A pergunta que se fazia ontem – quinta-feira – na cidade, era se o vice-prefeito Marcelo de Souza Brick tinha cumprido a promessa e se filiado ao PL, diante do silêncio e do evento que se anunciava com pompa para Florianópolis. Enquanto de manhã cedo o porta-voz do deputado Ivan Naatz, PL, de Blumenau, aqui em Gaspar descascava o atual presidente da Comissão Provisória, o engenheiro Rodrigo Boeing Althoff, e principalmente o integrante da comissão provisória local, Bernardo Leonardo Spengler Filho e que teria atuado para melar a filiação, ou a pompa, no início da tarde, o secretário desta mesma comissão, Márcio Cézar, e que virou o porta-voz do deputado na dissidência criada na Comissão Provisória do PL gasparense, informou diretamente ao blog de que Marcelo já tinha se filiado ao PL.
E com esta informação, Marcio Cézar também mudou o meu comentário desta sexta-feira e que já estava pronto. No sistema filiaweb da Justiça Eleitoral ainda não consta esta filiação do Marcelo. Então fiz três perguntas.
– Quando ele [Marcelo] assinou a ficha?”.
Márcio César foi taxativo: “oficialmente dia 14”, ou seja, terça-feira. Está escrito. E não bate com as informações que saíram mais tarde nas redes sociais do deputado de que tudo tinha se sacramentado ontem quinta-feira. Ai, ai, ai.
– Novamente escondido?”, observei a Márcio Cézar referindo-me à filiação em meados do ano passado quando Marcelo foi para o Patriota – ele estava no PSD. Naqueles dias descobriu-se a mudança duas semanas depois dela ter acontecido. O fato gerou tanta polêmica, quase complicou a candidatura de Marcelo a deputado estadual e que não deu em nada, porque o Patriota nem a legenda conseguiu para ter um deputado sequer na atual legislatura.
– Tudo às claras. Quem tinha que estar, estava presente“, respondeu-me Márcio Cezar sem nominar quem estava presente nesta filiação. “Lembra da história do remédio? Então, vamos curar o partido“, ou seja, tudo em Gaspar, o PL vai ser reformulado ao gosto do deputado Ivan, Marcelo, Gean e Márcio Cézar. E os incomodados que se acomodem ou se retirem. Agora é esperar para ver.
E ainda tentei:
– Mas esta filiação não seria ontem [ quarta-feira]?” Ao que Márcio Cézar respondeu: “nunca passamos uma data oficial”. Não é bem assim: é só acessar as redes sociais e ver que se tinha a quarta-feira como a data que marcaria, com grande festa e pompa, a entrada do Marcelo no PL – agora se sabe que de forma teatral, pois já estava oficialmente filiado, segundo Márcio Cézar. E lá testemunhando, estariam inclusive figurões do partido, incluindo o governador.
Não vou repetir aos meus leitores e leitoras o que já escrevi tantas vezes sobre as espertezas e erros que o político Marcelo, o que até já inverteu o seu próprio sobrenome original. Cansativo. Entretanto, o anúncio da ida dele para o PL sem o conhecimento da Comissão Provisória de Gaspar, tudo tratada lá em Brasília, bem como o providencial aborto da festa pública porque ninguém quis se associar a um possível engano, confronto e a confirmação da filiação feita novamente no escurinho dos bastidores da política, mostram uma repetida sucessão de equívocos e que podem não terminar bem. Ainda mais, em tempo de caça a políticos que querem se dar bem a qualquer custo.
E por quê? Porque em nenhum momento neste jogo de nomes, siglas e poder estão inclusos a cidade, seu futuro e mudanças. E não se deve esquecer que Marcelo é parte deste problema. Mesmo alijado, eles está bem quietinho numa cumplicidade singular. Parece mais uma jogatina de poder e humilhação, entre os mesmos e gente que de uma hora para a outra se achou dona dos votos de Gaspar. Tanto que substituiu a pompa de um churrasco que o governador Jorginho Mello fez na Casa d’Agronômica, em Florianópolis, na quarta-feira a noite. Nele estavam todos os secretários e a grande parte dos deputados estaduais.
O fato por si só é revelador de como o político Marcelo ficou refém de suas jogadas e um mico nas mãos de jogadores profissionais que transitam neste ambiente em Gaspar, no Vale do Itajaí, Florianópolis e até Brasília. Na foto que abre o artigo, Ivan (à esquerda) e Marcelo (à direita) acertam os ponteiros há um mês com o deputado sulista Daniel Freitas, PL, no gabinete da Câmara Federal. Gaspar tornou-se um mero detalhe. Apostou-se alto. Agora é pagar para ver quem estava mesmo blefando
Perderam a autonomia do PL de Gaspar que ameaçava debandar em massa, o presidente da Comissão Provisória do PL de Gaspar, engenheiro Rodrigo Boeing Althoff, bem como o membro da Comissão daqui e acusado de estar metido na trama em trazer o vice-prefeito para o PL, Bernardo Leonardo Spengler Filho. Ele foi lá na capital com o Rodrigo dizer aos que ele se relaciona na família do governador de que ainda não era hora para confusões. Nesta parada também esteve como o deputado Maurício Eskudlark, PL. Ele trabalhou para colocar água fria nesta fervura dentro do PL estadual.
Resumo: todos foram ensacados.
Ganharam, claramente, o deputado Ivan Naatz, PL, padrinho desta filiação que além da sua intromissão aqui, em detrimento da proteção do seu reduto de Blumenau. É uma expressa vingança contra o ex-amigo dos tempos difíceis de se arrebanhar voto por aqui pelo PV, o Rodrigo e quando ambos ralaram muito; ganhou o Márcio Cézar que divide, mas não comanda o PL de Gaspar; ganhou também o vereador Alexsandro Burnier, PL, que abençoava esta filiação, bem como, indiretamente o próprio governador que entrou no olho do furacão dos bolsonaristas daquicontinuou apostando sem aparecer; e diretamente não se queimou com as brasas que assaram a ovelha na quarta-feira à noite aos comensais da boca-livre da Agronômica.
E qual é o pivô disso tudo? Uma pesquisa.
Marcelo, sob o patrocínio de um apoiador, fê-la – não se sabe bem a metodologia e a abrangência -, colocou-a debaixo do braço e rumou para Brasília. E lá peregrinou com o deputado Ivan. E Ivan abriu caminhos no diretório estadual com Daniel Freitas e até empolgou alguns do diretório nacional. Bateram o martelo: tinham um fato novo, um potencial e uma joia rara.
Pesquisas, a esta hora do campeonato, sem definições de nomes concorrentes por aqui, sem as migrações partidárias que vão acontecer, com conjunturas econômicas imperfeitas diante do cinismo radical do PT, ou seja, sem definição do que será o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, PT e de Jorginho Mello, PL, em meados do ano que vem? É o mesmo que livro no prelo, sem editor para avaliá-lo a que público destina e bancá-lo, bem como distribuí-lo.
O aprendizado de Marcelo é algo nulo e assustador ao mesmo tempo se ele um dia quiser e vencer para ser prefeito de Gaspar. Está sempre sócio e ao mesmo refém de incertos e até incautos. Marcelo já está numa enrascada que o tornou o bobo da corte. E quer ser o bobo da corte em outro terreiro? E pelo mesmo método, o seu uso por gente que tem tudo para lhe deixar na mão mais adiante?
O MDB e o PP, em 2020 deram o golpe nele. Ofereceram a vice prefeitura de Gaspar com a promessa de ele assumir em meados do ano passado a titularidade, diante do juramento de que o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, renunciaria. Kleber, MDB, PP, PDT, PSDB e os das igrejas neopetencostais apenas anularam Marcelo. Tudo para não ser um concorrente naquelas eleições. Eu exagero? O que aconteceu e está acontecendo? Eu preciso desenhar mais uma vez?
