Faz uma semana. Mas, como ninguém ousou tocar – nem mesmo os dois vereadores que se dizem de oposição e estão obrigados a fiscalizar o que os outros onze da Bancada do Amém (MDB, PP, PSD, PDT e PSDB) por apoio incondicional não podem questionar sobre este assunto e por isso tudo se esconde da cidade – lá vou eu, de novo, esclarecer.
Na quinta-feira da semana passada houve duas audiências públicas – de poucos presentes, diga-se desde, logo: uma em que o controlador geral, Ernesto Hostin, apresentou o cumprimento das metas fiscais do segundo quadrimestre deste ano e a outra dedicou-se ao relatório da Saúde, de igual período, feito pela coordenadora da área na prefeitura.
Da audiência que tratou do cumprimento das metas fiscais até aqui – cujo ato é obrigatório, inclusive na sua ampla publicidade porque há repasses substanciais dos governos federal e estadual – o vídeo sumiu do ar no site da Câmara e ninguém o encontra na internet. Talvez, porque ele mostra as contas, mais uma vez, em perigosa situação diante da fragilidade estrutural em que se encontra o caixa da prefeitura. O fato é tão grave que levará a prefeitura fazer, as pressas, leilões de nove imóveis para se garantir os pagamentos obrigatórios deste ano, inclusive dos funcionários públicos. O projeto de lei já está na Câmara tramitando na velocidade de uma bala.
Já o relatório da Saúde, de toda a papagaiada justificativa para preencher o tempo, seis números valeram a pena toda a apresentação. Se eles não passaram despercebidos, por quem não deveria deixar isto acontecer, preferiram o silêncio aos questionamentos para ser esclarecer o que foi exposto. O Orçamento Municipal de 2023 da Saúde – que sempre os rotulei como sendo peças de ficção e franksteins no tal copia e cola de um exercício para o outro – previa R$ 54 milhões para a Atenção Básica, que é feita para atender os 15 postinhos, saúde bucal e 18 equipes que atuam neles. Nos oito primeiros meses do ano foram empenhados R$34,6 milhões.
Por outro lado, este mesmo Orçamento, já inchado e desproporcional, previa R$36 milhões para Assistência Hospitalar e Ambulatorial neste ano. Já foram empenhados R$32,5 milhões só nestes primeiros oito meses. Faltam quatro meses. E falta dinheiro que foi que nem água. Nesta toada, no mínimo serão necessários mais outros R$16 milhões, no mínimo, para deixar esta parte da máquina rodando. É um estouro espetacular, sem que tenha acrescentado nada de um ano para o outro.
Por isso, empilham-se aos montes na Câmara, Projetos de Leis, tirando dinheiro de todo o que é canto para dar a Saúde. Isto sem falar que a meta mínima constitucional de 25% obrigatória da Educação está com problemas para ser atingida e se isto acontecer, vai bater no Tribunal de Contas. Todos de cabelo em pé.
O que está acontecendo? Algo simples e óbvio.
O gestor, o homem que vive postando diariamente reuniões de planejamento e acompanhamento, o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB – junto com o seu vice Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, ou PP, talvez -, não planejou, não administrou e não conseguiu, enxergar ou então, com sua equipe, calculou mal, e bota mal nisso, à armadilha que armou, meteu-se e está preso. Inclusive, politicamente.
Ao invés de dar solução ao Hospital de Gaspar, por quase sete anos, tornou ele [Hospital] um problema cada vez mais grave para si, suas contas como prefeito, a cidade, e contra a imagem de gestor capaz, respingando tudo isso nos políticos que o apoiam.
Ora, 15 postinhos com 18 equipes espalhadas pelos bairros, incluindo o atendimento domiciliar, consumiram menos do que um Hospital e um ambulatório do Hospital sob ataque diário de mau atendimento?
Só isso nos diz o quanto erraram.
Perderam o foco: as pessoas. Perderam-se no resultado: o atendimento aos mais vulneráveis e famílias expostas ao atendimento precário do sistema de saúde municipal. Perderam dinheiro dos pesados impostos e que sumiu dos cofres da prefeitura para atender à armadilha do PT feita pelo ex-prefeito Pedro Celso Zuchi. Ele para ter controle de tudo, aumentar o empreguismo de companheiros e fazer política de poder, colocou o Hospital de Gaspar sob uma marota intervenção municipal. O prefeito Kleber, o seu ex-vice e hoje encostado na chefia de gabinete, Luiz Carlos Spengler Filho, PP, bem como o atual, Marcelo não conseguiram dar a volta por cima contra este nó em favor da cidade. Amadorismo em estado sólido.
Agora, Kleber, seu vice Marcelo depois de tanta barbeiragem administrativa, falta de foco e de gestão das prioridades dos recursos, estão torcendo para que o Hospital Santo Antônio, de Blumenau, por milagre, adote o Hospital de Gaspar, em perpétuo socorro. Mas, incrivelmente, ao mesmo tempo pelos seus que estão pendurados no Hospital e os protegem na Câmara, estão nos bastidores estão trabalhando, para que as dúvidas deste imbróglio não sejam aclaradas e por consequência, não sejam reveladas à cidade. E por quê? Para que, como maus gestores públicos, eles não expostos e avaliados naquilo que a população pode rejeitá-los: pelo voto.
