em uma proposta de reforma administrativa —apesar da resistência petista ao tema.

    Uma das distorções a enfrentar é a forma como se calculam os vencimentos. Uma teia de regras e resoluções do próprio setor beneficia seus profissionais.

    Em dezembro de 2023, por exemplo, Dias Toffoli, ministro do Supremo Tribunal Federal, decidiu pela retomada do pagamento do aumento salarial automático de 5% para juízes a cada cinco anos.

    Até o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, outrora um crítico dos supersalários, abriu o caminho para diversos penduricalhos em sua primeira sessão à frente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), alegando se tratar de uma equiparação a direitos dos integrantes do Ministério Público.

    As manobras têm alcançado também outras carreiras do sistema. De 2019 a 2022, a conversão em dinheiro da licença-prêmio no Ministério Público da União gerou despesas de R$ 439 milhões, segundo estudo da Transparência Brasil.

    A partir de dados do IBGE, a Folha mostrou que juízes têm a maior remuneração média entre 427 ocupações. Segundo o CNJ, a despesa média por magistrado foi de R$ 69,8 mil mensais em 2022.

    Não se discute que profissionais qualificados com tantas responsabilidades mereçam ser bem pagos. Os valores, no entanto, precisam estar enquadrados de forma clara e transparente nos limites fixados para o serviço público no Brasil, um país já iníquo em demasia.

  8. O GOLPINHO DE JAIR, por Elio Gaspari nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo

    Todo golpe vitorioso pinta-se heroico (São Petersburgo, 1917, ou Brasil, 1964) e todo golpe fracassado é mostrado como ridículo (Moscou, 1991, ou Brasil, 2022). Nenhum dos quatro teve tanto heroísmo nem tantas trapalhadas como as que foram pintadas pela vitória e pelo fracasso.

    O ex-capitão reformado nunca viu um golpe. Segundo o general Ernesto Geisel, foi “um mau militar”. (Geisel viu seis e ganhou com as brancas em cinco.)

    O golpe de Bolsonaro era público. Ele precisava de um apocalipse como prelúdio. Como o fim do mundo não veio, Lula está no Planalto e ele ficou sem passaporte.

    Pelo que se sabe até agora, Bolsonaro refinou o cenário em julho, numa reunião com três generais palacianos (Braga Netto, Augusto Heleno e Mário Fernandes), mais os ministros da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira e Anderson Torres, da Justiça. Todos acompanharam-no na condenação das urnas eletrônicas. O general Paulo Sérgio, que tinha oficiais na Comissão de Transparência do Tribunal Superior Eleitoral, foi preciso:

    “Vou falar aqui muito claro. Senhores! A comissão é para inglês ver.”

    Podia ter dito isso ao público, arrostando a contradita. Prático e clarividente, só o general Augusto Heleno:

    “Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. (…) Se tiver que virar a mesa é antes das eleições.”

    O golpe de 15 de novembro de 1889 foi armado dias antes, em segredo. O de 1937, combinado primeiro com os dois chefes militares da época. Em 1945, os mesmos generais decidiram derrubar Getulio Vargas de manhã e ele estava deposto à noite. Diferente dos anteriores, o de 1964 teve um espoleta: o general Mourão Filho, que comandava as mesas de uma Região Militar em Juiz de Fora (MG). (Na manhã de 31 de março o general Humberto Castello Branco tentou pará-lo e no meio da tarde o general Costa e Silva deixou o Ministério da Guerra temendo ser preso.)

    Bolsonaro não teve seu Mourão Filho. Os generais e coronéis que tramavam um golpe não tinham tropa para rebelar. O general Estevam Theophilo disse que queria uma ordem escrita.

    As 135 páginas da decisão do ministro Alexandre de Moraes expõem um planejamento chinfrim (porque fracassou). Faltam nele generais e coronéis da ativa com comando de tropa. Faltam, porque ali estão os oficiais silenciosos. Em 2022, por exemplo, circulava uma história segundo a qual Bolsonaro havia convidado o general Tomás Paiva, comandante da tropa do Sudeste, para uma de suas motociatas. Paiva recusou-se e o ex-capitão disse:

    “Muita gente sua virá”.

    “Se vier fardado vai preso”, teria respondido o general, que nunca disse uma palavra com sentido político.

    Como o general silencioso não fala, o espaço é ocupado por militares da reserva, que dão ordens aos seus taxistas, ou por generais palacianos, que comandam os motoristas de carros oficiais.

    O general Augusto Heleno disse uma verdade, só se vira a mesa antes da eleição. Noves fora 1930, depois, só se teria tentado em 1955, quando Juscelino Kubitschek já estava eleito. A trama passava pela demissão do ministro Henrique Lott (um general silencioso). Lott foi exonerado à tarde e, na madrugada, o presidente Carlos Luz estava deposto. Ele substituía provisoriamente o titular, Café Filho. Por ricochete, Café foi impedido de voltar ao Palácio do Catete. Em questão de horas, Lott derrubou dois presidentes.

