Um outro artigo já estava pronto para esta quarta-feira quando… Gaspar, definitivamente, não é para amadores. A foto que abre este artigo foi da reunião do colegiado desta madrugada. Igualzinha as quase centenas já feitas e que não produziram resultados efetivos para a cidade, como os próprios pares trombetearam na Câmara na quarta-feira da semana passada. A foto do relógio caro e digital, é a prova da marquetagem feita intencionalmente naquilo que não produz resultado para o cidadão e a cidadã.
Enquanto a governo de Gaspar distraía a cidade com reuniões de “planejamento” na madrugada para com ela dar a falsa impressão de fazendo horas extras e cobrando resultados dos seus secretários, comissionados e cargos de confiança, no mundo oficial – e que se esconde na imprensa local e regional – o Tribunal de Contas de Santa Catarina mandou avisar de que o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, terá que ressarcir aos cofres públicos, por “possíveis danos ao erário”, R$58.245,80. Isto sem a atualização monetária e que pode até dobrar este valor. O Tribunal abriu mais uma vez, tempo para Kleber e a sua turma recorrer.
Esta análise e julgamento no TCSC tratou denuncia a promoção pessoal de agentes públicos, em possível e flagrante violação aos princípios da moralidade e impessoalidade, culminando em suposto prejuízo ao erário.
A denúncia é de 2017 por uso indevido da marca de governo “Avança Gaspar” em suposta comunicação governamental e que foi interpretada como uma ação política promocional pelos denunciantes e acatada pelo Tribunal.
Ela envolve, vejam bem, o Samae de Gaspar e na época, então presidido pelo mais longevo dos vereadores, José Hilário Melato, PP, o mesmo que também já ensejou até uma desgastante CPI, e devidamente enterrada na Câmara. Ela, na época, tentava mostrar irregularidades à drenagem da Rua Frei Solano, no bairro Gasparinho. Melato se reelegeu e hoje é o vice-presidente da Câmara, onde de fato, manda mais que seu presidente, o reeleito Ciro André Quintino, MDB.
Voltando um pouco no tempo.
Em 2017, escolados, até porque tiveram os mesmos defeitos, questionamentos e revezes quando estavam no poder de plantão e exatamente por quem resolveu imitá-los, os vereadores do PT, Dionísio Luiz Bertoldi, Rui Carlos Deschamps e Mariluci Deschamps Rosa (ex-vice-prefeita), além de Cícero Giovane Amaro, então no PSD, disseram ao Tribunal, com farta prova documental produzida pela área de marketing da prefeitura e do Samae de Kleber, o vice Luiz Carlos Spengler Filho, hoje secretário de Ogras e Serviços Urbanos, além do próprio Melato que usavam dinheiro público para promoção fora do que determinava a lei. Todos eles, institucionalmente, estavam fazendo promoção pessoal e política com motes, com marca e narrativas governamentais.
O que decidiu o TCESC no dia 15 de fevereiro de 2023 e que só agora veio a público e mesmo percorrendo as redações, a maioria resolveu esperar o estouro da boiada em outro lugar? Dar ciência ao prefeito Kleber do ocorrido com a denúncia. Ela tinha sido transformada em Tomada de contas, onde Kleber e os envolvidos já se defenderam. O TCESC que definiu então em 14 de dezembro do ano passado o relator, José Nei Alberton Ascari, que Kleber foi individualizado como o responsável pela ação, dano e o ressarcimento aos cofres municipais. Kleber ainda pode espernear.
Este assunto eu já toquei nele por diversas vezes quando ainda escrevia a coluna para a edição das sextas-feiras do jornal Cruzeiro do Vale. Também já a repassei por aqui.
E todos os envolvidos mandando bananas para os denunciantes e para este escriba quando eu tocava no assunto. Então está aí. Três coisas a lamentar: primeiro o tempo que se levou para definir a a culpa, descaracterizá-la ou descartá-la, até porque à época havia um medo latente para a inelegibilidade de Kleber quando tentasse à reeleição; a não certeza da atualização da pena pecuniária, bem como a forma da imprensa na cidade esconder este tipo de assunto da razão dela existir: leitores, ouvintes e telespectadores. O promotor deste caso, foi o criterioso Diogo Roberto Ringenberg.
