Os políticos que buscam o poder a qualquer preço estão cada vez mais iguais, independente dos supostos campos ideológicos a que eles dizem pertencer ou defender. Usam falsa estopa (antiga vedação, explicando o velho ditado) na pregação de suas canoas. Foi assim que se descobriu a verdadeira razão da viagem desta semana do vice-prefeito Marcelo de Souza Brick, um zumbi dentro do tal Patriotas, depois que saiu do PSD para se aventurar a candidato a deputado estadual, partido que sequer fez o consciente eleitoral para eleger qualquer um dos seus candidatos abastados de verbas publicas dos fundos partidários e eleitorais.
Marcelo não é apenas zumbi no partido que se agarrou, escolha escondida de todos e à última hora, como também está isolado na atual administração de Gaspar, onde pelos acordos de bastidores pré-eleitoral deveria ser o atual prefeito do município. Desesperadamente, Marcelo tenta se reconstruir como um político viável. Nas urnas, de verdade, ele foi eleito uma única vez. Isto aconteceu há mais de dez anos. Foi em 2012 como vereador. Nela foi campeão de votos com 1.439 sufrágios. E num lance de sorte, mostrando a sua elasticidade para resultados pessoais, com ajuda do PT, Marcelo foi presidente da Câmara.
Desde então, só colecionou empregos comissionados e derrotas, até 2020 quando no PSD, uniu-se ao MDB, PDT, PSDB e PP e resolveu não correr riscos: tornou-se vice-prefeito de Kleber Edson Wan Dall, MDB, por iniciativa do MDB, o qual via em Marcelo um risco a ser “eliminado” para assim continuar folgadamente no poder e se garantir na reeleição.
Explicado aos sem memória ou que criam narrativas – devido à pressão que o poder de plantão exerce ao que sobrou da dita imprensa – as quais não se sustentam em fatos e números, prossigo.
Eu, antes de todos, afirmei nesta quarta-feira em A VIAGEM DO VICE DE GASPAR A BRASÍLIA E O FATO DELE PAGAR A VIAGEM DO “PRÓPRIO BOLSO” PODEM LHE CUSTAR CARO NO AMBIENTE POLÍTICO que Marcelo estava em busca de protagonismo para o novo embate eleitoral. Ele vive disso. Mirei no que vi. Acertei no que não vi. Marcelo com pepelinhos timbrados da prefeitura de Gaspar e às sombras do prefeito Kleber, este também como revelei, com viagem marcada para a Capital Federal na semana que vem, foi a Brasília distribuí-los em gabinete de parlamentares pedindo ajutório em emendas para as obras daqui. Desculpa esfarrapada para se relacionar, sentir temperatura, construir pontes, negociar e se dar bem.
Então é meia verdade de que Marcelo foi a Brasília sem despesas para os gasparenses. Marcelo, de verdade, foi acertar o seu ingresso no PL com o padrinho da hora, o deputado Ivan Naatz, PL, de Blumenau. Ou seja, agora se entende bem o porquê de Marcelo não ter pego as polpudas diárias da prefeitura de Gaspar para esta viagem. Explicado, vamos adiante.
Lá nas andanças em Brasília, Marcelo se “encontrou”, levado por Ivan, com a turma do PL catarinense que estava na reunião da Frente Parlamentar Catarinense. Entre eles, Daniel Freitas, de Criciúma, no Sul do Estado, de segundo mandato, ex-PSL e União Brasil, e que está à esquerda na foto acima. Alinhavou-se à entrada Marcelo no PL. O martelo ainda não está batido, garantiu-me uma fonte estadual de dentro do PL mais bolsonarista. O fato é de que houve realmente demonstrações recíprocas de interesses.
Depois de ver que Marcelo era manchete por aqui, Naatz começou a disparar à “novidade” aos veículos de comunicação de Gaspar. O tiro – e aviso – tinha um endereço: o ex-amigo, ex- companheiro de PV, o também não de direita e conservador e que é presidente da Comissão do PL de Gaspar, o engenheiro Rodrigo Boeing Althoff, ex-candidato a prefeito de Gaspar. Os Ivan e Rodrigo não se bicam. E Marcelo, pulou – como sempre fez até aqui na vida e o penúltimo exemplo tinha sido o caso emblemático do Patriotas- esta etapa.
Já contei há meses – e que um leitor deste blog me relembrou – em A DIREITA E O BOLSONARISMO FORAM ENGOLIDOS HÁ MUITO EM GASPAR. SÓ AGORA PERCEBERAM E CHORAM! Ou seja, comprova-se que antes do interesse partidário vem o desejo de poder e quem fica com as sobras dele.
Retomando.
O deputado Ivan garantiu na quarta-feira à noite com quem conversou ou trocou mensagem com ele sobre este assunto de que se dependesse do PL catarinense, tudo estaria sacramentado para a filiação de Marcelo. O deputado Ivan não disse quais do PL o acompanha nesta ideia. O PL nacional e o de Santa Catarina, bem como o de Gaspar não foge à regra, é uma bomba relógio. Há os moderados e os bolsonarista radicais. E se degladiam por espaços. Os radicais, em menor número, fazem barulho e acuam. Nem Marcelo, nem Ivan, nem Rodrigo são conservadores, de direita ou radicais.