E onde está Marcelo, o que não tem gabinete, o que nem nome mais aparece nas placas de inauguração, o marginalizado por Kleber, o MDB, o PP, o PDT, o PSDB daqui e o PSD do novo prefeito de fato, o deputado Federal Ismael dos Santos, que no fundo leva os evangélicos neopentecostais no mesmo embalo?
Marcelo se realmente está filiado do PL na forma como foi conduzido e se deixou se conduzir será carta micada nas mãos do deputado Ivan Naatz. E para quê? Primeiramente, para atingir um ex-cabo eleitoral com o qual não afina mais ou quer “chamá-lo” à conversa para os seus caprichos. Nada de futuro, de plano de governo, de apontar o que está errado e que se vai mudar. Nem mais, nem menos.
Ou seja, eles estão pensando em Gaspar e nos gasparenses? Nem Marcelo, nem Ivan estão. E nesta briga, nem mesmo Rodrigo e até o Márcio Cezar. Rodrigo ficou quietinho no seu canto depois de conseguir, surpreendentemente, contra toda a maré de indiferença dos políticos do seu partido, incluindo o próprio deputado Ivan, 22,21% dos votos válidos. Se tivesse ocupado o espaço do “mandato” sinalizado pela derrota e sido um ativo e responsável opositor, talvez até, pela cidade, o próprio Kleber, o MDB, o PP, o PDT e o PSDB teriam feito o mínimo ser mais e melhor para todos. Se tivesse feito o serviço de casa, Rodrigo não estaria na defesa daquilo que deixou vulnerável e parece que perdeu. Simples assim.
E por fim, para completar este assunto por hoje, chamo a atenção para dois pontos.
O primeiro deles é que o deputado Ivan Naatz não se encaixa no perfil de ser governo. Ele se dá bem, sendo oposição. Precisa de telhado de vidro para suas pedras. Piora tudo, quando está desconfortável com os radicais do seu PL, exatamente por sua origem mais à esquerda e combativa. Então, está mais do que na hora do Ivan se estabelecer no PL do B, pois a sua saída do partido implicaria na perda de mandato. Ora se até na filiação do Marcelo ele teve que fazê-la escondida, inclusive da cidade que Marcelo diz que quer governar, é porque Ivan não está encaixado no tempo e na engrenagem que move o seu partido.
O segundo, é que Marcelo não está morto. O que trabalha contra ele são seus erros e companhias. Marcelo fez da política um meio de sobrevivência. Ele sempre será a face dos que não querem dar a cara à tapa.
Depois, porque todos os partidos, repito todos, em Gaspar querem Rodrigo para puxar votos, mas ao mesmo tempo, não o querem com a caneta na mão. Mau sinal. Ele é antigo e vem desde quando foi a única fez eleito para um cargo, a de vereador em 2012, com 1.439 votos. Impressionante má percepção. É outra revelação que precisa ser avaliada, superada e apagada por Marcelo e seu entorno. E tudo se complica quando se sabe que o vereador Giovano Borges, PSD, é a permanente sombra dele. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
Neste sábado, Gaspar faz 89 anos de emancipação política de Blumenau. Não foi fácil. Foi quase uma guerra e pouco lembrado nas nossas escolas. É história contada pelo tijucano historiador e ex-prefeito de lá, José Ferreira da Silva. É memória preservada pela gasparense da Coloninha e moradora de lá, de trabalho exemplar no arquivo histórico, Sueli Vanzuita Petry. Quem desmembrou Gaspar, foi o interventor nomeado por Aristiliano Ramos – nome da nossa principal rua -, Jacob Alexandre Schmitt. Ele também encaminhou a separação de Ibirama, outro motivo de muita revolta.
Alexandre nascido quando aqui era distrito em três de maio de 1882 e morto em 23 de abril de 1950, foi na verdade tio-avô, do ex-prefeito de Gaspar (2005/09) de Adilson Luiz Schmitt. Alexandre foi o que construiu e manteve por muito tempo o primeiro hotel de Balneário Camboriú, o afamado Miramar. Sua antiga casa ficava na Alameda Rio Branco. Ela foi demolida recentemente para dar lugar a um prédio, ainda em construção.
A diferença I. Uma comitiva da Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí, com gente do governo do estado e da Alesc passou esta semana por Washington, no Distrito de Columbia, nos Estados Unidos. Sucessivas reuniões no Banco Mundial. Para que? Preparação para obter financiamentos que se aproximam de US$ 120 milhões para a Mobilidade Ativa em Balneário Camboriú, implantação do túnel submerso entre Itajaí e Navegantes, bem como um sistema regional de transporte coletivo envolvendo onze municípios da região, entre eles, Ilhota.
A diferença II. Aqui no Vale Europeu faltam pontes, faltam tuneis para cortar morros e ligar bairros, falta transporte coletivo integrado ao que já existe, falta asfaltamento e recuperação de simples ligação com a BR 470 como é o caso da rua Vidal Flávio Dias – enrolado pela prefeitura de Gaspar por mais de seis anos -, isto sem falar, que parte dos políticos daqui, são contra a duplicação da ligação entre Gaspar a Brusque. Tudo para não prejudicar menos de meia dúzia de empresários, seus cabos eleitorais no presente. Aliás, o secretário da Infraestrutura e Mobilidade de Jorginho Mello, PL, o deputado Jerry Comper, MDB, mal tem tinta na caneta para nomear a sua secretária de gabinete. Então…
O lado errado e viciado. Em Gaspar, o título Capital Nacional da Moda Infantil vai “alavancar o Planejamento Estratégico o tal projeto de reestruturação do Desenvolvimento Econômico Local – DEL – da Ampe – Associação das Micro e Pequenas Empresas – de Gaspar e Ilhota. Impressionante. O nada vai fazer mais nada. O certo é o DEL dar em algum lugar que tornar Gaspar a Capital Nacional da Moda Infantil, que ninguém sabe quem produz, o que agrega e onde se compram esses produtos por aqui.
Eu exagero novamente nesta tecla que toco há muito tempo? Olha só esta. No gabinete do prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, tendo de fundo, exatamente o grande painel de Capital Nacional da Moda Infantil, o prefeito presenteia um visitante ilustre, com uma cachaça gasparense, premiada internacionalmente. Esta sim, existe, é tocada, degustada e se sabe onde comprá-la: ali no Moendão, da família Schmitt.
O MDB de Gaspar enfraquecido está sem candidato e acha que qualquer um que receba apoio explícito do prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, vai se prejudicar nesta altura do campeonato. De onde vem esta conclusão? É segredo. Se não for de uma pesquisa formal e já pelo menos duas na praça feitas recentemente, é do que se ouve na praça e nos cantões. E não precisa ir longe. Os próprios vereadores da base estão se lamuriando de que a máquina de soluções na prefeitura está emperrada.
Até para escolher o novo presidente, o MDB de Gaspar está num dilema. Estuda-se um nome que possa ser manobrado por quem detém o poder, mas não pode mais aparecer por exigência de compliance da empresa em que trabalha.
O advogado João Pedro Sansão é palestrante contratado pela Assembleia Legislativa. “É coisa antiga” ue só agora foi liberado, justifica-se. A primeira palestra será em Joinville e terá como tema: “Argumentação e Oratória”. Será no dia 28 de março.
Diga-me com quem você anda e eu direi que você é. Autoridade é apanhada em um aniversário de amigo comum. Pede carona a outro amigo em comum para voltar para casa, quando se tinha carro e até motorista à disposição. No meio do caminho este seu amigo é parado pela polícia para averiguação. Tudo meio torto. E a autoridade ficou amuadinha no canto dela vendo todo o sufoco do amigo, como se tivesse no trapézio para resolver o que estava enrolado.
