Era de se esperar que eu comentasse hoje à saída, que anunciei aqui, há dias, do vereador Francisco Hostins Júnior, MDB, como titular da secretaria da Saúde. Mais um. A média beira a sete meses de duração.
Não vou comentar hoje. Darei tempo à imprensa, outra vez. Darei tempo para a grave denúncia feita ontem a noite na Câmara de Vereadores sobre a contaminação do ar da UTI que se improvisou durante a Covid. Isto pode ter levado a morte pacientes internados lá. A imprensa de Gaspar, ainda insiste, em artigos de hoje, em passar o pano em todo esses problemas. Eles escondem erros que precisam ser eliminados para o Hospital se tornar crível, confiável, transparente e referência para a sociedade. Simples assim. Ao contrário, e não se sabe qual o interesse, ou pura ingenuidade, está criando, ou sustentando, falsos heróis com nítida glamourização política. Impressionante!
A imprensa, acuada, ou temerosa, ou auto-censurada, não percebeu que ela própria é quem está perdendo a credibilidade, ao fingir que não sabe o que quase toda a cidade sabe via os aplicativos de mensagens. Eles carregam histórias, testemunhos, documentos, fotos, áudios e filmes etc. Tristeza! Talvez, porque nunca tenham passado por esta dúvida que pode significar a vida ou a morte. A imprensa espera pelos órgãos de fiscalização. Estes estão inertes. E o poder de plantão se orgulha de ter o corpo fechado. Orgulho perigoso, bobo e até mortal como se começa a se desconfiar.
Volto ao tema do comentário desta quarta-feira.
A notícia veio nesta segunda-feira, depois de quase duas semanas de “férias” de Hostins. Elas foram feitas para reflexão e um tempo para se voltar atrás ou no passo adiante que o ex-secretário deu. No fundo, este é o retrato da Saúde Pública em Gaspar. É mais um momento de um governo que navegando, sem rumo, não possui um porto definido para chegar e aproveitar os ventos que sopram na sua vela, mesmo sob tormentas. “É na tempestade que se conhece o verdadeiro comandante”, diz um velho adágio. Estamos conhecendo-o melhor, a cada dia. Então, tudo isso será tema de outro comentário.
Antes virar esta página e para compreender melhor este assunto de Gaspar, tomemos esta manchete da semana passada do portal UOL e replicada no jornal do grupo, a Folha de S.Paulo: “Por que o Ministério da Saúde é cobiçado pelo centrão de Lira.” E a resposta logo aparece nos três primeiros parágrafos. Os senadores e deputados federais não escondem nada. A cara de pau é explícita. A começar por, supostamente, eles não terem nada contra a titular da pasta Nísia Trindade, a não ser que, ela não é da turma deles, não é política e parece que não está muito aberta a concessões aos interesses eleitorais políticos, inclusive os do PT.
Então qual é cerne deste balacobado, segundo estes políticos que querem o controle do Ministério da Saúde, no mesmo artigo disponível no portal do UOL?
Primeiro, o Ministério da Saúde é uma das pastas com maior orçamento para se investir nas cidades, ou de outra forma, fazer política paroquial, com a dor, doença, esperança e a morte.
Segundo. Os aportes da Saúde têm capilaridade, ou seja, podem ser direcionados para diferentes estados e municípios, principalmente os com mais fragilidade na transparência e controle. São em torno de cinco mil possibilidades.
E em terceiro, como saúde é uma demanda importante da população, também “investimentos” em hospitais, remédios e programas de saúde são considerados excelentes materiais para propaganda em ano de eleições. Entenderam? Mais claro impossível. Primeiro a propaganda esperançosa e os votos; depois a ciência, a saúde e a cura como resultado para a população, normalmente, a mais carente, e que fica nas filas e nem mais se lembra dos discursos dos políticos e os votos que transferiram para eles em funções dos milagres que prometeram.