Rodrigo, ao contrário, mal orientado, estabeleceu-se numa bolha depois de quase conseguir fazer um milagre na eleição municipal de 2020. Sem estrutura, e numa campanha de dois meses, conseguiu 22,21% dos votos válidos (7.097) contra uma máquina dos principais partidos e à junção de um concorrente de peso, Marcelo, para a reeleição de Kleber e que conseguiu 65,60% dos votos válidos (20.960). As três outras candidaturas, incluindo o PT e a direita bolsonarista nem cócegas fizeram.
Rodrigo errou e foi soberbo. Achou que era à própria cocada preta. Não exerceu a responsabilidade dada pelas urnas de oposição. Esperou, no silêncio do seu sítio, ser carregado como a única opção. Foi engolido, não exatamente pelos adversários, mas pelo fogo amigo e a tática adotada.
“Não podemos desprezar a votação de Marcelo aí em Gaspar. São 14.500 votos”, justificou Ivan. Bom se o deputado está se referindo a uma campanha estadual para deputado, Marcelo conseguiu 14.444 votos em Santa Catarina. Em Gaspar, apenas 10.070 votos contra os 2.106 dados a Ivan.
No currículo de eleições há um histórico de votos do vice-prefeito de Gaspar. Marcelo além dos 1.439 votos na única vez eleito e diplomado em 2012 e dos 10.070 no ano passado, 9.210 dos votos (25,91% dos válidos ) quando disputou a prefeitura e perdeu para Kleber que teve 13.290 votos (37,39% dos válidos) o que por si só se explicou o medo de Kleber e o comodismo de Marcelo para se unirem em 2020, bem como os 10.009 votos que Marcelo conseguiu em 2018 como candidato a deputado Federal pelo PSD, está estabelecida o teto de Marcelo em Gaspar. Resumindo tudo: a média de Marcelo é de dez mil votos por aqui em todos os testes dele nas urnas que não para vereador.
A iniciativa de Marcelo não surpreende ninguém. A de Ivan também não. Agora que isto embaralha a corrida eleitoral, a isto embaralha. O próprio Ciro André Quintino, MDB, presidente da Câmara, que também nunca foi de direita, conservador, veste-se com a fantasia da vez e por isso, até flertou com o bolsonarismo, nutria o caminho do PL para ser candidato pelo partido, pois sabe que o seu MDB é feito de muitas manhas, donos e complicações. E no MDB Ciro não tem luz própria. E faz tempo.
E o caminho usado por Ciro é Bernardo Leonardo Spengler Filho, amigo de Bruno Mello, filho de Jorginho e que é o vice-presidente estadual do PL, onde o governador Jorginho Mello, oficialmente é seu presidente. Na quarta-feira Ciro não dormiu direito. Está tentando entender o novo cenário, se ele evoluir com Marcelo no PL. Acorda, Gaspar!
TRAPICHE
O PL de Gaspar reagiu imediatamente. O presidente da Comissão Provisória, Rodrigo Boeing Althoff, assustado, mandou avisar de que nada foi tratado com ele. Ou seja passou recibo. Enquanto isso, todos – e deste o bolsonaristas até os que não são tão bolsonaristas assim – tentavam entender à jogada do deputado Ivan Naatz.
Na reação, foi redistribuído pelos aplicativos de mensagens, um áudio da campanha do ano passado. Nele, o deputado Ivan criticava fortemente à postura de Marcelo de Souza Brick na mudança em surdina do PSD para o Patriota, bem como possíveis, problemas nas prestações de contas e à ligação dependente de Marcelo com o vereador, Giovano Borges, e que continua no PSD.
Aliás, é este o questionamento da hora: qual o papel que Giovano terá se Marcelo realmente se filiar ao PL. Há uma unanimidade, seja na ala radical, como na que não se importa muito se é de direita ou bolsonarista, contra este suposto relacionamento de dependência visceral de Marcelo com Giovano.
No fundo, Ivan ainda poderá sair do PL. Ele está desconfortável. Vem perdendo todas. Perdeu na composição para dar ao governo de Jorginho Mello, PL, maioria sustentável na Assembleia. Agora, o PL não o quer como líder do partido. Prefere Ana Coroline Campagnolo. O jogador de pedras, Ivan seria então o líder do governo. E o que estar por vir com tantos erros de Jorginho, sinaliza que pode ser ruim. Daí que….
Mistério. Ivan afirmou que Marcelo foi a dobradinha dele. Uma coisa não fecha com a outra. Ambos eram candidatos adversários numa mesma região a deputado estadual. Que dobradinha é esta? Ivan questionado, não explicou.
Na dobradinha para Federal e só dentro do PL, o pessoal que toca a Comissão Provisória de Gaspar tem na ponta da língua os votos de seus candidatos: Jorge Goetten, 2.374 votos; Caroline de Toni, 1.620 votos; Julia Zanatta, 1.188 votos e Daniela Cristina Reinehr, 1.066 votos. Daniel Freitas, que não tinha a preferência da Comissão, levou 733 votos.com quem ele dobrou?
Terça-feira foi a primeira sessão da Câmara de Gaspar e sem o vereador Amauri Bornhausen, PDT. Cadeirante, diabético ele morreu no ano passado no dia 12 de dezembro. No lugar Amauri, assumiu o suplente que se viu surpreendido pela eleição de Amauri, Roberto Procópio de Souza. O vereador empossado ocupou a tribuna para agradecer aos suplentes que o ajudaram com os votos na sua eleição. Nem um pio sobre Amauri que lhe deu a vaga com a morte e votos para ser suplente. Um esforço incomum para esconder este fato. Quem assiste fica pasmo.