    COMPOSTURA

    O general Walter Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, veio para a ribalta em 2018, quando foi colocado como interventor militar na segurança do Rio. Foi pedestre, porém discreto. Como chefe da Casa Civil e ministro da Defesa, repetiu o desempenho. É verdade que em junho de 2022 disse a empresários que, sem a auditoria das urnas eletrônicas, “não tem eleição”. Como é costume, desmentiu a notícia, pois sua fala teria sido tirada de contexto e mal interpretada. Jogo jogado, esses malditos jornalistas distorcem tudo.

    As revelações trazidas pela Polícia Federal mostraram outro Braga Netto, nas suas palavras textuais, sem direito ao recurso da patranha do contexto.

    Em dezembro de 2022, referindo-se ao comandante do Exército, general Freire Gomes, escreveu:

    “Omissão e indecisão não cabem a um combatente. (…) Cagão.”

    Poderia ter sido um momento de exasperação mas, dias depois, deu-se à futrica:

    “O Tomás foi hoje no VB, ontem. E aí acredite… Ele deu uma mijada no VB e na Cida.”

    Tomás era o general Tomás Paiva, que comandava a tropa do Sudeste e hoje comanda o Exército. VB era o general Eduardo Villas Bôas e Cida, a mulher dele.

    Braga Netto foi adiante:

    “Nunca valeu nada !! A ambição derrota o caráter dos fracos. Aliás… revela. Ele ainda meteu o pau no Paulo Sérgio, disse que ele tem que ficar quieto! A Cida ficou louca. Se retirou da sala, para não botar o artista para fora!”

    Na futrica, sobrou para Villas Bôas e para o ex-ministro da Defesa general Fernando de Azevedo e Silva, demitido por Bolsonaro, que estava quieto no seu canto:

    “Na verdade, VB tinha paixões discutíveis.. Fernando… Tomás.”

    O TUÍTE ESQUECIDO DE VB

    O general Eduardo Villas Bôas celebrizou-se com seu tuíte de abril de 2018, quando, como comandante do Exército, emparedou o Supremo Tribunal Federal, garantiu a permanência de Lula na cadeia e plantou a semente de uma anarquia militar.

    No dia 15 de novembro de 2022 foi publicado em seu nome outro tuíte que ficou esquecido. Duas semanas depois do segundo turno, VB dizia assim:

    “A população segue aglomerada junto às portas dos quartéis pedindo socorro às Forças Armadas. Com incrível persistência, mas com ânimo absolutamente pacífico, pessoas de todas as idades, identificadas com o verde e o amarelo que orgulhosamente ostentam, protestam contra os atentados à democracia, à independência dos Poderes, ameaças à liberdade e as dúvidas sobre o processo eleitoral.”

    A essa época o general estava fora do Exército e do governo. Padecendo há anos de uma moléstia degenerativa, não caminhava e respirava com a ajuda de aparelhos. Seu tuíte mostrava algum desapontamento com a imprensa:

    “O inusitado diante dos movimentos foi produzido pela indiferença da grande imprensa. Talvez nossos jornalistas acreditem que ignorando a movimentação de milhões de pessoas elas desaparecerão. Não se apercebem eles que ao tentar isolar as manifestações podem estar criando mais um fator de insatisfação. A mídia totalmente controlada nos países da cortina de ferro não impediu a queda do Muro de Berlim. A História ensina que pessoas que lutam pela liberdade jamais serão vencidas.”

    No dia 15 de dezembro os bloqueios em estradas eram 32.

  9. MANUAL PARA AFUGENTAR INVESTIDORES PRIVADOS, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    O governo quer atrair novas empresas para projetos de concessão e Parcerias Público-Privadas (PPPs) da nova edição do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que é preciso diversificar, uma vez que os grupos que já atuam no País estariam sobrecarregados.

    O diagnóstico do ministro não é exatamente novo. O certame para a concessão de estradas no Paraná realizado no ano passado foi disputado por dois fundos de investimento que já atuavam na área e no País. Já o leilão da chamada “rodovia da morte”, em Minas Gerais, não teve interessados.

    Nas ferrovias, a opção do governo foi a de renovar os contratos de concessão das atuais administradoras em troca da antecipação dos investimentos. Com algumas exceções, os leilões de aeroportos também têm registrado uma certa concentração de empresas que já haviam adquirido outros ativos.

    Com uma infraestrutura deficiente e um orçamento estrangulado, o Brasil não deveria se dar ao luxo de dispensar os investimentos da iniciativa privada. Porém, ao contrário do mercado financeiro, capaz de atrair capital externo interessado no diferencial das taxas de juros, o setor de infraestrutura ainda desperta muitas dúvidas nos investidores. E não sem razão.

    Basta lembrar o então prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella destruindo as praças de pedágio da Linha Amarela em outubro de 2019. Mais recentemente, após uma tempestade que deixou regiões da capital paulista por dias sem luz, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, entrou em uma saga judicial demagógica para tentar rescindir o contrato com a Enel.

    Cenas e atitudes como essas ocorreram nas duas principais cidades do País. É importante que se diga, no entanto, que atos de irresponsabilidade nessa seara não são exclusividade dos prefeitos.

    O edital de privatização do Porto de Santos chegou a ser enviado para apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU) no governo Bolsonaro, mas o processo foi suspenso após a eleição do presidente Lula da Silva.

    No caso da privatização da Eletrobras, aprovada pela Câmara e pelo Senado, o governo federal, por meio de uma ação no Supremo Tribunal Federal, tenta reverter sua perda de influência nos rumos da empresa, materializada no menor número de assentos no Conselho de Administração.