A ex-governadora, Daniela Cristina Reinehr, PL, e agora deputada Federal foi escolhida como membro titular da Comissão de Agricultura. É a voz de um estado com vocação para um modelo de agricultura familiar e pequenos módulos, e a deputada é uma produtora rural neste modelo. Espera-se que ela seja pragmática e não faça da comissão um exercício de ideologia política.
Porque no Senado, como mostram as redes sociais, Santa Catarina já está desfalcada. Jorge Seif Júnior, PL, está com um olho no seu estado natal, o Rio de Janeiro, e o outro, na família Bolsonaro, onde ele próprio se declara ser um filho dela.
A Justiça Federal está pedindo explicações à prefeitura de Gaspar – a que permite e até facilita a mistura de esgotos na rede pluvial pois aqui temos zero de coleta e tratamento de esgotos, apensar do TAC que se assinou com o ministério público há mais de dez anos -, se ela realizou as recomendações determinadas pela Justiça. O caso não é novo. É antigo. Ora, se é para valer, deveria não pedir informações, mas verificar e punir.
Antes tarde do que muito tarde. O prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, depois de quase um ano vendo o ribeirão Gaspar Mirim “comendo” aos poucos as margens das ruas Barão do Rio Branco, José Rafael Schmitt e a cabeceira da ponte, sob pressão de comerciantes, passantes e motoristas, diz que não vai mais esperar pela Defesa Civil de Brasília e de Florianópolis, onde comitivas gastando diárias foi pedir R$500 mil para arrumar o que já está quase sem conserto.
Se a prefeitura tivesse uma equipe efetiva de manutenção e se realmente preocupado quando surgiu o problema há meses, além de ter evitado este recorrente e espalhafatoso desgaste público contra a prefeitura, prefeito, secretário de Obras e Serviços Urbanos e a Defesa Civil, não teria gasto nem R$50 mil para a recuperação daquele talude, segundo os técnicos que consultei e que entendem do assunto.
Quem usa a Rua Silvano Cândido da Silva Sênior, a que vem de Blumenau pelo bairro da Ponta Aguda e vai dar na Vidal Flavio Dias, no distrito do Belchior, em direção a BR 470, em Gaspar, nota muito bem quando termina a jurisdição de Blumenau e começa a de Gaspar. O “prolongamento” da Silvano em Gaspar recebe o nome de Benedito Amorim. Além da má conservação, há dois pontos comprometidos para a barranca do Rio Itajaí Açú. Acorda, Gaspar!
15 comentários em “O VICE-PREFEITO MARCELO REPETE O ERRO QUE FEZ QUANDO ENTROU NO PATRIOTA. DIANTE DA REPERCUSSÃO NEGATIVA NO PL DE GASPAR ELE SE FILIOU ÀS ESCONDIDAS, EVITOU A POMPA ANUNCIADA PARA QUARTA-FEIRA EM FLORIANÓPOLIS. É REVELADOR. MARCELO ESTÁ REFÉM DE UM JOGO DE POLÍTICOS PELO PODER”
Pingback: O NÓ QUE OS POLÍTICOS DE GASPAR PRECISAM DESATAR ATÉ MAIO DO ANO QUE VEM. O PROBLEMA É QUE NÃO PODEM ERRAR AGORA E CRIAREM CONSEQUÊNCIAS - Olhando a Maré
FRANKLIN RECUPEROU A VOZ DAS RUAS, por Elio Gaspari nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Está nas livrarias “Quem foi que Inventou o Brasil?”, do jornalista e ex-ministro Franklin Martins. A pergunta é do compositor Lamartine Babo em 1934 e, na resposta de Franklin, o povo canta. Nesse volume, ele coletou 296 canções, indo da Independência à República, com algumas dezenas tratando da escravidão e do racismo.
A história de Pindorama deve muito à música. Basta dizer que o Hino da Independência tem letra de um jornalista político (Evaristo da Veiga) e música de D. Pedro I. Graças à música, conhece-se também o “Batuque de Palmares”, tão candidato que foi proibido em 1839:
“Folga nego, branco num vem cá
Se vié, pau há de levá”.
Com a colaboração de João Nabuco ao piano, foram trazidas de volta inúmeras canções, inclusive as “Cantigas Báquicas”, compostas em 1826 por José Bonifácio de Andrada, o poderoso ministro da Independência, exilado na França. Episódios que o andar de cima trata com gravidade; no de baixo as coisas eram mais simples. Quando o Banco do Brasil quebrou, em 1829, a rua cantava “piolhos, ratos e ladrões”. Quase meio século depois, quando quebrou um grande banco privado do Rio, cantava-se:
“E quem há de nos valer
Em momento tão sinistro?
Ah! Já sei, corramos todos
Ao palácio do ministro.”
No livro, cantam os revoltosos dos Farrapos, da Balaiada e da Praieira. Cantam também os defensores da ordem:
“Fora farrapos, fora
Não mais venham competir
Pedro Segundo não quer
Os Farrapos no Brasil.”
Demófobos festejando a polícia do Rio parece coisa de hoje, mas em 1839 um lundu cantava:
“Já foi-se o tempo
De mendigar.
Fora, vadios,
Vão trabalhar!”
Noutra ponta do imaginário do poder, em 1857, quando se falava das virtudes do Império, a rua respondia:
“Hoje tudo são progressos
Da famosa ladroeira.”
Franklin Martins enriqueceu a erudição histórica de seu trabalho com um olhar político sobre a grande questão do século XIX, a escravidão. O grande momento do livro está no resgate de canções das senzalas e do abolicionismo.
Lá estão as canções de “Pai João”:
“Nosso preto quando fruta
Vai pará na correção
Sinhô branco quando fruta
Logo sai sinhô barão.”
Pesquisador generoso, Franklin transcreveu 37 canções relacionadas com a escravidão e o racismo. Delas, 33 estão disponíveis, de graça, como todas as outras, no site “Quem foi que inventou o Brasil?”. (No total, o site oferece 1.400 canções, um tesouro.)
Os interessados que tiverem algum tempo, podem ouvir vozes da História que, em muitos casos, os livros contam de raspão. O prazer da audição fica incompleto sem a leitura dos verbetes dos livros. No que acaba de ser lançado, aprende-se que algumas canções foram resgatadas por Mário de Andrade. Ou ainda que, em 1949, o professor americano Stanley Stein recuperou as cantorias de velhos jongos. Stein pesquisava a história do café de Vassouras, mas, de quebra, legou esses documentos sonoros.
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e aderiu ao movimento “Respeito à Magistratura”, liderado por juízes que não querem voltar ao trabalho presencial. O cretino é contra todas as formas de trabalho, inclusive o virtual, e acredita que o movimento é um bom começo para viabilizar sua agenda.
Os juízes não querem comparecer ao local de trabalho e ameaçam dizendo que uma carta, defendendo essa prerrogativa, já tem o apoio de 800 magistrados. Seus nomes, contudo, não são conhecidos. O idiota encantou-se com esse detalhe. Não querem dar expediente no serviço, protestam e não comparecem nem ao menos com suas assinaturas.
Eremildo fez uma pesquisa no seu círculo de amizades, formado por pessoas que têm horror ao trabalho. Ficou com a suspeita de que a nascente desse glorioso movimento está num grupo de magistrados da Justiça do Trabalho. Os mais incomodados com o trabalho presencial são juízes que respondem por varas num estado e moram em outro.
Se a ideia prosperar, Eremildo disparará um manifesto com o apoio de 40 milhões de contribuintes que estão preenchendo suas declarações de Imposto de Renda, intitulado “Respeito aos idiotas”.
CADÊ O CARTÃO?