Uma comissão inventada Câmara de vereadores com uma intenção, mas que logo se desvirtuou por interesses políticos por orientação do gabinete de Kleber e Marcelo, começou a acompanhar a auditoria do Hospital de Blumenau. E está irritando à equipe blumenauense.
É que esta comissão já mostrou a que veio. Quer abafar os erros das dezenas de secretários de Saúde, gestores do Hospital e até presidente da Comissão de Intervenção. O último foi Jorge Luiz Prucino Pereira. Ao invés de ajudar, esta comissão está atrapalhando, informa gente ligada ao processo e do ramo. E se continuar neste tom, tende a piorar, comer dinheiro público bom sem a contrapartida e transparência para a sociedade. Vamos continuar com o mico nas mãos.
O doente Hospital de Gaspar tende a piorar e pedir mais dinheiro para sobreviver. Nenhum relatório com números, consegue sensibilizar os nossos políticos que é preciso mudar, rápido e radicalmente em favor da população. Simples assim. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
O homem da meteorologia. O presidente da Câmara, Ciro André Quintino, MDB, sem assunto, na segunda-feira, apareceu nas redes sociais trombeteando o apocalipse do mau tempo que veio a partir da madrugada desta quarta-feira. Ciro, mais uma vez estava substituindo gente que entende do assunto, que possui credibilidade para tal, que está obrigado a isso e o jornalismo sério em meio a tantas fake news e alarmismo sobre tema tão sério.
Impressionante como os políticos são mal orientados, ou então pior: não se deixam orientar. Tudo isso são sinais. Eles trabalham contra eles próprios, e não se dão conta. Se fazem isso sem o poder de gestor da cidade que o querem ser – e é um direito legítimos -, o que farão quando estiverem numa posição de poder?
O mesmo Ciro André Quintino, MDB, que meteu o bico onde não possui nenhuma autoridade – meteorologia -, ao mesmo tempo deixou de exercer aquilo que é de sua exclusiva competência e autoridade: dar amplo conhecimento à cidade, cidadãos e cidadãs que botou para dentro da Câmara mais quatro Corollas novos.
Estranhamente não fez um vídeo sequer com esta alvíssara. Também não deu um pio até hoje sobre os segredos da CPI da Pizza com sabor “Desconheço”, como se a Câmara e a CPI fossem entidades secretas e não pagas com dinheiro público, ambas tratando de assunto e dúvidas públicas como representante do povo. Da mesma forma, ainda está quieto e não tomou providências para recolocar no ar no site da Câmara, o vídeo sobre a audiência pública que dá conta à cidade das metas fiscais do 2º quadrimestre deste ano.
Como se vê, o político precisa de desgraça – ou assuntos aleatórios, viagens a Brasília e Florianópolis, festas etc – para esconder os seus próprios pecados. Tomara que a chuva que está por caindo e promete não ser pouca, na previsão, não tenha a proporção dos erros dos políticos ao redor de nós.
E para continuar. Ciro André Quintino, MDB, também acionou a imprensa amiga para dizer que vai ter ônibus intermunicipal do Gaspar Alto até o Distrito do Garcia, em Blumenau.
E segundo ele, como cabo eleitoral que é, com ajuda do secretário de Infraestrutura e Mobilidade, sem tinta na caneta, o deputado Jerry Comper, MDB. Faltou dizer a data que isto acontecerá. Mais, do que isso: faltou dizer quando isso acontecerá no bairro Bela Vista. No Gaspar Alto é fácil arrumar a situação: não há ninguém explorando aquela linha intermunicipal deficitária.
No Bela Vista, tem a Verde Vale e que até está disposta, desde que seja compensada.
Sinais das eleições do conselho Tutelar de Gaspar, além atraso e do vexame de concentrar tudo num local só, sem urna eletrônica e a contagem para pouco mais de cinco mil votos dados a 14 candidatos demorar seis horas. Um é a reeleição de parte deles e que pode refletir a eficiência do trabalho. A outra, como tudo foi politizado, é de que há um certo controle do poder de plantão.
A candidata preferencial do PT, Mari Inês Testoni Theiss, por um voto, não conseguiu a reeleição. Márcio Sansão, o mais votado, desligou-se do PSDB e colocou-se prudentemente a salvo do escândalo patrocinado pelo presidente Jorge Luiz Prucino Pereira. Está se filiando ao PP. A candidata apoiada pelo que se ensaia candidato pelo PL, Rodrigo Boeing Althoff, ficou mal na foto. E a que mereceu o apoio de Oberdan Barni, Republicanos, ficou entre as cinco. Então…
Ana Karina Schramm Matuchaki, que já foi secretária adjunta da Fazenda e Gestão Administrativa de Gaspar, e pelos critérios dos que estão enrolados nos números não servia, agora é secretária de Fazenda e Administração de Indaial, do prefeito André Moser e que acaba de se filiar do PL, em solenidade com Jair Messias Bolsonaro e Jorginho Melo. E propagou isso como um troféu aos daqui, depois de ser diretora geral da secretaria de Fazenda de Blumenau. Ela é uma operacional.
Como se vê, competência não combina muito bem com a administração de Kleber Edson Wan Dall, MDB e Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, ou PP, talvez. Karina deveria tirar do seu currículo que foi presidente da Comissão Interventora do Hospital de Gaspar. Não pega bem. Ou então dizer porque saiu de lá também.