Isto sem falar nas emendas parlamentares e ainda as obscuras emendas de relator – que ganhou outra forma. Elas possuem como foco a Saúde Pública nos estados e principalmente os municípios.
Ninguém falando na Saúde como um meio de salvar pessoas doentes, mas de pessoas no poder e que querem continuar no poder. Absurda inversão dos líderes políticos e sociais. Mansos, pagadores de pesados impostos que sustentam toda esta trama e drama.
Em Gaspar, nada disso foi diferente. É só olhar quem foi e quantos foram os secretários de Saúde e gestores do Hospital sob intervenção municipal. Bem como quem poderá substituir o próprio Hostins. Há uma briga na coligação. E não é coisa pouca. A qualificação técnica não foi o principal requisito para ocupar estas funções, muito menos a transparência disso tudo para a população, a que precisa e a que paga via os seus pesados impostos.
O Orçamento estourou, então entulhou-se de mais dinheiro para a “máquina” não parar. Quanto pior e sem controle, melhor. Parte-se para a emergência. É um processo vicioso, perverso e esperto. Os postinhos falharam. A Policlínica falhou. Sobrecarregado, o Pronto Atendimento do Hospital falhou. O próprio Hospital está numa crise de identidade, financeira e de credibilidade falhou e não sabe como sair daquilo que se afunda cada vez mais. E tudo isso, está sob questionamentos e dúvidas. E foram os políticos que armaram esta arapuca contra eles próprios. Estão se escapando, culpando e tentando calar os bisbilhoteiros, ou então, sem saída, demoram e dão explicações incompletas e das falhas à população aos poucos órgãos que lhes questionam.
Ao contrário do que engendram os políticos em Brasília para esta galinha dos ovos eleitorais, e não disfarçam isto, por aqui, até esta “galinha”, o governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, mas, talvez PP, estão perdendo os ovos. Será a cara saúde, que não chegou ao cidadão e cidadã, é a que os enforcará? Se até o então salvador da área, o que tinha o rótulo de bom gestor nesta área no governo de Pedro Celso Zuchi, PT, pulou fora é porque está dando tudo errado.
Onde começa o erro desta última cartada. É que o vereador e advogado não foi para lá com a única finalidade de resolver um problema grave e que se esconde e ao mesmo tempo prejudica a população. Ele foi ungido como candidato do mecanismo a prefeito, ou seja, igual quer o Centrão em Brasília. E Kleber, para salvar a si, já está tirou o pé do acelerador. Hostins foi engolido por duas realidades: a política na qual o seu MDB já não tem mais domínio e principalmente, por um governo – seu cabo eleitoral na ambição de ser prefeito – que não entendeu direito, depois de seis anos o que é planejamento e execução para resultados na área de Saúde e no governo como um todo. Muito menos, está preparado ou admitiu que há uma crise na Saúde local e que é preciso perder anéis, para salvar os dedos.
O MDB de Gaspar – sem lideranças raízes – entrou num beco sem saída. E não foi por falta de avisos, não de adversários ou deste escriba – sempre contestado -, mas da realidade. Foram amadores demais. E quem paga caro os desatinos dos políticos e suas tramas para se perpetuarem ou alcançarem o poder, são os mais vulneráveis nas suas dores, doenças, sofrimentos e esperanças. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
A possível ida do vice-prefeito, Marcelo de Souza Brick, que se elegeu pelo PSD, pulou para o quase inexistente Patriota, tem uma ficha assinada no PL com aval do deputado Ivan Naatz, PL, para o PP, vem causando mal-estar entre os próprios membros históricos do partido em Gaspar. A quem discorde frontalmente da articulação feita pelo mais longevo dos vereadores José Hilário Melato e o presidente do diretório gasparense, Luiz Carlos Spengler Filho.