O almirante Bento Albuquerque mudou sua versão no caso das joias das Arábias, mas a pergunta elementar continua de pé: Cadê o cartão que acompanhava os estojos?
Só ele poderá determinar quem estava mandando o presente, para quem e por quê.
Presente sem cartão é coisa de traficante.
DIPLOMACIA
A proposta da viagem de Lula à Ucrânia para negociar o fim da guerra era de vidro e se quebrou.
As reações do Congresso americano às suas iniciativas e omissões com os governos do Irã e da Nicarágua aconselham-no a cuidar melhor de suas relações com Washington.
Sem um trabalho paciente, arrisca-se a ficar no Sol.
RELAÇÃO TRINCADA
A ida da enfermeira Aline Peixoto, mulher do ex-governador Rui Costa, para o Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, trincou a relação do atual chefe da Casa Civil com o senador Jaques Wagner, seu velho patrono.
Se Rui Costa aceitar o papel de bedel de ministros que Lula lhe ofereceu, ele se tornará o objeto de todas as malquerenças da Esplanada.
O LIBBS E RICARDO BOECHAT
O juiz Dimitrios Zarvos Varellis, da 11ª vara Cível de São Paulo, condenou o laboratório Libbs a indenizar em R$1,2 milhão os filhos do jornalista Ricardo Boechat, que morreu em 2019 num acidente de helicóptero. O Libbs ouviu calado.
Caso típico no qual o poderoso acha que pode tudo. O laboratório contratou Boechat para fazer uma palestra em Campinas, comprometendo-se a transportá-lo. O acerto foi de mão em mão, e Boechat acabou embarcando num helicóptero com a licença vencida. Deu no que deu.
Numa situação desse tipo, o cavalheirismo sugeria que o laboratório, uma potência com 2.700 funcionários, produzindo anualmente mais de 50 milhões de unidades de medicamentos, aceitasse sua responsabilidade na tragédia. Nem pensar.
Os herdeiros de Boechat, assistidos pelo advogado Antônio Pitombo, foram à Justiça. O Libbs tentou de tudo, dizendo até mesmo que só haviam contratado a ida de Boechat a Campinas. Como ele voltou a São Paulo no helicóptero, o problema não era da empresa. Falso.
Na sua sentença, o juiz Zarvos Varellis lembrou “a necessidade de punição ao agente como fator de desestímulo da repetição da conduta.”
Ainda passará muito tempo até que grandes empresários aprendam que não lhes fica bem terceirizar responsabilidades nem acreditar que indo à Justiça amedrontam os ofendidos. Se o Libbs tiver aprendido, ótimo.
MISTÉRIO
Por temperamento, o ministro Carlos Lupi, da Previdência Social, não é um encrenqueiro.
Isso só aumenta a perplexidade diante da sua decisão de cutucar os interesses da banca sem perguntar nada ao Planalto.
DURMA-SE COM UM BARULHO DESSES, por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo
De boas intenções o inferno está cheio e elas são irmãs siamesas de “ideias geniais” que pululam em Brasília, animam a plateia, atiçam interesses e dividem o governo. O presidente Lula virou mediador entre a “criatividade” de Fernando Haddad, o “esquerdismo” do PT e a “genialidade” de ministros afoitos.
O pacote fiscal de Haddad empacou na reunião com Lula na sexta-feira, quando Rui Costa (Casa Civil) vocalizou a pressão do PT e de ministros gastadores por “maior amplitude” para obras e investimentos no teto de gastos. Eram 4 a 2: os petistas Lula, Haddad, Costa e Esther Dweck, vinculada ao partido, “contra” os liberais Geraldo Alckmin (PSB, ex-PSDB) e Simone Tebet (MDB). O problema, porém, foi PT contra PT.
Haddad corre para ajustar as vinculações constitucionais e o “novo PAC” (Programa de Aceleração do Crescimento) no pacote para anunciar tudo junto antes da viagem à China, no fim de semana.
Enquanto ele toureia o PT e aguarda a decisão de Lula, ideias “geniais” não param. Sem aval do Planalto, Márcio França (Portos e Aeroportos) lançou o “Voa, Brasil”, com trechos a R$ 200 para estudantes, aposentados e servidores públicos federais, estaduais e municipais. Lindo, não é? Mas quem paga a conta, ou a passagem? Vem aí um grupo de trabalho.
Carlos Lupi (Previdência), que manda no conselho do setor, também teve ideia genial sem combinar com os russos, Planalto e Fazenda: juros de 1,7% para empréstimos consignados de aposentados do INSS. Bacana, mas… os bancos não topam, BB e CEF entram na dança, o BC volta aos holofotes e as centrais sindicais vão às ruas. Enquanto isso, aposentados estão sem consignado nenhum.
França é do PSB, Lupi é do PDT e os dois partidos acertam federação com o Solidariedade, para marcar posição e fortalecer a centro-esquerda nos embates com o PT. Além de adversários e inimigos, Lula enfrenta guerrinhas de aliados e ameaças de “aliados”, tipo União Brasil.
E com o Supremo no meio. De saída, Ricardo Lewandowski, amigo de Lula, votou para liberar geral a ida de políticos (e companheiros?) para estatais; André Mendonça, o “terrivelmente evangélico” de Jair Bolsonaro, pediu vistas; Lewandowski transformou o voto em decisão monocrática; Mendonça jogou o julgamento – já do mérito – para o plenário. Durma-se com um barulho desses.
Se a coisa já é assim no Executivo e até no Judiciário, imagine-se a nova âncora fiscal e a reforma tributária no Legislativo, com 513 deputados, 81 senadores e Arthur Lira no comando… Haddad, que faz a parte dele, avisa: Agora é com o próprio Lula.
GÊNIO DA LÂMPADA, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Partiu do ministro Carlos Lupi, da Previdência, a mais nova “genialidade” do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) —usando o termo adotado pelo presidente, não sem ironia, para conter a proliferação de ideias divulgadas sem maior embasamento por seus auxiliares.
O pedetista Lupi, que já fora desautorizado após defender a revogação da reforma da Previdência, agora teve influência decisiva na redução do teto de juros aplicável ao crédito consignado para aposentados e pensionistas do INSS.
O corte da taxa —de 2,14% para 1,70% ao mês— foi aprovado por 12 votos a 3 no Conselho Nacional da Previdência Social. Não parece ter havido coordenação com o ministério da Fazenda, que no máximo teria alertado contra a mudança.
O problema é que o limite pode inviabilizar parte das operações por não cobrir os custos, que somam a taxa de captação dos bancos, despesas administrativas e de distribuição, inadimplência e os encargos tributários.
Ao menos 27 instituições operam com consignado. Mas várias são de pequeno e médio porte, com custos de captação acima dos de bancos de primeira linha, e já operavam com baixa rentabilidade.
Mesmo os maiores bancos terão de rever procedimentos. A suspensão de novas concessões de crédito ocorreu até no Banco do Brasil e na Caixa, o que demonstra a imprudência da decisão. Regras do Banco Central impedem a concessão de crédito na modalidade se houver rentabilidade negativa.
A consequência deve ser a limitação da oferta, que vinha rodando entre R$ 5 bilhões e 7 bilhões ao mês. Cerca de 14,5 milhões de aposentados tomam empréstimo consignado. Agora, qualquer dinheiro novo poderá ficar concentrado em tomadores com menor risco, pelo menos enquanto não houver redução da taxa básica de juros, hoje em 13,75% anuais.
O freio dos bancos públicos gerou revolta em parte do governo e no PT. Lupi, por sua vez, disse não ter medo de cara feia. Talvez o ministro se sensibilize com a contrariedade dos aposentados —os de menor renda e idade mais avançada serão os mais prejudicados.
A ansiedade por medidas mágicas para acelerar o crescimento se espalha pelo governo, causando disputas internas e emitindo sinais confusos para a sociedade.