Quem se posicionou por uma homenagem pública de reconhecimento a Amauri, foi o vereador Alexsandro Burnier, PL. Amauri apesar de ser da bancada do Amém, era crítico e cobrador ao governo Kleber Edson Wan Dall, MDB, nos erros, naqueles que via e não concordava. Roberto também já foi assim. Chegou ir até a Justiça por respostas de Kleber a seus requerimentos. Mas, mudou completamente ainda no mandato passado. Virou governo e nele estava empregado. Acorda, Gaspar!
9 comentários em “DEPUTADO IVAN NAATZ PLANTA O VICE-PREFEITO MARCELO BRICK NO PL DE GASPAR, APROFUNDA O RACHA NO DIRETÓRIO E TENTA ALTERAR O DESENHO ELEITORAL DE 2024”
LULA QUER O QUARTO POLO NAVAL, por Elio Gaspari nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
Boa ideia. O Brasil tem litoral, comércio, gasta uma fortuna em fretes marítimos e precisa de plataformas para exploração de petróleo. Como Asmodeu esconde-se nos detalhes, antes de colocar um só centavo na ressurreição de um polo naval onde quer que seja, conviria um exercício de humildade, explicando por que a geração de Lula financiou três polos navais, com três fracassos, um pior que o outro.
O primeiro polo naval nasceu no governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Atolou, e os grandes prejudicados foram os estaleiros que receberam incentivos e financiamentos públicos. O segundo polo nasceu durante o Milagre Brasileiro, na ditadura. Também atolou, com uma peculiaridade: o desastre materializou-se numa emissão de papéis da dívida da Superintendência de Marinha Mercante, a Sunamam. Em 1979 ela tinha um orçamento maior que o de muitos ministérios e funcionava como um verdadeiro banco. E como banco quebrou, com um buraco que pode ter chegado a US$ 1 bilhão em dinheiro de hoje. À época esse ervanário era chamado de “moeda podre”. Se fosse moeda de banco, valeria zero, como era da Viúva, rendeu cerca de 70% do seu valor de face, servindo para comprar ativos da mesma Boa Senhora. Assim, banqueiros e empresários compraram empresas estatais.
O terceiro polo naval surgiu no governo de Lula. Chegou a gerar perto de 100 mil empregos. Importam-se soldadores brasileiros que trabalhavam no Japão. Uma de suas joias era o estaleiro OSX, de Eike Batista. Quebrou com um espeto de R$ 4,2 bilhões. As petrorroubalheiras do consulado petista afogaram estaleiros e perderam-se dezenas de milhares de empregos. O petroleiro João Cândido, construído em Pernambuco, foi lançado ao mar em 2010 e adernou. Só voltou ao mar dois anos depois. Empresas beneficiadas por encomendas nesse terceiro polo naval ficaram mais conhecidas pelo que contaram à Justiça do que pelo que produziram.
Na retórica de Lula, não houve na História humana uma geração que financiasse quatro polos navais. O Japão, Coreia e Cingapura financiaram os seus uma só vez. Quando aconteceram problemas, os maganos foram para a cadeia e os operários continuaram a trabalhar, produzindo navios a custos competitivos.
Se Lula quer financiar o quarto polo naval, pouco lhe custaria reunir meia dúzia de técnicos para que lhe mostrassem como atolaram os três anteriores. Parte da resposta está nas roubalheiras.
Já que a conversa gira em torno dos estaleiros do Rio de Janeiro, vale a pena girar a roda da História. Apesar de muita gente boa acreditar que Portugal proibia a instalação de qualquer tipo de indústria no Brasil, é bom relembrar que na Ilha do Governador, em janeiro de 1663, foi lançado ao mar o galeão Padre Eterno, um dos maiores navios do seu tempo. Podia transportar quatro mil caixas de açúcar.
A COROA DA RIQUEZA NÃO TRAZ SORTE
Em Pindorama o título de “o homem mais rico do Brasil” não dá sorte aos seus titulares. Em 2012 esse galardão era exibido por Eike Batista, com uma fortuna avaliada em 30 bilhões de dólares. Deu no que deu.
Eike passou o título ao empresário Jorge Paulo Lemann, que encabeça a lista dos Dez Mais com uma fortuna estimada em US$ 16,1 bilhões, acompanhado pelos seus sócios Marcel Telles (US$ 10,8 bilhões) e Carlos Alberto Sicupira (US$ 8,8 bilhões). Com a bancarrota da rede Americanas, a mágica da trinca tisnou-se.
Ao contrário de Eike Batista, cujos negócios tinham muito pó e ao pó retornaram, a fortuna de Lemann, Telles e Sicupira deverá resistir ao tranco da Americanas e eles manterão boas posições na lista dos bilionários.
Na sequência, vem Eduardo Saverin (US$ 6,8 bilhões), um homem de sorte que se associou a Mark Zuckerberg quando ele lançou o Facebook, ainda como estudante em Harvard. Ele é um ponto fora da urucubaca porque mesmo tendo nascido no Brasil, foi jovem para Miami e vive em Cingapura.
Durante alguns anos o banqueiro José Safra disputou a posição. Homem discreto, atravessou em silêncio divergências e/ou brigas com irmãos, inclusive com a cunhada Lily, viúva de Edmond, morto em Monte Carlo em 1999. José morreu em 2020. Seu patrimônio teria passado dos US$ 19 bilhões.