A privatização e a greve I. Qual a diferença entre o governador Jorginho Melo, PL, e o de São Paulo Tarcísio Gomes de Freitas, Republicanos? Enquanto o catarinense está preocupado em engordar a qualquer preço o PL, criar despesas permanentes nos pequenos municípios e atender pleitos de servidores que descobriram como fungar no seu cangote, o paulista está preocupado com o futuro e como estruturar economicamente o maior estado do país para ele ainda ser viável e competitivo.
A privatização e a greve II. Lá Tarcísio acaba de enfrentar os sindicatos – os quais se reorganizam com a volta das cobranças absurdas contra os trabalhadores – o PSOL, o PT, e a esquerda do atraso e não arredou um milímetro na disposição de privatizar a Sabesp – a nossa Casan daqui -, linhas de trens e metrôs para colocar este dinheiro em desenvolvimento, educação e saúde, obrigações do estado com o cidadão.
A privatização e a greve III. Aqui, Jorginho, que de liberal não tem nada, prefere passar vergonha com uma Casan cabide de emprego, descapitalizadíssima, reconhecidamente incapaz de avançar no seu core business, chegando ao ponto de que ainda faz reservatórios novos podres gerando mais prejuízos à empresa e as comunidades, do que privatizá-la para, por agência reguladora, ela torne Santa Catarina e que é um polo turístico diversificado, também referência em saneamento e balneabilidade para segurança desse mesmo turismo.
A privatização e a greve IV. Igualmente acontece aqui em Santa Catarina com a Celesc, onde o governo a quer pública. A diferença também está em comportamento. Enquanto aqui, os servidores públicos e sindicatos colocaram Jorginho na parede e ele disse com todas as letras que nem está pensando na privatização, Tarcísio deixou claro, que vai fazê-la em discussão aberta, sob risco de desgastes diante dos protestos.
É por isso e outras deste pensamento torto, que o porto de Itajaí, preferiu ser público e municipalizado está parado há quase dois anos gerando um prejuízo em receitas para a prefeitura de Itajaí de mais de 15 milhões. E precisava disso. O prefeito de lá, o médico Volney Morastoni, MDB, é nascido no PT e isso diz muito.
Enquanto o porto de Navegantes, privatizado, do na outra margem do Rio Itajaí Açú, defronte ao quase fantasma porto de Itajaí, nada de braçadas. Se não fosse ele, além da importância estratégica na movimentação de containers, Santa Catarina teria perdido também receitas que ele gera o estado, e vejam só, para a prefeitura de Navegantes. Políticos pitocos.
O Hospital de Gaspar está na UTI. Nada é tão ruim que não possa piorar. Os técnicos de enfermagem pararam as atividades e foram cobrar da direção do Hospital sob intervenção municipal, o piso da categoria.
Fogo no parquinho. As coisas não andam bem na bancada do PL. Edilson Massocco desancou o deputado Ivan Naatz na briga pela liderança do governo. Ivan vai assumir por 30 dias no lugar do Massocco. O discurso duro e que corre as redes sociais, Massocco mostrou fragilidades de Ivan como ausências em votações cruciais, viagens internacionais e gastos em excesso de Ivan, segundo o Massoco, em diárias e viagens. Entende-se a razão pela qual o governador Jorginho Melo, PL, já não tem Ivan como deputado. E arruma de tudo para tê-lo fora da Assembleia.
Quem também não está contente como o PL está conduzindo os passos por aqui é o ativista de direita, Demetrius Wolff. É que ele está vendo o partido mais próximo do MDB, PP e PSD do que exatamente na oposição ao que imaginava. E para piorar, o PT que usava as suas críticas ao governo de plantão, agora passou a desacreditá-lo. Este divórcio, ao menos era coisa certa.
É falsa, e facilmente comprovada por documentos, que o presidente do Samae, Jean Alexandre dos Santos, MDB, quando secretário do Planejamento Territorial, trabalhou em parceria com o ex-fiscal do meio ambiente Pablo Adriano Ribeiro da Costa da Silva, como alegam alguns empresários afetados por suas decisões. É uma guerra. As versões se desmancham diante daquilo que o fiscal documentou, se protege e serve às autoridades
. Ainda bem. Acorda, Gaspar!
10 comentários em “EM OITO MESES GASPAR BOTOU 32,29% DO ORÇAMENTO EM SAÚDE. A OBRIGATORIEDADE ERA APENAS DE 15%. A PRECARIEDADE DESTA ÁREA MOSTRA O QUANTO O GOVERNO DE KLEBER E MARCELO ERROU E DESPERDIÇOU”
A GUINADA DE PACHECO, por Malu Gaspar, no jornal O Globo
Davi Alcolumbre (União-AP) deve ter batido algum recorde ao ler e aprovar em 40 segundos, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a emenda que limita o poder dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de proferir decisões monocráticas. O texto, que ainda precisa ser submetido ao plenário, proíbe as liminares sobre assuntos de interesse coletivo ou que anulem atos dos presidentes da República e do Parlamento.
Se não foi campeão de velocidade, o avanço a jato dessa emenda, que já tinha sido rejeitada em 2019, estabeleceu um novo patamar de tensão entre duas instituições que até outro dia viviam em harmonia.
Numa guinada que muitos ainda tentam explicar, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que antes matava no peito até pedidos de impeachment de ministros, tornou-se algoz do Supremo.