Para a Área Técnica [ do Tribunal], “as peças publicitárias veiculadas, além de ausente o caráter educativo, informativo ou de orientação social, visam apenas promover a gestão. Observa, tambèm, a presença do Prefeito em algumas dessas publicações e, ainda que divulgadas nas redes sociais do Responsável, sustenta que a vinculação da sua imagem com o programa ‘Avança Gaspar’ corrobora a ocorrência de sua promoção pessoal”.
A defesa de Kleber e os envolvidos contestaram. Para eles “os anúncios contêm informações relevantes à população, na medida em que permitem o acompanhamento das despesas e obras públicas, bem como demonstra todas as ações realizadas no Município de Gaspar; não havendo dano ao erário“.
Entretanto, esta tese não prevaleceu perante os experimentados técnicos e conselheiros do TCESC. Os argumentos e documentos levados pelos denunciantes, os precedentes em julgados anteriores, fecharam entendimento majoritário no TCESC contra o prefeito Kleber.
Para o Tribunal, “uma forma de examinar se está presente o caráter informativo de tais peças é indagar se o cidadão necessita ser informado a respeito do conteúdo da campanha publicitária; se de alguma forma a informação divulgada interfere na vida ou no cotidiano da população“. Ou seja, não se encontrou esta resposta. E em determinado trecho expositivo para culpar Kleber, o relator do caso no TCSC, afirmou: “são desprovidas de caráter informativo, pois são meros anúncios das realizações da gestão municipal, como forma de enaltecê-la a fim de “colher os dividendos eleitorais” de tais realizações“.
Quantas vezes meus leitores e leitoras foram informados de que a cara estrutura e custos do marketing de Kleber trabalha contra ele? Não produzia uma imagem de um líder político, mas um misto de ajuntador de miudezas com ator de reels de tik tok, como aquele “acorda pedrinho”, para glorificar ele pegando um avião em mais de uma dezena de viagens à Brasília sem pauta prévia e resultados posteriores claros, debatidos com a sociedade.
Para se salvar e não ter concorrente, à última hora, Kleber teve até que se unir a um vice e depois passar a perna nele no trato que fizeram e espalharam pela cidade. isto sem falar que teve que correr de uma candidatura a deputado estadual lançada por riquinhos, empresários e um conselho fake da cidade, exatamente, por não ter capital político para a cabala num ambiente de quase um milhão de votos válidos, que é o Vale Europeu. Virão mais revezes. Inclusive a da falta de ar. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
O circo. É dia de novo espetáculo. Pois não que nesta terça-feira o prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, para tapar o sol com a peneira, criar um factóide e distrair a cidade, marcou uma reunião de “planejamento”, mais uma, mas desta vez, as 5h30min no seu gabinete. E fez disso um estardalhaço de marketing na cidade só para chamar a atenção. Depois rumou para Florianópolis.
Acordados, os seus secretários e “çábios”, nas múltiplas reuniões de planejamento que Kleber faz por semana, ou não conseguem entender o chefe – e ele é culpado porque não os troca -, talvez, as 5h30min, quando muitos ainda estão no primeiro sono, mas convocados e com muitos cafezinhos, vão entender. O tempo dirá se a experiência foi válida.
O que pegou de verdade? O discurso de quarta-feira do presidente da Câmara, Ciro André Quintino, MDB, e que não o fez do nada e por maluquice. Ele estava coberto pela maioria onde está inserido dentro do Legislativo. As queixas não são de um o outro opositor, dos dois que fazem este papel na Câmara de 13 vereadores. Na terça-feira era dia de nova sessão e Kleber e seus “çábios”, resolveram estancar com espetáculos.
Os políticos que cercam Kleber espalharam a “novidade”, a de estar numa reunião as 5h30min. Teve a segunda-feira toda para fazer isso. Não fez. Criou um fato para dizer que estava trabalhando. E mais uma vez planejando. Mas, o que falha é o essencial: a execução. O que é pior, mesmo: a simples manutenção.
E acordar cedo não é novidade nenhuma. Só pode ser para políticos. Os nossos trabalhadores da Capital Nacional da Moda Infantil, inventada por políticos, acorda já a partir das 4h da manhã, para às 5h estar nas facções, fábricas e muitas vezes sem ter onde deixar seus filhos. E eles não planejam. Executam o que de dia é planejado por quem é pagou o possui conhecimento específico para isso.