Enquanto a rede Americanas está na frigideira, devendo ao banco Safra cerca de R$ 2 bilhões, Alberto Safra, filho do “Seu” José, abriu um processo contra a mãe e dois irmãos na Justiça americana, acusando-os de terem-no prejudicado na herança. O litígio envolve a holding que controla o Safra National Bank, que não tem relação com a casa de crédito da família no Brasil.
A lista dos bilionários brasileiros guarda uma diferença com a dos americanos. Apesar das encrencas em que se metem, Jeff Bezos, Elon Musk e Bill Gates associam seus nomes a transformações na economia. Um revolucionou o comércio, outro meteu-se com o carro elétrico e o terceiro, há tempo, mudou o rumo do negócio da informática.
OS MILITARES DE VOLTA
Com a ida de militares às terras dos ianomâmis em missão de socorro aos indígenas atormentados pelo garimpo e com o voo da Força Aérea para ajudar os chilenos a controlar incêndios florestais, as Forças Armadas brasileiras retornam a uma de suas virtuosas atribuições.
Como diria o poeta Cacaso, o vinagre vira vinho.
Durante a ditadura, ele escreveu:
Ficou moderno o Brasil
ficou moderno o milagre:
a água já não vira vinho,
vira direto vinagre.
BOLSA VERMEER
O Rijksmuseum de Amsterdam abriu uma exposição inesquecível, daquelas que só acontecem em décadas. Mostra 28 pinturas de Johannes Vermeer (1632-1675). Um prodígio, porque hoje existem menos de 40 quadros do artista com autenticidade comprovada. Há 30 anos, outra mostra juntou apenas 21.
De graça, o site do Rijksmuseum oferece na rede um serviço excepcional para quem tiver algum tempo para jogar fora. Numa visita eletrônica perfeitamente calibrada e narrada pelo inglês Stephen Fry (com legendas em inglês) vai-se por cada um dos quadros, com explicações didáticas e eruditas. Com cerca de cinco minutos para cada tela, percebem-se detalhes pelos quais poderia passar batido. As pérolas das garotas, os tapetes em cima das mesas ou o erotismo em diversos lábios.
Como na rede pode-se ver os quadros sentado e como não é preciso ver todos de uma vez, o Rijksmuseum deu ao mundo uma verdadeira Bolsa Vermeer. Não custa lembrar que o pintor levou uma vida dura. Criou 11 filhos, morreu arruinado aos 43 anos e sabe-se muito pouco de sua vida. Um de seus patronos era padeiro. Por séculos Vermeer foi tão subestimado que punham nomes de outros em suas telas. Seu “O Concerto”, roubado de um museu de Boston, nunca mais foi visto. Valeria 250 milhões de dólares.
RECONSTRUÇÃO DO PAÍS E POLÍTICA MONETÁRIA, por Pedro Malan, no jornal O Estado de S. Paulo
Vale relembrar o que disse Lula no primeiro discurso após sua vitória, na noite de 30 de outubro de 2022: “Esta não é uma vitória minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha. É a vitória de um imenso movimento democrático que se formou, acima dos partidos políticos, dos interesses pessoais e das ideologias, para que a democracia saísse vencedora. (…) A partir de 1.º de janeiro de 2023 vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim. Não existem dois Brasis. Somos um único país, um único povo, uma grande nação. (…) A ninguém interessa viver num país dividido, em permanente estado de guerra. (…) Esse povo está cansado de enxergar no outro um inimigo a ser temido ou destruído”.
Lula enfatiza a necessidade de reconstruir o País e sua alma. Recorro, a respeito desse propósito tão louvável, a Fernando Pessoa: “O primeiro passo para uma regeneração, econômica ou outra (do País), é criarmos uma atitude mental, um estado de espírito de confiança nessa regeneração”. Porém o que importa, de fato, no mundo real tem que ver com resultados efetivos. Estes, segundo o mesmo Pessoa, dependem de três coisas: “saber trabalhar”, “descobrir oportunidades” e “criar relações tanto na vida material quanto na vida mental”. O resto é sorte, diz Pessoa (“como herdar do tio brasileiro ou não estar onde caiu a granada”).
O momento recomenda que eu faça um comentário sobre as críticas à política monetária tal como conduzida pelo Banco Central; e sobre o voluntarismo de certas sugestões para “resolver” o problema.
Desde junho de 1999 o Brasil decidiu que seu regime monetário seria o regime de metas de inflação, que desde então vem servindo bem ao País. O Brasil decidiu tentar, desde 2000, ter um regime de responsabilidade fiscal, com a aprovação da lei que levou este nome. Temos um regime de taxas de câmbio flutuantes desde janeiro de 1999, quase um quarto de século. Os três foram avanços institucionais importantes.
Aquilo que seremos ou não como sociedade depende, é claro, de inúmeras outras questões econômicas, político-institucionais e sociais, que transcendem em muito as questões macroeconômicas. Mas um mínimo de previsibilidade, estabilidade, credibilidade e responsabilidade na área macroeconômica é condição inafastável para que os avanços nas outras áreas, que a tantos parecerão muito mais importantes, possam ser alcançados e consolidados.
Tenho insistido, há muito, na importância de distinguir entre (1) a decisão, que é política, sobre os regimes (monetário, cambial e fiscal) a adotar; (2) a operacionalização da política (monetária, cambial e fiscal), uma vez dados os regimes nas três áreas, e (3) sobre os níveis e variações específicos que assumem, a cada momento, as variáveis fundamentais de cada regime: a taxa de juros, a taxa de câmbio e, no caso do regime fiscal, os déficits (fluxo) e dívidas (estoques).