Nas últimas semanas, a Casa aprovou uma lei estabelecendo que só poderão ser demarcadas como terras indígenas as ocupadas antes da Constituição de 1988, dias depois de o STF deliberar que essa tese é inconstitucional.
Também botou para tramitar uma emenda do próprio Pacheco que torna crime todo porte de drogas, quando o Supremo já contava cinco votos contra um pela descriminalização da maconha para consumo pessoal em pequenas quantidades.
Na segunda-feira, Pacheco prometeu ainda que colocaria em discussão textos que limitam os mandatos dos ministros e definem uma idade mínima para assumir vaga na Corte.
A reação do outro lado da Praça dos Três Poderes veio rápido. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, disse que “respeita, mas não concorda”. “O Supremo foi a instituição que melhor serviu à democracia e portanto não é hora de mexer (com isso)”.
O decano Gilmar Mendes foi ao ex-Twitter dizer que “a proposta se fará acompanhar pelo loteamento das vagas em proveito de certos órgãos” e que transforma o Supremo em “agência reguladora desvirtuada”.
“Após vivenciarmos uma tentativa de golpe de Estado, por que os pensamentos supostamente reformistas se dirigem apenas ao Supremo?”, perguntou Gilmar.
No subtexto dessas declarações está a pergunta que não quer calar em Brasília: por que isso agora?
Aliados de Pacheco dizem que ele se sentiu ultrajado ao ver que, depois de anos “segurando a barra do Supremo”, a ministra Rosa Weber decidiu colocar em pauta todos os temas de uma só vez antes de se aposentar, atiçando o bolsonarismo.
“Em um mês, ela jogou fora o esforço que ele fez sozinho durante anos para conter os radicais”, diz um aliado de Pacheco.
Para magistrados e governistas, a explicação é outra e tem a ver com a disputa pela presidência do Senado.
A eleição só acontece em fevereiro de 2025, mas Alcolumbre, parceiro de Pacheco e candidato, já está correndo atrás de alianças. E quer ao seu lado os bolsonaristas, que deram 32 votos a Rogério Marinho (PL-RN) em 2023. É uma força relevante para quem precisa de ao menos 41 votos para ganhar — mais ainda quando se trabalha no modus operandi de “criar dificuldade para vender facilidade”.
Afinal, manobrar os votos da bancada conservadora contra o governo Lula pode ser conveniente para outras querelas — como a eventual nomeação ao Supremo de Flávio Dino, que vive às turras com a extrema direita.
“Davi já recebeu a lista de demandas dos bolsonaristas”, resume um personagem enfronhado nas articulações. “E nela está incluída a rejeição do Dino”.
Ninguém em Brasília acredita de verdade que o Senado barrará um candidato de Lula ao STF. Mas, da última vez que Alcolumbre resolveu tumultuar a vida de um “supremável”, André Mendonça, foram 141 dias de espera e chantagem nos bastidores.
Na época, Alcolumbre queria que Bolsonaro trocasse Mendonça por Augusto Aras, mas foi derrotado pela mobilização dos evangélicos. Agora, sonha em ver Aras reconduzido à PGR. Lula já disse que não há chance, mas Alcolumbre é tinhoso. Sabe que, mesmo que não leve o que quer, alguma vantagem vai tirar.
O irônico é tudo isso estar acontecendo sob um governo de esquerda, eleito só porque o Supremo venceu a batalha contra o negacionismo e o golpismo. Mais irônico ainda é o bolsonarismo, embora derrotado nas urnas e desmoralizado pela selvageria do 8 de Janeiro, parecer estar se fortalecendo a partir da briga.
Talvez seja justamente por ter vencido a batalha que o tribunal está na mira. Não só da direita, mas também da esquerda, o que mais se ouve é que os supremos, vitaminados, passaram a agir como quem se julga acima da lei.
Está aí uma discussão legítima e bem-vinda. Não é mesmo saudável uma democracia que dependa tanto da Suprema Corte, em que ministros decidem na canetada questões centrais para a coletividade ou protelam decisões indefinidamente com pedidos de vista. O problema é um debate tão necessário ocorrer em meio a ruídos que nada têm a ver com o cerne da questão — e sob a sombra de conveniências políticas e interesses inconfessáveis.
O JOGO DA SUPREMA CORTE, por William Waack, no jornal O Estado de S. Paulo
Discreta e calada, a ex-presidente do STF Rosa Weber também não resistiu à ambição de colocar seu nome na História. Vem, em boa parte, desse impulso individual a decisão de pautar o voto do aborto no Supremo, levando a severas consequências políticas.
As deliberações do STF sobre aborto, marco temporal e drogas (entre outras) expuseram um conflito profundo entre os Poderes, especialmente entre Judiciário e Legislativo. Há dois níveis entrelaçados nessa disputa.
O nível “imediato” é o da reiterada acusação, por parte do Congresso, de que o STF extrapola suas funções e está “legislando” em matérias de competência dos parlamentares. As ameaças de restringir mandatos dos ministros do
STF e alterar suas decisões no Congresso são o “troco” dado no dia a dia político.
O nível “profundo” é muito abrangente e se agravou recentemente. Envolve o próprio papel do STF na busca de realizar “visões” do “bom” ou do “melhor” para a sociedade – pautas ditas “progressistas”, por exemplo, empacadas no Legislativo ou no Executivo.