As genialidades criticadas por Lula só proliferam, porém, porque é ele quem até aqui demonstra preferir caminhos fáceis a escolhas prudentes para construir resultados sustentáveis a médio prazo.
DÚVIDAS RAZOÁVEIS? por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo
Existem várias maneiras para controlar as contas públicas, mas, ao final, trata-se de uma combinação de receitas e despesas. Tem-se falado recentemente em controle pela dívida. Ocorre que o tamanho e a evolução da dívida dependem da relação entre receita e despesas. Se o gasto excede a arrecadação, surge um déficit que logo se torna dívida.
Também se pode avaliar a dívida não pelo tamanho absoluto, mas pela relação com o Produto Interno Bruto. Se a dívida permanece estável, e o PIB cresce, é claro que o quadro fiscal ganha equilíbrio. Mas a outra variável — a equação de receita e despesa — continua dominante.
Dirão:
— Mas que monte de obviedades!
Com razão.
Então por que estamos insistindo nisso? Porque toda essa conversa sobre o novo arcabouço fiscal parece caminhar em busca de algum truque para escapar daquelas obviedades.
O que se sabe?
O orçamento do governo federal prevê para este ano um déficit em torno de R$ 230 bilhões, cerca de 2,3% do PIB. O ministro Fernando Haddad já falou em reduzi-lo para menos da metade — R$ 100 bilhões —, podendo zerá-lo em 2024.
Gente, trata-se de um ajuste fiscal brutal. Sumir com um déficit de 2,3% do PIB em apenas dois anos é uma proeza que só pode ser realizada com forte corte de gastos e ganhos expressivos na arrecadação. Dá para desconfiar. Ou, pelo menos, dá para levantar dúvidas razoáveis.
Considere o corte de gastos. Ainda nesta semana, o presidente Lula cobrou serviço de seus ministros, que apresentassem planos e obras. Antecipadamente, desconsiderou a desculpa da falta de dinheiro. Os ministros devem é buscar o dinheiro com os ministérios da Fazenda e do Planejamento. A nenhum ministro foi pedido um orçamento equilibrado ou algum esforço fiscal. A ordem implícita é gastar.
Considere agora o lado da receita. Haddad parece confiar bastante nos ganhos de arrecadação. O problema é que a carga tributária já é muito alta no Brasil — em torno dos 35% do PIB, calculando por baixo.
Um exemplo: fala-se em cobrar impostos pesados sobre dividendos que acionistas recebem, hoje isentos. Fazer com que os ricos paguem — é a versão ideológica. Ora, é verdade que o imposto sobre dividendos é pesado na maior parte dos países capitalistas. Mas isso porque o imposto de renda sobre as empresas é mais baixo. Isso, aliás, é o correto. Taxar menos as empresas, favorecendo sua operação, e taxar mais os acionistas, pessoas físicas que embolsam os lucros e dividendos.
Não se está falando por aqui em reduzir imposto das empresas, só em cobrar mais dos acionistas. Somando as duas taxações, na jurídica e na física, o imposto ficaria muito pesado e certamente afastaria investimentos.
Integrantes do governo também desconfiam de que haja muita sonegação e, digamos, desvios tributários— manobras que grandes empresas e os mais ricos fariam para fugir do pagamento dos impostos. Todos os governos falam isso, que não elevarão as alíquotas de impostos, mas cobrarão efetivamente de quem deve e não paga. Duvidoso. Do jeito que os políticos — de qualquer ideologia ou sem ideologia — gostam de gastar, já teriam descoberto esse filão.
Tudo considerado, o ministro Haddad tem uma tarefa hercúlea pela frente, se é que pretende mesmo zerar o déficit em dois anos. Tarefa econômica e política, pois o ambiente geral do governo Lula está muito claro: o Estado puxará o crescimento, e não se faz isso com ajuste fiscal tão rigoroso.
Daí as dúvidas em relação ao prometido novo arcabouço fiscal. Sobretudo porque existe outra forma de zerar déficits: chamá-los de outro nome. Mais exatamente, chamar as despesas de outro nome. Como diz Lula, gastar com o social e a infraestrutura não é despesa, mas investimento. Logo, sai da conta do déficit. Mais ou menos como se fez para furar o teto de gastos sem dizer que se estava furando. Basta excluir tais e tais despesas do teto.
Só que o extrateto não sai de graça. Do mesmo modo, seja investimento, seja despesa, o governo tem de gastar o mesmo dinheiro. Com truque ou sem truque.
O poder supremo conveniente ao poderoso de plantão ruge contra lei em vigor, feita pelos próprios políticos, em vigor e não contestada pelos políticos que a devem modificá-la, por sete anos. Impressionante…
STF PRECISA RESPEITAR A LEI DAS ESTATAIS, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
Tem horas que o Supremo Tribunal Federal (STF) se esforça por ser parte do problema, e não da solução. Em vez de rejeitar liminarmente uma ação inepta – a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 7331, contra a Lei das Estatais (Lei 13.303/2016) –, a Corte, por decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski, suspendeu, no dia 16 de março, trechos da lei. Trata-se de afronta ao Congresso e à Constituição.
Proposta pelo PCdoB, a Adin 7331 questiona os dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores titulares de alguns cargos públicos ou que tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral. A Adin 7331 constitui caso paradigmático de judicialização da política. Tendo perdido no Congresso, o PCdoB foi ao Judiciário tentar reverter a derrota.
Na Lei das Estatais, não há nada que fira a Constituição. O Congresso tem competência para definir critérios e restrições para os cargos nas estatais e empresas de economia mista. É matéria que cabe ao Legislativo decidir. No caso da Lei 13.303/2016, foi a própria política quem definiu os limites para a política. Como dissemos neste espaço (Cabe ao STF rejeitar a judicialização da política, 20/2/2023), “mais legítimo e constitucional, impossível”.
Pode-se discutir se o Congresso estabeleceu os melhores critérios, se eles são adequados às atuais circunstâncias, se a experiência de quase sete anos de vigência da Lei das Estatais recomenda manter as restrições originais ou alterá-las. Há todo um vasto campo de estudo, debate e negociação sobre o tema. No entanto, em razão do princípio da separação dos Poderes e, principalmente, do próprio princípio democrático, cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário, realizar esse debate. Questões políticas devem ser resolvidas pelos representantes eleitos, e não por juízes.
Defender a Constituição não é apenas impedir que leis inconstitucionais continuem vigentes. É também assegurar que as leis constitucionais produzam, sem obstáculos e entraves, todos os efeitos que o Congresso estabeleceu. Por isso, a Lei 9.868/1999, que disciplina o processamento das Adins e da Ação Declaratória de Constitucionalidade (Adc), determina que “a petição inicial inepta, não fundamentada, e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator”. No entanto, não satisfeito em não rejeitar liminarmente a ação, o relator ainda deu liminar contra a lei.
O caso explicita um ponto importante, que afeta diretamente o funcionamento do Estado Democrático de Direito. Assim como existem decisões do STF perfeitamente técnicas e corretas que desagradam profundamente a parte considerável da população – e faz parte do regime democrático exigir que todos respeitem essas decisões –, há também leis perfeitamente constitucionais que desagradam profundamente às opiniões e opções políticas de ministros do Supremo. E também faz parte do Estado Democrático de Direito exigir que todos, também os integrantes do Judiciário, respeitem essas leis.
O juízo sobre a constitucionalidade de ato do Legislativo ou do Executivo não tem nenhuma relação com o exercício de escolhas políticas. São outros critérios, outros fundamentos e outros procedimentos. É por isso que este jornal tem profundas ressalvas, por exemplo, ao “controle de constitucionalidade” baseado em negociações políticas mediadas pelo Supremo. É muito positivo que haja composição entre as partes em disputas judiciais sobre bens e direitos disponíveis. Mas o respeito à Constituição não é um valor que se negocia.