É importante a reafirmação da decisão política de que o regime de metas de inflação é o mais apropriado para o País. Dado nosso longo histórico nesta área, não teria qualquer credibilidade um governo que se limitasse a afirmar que “envidaria o melhor de seus esforços para manter a inflação sob controle – mas que não abriria mão de outros, mais importantes, objetivos econômicos e sociais”.
Há uma certa convergência, no caso do regime monetário, em favor do regime de metas de inflação. Mas há também uma crescente intenção de discutir a forma pela qual o Banco Central operacionaliza o regime, em particular a definição da meta de inflação para alguns anos à frente, bem como o nível e a trajetória dos juros básicos da economia.
É importante preservar a lei que assegura autonomia ao Banco Central para operacionalizar a política monetária por meio de decisões sobre a taxa de juros e seu curso futuro. Decisões adotadas dadas as metas estabelecidas, não pelo Banco Central, mas pelo governo – por intermédio do Conselho Monetário Nacional, no qual hoje estão presentes, além do BC, os ministros da Fazenda e do Planejamento.
É importante que haja debate honesto sobre o tema. Um debate baseado em discussões sobre nossa própria experiência, bem como sobre a experiência internacional. Um debate que deixe de lado o recurso a voluntarismos variados que não levam em conta o efeito e as consequências de decisões tomadas sobre o processo de formação de expectativas sobre o curso futuro da inflação, do câmbio e da dívida.
Há, sobre esses temas de fundamental importância, controvérsias legítimas entre pessoas de boa-fé. Não deveria haver ideologia nessa discussão, assim como não deveria haver ideologia no debate sobre o nível das taxas de juros corrente. Se os atuais 13,75% são vistos como “excessivos” e “insustentáveis”, é possível discutir as razões para tanto – e procurar as convergências possíveis entre soluções plausíveis. Dentre as quais se incluem talvez ligeiras elevações das metas antes definidas para 2024 e 2025. Sem perder de vista, nunca, que essas discussões não têm como excluir as questões fundamentais relacionadas às perspectivas de evolução dos resultados fiscais e dos efeitos sobre a trajetória da dívida no médio e longo prazos.
Bom dia.
Obrigada pelos “créditos” .
Ontem teve duas matérias no jornal Cruzeiro do Vale que revolveram o meu estômago 👀
1- Gasparenses não comparecem aos agendamentos médico em Gaspar.
Um recorde 😱😱😱
Queremos acesso aos nomes e telefones dos faltosos.
Depois de CONFERIR, a gente ACREDITA.
2- Começa a ser aplicada em Gaspar a lei do Executivo Municipal sobre as novas demarcações de PRESERVAÇÃO AMBIENTAL da cidade.
Esse PL aprovada em sessão plenária relâmpago e tumultuada por ir contra a CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Ela, a “lei”, LEGALIZA imóveis em situação irregular porque INVADIRAM área de RECUO de RIOS e RIBEIRÕES no município.
Tá lá gravado pra quem duvidar do que digo.
Teve inclusive um vereador que usou a tribuna da casa pra dizer que “se der problema lá na frente, a gente REVOGA A LEI” 😱😱
NESTE CASO, quem será RESPONSABILIZADO:
– O PREFEITO?
– A CÂMARA DE VEREADORES?
– OU QUEM ACREDITOU NELES???
Dois fatos.
O primeiro é esta dos faltosos. O secretário da Saúde está em campanha e está salvando a pele dele. Uma pessoa com dores, medo e sintomas, não pode ficar numa fila de exames ou procedimentos por meses. Se não morrer antes, a dor já passou ou ele foi atrás de uma solução no ambiente público ou até privado, tirando o dinheiro do bolso que não tinha. Aí quando chega a vez dele, falta. Falta comunicação ativa de acompanhamento dos casos da secretaria de Saúde
Segundo: olha estes assuntos de meio ambiente em Gaspar começam a ganhar contornos perigosos e quando os políticos se derem conta, estarão presos em armadilhas que eles próprios armaram. para quem fez uma lei abertamente inconstitucional com o olho fechado dos técnicos da Câmara, depois que ela foi usada amplamente, por pressão do Ministério Público, a desfizeram e nada aconteceu aos autores, aprovadores e desaprovadores da Lei, sinalizou-se que a corda pode ser esticada.
Aliás, segunda-feira, casualmente, eu trato deste assunto em artigo já escrito e ainda não publica.
SENHOR POLARIZAÇÃO, por Demetrio Magnoli, no jornal Folha de S. Paulo
Diz-se por aí que Lula ainda não desceu do palanque. De fato, na campanha eleitoral, o candidato até que evitou o proverbial palanque: buscou aliança com o centro democrático, sinalizou uma pacificação nacional, prometeu governar para todos. Foi só depois dela que o presidente subiu no palanque, reacendendo a fogueira da polarização. A estratégia discursiva organizou-se sobre quatro eixos, pontilhados por mentiras factuais e clamorosas contradições.
1) Independência do Banco Central
A linha definida por Lula foi exibir o BC como inimigo: um agente do bolsonarismo engajado na elevação dos juros para sabotar o crescimento econômico. Gleisi Hoffmann declarou que “o BC não deu um pio sobre as façanhas orçamentárias de Bolsonaro”. É fake news impune: durante o (des)governo bolsonarista o BC elevou a Selic de 2% para 13,75% e, ata após ata, o Copom alertou para as “façanhas” cometidas contra a responsabilidade fiscal. O BC é o STF de Lula.