Os argumentos vão desde à falta de identidade do vice-prefeito com a história do partido em Gaspar até, e principalmente, a desconfiança de que o político não seja confiável e que no poder, possa roer a corda nos acordos que estão sendo alinhavados neste momento e que permitiram Marcelo de Souza Brick voltar – depois de mais de um ano – a aparecer em público e se entender com o prefeito Kleber Edson Wan Dall.
A propaganda é a alma do negócio ou exposição das contradições. Nesta semana, o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, rumou com o vice para Florianópolis. Marcelo de Souza Brick, Patriota, ou PL, sei lá, quis mostrar que tem caminhos abertos por lá. E foram ao escritório catarinense do BRDE conversar com o diretor recém nomeado, o ex-prefeito de Blumenau, João Paulo Kleinubing. Na pauta, o financiamento do banco regional para bancar a infraestrutura e pavimentação da Rua Vidal Flávio Dias, no Belchior Baixo, Distrito do Belchior.
Boa. Este financiamento já está aprovado na Câmara há anos. Esta obra era uma promessa do prefeito quando ele era candidato e ganhou em 2016. É vital para o desenvolvimento do parque logístico e industrial daquela área. E por que não foi feito até agora? Por falta de prioridade e agora, porque a prefeitura está com a capacidade de endividamento no limite. Simples assim. Como estamos à beira de uma campanha, os políticos já armaram um palanque defronte os empresários de lá.
A notícia é esta: depois de anos Sandra Hostins deixou a Apae de Gaspar.
A notícia é esta: O Controlador Geral do município, Ernesto Hostin, está agora convocado a ir a Câmara explicar os seus papelinhos e a situação financeira da Saúde e do Hospital de Gaspar. Finalmente os vereadores da Bancada do Amém (MDB, PP, PDT, PSD e PSDB) e o governo entenderam que quem não deve, não teme. E que isto estava virando um problema contra o próprio governo e os vereadores. O requerimento foi do vereador Dionísio Luiz Bertoldi, PT.
5 comentários em “COMO UMA NOTÍCIA E UM DEBATE NACIONAL, ONDE O CENTRÃO QUER TOMAR POLITICAMENTE A SAÚDE DE UMA RECONHECIDA AUTORIDADE TÉCNICA, PODE EXPLICAR O QUE ACONTECE EM GASPAR?”
COM UEM, ENTÃO? por Willian Waack, no jornal O Estado de S. Paulo
Jair Bolsonaro caminha para a guilhotina da inelegibilidade. Se for cortada, sua cabeça ficará como um troféu a ser exibido por uma das bolhas do espectro político brasileiro e tratada como símbolo de martírio pela outra.
Num futuro museu da ciência política é provável que a cabeça cortada figure como exemplo de quem surfa uma onda cuja abrangência nunca entendeu, despreze os fundamentos de organização e conduta da ação política, ignore a importância de uma boa estratégia e confunde bravata com coragem.
Nunca ficou claro se Bolsonaro queria controlar as instituições que o limitavam ocupando-as “por dentro” ou tentando derrubá-las “por fora”. Acabou severamente tolhido por Judiciário e Legislativo. Iniciou o mandato dizendo que “não faria a política de sempre” e acabou totalmente embrulhado por ela.
Há certo consenso quanto ao fato de Bolsonaro ter se transformado num cabo eleitoral de Lula. Mas não se pode ignorar um fator emocional muito além do que sua figura possa ter servido de contraste em favor do adversário: foram a frieza e a ausência de solidariedade e empatia com o sofrimento de milhões de pessoas durante a pandemia.
As eleições que ele perdeu deixaram evidente o peso majoritário do que se possa chamar de “centro-direita” no eleitorado. O problema para essa larga fatia é o fato de que ela é dispersa e Bolsonaro nunca a liderou de forma abrangente. Para um contingente nutrido do setor conservador, Bolsonaro não é uma figura a ser cultuada – mas, sim, a ser esquecida.