Em conformidade com sua missão de defender a Constituição, cabe ao plenário do STF rejeitar a liminar do ministro Lewandowski. Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, a decisão não fortalece o Supremo. Ao invadir as competências do Congresso, ela torna o STF submisso às vontades do Executivo e de quem perdeu na política. Em respeito à sua própria autoridade, o Judiciário tem o dever de devolver a palavra ao Legislativo.
Pronto: os jovens de esquerda são mais “depressivos” porque são mais “sensíveis”. A esquerda acadêmica e até do jornalismo, não se cansa de produzir desculpas esfarrapadas quando ela está sendo diagnosticada como doente, por estar fora do contexto de atualização.
A POLÍTICA ESTÁ ADOENCENDO A ESQUERDA? por Pablo Ortellado, no jornal O Globo
Uma pesquisa publicada no fim do ano passado disparou um grande debate nos Estados Unidos sobre a relação entre saúde mental e política. O estudo, publicado na revista SSM Mental Health, apontou uma correlação intrigante entre a identidade política dos adolescentes e uma escala que mede depressão. Estudantes do último ano do ensino médio (17 e 18 anos) que se identificam como “liberais” (na tradição americana, de esquerda) têm pontuação média significativamente maior na escala que mede depressão do que aqueles que se identificam como “conservadores”. A diferença aparece em toda a série histórica e, mesmo quando a depressão entre todos os adolescentes dispara, no começo dos anos 2010 (provavelmente pelo maior uso de mídias sociais), a pontuação é maior para adolescentes de esquerda e maior ainda para meninas de esquerda.
A recepção da pesquisa ficou restrita aos círculos acadêmicos até o fim de fevereiro, quando foi descoberta e passou a ser discutida nas redes sociais e na imprensa americana. O debate produziu dois tipos de explicação.
A primeira acredita que os jovens de esquerda adoecem mais porque são mais sensíveis e mais impactados pelas mazelas do mundo. Essa é a hipótese dos próprios autores do artigo. Eles especulam que, no período do estudo, “guerra, aquecimento global, tiroteios nas escolas, racismo estrutural, violência policial contra negros, machismo generalizado e desigualdade socioeconômica desenfreada” tomaram o discurso político e geraram uma reação de movimentos juvenis. Assim, “adolescentes liberais [de esquerda] podem ter se sentido alienados num clima político conservador, de modo que sua saúde mental sofreu mais em comparação com a de seus pares conservadores cujas visões hegemônicas floresciam”.
A colunista do jornal The New York Times Michelle Goldberg logo percebeu que a hipótese dos autores do estudo não era muito consistente com os dados. Embora fosse razoável supor que o misógino governo Trump deprimisse meninas adolescentes, não era isso o que os dados mostravam. O maior índice de depressão entre adolescentes de esquerda não pareceu ser afetado pela mudança de governo, permanecendo mais elevado tanto no governo progressista de Barack Obama (2013-2016) como no governo conservador de Donald Trump (a partir de 2017).
A tese dos autores também despreza que seria igualmente razoável esperar descompasso entre valores e percepção do mundo entre os adolescentes conservadores, já que, no entendimento desse grupo, eles é que estão deslocados num mundo controlado por elites progressistas que destroem a família convencional e os valores americanos tradicionais.
A segunda linha de interpretação, capitaneada pelo psicólogo social Jonathan Haidt, tenta explicar o adoecimento dos jovens de esquerda pela política progressista contemporânea, que, diz ele, estimula a sensibilidade diante de pequenas agressões e enxerga simples ofensas como grandes e insuportáveis violências. Essa política se difunde pelas mídias sociais. Para Haidt, as meninas adoecem mais porque fazem mais uso delas. Ele compara esse tipo de política a uma terapia reversa: enquanto na terapia se busca contextualizar, criar distanciamento e aprender a lidar com os traumas, nessa política há um esforço para ver ofensas como violências intoleráveis que não devem ser esquecidas.
A explicação de Haidt faz sentido e, se for mesmo verdadeira, deveria servir como alerta — e não apenas para os progressistas mais jovens. Talvez devamos seguir nos esforçando para perceber e condenar as injustiças, mas discernindo o mais grave do menos grave e não deixando a existência no mundo se tornar uma provação insuportável.
a “cábia” “çapiciência” das teses macroeconômicas da esquerda do atraso. Inventam dinheiro, inventam juros baixos e tratam todos como ignorantes sob o relho do populismo medieval. Esta é a cara do PDT, o candidato ao prêmio Nobel, se ele tivesse a categoria do Febeabá – Festiva de Besteiras que Assola o País, do impagável Stanislaw Ponte Preta, do jornalista Sérgio Porto
Nota: para não dizer que é implicância de alguém esclarecido, o próprio Banco do Brasil e da Caixa, ou seja, bancos do governo, nesta sexta-feira, e depois deste artigo abaixo já estar publicado, também disseram que suspenderam os empréstimos consignados que foram tabelados nos juros pelo próprio governo petista de Luiz Inácio Lula da Silva.
LUPI MEXEU EM VESPEIRO COM JUROS CONSIGNADO, por Cláudia Saflate, no jornal Valor Econômico
Começou ontem a prática de um teto de juros de 1,70% ao mês para o crédito consignado dos aposentados do INSS, conforme decisão de segunda feira do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS).
O Ministério da Fazenda e a Casa Civil, no entanto, estão debruçados sobre uma alternativa a essa medida, que aparentemente beneficiaria os aposentados, mas que os atinge em cheio.
Ontem os bancos divulgaram nota avisando que estão suspensas, por tempo indeterminado, as operações de concessão de crédito novo, refinanciamento e portabilidade para o consignado do INSS.
O resultado da decisão do CNPS, cujo placar foi de 12 votos a favor e apenas 3 contra, portanto, vai ser secar a oferta de crédito, sobretudo para os aposentados com menor renda e para o público com idade mais avançada. Os de mais idade, quando morrem, a dívida simplesmente desaparece, entrando nas estatísticas de inadimplência, onde respondem por 70%.
O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, comemorou a decisão do CNPS, que preside, por considerar que as taxas cobradas anteriormente eram “abusivas” justamente com as pessoas mais vulneráveis. “Vejo essas taxas atuais como abusivas para os beneficiários do INSS, que são pessoas, em sua grande maioria, extremamente vulneráveis”, disse ele em nota oficial logo após a reunião.
Na prática, porém, o CNPS inviabilizou o crédito consignado para as pessoas que mais necessitam de crédito mais barato. Assim como tornou difícil a vida das 77 mil pequenas e médias empresas e 240 mil agentes de crédito (os “pastinhas”), que atuam como correspondentes bancários. E, de forma inadvertida, jogou alguns milhões de aposentados em linhas bem mais caras dos bancos, no colo de agiotas ou no rotativo dos cartões, que cobra 400% de juros ao ano. A taxa de juros do não consignado é de, em média, 5,2% ao mês. Nas financeiras, ela é de 20% ao mês.
Com os juros mensais em 2,14%, vários bancos – no total, são 27 instituições que operam com o consignado – especialmente os de pequeno e médio porte, já vinham apresentando uma rentabilidade próxima de zero.
Aliás, a taxa foi aumentada em dezembro de 2021, quando era de 1,80% e passou para 2,14%. Isso porque a taxa básica de juros, a Selic, chegou a 9,25% naquela ocasião. Agora, ignorando-se completamente a racionalidade econômica, com a Selic em 13,75%, o ministro da Previdência opta pela ideologia e aplaude a decisão do CNPS. E transforma em negativa uma rentabilidade que era muito próxima de zero.