2) Desestatização da Eletrobras
Lula qualificou a privatização da empresa como um crime contra o povo (“bandidagem”, nada menos), anunciando que a AGU acionará o Judiciário para revertê-la. A “bandidagem”, contudo, foi aprovada pelo Congresso, com o voto dos neoaliados lulistas. O governo pretende transformá-los em réus? Ou prevaricará? O presidente pediu, em 27 de janeiro, que os líderes parlamentares do governo desistam de “judicializar a política”. Pelo visto, a orientação só vale para os outros.
3) A natureza do golpismo
“Atos golpistas foram revolta dos ricos que perderam as eleições”, diagnosticou Lula, referindo-se ao 8 de janeiro. Demagogia em estado bruto: não faltaram pobres nas depredações golpistas de Brasília. Bolsonaro obteve 49% dos votos, vencendo no Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Seriam os “ricos”? Nessa hipótese, o Brasil deixaria a Suíça no chinelo.
4) Narrativa estatal sobre o impeachment
Como presidente, em visita ao exterior, Lula afirmou que o impeachment de Dilma Rousseff foi um “golpe de Estado”. Hélio Doyle, novo presidente da EBC, quer que a estatal de comunicação oficialize a narrativa revisionista. O mesmo STF que anulou as condenações de Lula supervisionou o impeachment, atestando sua legalidade. De acordo com a fake news lulista, os presidentes do Senado e da Câmara e os juízes do STF são golpistas –portanto, criminosos. Segundo a lógica presidencial, o próprio Lula chefia uma quadrilha de criminosos golpistas, pois dá guarida, no seu governo, a eminentes apoiadores do impeachment, como Alckmin, Tebet e Marina Silva, entre outros.
A polarização tem mil utilidades. Mantém a base militante aquecida, substitui o debate racional pelo intercâmbio de acusações, inventa bois de piranha para barbeiragens econômicas. Mas, especialmente, fabrica um conveniente “inimigo do povo”.
A retórica polarizadora de Lula forma um arco completo. O “golpe do impeachment” e o ensaio golpista do 8 de janeiro são elementos da guerra permanente dos “ricos” contra os “pobres”. A independência do BC e a privatização das estatais não passam de ferramentas dos “ricos” numa ofensiva destinada a conservar as desigualdades sociais e eternizar a pobreza. Os que não estiverem comigo são soldados da guerra da elite contra o povo.
Lula dá de dez em Bolsonaro no esporte da polarização. Começou bem antes, com a “herança maldita” de FHC, no seu primeiro mandato, quando prosseguia a política macroeconômica do antecessor. Sabe deplorá-la sem corar, enquanto a pratica. Acima de tudo, conhece a arte de adaptar a estratégia à conjuntura.
O presidente fala a uma nação traumatizada pelo 8 de janeiro. Atrás de suas sentenças, há o espectro de Bolsonaro. A meta final é identificar a crítica a seu governo com o golpismo bolsonarista. Não há espaço para mais que dois: quem não estiver comigo, está com ele. Eis o que Lula quer dizer.
Para os que criaram a creche em meio período em Gaspar – incluindo gente que se diz técnica na área – lerem. E entenderem o mal que fazem contra o futuro das pessoas
INFÂNCIA LONGE DA PRÉ ESCOLA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O início de mais um ano letivo renova o desafio para que o País consiga universalizar por completo o acesso à educação básica. Apesar de enormes avanços nas últimas décadas, 1 milhão de crianças e adolescentes permanecem fora da escola. Vale notar que essa exclusão atinge principalmente a população em idade pré-escolar, na faixa de 4 a 5 anos − fase em que o cérebro está em plena formação. O recém-lançado Censo Escolar de 2022 mostra que 512 mil crianças nessa faixa etária estavam longe das salas de aula no ano passado. Uma lástima e um alerta para que as redes de ensino adotem ou reforcem estratégias de busca ativa.
A meta de universalização do atendimento das crianças de 4 e 5 anos foi incluída no Plano Nacional de Educação (PNE) e deveria ter sido atingida em 2016. De acordo com estimativa do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), no entanto, a parcela de crianças sem frequentar a pré-escola girava em torno de 8% no ano passado, índice bem maior que o verificado no ensino fundamental (0,3%). Vale lembrar que o PNE é lei e que a própria Constituição prevê o atendimento escolar obrigatório a partir dos 4 anos de idade. No Brasil, não raro, nem isso basta para garantir a efetivação de direitos.
Recente estudo elaborado pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal − Desigualdades na garantia do direito à pré-escola − chamou a atenção para a diminuição de matrículas durante a pandemia de covid19 e como isso afetou ainda mais as crianças de famílias de baixa renda, pretas, pardas e indígenas. Os novos dados do Censo Escolar, felizmente, revelam que essa tendência foi estancada em 2022. Uma boa notícia. Mas o País tem muito a avançar rumo à universalização.
Pesquisas em diferentes países já constataram a contribuição da pré-escola para o desenvolvimento cognitivo e emocional, com reflexos na vida adulta. Brincadeiras e atividades na pré-escola facilitam a alfabetização na idade certa, passo decisivo para as demais aprendizagens no ensino fundamental e médio. Quem é privado desse tipo de experiência na infância tende a enfrentar mais dificuldades. O relatório da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal diz isso claramente: “Crianças que frequentam a pré-escola têm mais chances de terminarem a educação básica e maiores taxas de empregabilidade, bem como níveis mais altos de escolarização durante a vida adulta.”