Cada coisa. É o marketing do desastre. Só Kleber é quem não enxerga onde meteram ele. Acorda, Gaspar!
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ERROS ANTIGOS, por Merval pereira, no jornal O Globo
O PT repete erros antigos e os usa para justificá-los, como se assim amenizasse os estragos decorrentes. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve uma vitória política importante contra o próprio partido ao conseguir convencer o presidente Lula de que a volta dos impostos federais dos combustíveis seria fundamental para o equilíbrio das contas públicas.
Não há sentido em o PT fazer campanha contra uma política econômica que tem lógica e coerência diante da crise que o país enfrenta. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, selou em decorrência uma aliança com o PSOL em favor de “uma política econômica de esquerda”.
Seria “de esquerda” provocar o desequilíbrio fiscal com medidas populistas, como o fim dos impostos dos combustíveis? Se for isso, Bolsonaro é de esquerda, pois foi o que fez para ganhar votos na campanha eleitoral em que foi derrotado, nunca é demais lembrar, por uma diferença ínfima de votos. Se fosse simples assim fazer uma política econômica que estimule o desenvolvimento sem provocar inflação, a solução teria sido dada pela “nova matriz econômica” do ex-ministro Guido Mantega, iniciada no final do segundo mandato de Lula e aprofundada no governo Dilma, com as consequências que o país sofre até hoje.
Haddad, para dar um ar de normalidade a essa autoflagelação do PT, lembrou que ainda em 2003 o partido também fez um abaixo-assinado criticando a política econômica de então, pedindo a saída de Antonio Palocci, ministro da Fazenda durante o primeiro governo Lula. Como ficou claro, Palocci tinha toda a razão ao dar continuidade à política econômica do governo antecessor, baseada justamente no equilíbrio fiscal, em metas de inflação e no câmbio flutuante.
A diferença é que hoje a situação econômica, no Brasil e no mundo, é muito pior, e é preciso tomar medidas muito mais duras para superar a crise. Nos primeiros governos Lula, o vice-presidente José Alencar foi o maior opositor dos juros altos definidos pelo Banco Central, que não tinha independência ainda e abrigava um tucano, o deputado federal Henrique Meirelles. A campanha do vice não abalou o BC de então, que, com o apoio do presidente Lula, tinha autonomia incontestável.
No primeiro mês de governo, os juros, que já estavam em 25% para tentar conter a inflação que acelerava, subiram para 25,5%, o que provocou a revolta petista. Lula só foi interferir no Banco Central no final do segundo mandato, influenciado por Mantega. Os juros, que já tinham estado em 26,5% no primeiro mandato, estavam em 11,25%, e Lula achou que não precisava mais de Meirelles.
Só não o substituiu pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo — que chegou a ser convidado —porque o Brasil recebeu o grau de investimento da agência Standard & Poor’s. Sinal de que a economia havia entrado nos trilhos. Os detalhes estão narrados no livro “Eles não são loucos”, do jornalista João Borges, editado pela Penguin.
Hoje, com o Banco Central independente fora do controle do governo, é o próprio Lula quem vocaliza a insatisfação com os juros em 13,75%. O ministro Haddad, sob fogo cruzado do PT, deu uma demonstração de força e também de que leva a sério o compromisso com o equilíbrio fiscal. Mas entrou na liça para forçar uma queda nos juros.
Ele espera que esse esforço que fez para dobrar o presidente Lula seja recompensado com uma queda dos juros, o que daria a ele mais força interna no PT. A visão política dos petistas de que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, está boicotando o governo por ser bolsonarista também predominou na gestão de Meirelles no BC e de outros economistas liberais na ocasião, como Marcos Lisboa, Murilo Portugal e Joaquim Levy.
A falta de visão de longo prazo provoca situações bizarras, como aquela em que se meteu Gleisi Hoffmann. Ao criticar a posição de Haddad sobre a taxação de combustíveis, ela disse que promessas de campanha seriam “descumpridas” se fosse retomada. Quem fez as promessas de campanha foi o presidente Lula, que autorizou a volta.