    Para dar sobrevida a estatais estaduais, o Executivo tentou passar por cima do marco do saneamento, também aprovado pelo Congresso, por meio de decreto, ainda que a incompetência dessas empresas em universalizar o acesso à água e ao esgoto tratados esteja mais do que atestada.

    Como explicar essas idas e vindas, de maneira convincente, para os investidores privados que tanto se pretende atrair? Eis o tamanho do desafio do ministro da Casa Civil, que precisará muito mais do que retórica para mostrar que o Brasil respeita contratos e tem segurança jurídica, regras claras e agências reguladoras independentes. Também será preciso dobrar a aposta em medidas que favoreçam o ambiente de negócios.

    Algo que também faria diferença nessa área seria a reconquista do grau de investimento. Fundos de pensão estrangeiros, que tradicionalmente investem em ativos de infraestrutura, têm limitações para aplicar recursos em países mal avaliados pelas agências de classificação de risco.

    No caso brasileiro, a maior dúvida das agências não é a exposição ao setor externo, mas a política fiscal. Não por acaso, ao elevar o rating soberano do País, logo após a aprovação da histórica reforma tributária pelo Legislativo, a agência de classificação de risco S&P enfatizou a importância de que o País permaneça na rota do pragmatismo para criar as bases para um crescimento econômico sustentável e perene.

    Nesse sentido, a defesa do déficit zero é importante, mas insuficiente. Como mostrou o Banco Central, a dívida bruta do País voltou a subir pela primeira vez em três anos e atingiu 74,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Garantir que a curva do endividamento público pare de crescer e atinja a estabilidade é fundamental para que o País passe a ser visto como um destino seguro para os investidores de longo prazo.

  10. AS INSTITUIÇÕES ESTÃO FUNCIONANDO? por Merval Pereira, no jornal O Globo

    As instituições brasileiras estão realmente funcionando, como gostamos de dizer, diante das inúmeras crises institucionais que enfrentamos nos últimos anos? Aparentemente, sim, mas com distorções que a qualquer momento cobrarão seu preço. Vivemos uma espécie de democracia do tipo jabuticaba brasilienses, que só com muita boa vontade parte de nós, brasileiros, compreende.

    Ponto delicadíssimo desse simulacro de democracia é a participação dos militares na tentativa de golpe. Louvam-se as Forças Armadas porque não aderiram, exige-se a condenação dos que aderiram, mas esquecemos de que as omissões de oficiais graduados, não denunciando os que conspiravam, e permitindo o acampamento de golpistas em frente aos quartéis pelo país, tudo faz parte do mesmo corporativismo nocivo às instituições brasileiras.

    Todos os ministros que estavam naquela reunião revelada em vídeo oficial e não pediram demissão, militares ou não, são igualmente culpados. Os sinais trocados vêm de muito tempo, não é de agora, e poderão ser trocados novamente, de acordo com os ventos políticos. Só essa possibilidade já demonstra que não vivemos em uma democracia genuína, mas em um simulacro de democracia, que serve aos que estão momentaneamente no poder.

    A democracia representativa depende do equilíbrio entre os Poderes, cada um autônomo e independentes entre si. No Brasil atual, nada disso acontece. Cada um dos Poderes trata de suas prioridades, colocando-as acima das questões nacionais. É verdade que o orçamento não é do Executivo, como disse o presidente da Câmara Arthur Lira. Mas, no presidencialismo, é o Executivo que dá as diretrizes gerais do governo, não cabendo ao Legislativo decidir para onde vão as verbas. Precisam adaptar as necessidades de seus redutos eleitorais ao planejamento central, ou convencer o Executivo a incluir suas prioridades nos planos do governo.

    O Poder Executivo, para se proteger do assédio econômico do Legislativo faminto por verbas, se aproxima do Supremo Tribunal Federal (STF) em busca de apoio institucional, o que evidencia uma distorção do papel do Judiciário.

    Assim como em outras ocasiões, o Supremo atua politicamente, dependendo de onde os ventos sopram. Lula acabou na prisão acusando a Justiça de estar atuando politicamente para impedi-lo de disputar a eleição presidencial de 2018 que teoricamente venceria, segundo pesquisas de opinião. Como se sabe, pesquisa que vale é voto na urna, mesmo que Bolsonaro não goste disso. Por sinal, ele acabará no mesmo destino de seu malvado preferido, a cadeia, acusando o governo de perseguição.

    Mas, como esse país não é para amadores, tem a chance de conseguir sair da prisão mais adiante, e se eleger novamente presidente da República. Isso porque a volubilidade de nosso Supremo pode ter as consequências mais imprevisíveis, agora já nem tanto. Até o final do governo, Lula não nomeará nenhum outro ministro, a não ser que um deles queira sair antes do prazo. O próximo presidente nomeará três ou dois ministros. Se for do grupo representativo da direita, poderá fazer a maioria do plenário.

    O que o ministro Dias Toffoli está fazendo para se reaproximar de Lula, seu protetor que se sentiu traído pelo protegido quando este tentou exercer a soberania polêmica que a toga lhe conferiu, é exemplar de um poder que deveria ser o equilíbrio republicano e acabou se perdendo em disputas políticas internas e externas.