O problema vai além do ativismo judicial, pois se trata do papel político em sentido amplo do STF e seus integrantes (além do óbvio jogo político em sentido estrito no qual estão envolvidos até o pescoço). O Supremo veio deixando de ser apenas a instância que interpreta o que é ou não constitucional e passou a estipular qual a regulação adequada para diversos temas.
Ocorre que o STF não “pensa” hoje como se fosse uma cabeça. Nesse sentido, sofreu bastante com recentes presidências. A atual pretende recuperar o que o ministro Luís Roberto Barroso chama de “consensos nacionais”. No fundo, implica assumir que, na falta de elites no sistema políticopartidário capazes de conduzir qualquer agenda abrangente, caberia ao STF essa missão.
O que torna a situação atual muito delicada é o fato de que esses dois níveis mencionados (o da “politicagem” e o do confronto entre visões políticas na sociedade) se confundem na atuação de um Executivo que enxerga no STF um “aliado” decisivo em questões que vão da economia à pauta de costumes. Em outras palavras, o que forças políticas chamadas de esquerda não conseguem no Congresso vão buscar no Supremo, pois ali se sentem “acolhidas”.
Há uma noção entre integrantes do STF de que no contexto da disputa entre os Poderes e das profundas divisões sociais o recomendável no momento seria prudência e “baixar a bola”. E que a Corte não pode ser percebida pelo público, embora o seja, como espécie de braço auxiliar de uma corrente política. O problema é como combinar esse jogo.
DE CALÇAS CURTAS, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Já se sabia que era circunstancial o alívio no clima econômico observado no país em meados deste ano. Agora que os humores voltaram a piorar, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encontra em posição de fragilidade devido aos maus resultados e perspectivas das contas do Orçamento.
Cerca de três meses atrás, havia uma confluência de notícias positivas —o Produto Interno Bruto crescera acima do esperado, a inflação dava sinais de queda, avançava no Congresso a nova regra fiscal e agências de risco faziam observações favoráveis ao país.
Havia certa calmaria no cenário internacional e, mais importante, por aqui saíam de cena os piores temores quanto às inclinações gastadoras e intervencionistas da gestão petista. O alívio de então se refletiu nas cotações do dólar, que caíram para pouco mais de R$ 4,70.
De lá para cá, no entanto, o governo Lula foi incapaz de apresentar medidas que elevassem a credibilidade das finanças públicas —e, em particular, da meta oficial de eliminar o déficit orçamentário já no próximo ano.
Pelo contrário, o desempenho da arrecadação de impostos, os resultados do Tesouro Nacional e a proposta de Orçamento para 2024 deram mais razões para o ceticismo.
A receita tributária não acompanhou o desempenho surpreendente do PIB, e o déficit primário (que exclui gastos com juros) de janeiro a agosto, de R$ 104,6 bilhões, é o maior para um início de mandato desde o Plano Real.
O projeto de lei orçamentária levantou questionamentos em série sobre o esperado déficit zero, que se baseia não apenas em projetos em tramitação difícil no Congresso como em projeções que parecem excessivamente otimistas.
As estimativas de analistas para o rombo federal no próximo ano rondam os R$ 80 bilhões —o que seria um fracasso retumbante já no primeiro ano do novo regime fiscal. Não por acaso, espera-se crescimento contínuo da dívida pública como proporção do PIB.
É nessa situação que o país enfrenta um cenário global que se tornou mais incerto, com temores de juros mais altos nos Estados Unidos, encarecimento do petróleo e desaceleração da economia da China. No termômetro cambial, a cotação do dólar subiu a R$ 5,15.
Não se trata de dar importância demasiada a oscilações do mercado financeiro. Fica evidente, porém, que a economia brasileira estará mais vulnerável a períodos de adversidade enquanto o governo Lula relutar no inevitável enfrentamento dos gastos públicos.
Dele dependem o controle da inflação, o alcance do corte dos juros do Banco Central, o crescimento da economia e, por extensão, a redução duradoura da pobreza.
ATAQUE DO CONGRESSO AO STF É PARTE DO LIQUIDIFICADOR HISTÓRICO DO BRASIL RECENTE, por Vinicius Torres Freire, no jornal Folha de S. Paulo
O motivo imediato da ofensiva do Congresso contra o Supremo foi a decisão da corte de dar a indígenas mais direitos sobre as terras que ocuparam e de tratar de aborto e maconha. O ataque é uma das tantas críticas a uma década de exorbitâncias do STF —críticas de interesse, mérito e qualidade variados.
Caso a ofensiva vingue, será outro dos rearranjos, reformas e depredações do sacolejo institucional e social incessante que ocorre desde 2013, na década da depressão econômica.
Não dá para dizer que o Brasil foi virado do avesso. A casca grossa da desigualdade, da violência e da incapacidade de crescer continua evidente. Depois de tantos transplantes e implantes, o país parece um Frankenstein que passou por harmonização facial, com alguns órgãos novos. É muita mudança para resultados até agora sinistros ou sem efeito maior nas condições de vida e na civilização.
Houve muita mudança institucional na economia, várias que tocam na medula de relações sociais, a maior parte projetada sob Michel Temer (2016-18), pela coalizão que depôs Dilma Rousseff. Quase sem resistência, mudaram a Previdência (2019), o trabalho (2017) e o Banco Central (2021). Pode passar a tributária. Menos visíveis, mudaram leis de licitações, crédito, estatais, subsídios de juros (que permitiram um mercado de capitais maior) etc.