A PRESSA DE LULA, por Maria Cristina Fernandes, no jornal Valor Econômico
“O melhor presidente do país foi o senhor e não a Dilma.” O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ouviu esta frase de um ministro a quem cobrou pressa nos resultados. Por semanas a fio, o enredo desta pressa foram as provocações dirigidas por Lula contra o Banco Central, uma toada que remete ao isolamento da ex-presidente do PIB nacional na crise que precipitou o fim de seu governo.
Na manhã dessa terça-feira, o presidente voltou a falar em pressa durante o relançamento do Conselho Nacional de Segurança Alimentar: “Estamos há 59 dias no governo. Não temos mais quatro anos. Temos três anos e dez meses e um dia pela frente”. E explicitou sua preocupação com a marca que os 100 dias de seu governo terá. Uma gestão que já fez o primeiro repasse da merenda escolar aos municípios – os mesmos R$ 0,36 que embalaram a campanha petista contra o governo Bolsonaro.
Quatro horas depois, a pressa de Lula cedeu a uma lombada com o anúncio da reoneração dos combustíveis. O ministro da Fazenda ganhou tempo ao demonstrar a Lula que se acelerar rumo ao desatino fiscal seu governo vai se parecer mais com o de Dilma Rousseff do que com os mandatos que lhe permitiram entregar a faixa com a maior popularidade da redemocratização.
As primeiras pesquisas mostraram que Lula começa o governo muito mais próximo da magra vitória de outubro do que da consagração de 2010. Conseguiu capturar, até aqui, menos de 10% do eleitorado do ex-presidente, o que é pouco para devolver o bolsonarismo ao seu núcleo duro.
Uma das razões é que Lula tem que administrar uma rejeição resiliente. Enfrenta um lavajatismo recalcitrante e um bolsonarismo que custa a voltar para a pasta de dente. São fenômenos que ultrapassam a batalha eleitoral e se incorporaram à paisagem. Podem fazer com que, no limite, as ambições de Lula se realizem num governo mais popular do que a figura do presidente.
A notícia de que o vice-presidente, Geraldo Alckmin, terá agendas de governo independentes do titular e até do próprio Ministério da Indústria e Comércio que comanda parece responder a esta percepção. Será uma agenda mais afeita a políticas públicas populares, como o Bolsa Família ou o Minha Casa Minha Vida.
Tanto melhor se o mesmo acontecer com agregados pela frente ampla, como Marina Silva e Simone Tebet, do que com aqueles incorporados pelo mandarinato parlamentar, como Juscelino Filho.
É como maestro de um governo que, efetivamente, traduza esta frente ampla que Lula pode ser reconhecido por uma fatia mais expressiva dos 57 milhões que, em outubro, optaram por Jair Bolsonaro e custam a largá-lo. O lulismo que ultrapassa as fronteiras do governo parece um fenômeno datado e circunscrito aos seus dois primeiros mandatos. Lula não precisou dos moderados apenas para ganhar a eleição. Ele precisa deles para governar.
Esta ideia apareceu em muitos discursos de sua campanha e em atos de seu governo como aquele que presidiu a união federativa em favor dos desabrigados do litoral norte de São Paulo. Na prática, porém, não é a frente ampla que tem movido o governo, mas a pressa de Lula.
Os ministros têm se surpreendido com o grau de cobrança de um presidente pouco afeito a uma rotina indulgente. Num único dia, sua agenda chegou a registrar 15 audiências. Se a primeira-dama, Janja da Silva, tivesse tanto poder como lhe imputam, não se estenderia tanto. Como Lula é o mais velho de sua equipe, tem licença para cobrar que o ritmo se reproduza na Esplanada.
Passou a reclamar menos da imprensa e a cobrar mais dos ministros pelas más notícias que recebe. Sua equipe hoje se divide entre aqueles que, cobrados pelo chefe, se apressam a tomar providências e a dar entrevistas para anunciá-las, doa a quem doer, e aqueles outros que buscam ganhar tempo costurando, internamente e com os demais Poderes, os impactos das demandas emanadas do gabinete presidencial.
Um integrante do primeiro time explica que a celeridade com que dá sequência às demandas de Lula é pautada também pelo fogo amigo. Colado em Lula, se protege dos adversários internos. O mundo gira e o Brasil roda, só as labaredas dos governos petistas não se extinguem.