    Durante o julgamento do mensalão, houve uma discussão no plenário do STF sobre o papel da instituição, que deveria ser o de defender a Constituição e acabou sendo tragada pelos julgamentos criminais envolvendo autoridades com foro privilegiado. O hoje presidente do STF ministro Luís Roberto Barroso propôs, lá pelas tantas, que fosse criado um tribunal especial para tratar dos crimes de autoridades, ficando o Supremo apenas com o controle constitucional.

    Foi rebatido candidamente, por diversos ministros, que alegavam que assim o tal Tribunal Especial teria mais poderes que o próprio Supremo. Por que isso? Porque o poder do Supremo hoje está não na sua autoridade moral e legal, na sua respeitabilidade, mas no seu poder de soltar ou prender autoridades.

    Com essa prerrogativa, o Supremo sem dúvida teve um papel fundamental na defesa da democracia brasileira, que teria sido engolida pelo autoritarismo se encontrasse pela frente uma Corte invertebrada, disposta a entregar-se ao poder do momento. Um exemplo de como no Brasil nossa democracia está distorcida é a atuação do ministro Alexandre de Moraes à frente de inquéritos sobre ataques ao Estado de Direito e fake news.

    Nascido de maneira irregular, quando Alexandre de Moraes foi designado relator sem sorteio pelo então presidente Dias Toffoli, o inquérito foi se estendendo, e hoje qualquer ação que pareça vagamente similar ao original tem o ministro Moraes como prevento. Isso lhe dá um poder excessivo, até mesmo de tomar medidas monocráticas que praticamente nunca vão à chancela do plenário.

    Ao lado de claros excessos, condenados no que tange à Operação Lava-Jato, mas aceitos no momento atual, há evidentes vitórias no desvelamento do roteiro do golpe de Estado que o então presidente da República, de maneira nojenta, orquestrou. Assim como na época da Lava-Jato, consideravam-se aceitáveis desvios depois revelados por quebra ilegal de sigilo de procuradores e do juiz Sergio Moro, hoje as evidentes provas de golpe de Estado também são justificativas para uma aceitação de métodos inortodoxos de ação jurídica.

    Uma demonstração de como os ventos mudam, o ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo, destacou-se na defesa da Operação Lava-Jato, classificou de “cleptocracia” o então governo Lula, rompeu com ele quando tentou adiar o julgamento do mensalão. Hoje, é o maior adversário da Lava-Jato, e voltou às boas com o presidente Lula. Os mesmos ministros que negaram habeas corpus para soltar o então ex-presidente mudaram seus votos, muitos baseados na espionagem ilegal do hacker de Guaratinguetá.

    O poder político dá a ministros do Supremo o direito de destruir de diversas maneiras a Operação Lava-Jato, a tal ponto que todos os condenados, ladrões confessos, estejam, de uma maneira ou outra, livres de suas penas, e as empresas corruptoras estejam recebendo de volta o dinheiro que roubaram dos cofres públicos. A maior prova de que o poder excessivo provoca ações sem controles, especialmente quando partem da mais alta Corte de Justiça do país, é a vingança contra a Transparência Internacional, que criticou as decisões de Toffoli de suspender ou anular multas milionárias de empresas corruptoras. Não há outra maneira de definir essa decisão, sobre uma acusação já anulada pelo Ministério Público.

    A política corrosiva de Bolsonaro, sabidamente conhecida de todos os que têm verdadeiros sonhos republicanos, justifica aparentemente a união do Supremo com o Executivo, que anda pressionado de maneira ilegítima pelo Congresso conservador, em boa parte bolsonarista, que impede o governo de governar na direção que lhe parece a melhor, embora a oposição tenha direito de discordar.

    Não é possível, porém, impor às diretrizes governamentais seus próprios desejos, assim como não pode o Executivo tentar alterar decisões já tomadas pelo Legislativo. Não é papel do Supremo desempatar essa disputa política, a não ser que ela fira a Constituição. Como se vê, os três Poderes estão em conflito entre si. O presidente Lula está tentando superar esses obstáculos impostos pelo Congresso com uma aproximação dos governadores, mesmo os de oposição. Esse é o caminho político correto. Os outros levam a uma corrosão da democracia. As instituições parecem funcionar, mas o resultado desse simulacro pode ser desastroso.

  11. UM BAITA EQUÍVOCO, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo

    Dia desses eu estava num hospital em São Paulo, para exames. Na sala de espera, já com as desagradáveis agulhas enterradas na veia e aquele uniforme de paciente, aproxima-se um senhor, na mesma condição, e me pergunta direto:

    — Como vai o nosso Brasil?

    Mal-humorado, falei qualquer coisa vaga e já ia voltando para o celular quando o cidadão, em voz já alterada, atacou:

    — Como vocês da imprensa não percebem? Já estamos na ditadura. No comunismo!

    De humor piorado, respondi:

    — Ora, que besteira!

    E mudei de sala, enquanto o cidadão ainda falava.

    Estava num hospital privado, que atende bons (e caros) planos de saúde. O sujeito tinha recursos e certamente acompanhava os noticiários. Comentei com minha acompanhante:

    — Como é possível? Era só o que faltava, Lula comunista.