Houve mais privatização: saneamento, gás, Eletrobras. Sobra pouca coisa maior para vender. O capital mudou de cara. A lista nova da grande empresa é dominada por agro, commodities em geral e pelo ruído de fundo da finança.
Apesar do bochicho recente, sindicatos e centrais quase desapareceram. Há precarização do trabalho e desprezo dos novos trabalhadores pelo sistema velhusco de proteção social.
O teto de gastos de Temer (2016) e o teto móvel de Lula 3 são mais sintoma do que reforma, sintoma de que o tamanho e a organização do gasto público chegaram a uma situação crítica e de impasse. Dentro da estrutura e do tamanho do orçamento e de possibilidades políticas e econômicas de aumento de impostos, não há como fazer mais (ou melhor) política social nem investimento público. É imobilismo maior e crítico entre as mudanças.
O Congresso avança sobre poderes restantes de gasto do Executivo sem assumir responsabilidade de governo, o que também depreda o que sobra do Orçamento. Controla meios de financiar partidos e caciques do centrão ora dominante (fundões partidários, eleitorais e emendas).
Ocioso mencionar o colapso do sistema partidário de 1994-2014. Além da organização da extrema direita, difunde-se uma cultura alucinada sobre fatos da política, da sociedade e da história, o que se chama de “negacionismo”, mas vai bem além disso.
A política passou mais e mais pelo sistema de Justiça. Além do exemplo óbvio da Lava Jato e sua tentativa de acabar com Lula e o PT, vide agora, em escala menor, o STF como respiro para o programa de uma esquerda derrotada no Congresso.
Forças que fermentavam desde os anos 1970, como periferia e favelas largadas à própria sorte e o interior rural, se organizaram com poder maior por meio da política dos evangélicos e do partido do agronegócio. Outro efeito da sedimentação da desgraça social foi a organização nacional e profissional do crime, que se estabilizou, “institucionalizou”, na década passada.
Celular, influencers e fenômenos pop autônomos das redes definem o debate cultural relevante. É universal, claro, mas o impacto é maior em um país que não passou pela difusão da cultura letrada e da escola.
É um sumário limitado de um tempo em que o país é batido em um liquidificador histórico. É grande, intenso, mas difícil dizer que tenha direção, sentido ou, pior, resultante benigna.
LULA ATUOU EM OPERAÇÃO ANTI-MILEI, por Rosa Maria, no jornal O Estado de S. Paulo
Era uma sexta-feira do fim de agosto quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que tinha urgência em falar com Simone Tebet. A ministra do Planejamento não estava em Brasília, mas foi logo contatada por telefone. A pressa de Lula não era à toa: o Brasil precisava autorizar, ainda naquele mês, uma operação para que o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) concedesse empréstimo de US$ 1 bilhão à Argentina.
Com participação de 37,3% no capital do CAF, batizado em seu nascimento como Comunidade Andina de Fomento, o Brasil tem o maior peso nas decisões do banco. Em situação econômica dramática, com inflação de mais de 100% ao ano e sem dólares na praça, a Argentina necessitava do empréstimo ponte para o FMI liberar um desembolso de US$ 7,5 bilhões.
Tebet é a governadora do Brasil no CAF e por isso a operação de socorro precisava do seu aval. A rigor, o país vizinho não poderia mais ter acesso aos recursos porque já havia esgotado o limite de crédito.
Lula, porém, entrou em cena e os países-membros do CAF aprovaram a transferência de US$ 1 bilhão diretamente para o FMI, em nome da Argentina.
Dos 21 países que compõem o CAF, somente o Peru votou contra. De lá para cá se passou um mês e hoje faltam menos de três semanas para a eleição que vai definir o sucessor de Alberto Fernández na Casa Rosada.
A possibilidade de vitória de Javier Milei, político visto como a versão piorada de Jair Bolsonaro, provoca cada vez mais pânico no Planalto.
Líder populista com um discurso antiestablishment, Milei prega a dolarização do país, a saída do Mercosul e a extinção do Banco Central. Auxiliares de Lula classificam a eventual ascensão do deputado argentino como um desastre. Tanto que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a dizer que “o Mercosul está em risco”.
Defensor do libertarianismo, Milei já insultou os dois principais parceiros comerciais da Argentina: chamou Lula de “socialista com vocação totalitária” e descreveu a China como “governo de assassino”.
O Planalto tem feito tudo para dar uma força ao ministro da
Economia, Sergio Massa, que disputa a cadeira de Fernández. Mas a briga está cada vez mais difícil para o peronista.
A eleição na Argentina é no próximo dia 22 e tudo indica que haverá segundo turno. Diante do cenário de incertezas, Lula decidiu partir para o “tudo ou nada”. A estratégia é ancorada por um diagnóstico pragmático: o possível triunfo de Milei ressuscita um polo de extrema direita na América Latina. Perto dessa hecatombe, a partilha de mais cargos com o Centrão virou apenas uma pimentinha nos olhos de Lula.
Não é só o Porto de Navegantes (privado) que humilha o outrora fantástico Porto de Itajaí (público). O Porto Itapoá (privado) movimentou 885.822 TEUs (Twenty-foot Equivalent Unit – unidade de contêiner de 20 pés) no ano de 2022, representando um crescimento de 14,28% em relação ao que foi movimentado pelo Terminal em 2021. Com isso, teve maior crescimento entre os cinco maiores terminais de contêineres do Brasil. (+em: https://www.portoitapoa.com/porto-itapoa-celebra-crescimento-em-2022-e-vislumbra-oportunidades-para-o-futuro/#:~:text=O%20Porto%20Itapo%C3%A1%20movimentou%20885.822,terminais%20de%20cont%C3%AAineres%20do%20Brasil.)