Um integrante do segundo time diz que costura de fora para dentro na tentativa de ampliar a base do governo. Ao tentar responder às demandas de Lula pelo desfazimento da herança bolsonarista, tem encontrado parlamentares aliados ao governo passado, que, a cada momento em que o presidente pisa num calo do bolsonarismo, mais dificuldades têm para justificar, junto à sua base, uma aliança com o novo governo.
O choque entre a pressa de Lula e as lombadas da Esplanada só não é maior porque é uma equipe calejada esta que aí está. Somados os mandatos dos ministros em governos estaduais ou em outras passagens pela Esplanada, chega-se a 70 anos. Experiência de governo permite saber onde dá para acelerar e as curvas em que se pode capotar.
Nenhum deles, porém, tem a experiência acumulada por Lula em embates parlamentares. E esta parece ser a real motivação da pressa do presidente. O 8 de janeiro, e o genocídio ianomami estenderam não um tapete, mas um colchão vermelho de boa vontade com a estreia do governo.
Com o início efetivo da agenda do Congresso, a partir da próxima semana, é que se poderá aquilatar o quão fino já está este colchão. A agenda do Executivo no Congresso tem enroscos como a reforma tributária, o arcabouço fiscal e a reoneração dos combustíveis. O “orçamento secreto” foi apenas parcialmente desidratado. A autonomia do Congresso também conta com os fundos partidário e eleitoral para se impor frente ao Executivo. E as lideranças do Centrão ainda se valem do bolsonarismo recalcitrante, em pautas como a CPI do 8 de janeiro, para tentar reaver os espaços perdidos.
Seus patrocinadores tentam se valer dos mesmos métodos do ex-presidente. Pretendem, com a comissão, levar os governistas a esticar a corda com as Forças Armadas, onde prosperam as desavenças internas em torno da submissão à nova ordem, para desestabilizar não apenas a sociedade, mas o novo governo.
É esta turbulência que marca o início efetivo dos trabalhos legislativos. A velocidade de tramitação das pautas do Executivo no Congresso é proporcional à capacidade de entrega de seu governo e à popularidade dela decorrente. Vem daí a pressa. E também as lombadas.
A PRESSA COMO INIMIGA, por Willian Waack, no jornal O Estado de S. Paulo
Ninguém duvida de que o desempenho geral da economia tem considerável peso na popularidade de governantes, embora não seja o único fator. Mas a maneira como os principais dirigentes do PT enxergam a questão traduz, às vezes, certa paranoia e limita tomadas de decisões.
Ao justificar, por exemplo, a decisão inicial de Lula de prosseguir com a demagógica desoneração dos impostos sobre combustíveis – herança do governo anterior –, o ministro da Fazenda mencionou como motivo os “rumores de um golpe de Estado” naquele momento.
A insurreição bolsonarista do 8 de janeiro reforçou no Estado-Maior petista a convicção de que dificuldades econômicas “abrem caminho para o golpismo”, nas palavras do ministro da Justiça. Nesse raciocínio, a taxa Selic não é outra coisa senão a “asfixia” política do atual governo.
O primado da popularidade de curto prazo do presidente torna impossível aos dirigentes petistas enxergarem a questão fiscal como um necessário conjunto de decisões de caráter imediato que, por sua vez, balizam condições para políticas monetária, creditícia e tributária.
Há doutrinas econômicas como pano de fundo para essa postura (o célebre “gasto é vida”), mas o critério essencial é político do mais descarado imediatismo. Assim, a expansão dos gastos públicos surge como essencial do ponto de vista da sobrevivência política do Lula 3.
Dessa expansão se espera um “milagre” de crescimento que ainda não se vislumbra, e algum tipo de entusiasmo que ainda não se sente – o que aprofunda nos dirigentes petistas a ideia de que estão “cercados”. Nesse sentido, identificam como principais adversários as percepções de risco manifestadas por agentes econômicos (o tal “mercado”) e o Centrão.
De fato, ambos estão impondo consideráveis limitações ao que é um governo petista com fachada de “frente ampla”. O embate com “os mercados” resultou até aqui em taxas de juros futuras altíssimas e numa cautela em investir por parte do setor privado.