Podem-se identificar agremiações partidárias “de direita”, mas não existe um partido dominante “da direita” (como existe o PT na esquerda). O que se poderia chamar de espectro amplo de “centro-direita” no Brasil ostenta convergências, mas não um conjunto coordenado de postulados e, menos ainda, uma proposta de atuação comum.
Num cenário desses a cabeça de Bolsonaro continuará tendo relevância para uma parcela ainda significativa do eleitorado, embora menor do que já foi. Líderes populistas são capazes de fazer sucessores quando estão no poder e dispõem de máquina partidária e estatal. Não é o caso de Bolsonaro, que não tem herdeiro sequer próximo da sua estatura política.
A ausência do nome dele como candidato obviamente abre um campo enorme para outros nomes, sobretudo entre alguns atuais governadores. É o caminho “natural” da política, que não tolera vácuos. E resolve um pedaço importante da grande tendência de centro-direita, que era como se livrar dele.
Permanece, porém, o dilema essencial: com quem, então?
JOGO DE COMPADRES, editorial no jornal Folha de S. Paulo
Sem surpresa, Cristiano Zanin Martins, o advogado pessoal de Lula, teve sua indicação para o Supremo Tribunal Federal confirmada pelo Senado Federal. O placar foi folgado, 58 a 18 —bastavam 41 votos.
Na sabatina, Zanin cumpriu o roteiro esperado. Estava calmo, foi claro e objetivo. Fez loas à democracia, à separação dos Poderes, à independência dos magistrados, às garantias fundamentais.
Não respondeu às perguntas mais específicas sobre temas que estão em pauta, afirmando que não poderia antecipar seu voto em caso de assumir uma vaga no STF.
Se o processo de confirmação foi tranquilo e politicamente bem costurado, seu significado institucional é dos mais lamentáveis. A indicação, afinal, só atende de forma precária ao requisito essencial exigido para o cargo e viola de forma flagrante um dos mais venerados princípios constitucionais aplicáveis à administração pública.
O requisito é o notório saber jurídico. Ninguém duvida de que Zanin seja um advogado correto. Mas há, ou, pelo menos, deveria haver, uma diferença entre competência para atuar no mercado advocatício e o saber de que fala a Constituição.
Zanin não detém títulos acadêmicos de destaque nem é autor de obra jurídica de relevo. Sua reputação deve-se principalmente ao fato de ter defendido Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Lava Jato. E, vale observar, suas teses sobre o caso vinham sendo derrotadas em todas as cortes até o vazamento de diálogos comprometedores envolvendo o ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR).
O princípio violado é o da impessoalidade. Como o próprio Lula reconheceu durante a campanha, é errado ocupar o STF com amigos.
O remédio institucional para tais moléstias se chama Senado Federal. Conforme o modelo aqui adodado, o presidente da República propõe o nome para a vaga no STF, mas ele só é efetivado se os senadores, após sabatina, o aprovarem.
Na prática, entretanto, rejeições têm probabilidade quase nula. Houve apenas cinco na história, e todas elas no longínquo 1894, sob o governo de Floriano Peixoto.
Há um problema de desenho. No Brasil, devido ao chamado foro especial, os senadores, ao decidirem se aprovam ou reprovam ministros do STF, estão escolhendo quem vai julgá-los caso enfrentem problemas com a lei —e ninguém quer correr o risco de indispor-se com seu juiz natural.
A consequência dessa atitude mais complacente é tornar o sistema muito pouco efetivo. Como o controle exercido pelo Senado é frágil, presidentes se sentem livres para indicar quem bem entenderem, mesmo que isso viole princípios fundamentais como a impessoalidade do poder público.