Respeitável público!
Pois é. Exemplos de sucesso, produtividade, competitividade, atualidade, agregado de tecnologia e geração de tributos p o poder público, abundam.
Estranho mesmo é a cabeça do atraso dos políticos e gestores públicos em relação à sua inserção no século 21
A conclusão, é a melhor linha de ser lida. O PT e a esquerda do atraso atraem os incautos, finge de amigos e quando no poder os larga no meio da rua e com rótulos. Ou alguém em sã consciência acha que Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito só com os votos do PT, da esquerda do atraso e lulistas, se não os que acreditaram em união nacional contra o exagerado egocentrismo da família B
Bolsonaro?
A ESTREMA DIREITA ESTÁ VIVÍSSIMA, por Mariliz Jorge Pereira, no jornal Folha de S. Paulo
Sem um presidente boquirroto reina a impressão de que o pior já passou. E não falo dos problemas do país, que são muitos, mas da iminente morte da democracia que nos rondou nos anos de distopia bolsonarista. Essa falsa calmaria, no entanto, pode ser apenas aquela que antecede tsunamis. Cientistas identificaram que em períodos entre 15 e 75 meses antes de grandes atividades sísmicas tudo parece estranhamente tranquilo, mas é o momento em que o estresse está se construindo nas falhas. Na política, uma dessas falhas é a esquerda achar que o jogo já foi jogado e relaxar.
O bolsonarismo se recolheu depois do 8 de Janeiro, parte porque seu líder maior se acovardou, abandonou o país e foi incapaz de entregar o golpe de Estado que prometia. Sem uma liderança, fica a impressão de que a extrema direita está desorganizada e talvez esteja como um bloco único. Mas há sinais de que continua a se movimentar, apesar do desmembramento do bolsonarismo. Se a ala intervencionista está desmoralizada, não se pode dizer o mesmo dos neoconservadores que jamais se desmobilizaram.
A eleição dos conselhos tutelares mostrou que as chamadas pautas de costumes alimentam essa militância. Igrejas evangélicas, políticos e influenciadores se mobilizaram para eleger representantes. O pastor Silas Malafaia, por exemplo, emplacou dez conselheiros no estado do Rio.
Não se trata apenas de uma tentativa de ocupação reacionária de um setor responsável por garantir direitos e proteção de menores de 18 anos –basta lembrar da tentativa de impedir o aborto legal de uma criança de 11 anos, vítima de estupro. Essa medição de forças é uma prévia das eleições municipais de 2024. Outro sinal importante de que a extrema direita está vivíssima é o domínio do uso das redes sociais, como mostra reportagem de Uirá Machado.
Enquanto isso, a esquerda continua sua cruzada para que todos falemos “todes” e para transformar aliados em cancelados.
A BATATA QUENTE DOS PRECATÓRIOS, por Zeina Latif, no jornal O Globo
No final de 2021, o governo Bolsonaro produziu uma “batata quente”. Trata-se da mudança na sistemática de pagamento de precatórios (despesas decorrentes de sentenças judiciais), por meio de uma emenda à Constituição, que postergou para 2027 parte importante dessas despesas incorridas entre 2022 e 2026.
A motivação foi o aumento expressivo do valor a ser saldado em 2022, chegando a R$ 89 bilhões ante R$ 54,9 bilhões em 2021, o que, pela regra do teto, exigiria importante corte de despesas, justamente em um ano eleitoral.
A moratória unilateral foi bastante criticada, e a medida foi apelidada de PEC do Calote. Os mercados reagiram negativamente, com queda da Bolsa e dólar acima de R$ 5,50.
O passivo acumulado entre 2022 e 2026 poderá chegar a R$ 200 bilhões em 2027, conforme o Relatório de Projeções Fiscais de julho do Tesouro. O valor equivale a 1,4% do PIB, sendo um passivo oculto, não incorporado às estatísticas oficiais de endividamento público.
Somando-se o valor devido em 2027, a cifra deverá chegar a R$ 250 bilhões, segundo o governo. Mantida a regra atual, o pagamento desse passivo deverá se submeter ao limite de despesas do arcabouço fiscal, comprimindo o espaço para as despesas discricionárias.
É meritório o esforço do Ministério da Fazenda em tratar desse passivo, desarmando a bomba a explodir em 2027, valendo o registro de que o PT votou contra a PEC dos Precatórios. A inação impactaria as expectativas dos agentes econômicos quanto à sustentação do regime fiscal e machucaria a própria credibilidade do ministro Haddad.
Isso sem contar o problema concreto de a batata quente cair no colo do próximo presidente, que poderá ser do PT. A omissão agora sairia caro.
Melhor seria se esse tema tivesse sido tratado na proposta do arcabouço fiscal ou antes disso, na PEC da Transição. É inevitável a dúvida sobre a motivação dessa omissão; talvez para se buscar posteriormente uma saída que não prejudicasse os planos de expansão de gastos do governo.