O estudo foi elaborado com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). As duas organizações estão à frente de iniciativas de busca ativa para tentar reduzir o contingente de crianças longe das salas de aula. A educação infantil é responsabilidade das prefeituras, mas esse esforço deve mobilizar também os governos estaduais e o governo federal, além da Justiça, dos conselhos tutelares e das famílias em todo o País. Cada criança matriculada é uma chance a mais de um futuro melhor.
BIDEN DÁ A LULA A CHANCE DE MUDAR DE ASSUNTO, por Vera Magalhães, no jornal O Estado de S. Paulo
A crise entre Lula e o Banco Central sai de cena momentaneamente graças à viagem do presidente brasileiro aos Estados Unidos para um encontro bilateral com Joe Biden. É uma bem-vinda possibilidade de Lula mudar de assunto e dar aos bombeiros dos dois lados a chance de aplacar um bate-boca que tem pouca chance de produzir algo proveitoso para o próprio governo.
A agenda com Biden, ao contrário, tem dois temas de consenso que permitem a Lula surfar externa e internamente, podendo render dividendos imediatos ou produzir uma narrativa que impulsione iniciativas no Congresso e na sociedade.
São eles o meio ambiente e a defesa da democracia. É muito boa a ideia de sugerir aos Estados Unidos que ingressem de alguma maneira como mantenedores do Fundo Amazônia. Trata-se de uma iniciativa já consolidada, que tem dois países europeus, Alemanha e Noruega, como financiadores e que, simbolicamente, também ficou travada pela política destrutiva de Jair Bolsonaro para o meio ambiente.
Se conseguir engajar os Estados Unidos nessa ou em outra linha de financiamento a projetos em defesa da Amazônia, no momento em que o mundo acompanha com atenção a crise humanitária dos ianomâmis, Lula terá conseguido mostrar em menos de dois meses de mandato, com resultados concretos, como se pode, com diplomacia correta e sem deixar a ideologia atravessar temas de Estado, obter benefícios para o país.
É o tipo de tema com capacidade de reduzir resistências ao governo em setores empresariais e no mercado, uma vez que, hoje, investimentos, exportações e negócios de toda natureza estão inevitavelmente condicionados à boa governança climática e ambiental.
Se Lula conseguir destravar recursos que não andavam em razão da forma como Bolsonaro transformou o Brasil num pária nas mesas globais de negociação, será um forte vetor de diferenciação entre o presidente e seu antecessor, com muito mais concretude e efetividade que empreender uma guerra com a autoridade monetária nacional.
O segundo tópico de consenso em proveito do Brasil é a defesa da democracia, que une os dois países graças às figuras de Donald Trump e Jair Bolsonaro e ao que legaram em sua saída do poder, o 6 de Janeiro deles e nosso 8 de Janeiro dois anos depois.
Biden tem todo interesse em ter Lula como aliado na pregação pela necessidade de as democracias estabelecerem mecanismos que as blindem dos extremistas que tentam dinamitá-las a partir de dentro. A investigação sobre a invasão do Capitólio avança para a fase final, em que se discutirá a responsabilização de Trump, e isso se fundirá de forma ainda imprevisível com o início da campanha eleitoral de 2024.
O Brasil tem muito a estudar sobre o caso norte-americano, e um discurso alinhado entre Lula e Biden em defesa da contenção do extremismo doméstico politicamente motivado pode ajudar a pavimentar o caminho, em Brasília, para a discussão no Congresso de um pacote de salvaguarda à democracia, que começou a ser analisado com velocidade máxima pelo Ministério da Justiça de Flávio Dino, mas perdeu ímpeto nas últimas semanas, também ele engolido pelas querelas econômicas.
Nosso “Capitólio candango” completou um mês com diferentes estágios de consequências. Enquanto as investigações correm céleres, e até o Ministério Público Federal se empenha em denunciar os praticantes da tentativa de golpe, o governo parece apostar na linha da pacificação com as Forças Armadas, sem responsabilização dos que foram simpáticos aos golpistas — muitos foram afastados de seus postos, mas não se viu até aqui nenhum processo de averiguação de condutas.
A viagem pode ter o salutar efeito de reavivar no presidente a necessidade de ter esse tema como prioridade, até porque ele é capaz de manter alinhados o Congresso e o Judiciário, que não terão a mesma sinergia com o Executivo no caso da polêmica com o BC.
O REBANHO DE BODES EXPIATÓRIOS DO PT, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
É um locus classicus: o Brasil não é fustigado por catástrofes naturais, não tem histórico de guerras internacionais nem guerras civis, e, em que pesem as cicatrizes de seu passado escravocrata, é uma democracia multiétnica e multicultural enriquecida por imigrantes de todo o mundo, que tem à disposição abundantes recursos naturais para prosperar.
Mas, apesar disso, os índices de crescimento econômico, de saúde ou educação são cronicamente medíocres. O Estado, paquidérmico e ineficiente, é um sorvedouro de recursos saqueados dia e noite por legiões de políticos patrimonialistas, clientelistas e corporativistas. A sociedade, uma das mais desiguais do mundo, está unida pelo medo à violência e dividida pela radicalização política. Refletindo as causas e sintomas desse persistente mal-estar, as últimas eleições – mesmo num cenário de desemprego elevado, indústria estagnada, inflação acelerada e contas públicas desancoradas – foram uma batalha campal cujo rastro foi um deserto de propostas jamais visto desde a redemocratização. E, em tudo isso, qual é a parcela de responsabilidade do partido que governou o País por 14 dos últimos 20 anos? Segundo seu líder máximo, nenhuma. Ao contrário, se o Brasil não é o céu na terra, é porque o inferno são os outros.