Os nossos políticos não nos representam, ou estão fazem o que sempre fizeram, sem preparo, fazem de conta que usufruem do status e da montanha de dinheiro do mandato pago com os nossos pesados impostos. Aliás, Santa Catarina está com déficit de senadores no Senado desde a última eleição. O carioca Jorge Seif Júnior, PL, está a serviço incondicional dos Bolsonaros. A suplente do senador e atual governador Jorginho Mello, PL, ex-esposa do falecido do blumenauense, mas político por Joinville, Luiz Henrique da Silveira, a brusquense Ivete Appel da Silveira, MDB, não sabe a que veio. Sumida, e quando aparecer está biruta de aeroporto. Sobrou Esperidião Amim Helou Filho, PP, que parece o único catarinense da Câmara Alta. E descata-se
ZANIN ESTAVA MAIS PREPARADO DO QUE OS SENADORES, editorial de O Globo
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), o advogado Cristiano Zanin passou sem sobressaltos pela sabatina na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado ontem antes de ser aprovado pelo plenário da casa com o placar folgado de 58 votos a 18. Perguntas e respostas seguiram o padrão morno das sabatinas de senadores. Tudo dentro do previsível. Mais uma vez perdeu-se a oportunidade de questionar de modo mais rigoroso um candidato à mais alta Corte.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) usou seu tempo para atacar o julgamento do pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) saudou Zanin pela indicação ao Tribunal de Contas. Mesmo entre os que tentaram acertar o alvo, houve perguntas descabidas. O senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), relator da indicação, perguntou a Zanin como se portaria diante de decisões monocráticas que perduram por muito tempo, prática encerrada para temas considerados urgentes.
Confirmando as expectativas, o senador Sergio Moro (União-PR) foi quem mais fez perguntas. Logo no começo, o ex-juiz da Operação Lava-Jato tentou negar o óbvio ao dizer que não havia nenhuma questão pessoal em suas indagações. Moro, que no auge chegou a ser cogitado para o Supremo, tinha diante de si justamente o advogado que obteve anulação de suas sentenças contra Lula. Era uma oportunidade de confrontar Zanin de modo robusto, com o argumento mais forte de quem se opunha à indicação: a proximidade de Lula. Despreparado, Moro a desperdiçou. Ao inquirir Zanin, citou desinformação coletada na internet e afirmou que ele era padrinho de casamento de Lula. Foi logo corrigido.
Felizmente, a sabatina não foi apenas circo. Zanin foi questionado sobre Lei das Estatais, liberdade de imprensa, foro privilegiado para autoridades, aborto, diferenças entre traficantes e usuários de drogas e marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Procurando fugir de polêmicas, abusou da estratégia de se negar a dar detalhes sobre o que pensa.
Sobre o foro privilegiado, disse que não deveria “analisar um julgamento que já ocorreu no Supremo Tribunal”. Noutro momento, driblou a questão sobre a Lei das Estatais afirmando que, se confirmado, teria de analisar o assunto. Em raros momentos foi pressionado de forma mais enfática. Tais momentos, porém, foram insuficientes para dar à sabatina o caráter necessário de confronto, de inquisição e exposição do candidato em todas as suas facetas e paradoxos, para que ele pudesse ser conhecido e avaliado pelo público. Zanin não enfrentou aquilo que defendia enfaticamente em seus casos da Lava-Jato: o contraditório.
Ele estava evidentemente mais preparado que seus inquisidores. Assegurou que não julgará processo em que tenha atuado como advogado no passado. Sobre suspeições, afirmou que terá de “avaliar o conteúdo do processo e aplicar o que diz a lei”. Ambas são posições sensatas. Por tudo o que declarou, a expectativa é que adote uma postura garantista quando chegar ao STF para ocupar a vaga deixada pela aposentadoria de Ricardo Lewandowski. Numa de suas respostas, Zanin afirmou que não estará subordinado “a quem quer que seja”. Que cumpra sua palavra.
TUDO AO SEU TEMPO, por Zeina Latif, no jornal O Globo
O nível de incertezas em relação ao cenário econômico se reduziu desde a eleição de Lula, após as muitas ameaças de retrocesso em avanços de governos passados. O céu não é de brigadeiro, longe disso, mas tensões foram aliviadas.