Quanto ao enfrentamento com o Centrão, está apenas no começo. Ele se dá na arena clássica da ocupação de cargos na máquina e nas grandes estatais, das quais a Petrobras é apenas a mais visível. Já é guerra surda, por exemplo, por causa da paralisação da montagem do segundo escalão em ministérios que lidam com setores essenciais da economia, como Minas e Energia, onde o PT bloqueia nomes que julga “bolsonaristas”.
A pressa e a ansiedade de Lula em produzir logo resultados econômicos que se traduzam em benefícios políticos estão tirando de seu governo qualquer horizonte mais ampliado.
O ARTIGO 142 É INOCENTE, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Ministros dignitários do governo querem mudar o texto do artigo 142 da Constituição para impedir novas aventuras golpistas. A intenção pode ser boa, o resultado será nulo, e a iniciativa acabará no ridículo.
O tão falado 142 diz o seguinte:
Art. 142 — As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos Poderes Constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Seu autor intelectual foi o general Leônidas Pires Gonçalves, ministro do Exército de março de 1985 a março de 1990. Criou-se a fantasia segundo a qual esse texto abre o caminho para golpes militares, a partir de uma malversação de mobilizações militares pelo instrumento da Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Durante o governo de Michel Temer, por pouco não se chegou a uma utilização homófoba da GLO, permitindo a expedição de mandados coletivos de busca e apreensão para os moradores de uma rua, comunidade ou bairro. Ficou no talvez.
Pode-se dar ao artigo 142 qualquer redação, e ainda assim o regime democrático poderá ser ameaçado por golpes militares, mas jamais haverá golpe sem a participação e o estímulo das vivandeiras civis.
Se não houve golpe no ocaso do bolsonarismo, foi porque eram irrelevantes as vivandeiras, e prevaleceu na cúpula militar o sentimento legalista. É bom lembrar que o ex-ministro Anderson Torres, em cuja casa havia um projeto maluco de golpe, é um paisano. O regime mostrou-se blindado pela firmeza das posições do Judiciário e do Congresso.
A discussão do texto do artigo 142 desloca o eixo da questão para o mundo da fantasia. Anderson Torres está preso, e presas estão centenas de pessoas que vandalizaram o Congresso, o Planalto e o Supremo Tribunal Federal. Os denunciados são 912. O ministro Alexandre de Moraes conduz a investigação do golpismo do 8 de Janeiro. Nas mãos desse magistrado está a responsabilização dos culpados, civis e militares.
Nenhum dos 912 denunciados ou daqueles que se meteram com o 8 de Janeiro queria garantir os Poderes Constitucionais. Pelo contrário.
É de um militar, o marechal Castello Branco, a melhor qualificação das vivandeiras:
– Eu os identifico a todos. E são muitos deles, os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e provocar extravagâncias do Poder Militar.
No ano do centenário da morte de Rui Barbosa, um campeão de campanhas civilistas, fica a lembrança de que a ação de vivandeiras, anterior a 1930, não se resume aos trogloditas dos vandalismos do 8 de Janeiro.
No dia 9 de novembro de 1889, Rui bulia com os granadeiros, insinuando que o governo queria diluir a força do Exército, que “ir-se-á escoando, batalhão a batalhão, até desaparecer da capital do império o último soldado”.
Na manhã do dia 15 deu-se a extravagância, e à tarde ele foi nomeado ministro da Fazenda.
TRABALHO A PRESERVAR, editorial do jornal Folha de S. Paulo
São dignos de celebração os números que mostram a expressiva queda do desemprego no país ao longo do ano passado, divulgados pelo IBGE nesta terça-feira (28).
Encerrou-se 2022 com taxa de desocupação de 7,9% no quarto trimestre, ante 11,1% medidos 12 meses antes e 14,2% ao final de 2020, quando se vivia o pior do impacto da pandemia. Trata-se da melhora mais longa e aguda desde o fim da recessão de 2014-16.
Isso não quer dizer, claro, que se viva um momento brilhante de pujança econômica e ascensão social. Há senões, a começar pelo rendimento médio do trabalho de R$ 2.808 mensais – que, embora tenha aumentado recentemente, ainda é o menor em cinco anos.