Mal esquentou a cadeira presidencial, Lula já soou o apito para que seu rebanho militante arrebanhasse seus surrados bodes expiatórios. Segundo levantamento do Estado, em um mês Lula já apelou ao menos oito vezes ao antagonismo entre ricos e pobres. A invasão às sedes dos Três Poderes, por exemplo, “foi uma revolta dos ricos que perderam as eleições”. A bola da vez é o Banco Central, acusado de perseguir uma meta da inflação que não é o padrão “brasileiro”, seja lá o que isso queira dizer.
Na mitologia lulopetista, o Brasil vivia uma espiral virtuosa até o “golpe” destruir tudo. “Essa é a explicação que encontrei para o impeachment da presidente Dilma Rousseff, minha prisão e as várias mentiras fabricadas contra o PT”, disse Lula a um jornal chinês. “A única explicação que posso encontrar é esta. Os Estados Unidos estão sempre intervindo na política latinoamericana.”
Assim Lula estima as instituições nacionais: a imprensa, que denunciou escândalos de corrupção como o mensalão e o petrolão; a polícia, que os investigou; o Judiciário, que os condenou; o Congresso, que num processo presidido pela Suprema Corte destituiu sua criatura por crimes de responsabilidade, todos são fantoches de um grande complô do “imperialismo estadunidense”, do “capital”, das “elites” contra o “povo”, obviamente encarnado em Lula.
O PT se escandaliza com a miséria e a desigualdade, como se suas políticas econômicas negacionistas não tivessem nada a ver com a pior recessão da história recente; escandaliza-se com a corrupção, como se ela nada tivesse a ver com o sistemático aparelhamento do Estado para servir aos interesses do partido; escandaliza-se com a radicalização, como se ela nada tivesse a ver com a renitente demonização de seus adversários e críticos.
Questionado duas vezes em entrevista à RedeTV! sobre o que teria a dizer a todos que o rejeitaram nas urnas – que, somados os votos ao adversário, nulos, brancos e ausentes, representam quase 60% do eleitorado –, Lula só aludiu à “indústria de mentiras criada nesse país”. Ou seja, toda essa gente é mera massa de manobra ludibriada pela conspiração contra o PT. Logo, suas opiniões não são passíveis de conciliação, só de retificação ou retaliação.
Na verdade, o que Lula não tolera não é o empresariado, o Banco Central, a imprensa, o Judiciário, o Congresso, as massas que protestaram inúmeras vezes nas ruas; o que Lula não tolera é a insubmissão. Quaisquer parcelas da sociedade civil ou das instituições públicas que não sejam submissas ao projeto de poder hegemônico do PT já foram julgadas e condenadas pelo “tribunal da História”. Elas são culpadas de não rezar o credo petista, de não prestar genuflexão ao grande líder, e devem ser sacrificadas no altar erguido ao seu culto, como irredimíveis bodes expiatórios.
A vida dos políticos que pagamos como ela é
ARTHUR LIRA COMEÇA A PASSAR BOIADA ATÉ NO TCU, por Josias de Souza, no UOL
Ao aprovar a indicação do deputado Jhonatan de Jesus para ocupar uma cadeira de ministro do Tribunal de Contas da União, o Senado não se limitou a avalizar uma decisão que o plenário da Câmara havia aprovado. Os senadores endossaram uma mamata perigosa, imoral e ofensiva.
Jonatahn tem 39 anos. Foi apadrinhado por Arthur Lira, o soberano da Câmara. Pela lei, permanecerá no TCU até os 75 anos, quando terá que se aposentar. Sobreviverá ao governo Lula 3 e às administrações dos próximos oito presidentes. Ou seja: Ganhou de presente uma sinecura com prazo de validade de 36 anos.
A mamata é perigosa porque revela que o rei Arthur começa a passar sua boiada até no TCU. Em discurso na Câmara, Jonathan disse que vai ao tribunal de contas “imbuído do desejo de ajudar”. Para ele, “o TCU não existe para punir. O seu papel é auxiliar o Parlamento brasileiro. É auxiliar, fiscalizar e orientar, acima de tudo”. Para o novo ministro, o TCU não deve promover a “criminalização da política”. Absteve-se de falar sobre a politização de larápios que transformam a política em mais um ramo do crime organizado.
A mamata é imoral porque foi impulsionada pelo Palácio do Planalto. Jonathan é filiado ao Republicanos. Lula e seus operadores enxergaram na ascensão do deputado uma oportunidade para seduzir o braço partidário da Igreja Universal, atraindo a turma do bispo Edir Macedo para o bloco governista.
A mamata é ofensiva porque não há nela nada que possa representar interesse público. O deputado Jhonatan, médico de formação, não parece aparelhado para atuar no tribunal de contas como fiscal da aplicação de recursos arrancados pelo Estado do bolso do contribuinte.
O pai do novo ministro é o senador Mecias de Jesus. Ambos foram eleitos por Roraima. Apadrinharam a nomeação de uma trinca de diretores do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami. Esse pedaço da máquina pública frequenta inquéritos em que a Polícia Federal apura fraude na compra de remédios.