    Isso foi algumas semanas atrás, antes mesmo da operação sobre a Abin paralela. Pois, no vídeo conhecido ontem, ouvindo a fala de Bolsonaro, a coisa ficou mais clara. Como meu inoportuno vizinho de sala de espera, o ex-presidente acreditava mesmo que o Brasil estava sob a ameaça de tornar-se comunista com a eleição de Lula. E certamente ambos continuam acreditando nisso.

    Na percepção descolada da realidade, o ex-presidente tem certeza de que foi roubado na eleição. A lógica desviada: se a maioria da população brasileira é cristã e se um cristão não pode ser esquerdista, muito menos comunista, então o Tribunal Superior Eleitoral fraudou o pleito. Bolsonaro teve 58.206.345 votos, 49,10%, no segundo turno. Será que todo esse pessoal pensa do mesmo modo?

    Pelas pesquisas, sabemos que muitos votaram em Bolsonaro porque consideravam Lula a pior opção. Não por considerá-lo comunista, mas principalmente por causa da lembrança do desastre de Dilma, do petrolão e do mensalão. Mas pesquisas mostram também que o ex-presidente mantém apoio entre 35% e 40% do eleitorado, conforme as perguntas.

    E, entretanto, Bolsonaro não poderia ter sido mais sincero quando, no vídeo, diz, com palavrões, que a eleição de um deputado do baixo clero, desprezado, só pode ter sido um engano. O que nos remete a outra questão: como tantos se equivocaram tanto? Não, não tenho a resposta. Apenas coloco a questão.

    Quando fala em comunismo, Bolsonaro não está pensando na Coreia do Norte, mas na Venezuela. Ora, o regime de Maduro é uma ditadura de ladrões, que montam empresas-sinecuras e destroem o Estado. Houve grossa corrupção no Brasil. Foi apanhada, e todos ficaram sabendo porque não tem ditadura por aqui, e a imprensa livre contou e conta tudo. Por isso mesmo, não ajuda em nada para o país a defesa que Lula faz de Maduro. Também não ajuda o desmonte do sistema de combate à corrupção.

    Isso certamente é alimento do bolsonarismo — e essa é questão essencial no quadro político e social do país. Haveria ditadura se o golpe bolsonarista tivesse dado certo. Hipótese impossível, convém ressaltar. Aquele bando de incompetentes conseguiu produzir o quebra-quebra de 8 de janeiro e, notável, deixar um rastro de provas. Minutas do golpe espalhadas por escritórios e celulares, vídeos e gravações de reuniões secretas, conversas de WhatsApp, fake news primárias.

    Estariam guardando para a posteridade? Achariam que ainda poderiam dar o golpe? Julgavam-se imunes? Deu piada. Exército de Brancaleone foi a óbvia para os mais velhos.

    Mas Bolsonaro e sua turma tiveram e têm apoio nas Forças Armadas, entre políticos e na elite brasileira. Paulo Guedes é um representante da elite financeira. E está no vídeo, traçando um sanduíche, mudo então e depois.

    Houve chefes militares que não embarcaram no golpe — e isso foi essencial para que a coisa não avançasse. Mas houve outros que topavam aderir, desde que, disseram, Bolsonaro assinasse a ordem.

    Bolsonaro esperava antes a adesão dos comparsas em comando militar. Um lado esperando o outro, ambos, vamos falar francamente, com medo de sair na frente. Ainda bem. Não haverá golpe.

    A que ponto chegamos. Estamos celebrando isso?

  12. Os frutos indesejáveis do excessivo e imprudente envolvimento de militares no governo de Jair Bolsonaro começam a aparecer de maneira clara e constrangedora. Investigações da Polícia Federal (PF) apontam que oficiais de alta patente, da ativa, estavam dispostos a atentar contra a soberania popular e manter Bolsonaro no poder.

    Não foi por falta de aviso. Bolsonaro é elemento subversivo desde os tempos em que era dublê de sindicalista e militar. Inconformado com a democracia, fez da truculência e do desapreço pela República seus principais ativos eleitorais. Nos seus mais delirantes sonhos, pretendia, se lhe dessem a chance, estabelecer no País o regime sonhado pela linha dura da ditadura militar. Isso era público e notório. Ninguém pode se dizer enganado.

    Bolsonaro pretendia arrastar as Forças Armadas para seu empreendimento autoritário. Tentou adonar-se do Exército, seja em palavras, seja em atitudes. Não hesitou em trocar a cúpula militar para ter ali oficiais que fossem fiéis a ele, e não ao País. Como se vê agora, não conseguiu, mas o vírus da sedição já estava inoculado, e o Exército, em algumas ocasiões, preferiu a contemporização à imposição de disciplina – o caso do general Eduardo Pazuello, que deveria ter sido punido por fazer comício com Bolsonaro, mas não sofreu nem sequer uma advertência, é exemplar dessa hesitação. Além disso, alguns militares se prestaram ao vexaminoso papel de dar sustentação às teorias da conspiração assacadas contra o sistema eleitoral.