O Conselho Monetário Nacional determinou, em 2013, que os bancos têm que controlar a viabilidade econômica da operação. Ou seja, eles não podem operar com margem de rentabilidade negativa na concessão de crédito consignado. O Banco Central, que é o órgão regulador do sistema financeiro e cuida da sua saúde e resiliência, não foi consultado nem a Fazenda.
Dos 31,6 milhões de aposentados do INSS, 14,5 milhões tomam empréstimo consignado. E desses, 42% estão negativados, ou seja, não conseguem crédito de outra forma, e uma parte importante deles usa o consignado como complementação de renda. Foi nesse vespeiro que Lupi mexeu. Na tentativa de proteger os aposentados ele está os prejudicando. Vai empurrá-los para linhas de crédito mais caras.
A estrutura de custos do crédito consignado é o custo de captação, que consumia a metade do teto de 2,14%.
Os bancos médios pagam até 120% do CDI (para emprestar em média por dois anos). O custo do funding, que é estimado em 1,12%, mais o custo de distribuição, que é de 0,38%, e a inadimplência, que é de 0,19%, já pegam boa parte do custo total.
Isso somado ao custo de processamento pago à Dataprev, mais PIS/Cofins, além de pessoal e outros custos administrativos, resultam em uma margem negativa de 0,23% antes de pagar o Imposto de Renda sobre a Pessoa Jurídica (IRPJ) e a CSLL. Foi por esta razão que ontem os bancos privados anunciaram a suspensão da concessão de crédito, seja novo, seja para refinanciar a dívida. ou, ainda, o pedido de portabilidade.
Banco do Brasil e Caixa, que respondem por 11% do crédito consignado, cobravam taxas maiores do que 1,70%. O BB operava com 1,96%, e a Caixa, com 1,84%. Eram as menores taxas do mercado. A justificativa é que eles têm um menor custo de captação de recursos.
O fato, porém, é que não se deve mexer em temas complexos com vontade de fazer populismo.
Afinal, este é um mercado de crédito que movimenta mais de R$ 5 bilhões por mês, em média. Em janeiro foram mais de R$ 7 bilhões em crédito consignado, justamente em um momento em que o governo gostaria de ver expansão de crédito, e não uma contração.
Fica o registro em parabenizar o Jornal Cruzeiro do Vale que até que enfim a imprensa começa a cobrar este des governo municipal, falando sobre o abandono do prédio do BESC.
Aproveito pois está abandonado a cidade de Gaspar como um todo: Hospital, cabeceira da ponte, o importante Parque Náutico ao mato, alagamentos constantes, binários de trânsito ineficientes, secretaria de meio ambiente com sérias denúncias.
Finalmente, a imprensa de Gaspar, tratada com migalhas pelo poder que a tem ajoelhada e vendo a sua audiência cair e mesmo tempo de ver este ser a única referência da cidade, resolveu dar o ar da graça. Seja bem-vinda do espaço que nunca deveria ter abandonado.
O MUNDO (AINDA), NÃO DESABOU, por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo
A turma do Ministério da Fazenda estava para lá de preocupada com os sacolejos do Silicon Valley Bank (SVB) e do Credit Suisse, mas alguém mantinha a cabeça fria na quarta-feira à tarde, no pico da insegurança: o ministro Fernando Haddad, apostando que a crise não passaria dali e, se passasse, não afetaria, ou dificilmente afetaria, o sistema bancário brasileiro.
“A regulação bancária do Brasil é muito superior e mais rígida do que a americana e a europeia”, me disse o ministro, reconhecendo que, ao longo de quatro crises internacionais no governo FHC e da quebra do Bamerindus e do Marka FonteCindam, o sistema foi se aperfeiçoando até chegar ao Proer, por exemplo. “Se a crise ficar do tamanho que está, tudo bem”, acrescentou, minutos antes de seu assessor trazer a boa notícia: o compromisso do banco central da Suíça com US$ 54 bilhões para o Credit Suisse, segundo maior banco do país.
Com bolsas subindo e dólar caindo, Haddad pode se concentrar só na nova âncora fiscal, que será discutida hoje com Lula para ser anunciada antes da viagem à China. “Eu não tenho escola econômica”, gaba-se o ministro, que estudou com sua equipe uns 30 modelos de diferentes países e continentes e “passou horas esmiuçando o pacote do (Joe) Biden nos EUA” – que, vale dizer, privilegia a economia verde, cobra mais da poluente e inclui… aumento de impostos para os muitíssimo ricos.
Por aqui, só se fala em gastar e cabe a Haddad reequilibrar receita x despesas, no discurso e na prática. Ele começou com a reoneração de combustíveis, Carf e PIS-Cofins e explica a “criatividade” da nova âncora: inverter a lógica de que nas vacas gordas pode gastar e nas vacas magras mete a tesoura, piorando tudo. A ideia é criar um “colchão de segurança” com a arrecadação alta, para usar se ela cair.
E aumento de imposto? “O objetivo não é aumentar alíquotas, mas fazer quem não paga passar a pagar”, diz. Reforça a primeira parte da resposta com o IVA, dizendo que “imposto sobre consumo no Brasil é muito alto, pode até cair”. Na segunda parte, não especifica quem e como, mas há milhões de trabalhadores informais que não pagam impostos e sabe-se lá quantos ricaços craques em driblar o Fisco.
Juntando tudo, a ideia é flexibilizar o teto de gastos sem excluir despesas, nem as sociais; aumentar a base de arrecadação; usar lei complementar, não emenda constitucional; tourear Lula, PT, mercado e Congresso; e garantir apoioschave, como o de Arthur Lira, com quem o ministro jantou no mesmo dia. Se tudo der certo, a reforma tributária servirá como “catalisador fiscal”. Se… •
Coincidência? Um Estado governado pelo PT, o crime organizado acua a sociedade e humilha o estado formal omisso
PRESÍDIOS SIMBOLOS DA FALÊNCIA DO ESTADO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
Há dias a população do Rio Grande do Norte é acossada por mais uma onda de terror orquestrada por uma facção criminosa. A Secretaria da Segurança potiguar acredita que a ordem tenha partido de lideranças do Sindicato do Crime (SDC) – uma dissidência do PCC – que estão em uma penitenciária da Grande Natal, em retaliação ao endurecimento das regras nas prisões locais. Um “salve” – ou convocação – que circula por WhatsApp supostamente lançado pelo SDC “justifica” a selvageria como uma reação às condições “degradantes” dos presídios. Essas causas não se excluem e expõem as raízes de duas metástases que se retroalimentam e se alastram com assombrosa velocidade: a ascensão do crime organizado e a deterioração do sistema prisional.
Na última década, o Brasil passou de consumidor da cocaína produzida na Colômbia, Peru e Bolívia para um dos maiores fornecedores do mundo, respondendo por 7% das apreensões globais, só atrás da Colômbia (37%) e EUA (18%). As disputas das facções pela rota da Amazônia até os portos nordestinos é plausivelmente a principal causa da escalada de violência no Norte e no Nordeste.
A segurança pública é dever dos Estados, mas nenhum deles tem recursos para enfrentar organizações que, em acelerada nacionalização e internacionalização, se ramificam sofisticadamente por âmbitos variados da sociedade civil, dos mercados e do Estado. Em 2018, o Congresso buscou resolver essa “acefalia federativa” criando o Sistema Único de Segurança Pública para coordenar ações de prevenção e inteligência entre os três níveis da Federação. Mas o programa foi praticamente descontinuado pelo último governo, mais interessado em armar os cidadãos do que em sofisticar a segurança pública. Nesse vácuo, as facções multiplicam seus tentáculos como hidras.