A Fazenda propõe quitar cerca de R$ 95 bilhões da fatura este ano (refere-se à soma do passivo acumulado em 2022 e 2024, por conta da PEC dos Precatórios), com abertura de crédito extraordinário, o que significa a despesa não estar sujeita aos limites do arcabouço fiscal. É uma proposta adequada.
O problema maior é propor contabilizar o pagamento da correção de valores pelo atraso no desembolso dos precatórios como despesa financeira, de forma permanente, o que implicaria não entrar no resultado primário.
Isso fere as boas práticas da gestão fiscal, bem como a credibilidade da equipe econômica. Existe ainda o efeito colateral de reduzir o incentivo para o governo evitar precatórios, já que esse pagamento deixaria de constranger o Orçamento.
A proposta da Fazenda vai além de saldar o passivo deixado pelo governo anterior, mas não de forma a enfrentar o problema, e sim o camuflando por meio de mudança em critério contábil, o que alimenta desconfianças.
A solução ideal seria cortar despesas para acomodar o pagamento de precatórios, a ser normalizado, e estabelecer boa governança para conter seu crescimento — especialistas apontam certo descuido do governo nessa frente.
É verdade que mesmo um governo reformista teria dificuldades para cortar despesas, pois cerca de 92% são obrigatórias e não há uma grande reforma que altere de modo expressivo a dinâmica dos gastos. Serão necessárias várias iniciativas, inclusive outra rodada de reforma da Previdência. Ainda que desafiador, é necessário haver esforço nessa direção, incluindo a contenção de gastos discricionários.
Mesmo o caminho de buscar saídas alternativas para lidar com o elevado volume de precatórios não dispensa o cuidado com medidas para minimizar perdas. Para isso, a transparência na gestão fiscal é pedra fundamental. E, como não poderia deixar de ser, é necessário trazer a agenda de redução de despesas.
A experiência do passado deixa lições. A credibilidade de Paulo Guedes foi abalada por ter furado o teto, sem apresentar qualquer reforma estrutural para conter gastos obrigatórios. O abalo não foi maior porque a arrecadação batia recordes, inflada pela alta de commodities e pelo aumento da inflação no atacado.
O argumento de que os fins (suspender a moratória) justificam os meios (mudar as regras contábeis) não é adequado. Precisa haver esforço fiscal.
A PAROLAGEM CONTRA A CRIMINALIDADE, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Um salão do Palácio do Planalto ganhou o apelido de Cabo Canaveral, numa referência à base de lançamento de foguetes dos Estados Unidos. De lá, os governos brasileiros lançam planos e programas para resolver problemas, e de lá o ministro Flávio Dino lançou o Enfoc, ou Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas. Com um toque de atualidade, o Enfoc tem eixos, e são cinco, todos genéricos. Há dias, o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Ricardo Cappelli, disse que “não existe bala de prata” para a questão da segurança pública brasileira. Santas palavras.
Há décadas a segurança dos cidadãos é tratada com uma mistura de onipotência, empulhação e demofobia. Ora com a intervenção militar no Rio; ora com o negacionismo de Rui Costa, chefe da Casa Civil de Lula e ex-governador da Bahia; ora com a solidariedade do governador paulista Tarcísio de Freitas diante da matança ocorrida no Guarujá. Rui Costa e Tarcísio de Freitas estão em polos opostos da política nacional, mas falam dialetos semelhantes quando tratam da segurança pública e, sobretudo, da ação de suas polícias militares.
A ação do crime organizado na Amazônia, no Nordeste ou no Rio de Janeiro e em São Paulo tem a mesma raiz, com folhagens diferentes. Enfocs ou coisas do gênero não resolverão coisa nenhuma. Geralmente, resultam na compra de equipamentos futurísticos. Quando dá tudo errado, o dinheiro da Viúva é colocado em equipamentos que refrescam a vida de fornecedores. Exemplo disso está nas câmeras individuais para ser usadas por policiais militares de São Paulo. Foram compradas, mas não são usadas em operações que resultam em chacinas.
A bandidagem é apenas o galho mais cruel e vistoso desse problema. Há outros, como a secular autonomia das polícias militares, que, em alguns estados, avançam sobre as atribuições da Polícia Civil. No Rio, até a Polícia Rodoviária Federal se mete em matanças.
A balbúrdia policial dos estados ocorre numa época em que a Polícia Federal mantém um razoável nível de profissionalismo e neutralidade.
Pelo andar da carruagem, a segurança pública será um tema prioritário na agenda política, e a situação da Bahia, com 16 anos de governos petistas, indica que o rei está de tanga. Não só pelos maus números, mas também pela arrogância.
Ricardo Cappelli teve atuação exuberante como interventor na segurança de Brasília depois do 8 de Janeiro. Quando ele diz que não há bala de prata para esse problema, sugere que alguém no governo está disposto a calçar as sandálias da humildade.
Depois do 8 de Janeiro, numa demonstração da cegueira oficial, o governo chegou a lançar o balão da criação de uma Guarda Nacional para guarnecer a capital. Se cinco polícias e três forças armadas não funcionam, cria-se mais uma unidade. Felizmente, a ideia foi esquecida.
Se os governos abandonarem a prepotência e o lançamento de programas de nome comprido, começando a fazer o dever de casa e valorizando bons exemplos nas polícias, a caminhada será longa e áspera, mas levará a algum lugar.
Uma coisa é certa: repetir o que deu errado achando que, desta vez, a coisa irá bem é apenas uma forma de autoengano, se não for pura empulhação.