    De todo modo, ao que tudo indica, o bolsonarismo não conseguiu seu intento manifesto de dobrar os comandantes militares – somente o almirante Almir Garnier Santos, comandante da Marinha, teria se colocado a favor do golpe, segundo as investigações. Já os chefes militares que se recusaram a participar foram alvo de campanha de ódio, inclusive contra seus familiares, deflagrada pelos militares bolsonaristas para desgastá-los nos quartéis.

    Do conjunto de evidências coletadas pela PF, depreende-se que o golpe para impedir a posse do presidente Lula da Silva também não foi adiante porque havia ímpeto, mas não havia “uma noção clara de como fazê-lo”, como corretamente salientou William Waack em sua coluna neste jornal. Isso em nada atenua a gravidade do material reunido pela PF dando conta de que no centro nevrálgico da tentativa de golpe estiveram militares graduados, inclusive no comando de tropas. Sabe-se lá em nome de que projeto de poder, mobilizaram-se para tentar manter na Presidência um mau militar, e devem ser exemplarmente punidos por isso.

    Como se viu, uma plêiade de generais que até pouco tempo atrás tinham assento no Alto Comando do Exército é suspeita de envolvimento na intentona. Portanto, mais do que a conclusão das investigações da PF e a punição exemplar de todos eles na medida de suas responsabilidades, às Forças Armadas, em particular ao Exército, impõe-se urgentemente um profundo reexame da formação de seus quadros. Não há mais sombra de dúvida de que o pensamento golpista grassa em alguns setores das Forças Armadas, e isso só pode ser enfrentado com uma educação orientada pela atuação dos militares dentro das estritas balizas do Estado Democrático de Direito. Nada além.

    Ao fim e ao cabo, os golpistas tornaram-se vozes estridentes, porém isoladas, na caserna. Prevaleceu o respeito à Constituição. Mas isso não pode depender, por óbvio, do ânimo dos militares que estejam em posição de comando num dado momento. Uma operação inédita da PF chegou a militares de alta patente por uma tentativa de sedição. Num país sério como o Brasil pretende ser, um fato gravíssimo como esse deve ser o ponto de partida para uma reflexão sobre a contaminação política da caserna. O episódio tem de servir para que se reafirme que os militares não são os tutores da República e que devem manter distância da política, própria da vida civil, atuando nos estreitos limites que a Constituição lhes impõe.

  13. QUE SE FAÇA JUSTIÇA, NÃO VINGANÇA, editorial do jornal Folha de S. Paulo

    Ao que parece, chegará a hora em que integrantes do alto escalão durante a administração Jair Bolsonaro (PL), incluindo o ex-mandatário, terão de prestar contas à Justiça.

    O presidente e seu séquito abusaram da irresponsabilidade. Se também cometeram crimes de lesa-democracia, é algo a ser decidido num quadro que precisará ser justo e regular, com amplo direito de defesa e o devido processo legal.

    Por ora conhecem-se fatos preliminares de uma investigação, graves o bastante para justificar aprofundamento. Há indícios de que um círculo de autoridades civis e militares em torno de Bolsonaro tramou subverter a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

    Segundo a Polícia Federal, debates sobre um decreto golpista —no molde da minuta achada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, fato revelado pela Folha— foram travados após o segundo turno pelo presidente da República, que teria ordenado supostas correções na proposta e, com ela, assediado as Forças Armadas.

    A investigação confirma que o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, se negou a abonar aventuras, mas lança dúvidas sobre as condutas de um então integrante do Alto Comando da força terrestre e do chefe da Marinha. São informações iniciais, ainda carentes de maior escrutínio.

    O golpe não tinha como se consumar, dada a oposição da institucionalidade, incluindo o comando do Exército, e da sociedade a retrocessos autoritários, o que não exclui a hipótese de indivíduos inconformados com a derrota nas urnas terem urdido uma virada de mesa.

    Para fins da aplicação da lei de defesa da democracia, sancionada por Bolsonaro em setembro de 2021, não é preciso desfechar o putsch; basta a tentativa de fazê-lo para o cometimento dos crimes de golpe de Estado e de abolição do Estado de Direito.

    Seria precipitado e impróprio, nesta fase dos desdobramentos, concluir que o ex-presidente e os outros investigados incidiram nesses delitos. Os trabalhos policiais estão inconclusos, e o crivo incipiente da Procuradoria-Geral nem sequer produziu denúncia formal.

    Seria, isso sim, o momento recomendável para dar cabo das heterodoxias nas apurações. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, além de condutor anômalo do inquérito e alvo frequente de ataques bolsonaristas, agora figura como uma das vítimas da suposta tentativa de golpe —sua prisão teria sido tramada.

    O melhor é que a PGR assuma o papel de parte acusadora, e os 11 ministros do STF se recolham para a posição de julgadores imparciais de uma provável ação penal, ouvindo com equidistância os argumentos de acusação e defesa.

  14. Bom dia.

    Acho hipócrita o discurso daxx autoridadexxx sobre MULTAR quem faz uso de drogas em lugares públicos quando bares, restaurantes e INCLUSIVE FESTAS DE IGREJAS tem como carro chefe a VENDA DE BEBIDAS ALCOÓLICAS.