As médias, ademais, escondem desigualdades de todos os tipos. O desemprego entre as mulheres nordestinas ainda atinge alarmantes 13,2%, enquanto entre os homens do Sul não passa de 3,6%. Não parece absurdo, aliás, correlacionar tais percentuais aos perfis dos eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).
Nada menos que 16,4% dos jovens de 18 a 24 anos em busca de ocupação não a conseguem. Entre os que se declaram pretos, a taxa de desocupação é de 9,9%, ante 9,2% dos pardos e 6,2% dos brancos.
Pode-se constatar, de qualquer modo, que o mercado de trabalho se tornou mais favorável em todos os recortes, graças a um crescimento surpreendente da economia, em torno dos 3% no ano passado.
Já os impactos da reforma trabalhista de 2017 ainda são difíceis de mensurar – mas ao menos se esvaziaram teses desonestas que associavam a flexibilização da CLT a números ruins, em períodos anteriores, provocados por estagnação econômica ou pela crise sanitária.
A informalidade, principal alvo da reforma, caiu de 40,7% para 38,8% da população ocupada, percentuais que somam assalariados sem carteira assinada, trabalhadores familiares, autônomos e empregadores sem CNPJ.
Trata-se ainda de uma exorbitância, o que antes confirma o acerto do objetivo de permitir contratos de trabalho mais realistas e adaptáveis a diferentes atividades. É evidente, porém, que não haverá avanço expressivo sem expansão continuada do Produto Interno Bruto.
O governo Lula não deveria abordar o tema apenas com o viés do sindicalismo – o das corporações organizadas. Retrocessos no emprego podem ter custo político particularmente alto para o petista.
LULA 3 INCORPORA À ESPLANADA DOS MINISTÉRIOS ESCÂNDALOS QUE JÁ VEM PRONTOS, por Josias de Souza, no portal UOL
“Não preciso ficar prestando contas porque as pessoas me conhecem”, repetia Lula durante a campanha presidencial. “O que eu tenho é o legado de oito anos de Presidência da República.” Na área econômica, ainda não foi possível distinguir que Lula assumiu o Planalto – se o da austeridade ortodoxa do primeiro mandato ou o da heterodoxia expansionista do segundo. Na composição política, porém, é notável a diferença de Lula 3. As extravagâncias pululam nos primeiros dois meses. No momento, está pendurado de ponta-cabeça nas manchetes o ministro Juscelino Filho, das Comunicações.
Sob Bolsonaro, o deputado Juscelino usou R$ 5 milhões do orçamento secreto para asfaltar uma estrada que passa em frente à sua fazenda, no Maranhão. Na campanha à reeleição para a Câmara, no ano passado, omitiu da Justiça Eleitoral um patrimônio avaliado em R$ 2,2 milhões em cavalos de raça. No ministério, cavou uma agenda hipoteticamente “urgente” em São Paulo como pretexto para voar nas asas da Força Aérea Brasileira para um leilão de cavalos.
Médico e empresário, Juscelino revela-se dotado de múltiplas aptidões. Nenhuma delas orna com as atribuições de um chefe da pasta das Comunicações. Ganhou o ministério como representante do União Brasil. A legenda obteve outras duas pastas. No Turismo, emplacou Daniela do Waguinho, notabilizada pelos vínculos com milicianos do Rio. Na Integração Regional, Waldez Góes, condenado no STJ por desvios de verbas públicas. Aos poucos, o desarranjo ético do terceiro mandato de Lula vai ganhando nome.
Muitos o chamam de Juscelino, Daniela ou Waldez. Outros o batizam de Davi Alcolumbre, patrono das três nomeações. Alguns preferem chamar de Elmar Nascimento, o líder do União Brasil que se escorou no prestígio de Arthur Lira para manter sob seus domínios a Codevasf, autarquia pela qual verbas secretas do orçamento saíram pelo ladrão na gestão Bolsonaro.
Se os nomes da perversão fossem esses, a solução seria simples. Bastariam alguns golpes de caneta. Mas o verdadeiro nome do problema é Lula. Nos mandatos anteriores, suava o paletó para produzir seus próprios escândalos – mensalões e petrolões. Agora, incorpora à sua terceira gestão escândalos que já chegam prontos à Esplanada dos Ministérios.