Até o cenário internacional desanuviou. Havia grande preocupação com a inflação elevada no mundo, temores de um longo ciclo de alta de juros pelo Fed e de recessão nos EUA, e posteriormente, a quebra de instituições financeiras causou sobressaltos. O quadro mudou.
O arcabouço fiscal, apesar de não convencer analistas quanto à volta dos superávits primários, reduziu o temor de descontrole das contas públicas, que fora alimentado pela PEC da transição, ao esticar em demasia o aumento de gastos.
Ao mesmo tempo, os Poderes contribuem para conter riscos. O Judiciário acena com decisões para elevar a arrecadação – algo não necessariamente bom para o ambiente de negócios –, enquanto o Congresso limita o retrocesso em relação às reformas aprovadas.
Há também a materialização de esforços do passado. Nos últimos anos, o comportamento do PIB tem surpreendido positivamente.
Há razões para acreditar que o potencial de crescimento do país aos poucos se recupera, impulsionado por acertos na política econômica desde 2016, principalmente as reformas estruturais. Não por acaso, as estimativas do mercado para o crescimento do PIB no longo prazo estão na casa de 2%, um avanço em relação ao passado recente.
A surpresa com o PIB do primeiro trimestre, ainda que puxado pela agropecuária, mostra uma maior resiliência da economia, o que abriu o caminho para a mudança de perspectiva da nota de crédito do país pela S&P.
Dos muitos indicadores avaliados pelas agências de rating, o crescimento econômico (e o PIB per capita) tem papel central, enquanto indicadores fiscais, ainda que muito importantes, não têm o enorme peso imaginado — tampouco o arcabouço fiscal tem as características para mudar o jogo.
Vale lembrar que o crescimento do PIB acaba favorecendo as contas públicas, pois contribui para o aumento da arrecadação e a redução de despesas, como as de seguro-desemprego ou aquelas associadas a serviços públicos que são substituídos pelo setor privado. Indiretamente, beneficia os indicadores medidos como proporção do PIB (déficit, dívida).
A menor percepção de risco por parte de investidores e o aumento do potencial de crescimento econômico são boas notícias para o BC, pois reduzem o risco inflacionário.
Já a inflação, seu recuo recente é mais do que bem-vindo. Ainda que o pior tivesse ficado para trás, com a descompressão no mercado global de commodities, havia razões para a cautela. Primeiro porque o repasse da desinflação no atacado ao consumidor ocorria de forma muito lenta, em um contexto de margens deprimidas no varejo, decorrentes de pressões de custo nos anos anteriores.
Segundo, a inflação de serviços estava muito teimosa, em meio a maiores reajustes salariais e medidas do governo que estimulam o consumo.
Terceiro, o comportamento da taxa de câmbio, descolado do que seria o esperado, refletia os ruídos da política e o risco de leniência fiscal. Tudo isso em um quadro de descolamento das expectativas de inflação em relação às metas, causado pelo governo, o que poderia intensificar o repasse de pressões de custos ao consumidor.
A perseverança do BC atenuou os riscos inflacionários, o que se reflete também na queda, ainda que modesta, das expectativas de inflação para o médio e longo prazo.
Abre-se, assim, a porta para o início do corte de juros. O comportamento da economia mostra que o remédio aplicado (juros) tem funcionado, considerado o tempo necessário para fazer efeito. E a redução das incertezas aumenta a confiança do BC nos modelos de projeção de inflação, que apontam para sua queda, dando mais segurança para uma reorientação da política monetária.
Quanto ao timing para iniciar o corte de juros, isso depende do julgamento do BC quanto a ser ou não adequado surpreender os mercados e iniciar o corte agora, sem ter feito sinalização para isso. Não dá para descartar surpresas. Seria uma forma de indicar sua confiança na estratégia de relaxamento, em meio a novos elementos no cenário, dentro e fora do país.
Mas o mais importante é saber quão longe irá o corte de juros, um jogo ainda a ser jogado. Dependerá das escolhas do governo, não do BC.