    Sem falar na vasta gama de entorpecentes disponibilizados
    (com receita)
    nas gôndolas das farmácias da esquina. 😱😱🥂
    Pior: na maioria das vezes o INCENTIVO COMEÇA DENTRO DE CASA.
    😔

    Bom e merecido descanso pro senhor e pra sua família 🙌🌈🌟

  15. ATÉ ONDE VAI O ESTRAGO NAS FORÇAS ARMADAS? por Willian Waack, no jornal O Estado de S. Paulo

    Oque se pode considerar como “hard facts” no material que embasou prisões, buscas e apreensões contra Bolsonaro, aliados e militares dá a ideia de um grupo motivado pela intenção geral de “virar a mesa” – isto é, dar um golpe –, mas sem sequer uma noção clara de como fazê-lo. E, principalmente, sem a necessária força militar.

    As transcrições de conversas sobretudo entre os mais próximos de Bolsonaro revelam um grupo preso às próprias quimeras políticas e tão incompetente a ponto de gravar parte do que se pode chamar de “conspiração”, embora mais pareça uma conversa de botequim em Copacabana de militares de pijama.

    O ponto nevrálgico da investigação não é mais a figura de Bolsonaro, suficientemente comprometida e envolvida em processos de vários tipos, fora esse. É saber até onde chega o estrago dentro da instituição das Forças Armadas. Qualquer que fosse o roteiro do golpe, que até aqui não está claramente descrito na investigação, parece claro que, de saída, os comandantes de tropa não queriam participar.

    Sabia-se da penetração do bolsonarismo na cúpula das Forças, o que se torna mais nítido agora com o material divulgado pela PF. Ela foi ao ponto de provocar uma divisão entre comandantes no Exército, com a maioria mantendo o que sempre achou de Bolsonaro: um capitãozinho rebelde, cuja única serventia era varrer o petismo da paisagem política.

    Mas os atuais comandantes constatam hoje consternados que a investigação passou por cima da instituição, que não foi capaz de matar na raiz o bolsonarismo em suas fileiras. Que generais de quatro estrelas foram humilhados na operação da PF, sem que a instituição possa reagir. Nem deve.

    Quando é que a coisa toda afundou numa instituição que se esforçara para recuperar confiança, prestígio e imagem? Talvez naquilo que era público e notório, mas os próprios militares preferiram fechar os olhos. Foi quando o general Pazuello participou de um comício de Bolsonaro, violando o Estatuto das Forças Armadas, e o Exército não o puniu.

    Uma vez rompida a disciplina no topo, o resto é consequência.

  16. CONDENAÇÃO PRIMEIRO, PRISÃO DEPOIS, por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo

    A prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro tarda, mas não falha, e tem até um cronograma: o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Polícia Federal (PF) não pretendem correr nenhum risco jurídico, policial ou político e só pretendem chegar a esse ponto depois das investigações, das instâncias de julgamento e da eventual condenação pela mais alta Corte de Justiça do País. Não estão previstas prisão preventiva ou temporária, só depois da tramitação em julgado.

    A estratégia é rigorosa e detalhada, com uma sequência de operações da Polícia Federal, uma lista crescente de alvos e a apresentação robusta de provas até que não haja mais nenhum fiapo de dúvidas sobre a responsabilidade direta de Bolsonaro pela armação de um golpe de Estado em que ele seria o principal beneficiado.

    STF e PF têm obsessão com o rigor na investigação, na produção das provas e na avaliação jurídica, lei por lei, artigo por artigo, para não dar margens nem alimentar o discurso bolsonarista de que estaria agindo em conluio com o governo Lula para perseguir Bolsonaro e evitar seu retorno à política e às eleições. Uma parte importante da estratégia é preparar os ânimos da população, mostrando as provas e montando a história do golpe detalhe por detalhe.

    Entre as novas provas reveladas pela PF destacam-se duas. Um vídeo em que Bolsonaro e generais discutiam abertamente o golpe e o general Heleno defendeu que a “virada de mesa” deveria ser antes da eleição. E um texto apócrifo, mas encontrado no próprio gabinete de Bolsonaro no PL, justificando a decretação de estado de sítio. A PF apreendeu o passaporte de Bolsonaro, para evitar que ele fuja do País (dois filhos já têm cidadania italiana). Desta vez, todos os caminhos não levam a Roma, mas à prisão de Bolsonaro.

    Atenção a um dos presos, Filipe Martins, discípulo do indescritível Olavo de Carvalho e ex-assessor internacional da Presidência, que foi processado por postar-se atrás do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, fazendo um gesto de supremacistas brancos – ou seja, um gesto nazista.

    Isso remete ao ex-secretário da Cultura Roberto Alvim, que gravou vídeo de inspiração nazista, com trechos de Goebbels e a música preferida de Hitler ao fundo. Martins e Alvim tinham tudo a ver com um governo que pretendia fechar o TSE, prender o ministro do STF Alexandre de Moraes, decretar estado de sítio e instalar uma ditadura. Lula é que iria transformar o Brasil numa Venezuela?

  17. ACUSAÇÃO DE GOLPE É A MAIS GRAVE NUMA DEMOCRACIA, editorial de O Globo

    Uma investigação da Polícia Federal (PF), conduzida com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF), apresentou evidências convincentes de que Jair Bolsonaro, quando presidente, alguns de seus ministros, assessores próximos, funcionários do governo e militares tramaram contra a soberania do voto popular, preparando um golpe de Estado. São áudios, vídeos, mensagens de texto e documentos que dão muita consistência às acusações. Não existe acusação mais grave numa democracia. Por isso a investigação deve prosseguir com o maior rigor — mas também com a máxima serenidade.