Não é por coincidência que, da malha de crimes perpetrados por elas, a sua face mais monstruosa esteja nos presídios. Massacres, decapitações e até canibalismo se tornam uma apavorante rotina, especialmente nas prisões do Norte e do Nordeste.
Em tese, o sistema carcerário deveria atender a três fins: a proteção da sociedade pelo isolamento de seus agressores, a dissuasão dos aspirantes ao crime e a ressocialização dos condenados. Na prática, o sistema prisional inverteu completamente esses fins – e, a começar pelo primeiro e mais importante, promove o seu oposto.
Nas últimas décadas, os presídios se transformaram em verdadeiras incubadoras do crime. É de lá que as facções extraem sua matéria-prima. Na comparação internacional, o Brasil tem altas taxas de encarceramento, de presos sem condenação e de superlotação. Apenas 15% dos presos estudam e 18% trabalham. Cerca de 40% são provisórios. Responsáveis por crimes de menor impacto e que poderiam ser passíveis de penas alternativas, na maioria jovens, são obrigados a se submeter a pactos de vassalagem com condenados por crimes de sangue, hediondos ou de organização criminosa, que, estima-se, representam só 13% da população prisional.
Todos os anos são enviados para essas “masmorras medievais” – na célebre definição de José Eduardo Cardozo, então ministro da Justiça, em 2015 – multidões de pobres-diabos que, após passar pelos rituais da academia do crime armada pelas facções, são bombeados para a sociedade em legiões mais ressentidas, mais violentas e mais organizadas.
Ao invés de reintegrarem os criminosos à sociedade, os presídios estão submetendo a sociedade ao crime. Numa espécie de pesadelo, porções inteiras do Brasil transformam-se num grande presídio. Os abastados se enclausuram em condomínios amuralhados e carros blindados. Os pobres veem bairros inteiros serem sequestrados pelas organizações criminosas, que controlam seus mercados e infraestrutura, cooptam seus votos e recrutam seus filhos, num verdadeiro Estado paralelo. Os que ousam resistir são retaliados com as mais horrendas humilhações e crueldades.
Os presídios que, em tese, deveriam ser o símbolo maior do poder do Estado, na prática são hoje o emblema máximo de sua falência. Enquanto essa subversão infernal não for revertida, a Nação pagará cada vez mais com seu sangue.
Bom dia.
Parabéns pelo texto acima, sobre os presídios.
Realmente, eles são um centro de recrutamento de soldados para o crime organizado.
Eu conheci um jovem que foi pego comercializando uns baseadinhos na esquina de casa.
Mesmo sem antecedentes ou sentença judicial, por ser pobre, foi jogado e esquecido na cadeia.
Tudo junto e misturado.
Segundo seu relato, pra conseguir “proteção” contra estupro e espancamento, também pra conseguir um lugar pra dormir, o detento “calouro” tem que se “filiar” a uma facção criminosa.
A “dívida” será paga em dinheiro ou em “serviços” na hora que o portão abrir. 👀😥
Felizmente o Prefeito tem bom gosto ao presentear!
O ALERTA POTIGUAR, por Malu Gaspar, em O Globo
De tempos em tempos, o crime organizado produz um espetáculo de violência e selvageria que nos lembra da pior maneira possível de uma de nossas mais graves lacunas, que nenhum governo foi capaz de sanar: a falta de uma política integrada de segurança pública, que submete os brasileiros à constante sensação de vulnerabilidade.
Nos últimos dias, o Rio Grande do Norte vem sofrendo com ataques a ônibus, prédios públicos e lojas que resultaram em três mortos e 43 presos. Para tentar conter a desordem, a governadora Fátima Bezerra (PT) recorreu ao governo federal, que enviou a Força Nacional*.
Pelo que se sabe até agora, os ataques têm relação com as péssimas condições nos presídios locais, com denúncias de tortura, superlotação e de comida estragada.
Em 2021, o Amazonas foi palco de crise semelhante, que também terminou com a chegada da Força Nacional. Em 2019, tinha acontecido no Ceará. Rebeliões nas penitenciárias de Pedrinhas, no Maranhão, e de Alcaçuz, no mesmo Rio Grande do Norte, já haviam legado à memória nacional imagens tenebrosas de presos decapitados e incinerados durante rebeliões.
Embora cada caso tenha um motivo particular, todos começaram com o “salve” de uma facção criminosa com ramificações nos presídios locais. Em todos houve uma resposta improvisada — como esparadrapos que cobrem as feridas, mas não curam o tecido doente.
O esparadrapo de Jair Bolsonaro foi a liberalização do acesso às armas, com a tentativa de implantar um “excludente de ilicitude” que, na prática, também servia como um “liberou geral” à violência policial. Como se vê, a política do tiro, porrada e bomba não fez os criminosos desaparecer, não reduziu o crime organizado, nem ajudou a impedir novos ataques e rebeliões.
Quando Bolsonaro assumiu o governo, o Brasil estava prestes a implantar o Sistema Único de Segurança Pública, criado em 2018 depois de um amplo debate do Congresso.
Mas o sistema, planejado para integrar as bases de dados sobre crime de todo o país, permitindo a articulação de operações e atividades de inteligência, foi esquecido e até hoje carece de regulamentação e estrutura. Se estivesse em funcionamento, poderia ter ajudado a prevenir os ataques no Rio Grande do Norte.
O desleixo com a segurança pública é fruto de uma característica comum à esquerda e à direita: a falta de coragem para discutir o tema em profundidade. Para boa parte da direita, política de segurança pública é matar bandido. A esquerda historicamente evita o assunto, que considera “questão de polícia”.
Na campanha, o time de Lula ensaiou um debate sobre segurança em que se propunha a reformulação das polícias, mas ele foi rapidamente sufocado. Temia-se a má repercussão numa fatia do eleitorado que poderia fazer diferença decisiva em favor de Bolsonaro.
Houve, ainda, uma intensa discussão sobre a necessidade de criar um Ministério da Segurança Pública separado do Ministério da Justiça, para manter o foco no combate ao crime sistêmico. O tema rachou os aliados do petista, que ao final optou por deixar tudo como estava.
Ontem, enquanto cem homens da Força Nacional desembarcavam em Natal, Lula anunciava a distribuição de 270 viaturas policiais licitadas* no governo passado e a recriação do Pronasci, um programa que financia de viaturas a delegacias, passando por programas de educação e ressocialização de presos.
No discurso, Lula falou da importância do acolhimento à mulher e do investimento em educação para reduzir a criminalidade, mas não disse uma palavra sobre os acontecimentos no Rio Grande do Norte, onde teve 65% dos votos no segundo turno.
Aliados de Lula têm sido explícitos ao dizer que, pelo menos neste primeiro semestre, não há chance de o governo investir num debate mais aprofundado sobre a reforma das polícias, a ampliação da Força Nacional ou qualquer outro tema espinhoso na área de segurança pública.
É até compreensível, dado que o Planalto ainda não conseguiu resolver nem mesmo questões bem mais simples, como a nomeação para os cargos de segundo e terceiro escalão. Ou mais urgentes, como a formação da base de apoio no Congresso. Mas não deixa de ser preocupante e certamente cobrará um preço.
Da última vez que a esquerda deixou no vácuo um tema tão importante para o brasileiro médio, teve que engolir a ascensão de Jair Bolsonaro.
Atualização às 8h48: O Ministério da Justiça informou que está apenas colaborando com o governo do Rio Grande do Norte e não realizou intervenção federal no sistema penitenciário do estado. O que está em curso é uma operação tática para estabilizar a situação nos presídios — diferente da intervenção que ocorreu, por exemplo, no Distrito Federal após o 8 de janeiro. Também observou que as viaturas entregues ontem foram licitadas no governo passado, mas pagas (e portanto compradas) nesta gestão. Os trechos do texto original que continham essas informações foram corrigidos.