O GOVERNO LADRA CONTRA O BC, por Vinicius Torres Freire, no jornal Folha de S. Paulo
O presidente da República deve ter facilidades para demitir o presidente do Banco Central. Tal poder é tão mais justo quando se trata de Luiz Inácio Lula da Silva e de um presidente do BC nomeado por Jair Bolsonaro, que fica no cargo até 2024, se quiser, pois tem mandato legal.
É o que disse o ministro Rui Costa, da Casa Civil, em um almoço com parlamentares. A Selic e outras taxas de juros ainda estão nas alturas em parte por declarações como estas, de Costa ou de Lula.
O país “legitimou” um novo projeto econômico por meio da eleição de Lula, o que se sobrepõe à ideologia de uma pessoa, Roberto Campos, que preside o BC, segue o ministro.
Para começar, essa conversa revela que Costa tem escassa compreensão de como funciona o Banco Central. Além disso, sugere a primazia de políticas de governo sobre políticas de Estado (se muda o governo, tudo pode ser virado do avesso). Pode ser o caso, mas onde está a proposta de mudança institucional?
Até agora, o governo ladra, mas não morde, em parte porque a derrubada da autonomia do BC não vai passar no Congresso. Se passasse, qual o plano de reforma do BC? Apenas nomear um amigo, como Lula acaba de fazer no STF ou como diz que quer fazer na Eletrobras, por exemplo? Isso é República?
Sim, a política, o funcionamento e o grau de subordinação do BC a diretrizes do governo podem ser objeto de debate e mudança. Aliás, o governo já pode decidir, por exemplo, qual a meta de inflação ou como e quando a alcançar.
Desde a eleição, o governo apenas xinga o BC e sugere que vai mudar a meta de inflação. Essa conversa, além dos ataques de Lula à ideia de controle da dívida pública, provocou uma alta de juros no atacadão do mercado de dinheiro onde se definem as taxas de financiamento da dívida do governo, que são os pisos do custo do crédito em geral.
Foi apenas quando surgiu algum plano de contenção de gastos (“arcabouço fiscal”) e quando melhoraram algumas condições financeiras determinadas lá fora (como o dólar), por exemplo, que os juros no mercado voltaram ao nível de novembro, do “Lula Day”, baixa que ocorreu a partir de maio.
O ruído sobre a mudança (aumento) da meta de inflação ainda impede a queda mais rápida de expectativas e juros. Se o governo já tivesse dito que não vai mexer na meta, a ser decidida no final do mês, estaria ganhando dinheiro. Mas, com esse rumor ignaro tem dado dezenas de bilhões aos rentistas que diz execrar.
Quase ninguém no governo Lula entende os rudimentos do funcionamento do mercado financeiro.
Entende-se por lá, na verdade, que “tudo é político” ou politiqueiro, mesmo. Que preços, condições financeiras, investimento produtivo ou consumo se decidem por canetada, o que fica evidente na palermice vexatória desse programa “Mais Carros”. É a mentalidade de deputado decidindo o uso de emenda parlamentar ou ministros disputando a nomeação para uma superintendência da Codevasf no interior da Bahia.
Se o governo tem outra ideia além de nomear amigos do rei para os postos-chaves do Estado, qual é? Ainda que morra no Congresso, qual é a sua teoria monetária moderna, por assim dizer? Apenas baixar a Selic na marra, colocando um sultão amigo no BC, com outra “concepção ideológica”?
Então, o que o governo vai fazer com expectativas de inflação, juros futuros e dólar? São os indícios da disposição dos donos do dinheiro grosso a emprestar ao governo ou a manter seu dinheiro em reais. Em suma, o preço que cobram. Vai tabelar preços e juros, controlar saída de capital?
É bom dar um jeito de que os endinheirados cobrem menos. Mas qual é o plano de Lula 3 além dessas queixinhas desinformadas e contraproducentes?