    A Operação Tempus Veritatis, deflagrada ontem pela PF com autorização do ministro Alexandre de Moraes, do STF, investiga um grupo acusado de tramar um golpe de Estado para manter Bolsonaro no poder desde quando era antevista a possível derrota para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições de 2022. Segundo a PF, caso a derrota se concretizasse, um plano previa a prisão de Moraes, do decano do STF, Gilmar Mendes, e de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado.

    A PF diz que mensagens apreendidas na investigação mostram que Bolsonaro recebeu a minuta do decreto da prisão e a editou para retirar da lista de presos Gilmar e Pacheco — é a primeira vez que se menciona uma ação direta do então presidente nas tramas golpistas. Também sustenta que Bolsonaro convocou os comandantes das Forças Armadas ao Palácio da Alvorada para “pressioná-los a aderir ao golpe de Estado”. Suspeito de ter desempenhado papel central na trama em novembro de 2022, Filipe Martins, ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, foi um dos alvos da operação, e sua prisão preventiva foi decretada.

    Outro suspeito cuja prisão foi decretada é o coronel da reserva do Exército Marcelo Câmara, ex-assessor especial da Presidência apontado como responsável pelo “núcleo de inteligência paralela” dos golpistas. Entre as atividades atribuídas ao grupo estava o monitoramento dos passos do próprio Moraes. Em determinado momento, diz a PF, o planejamento para a prisão de Moraes tinha local e data marcados: São Paulo, 18 de dezembro de 2022.

    A PF diz ter evidências que comprovam o que chama de “dinâmica golpista” antes mesmo do primeiro turno das eleições. A ideia dos conspiradores era contestar qualquer resultado desfavorável a Bolsonaro por meio das acusações sem fundamento contra o sistema eleitoral que circulavam havia meses. A conspiração envolveu até o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que chegou a usar verbas do partido para financiar os ataques à urna eletrônica e pediu a anulação do resultado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ontem a polícia encontrou na sede do PL documentos para decretação de estado de sítio. Costa Neto, alvo de mandado de busca e apreensão, acabou preso por portar arma sem permissão legal.

    Um vídeo apreendido no computador do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que firmou acordo de delação premiada depois de preso em maio passado, é uma das provas mais robustas apresentadas no inquérito. Ele registra uma reunião em julho de 2022 com a presença de Anderson Torres (então ministro da Justiça), Augusto Heleno (chefe do Gabinete de Segurança Institucional) e Walter Braga Netto (ministro da Casa Civil).

    De acordo com a descrição do vídeo feita pela PF, Bolsonaro, nervoso com a possibilidade de derrota nas urnas, exige que os ministros tomem providências contra o TSE. Na gravação, Torres promete reforçar os ataques ao sistema eleitoral, e Heleno opina que se “tiver que virar a mesa, é antes das eleições”. Torres, Heleno, Braga Netto e o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, estão entre os alvos de mandados de busca e apreensão. Pelo envolvimento na trama golpista, Bolsonaro foi proibido de deixar o país e de se comunicar com os demais investigados.

    Os indícios revelam que Braga Netto, vice na chapa derrotada de Bolsonaro, concentrou esforços para pressionar e atacar militares em posição de comando contrários à ideia de golpe. Segundo a PF, as investidas partiram de múltiplos canais. Em conversas por mensagem rastreadas pelos investigadores, Braga Netto dá orientação para que o então comandante da Força Aérea, o tenente-brigadeiro Baptista Júnior, contrário ao golpe, seja atacado. E para que o almirante de esquadra Almir Garnier Santos, favorável ao golpe, seja elogiado. Braga Netto manda “oferecer a cabeça” do general Freire Gomes, então comandante do Exército, e se refere a ele com um palavrão quando confrontado com a informação de que ele não aderira ao golpe. Apesar dos esforços golpistas, é sempre fundamental lembrar que, ao fim, prevaleceram o bom senso e a postura legalista no Alto-Comando do Exército. O país se livrou da intentona e houve transferência de poder ao vencedor das eleições.

    Os desafios do inquérito não têm paralelo na História recente do Brasil. Ele confirma o que muitos denunciaram ao longo do mandato de Bolsonaro — a imprensa sempre vigilante. Diante de acusações tão graves, os eventuais indiciados deverão ter amplo direito de defesa, de modo a dirimir quaisquer dúvidas sobre o caráter republicano das investigações. Muitos tentarão posar de vítimas de arbítrio, usando o processo em benefício político próprio. Para evitar essa postura e desmenti-los, PF, Procuradoria-Geral da República e STF precisam manter atuação serena e responsável. Antes de qualquer julgamento, todos merecem a presunção de inocência, da mesma forma que os acusados de crimes no 8 de Janeiro.

    A democracia é conquista inegociável, e tramar contra o resultado das urnas é atentado inadmissível. Por isso as investigações devem seguir com afinco e, comprovada a culpa nos tribunais, a punição aos condenados deve ser severa. É o mínimo a que o Brasil tem direito para preservar a democracia que tanto nos custou.

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